Obrigado, Perdão Ajuda-me

Obrigado, Perdão Ajuda-me
As minhas capacidades estão fortemente diminuídas com lapsos de memória e confusão mental. Esta é certamente a vontade do Senhor a Quem eu tudo ofereço. A vós que me leiam rogo orações por todos e por tudo o que eu amo. Bem-haja!

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

A surpresa do Concílio

Na próxima quinta-feira passa o cinquentenário de uma das realizações mais espantosas da humanidade. O início do 21º concílio ecuménico da Igreja Católica constitui um acontecimento decisivo para os fiéis mas, mesmo em termos meramente históricos, é um facto ímpar. 
Primeiro porque envolve uma das instituiçõe mais notáveis da humanidade. Não só é a maior comunidade religiosa mas, em certo sentido, é também a maior, mais antiga e influente organização de sempre. Só que, como dizer isto criaria irritação em certos sectores, será mais pacífico afirmar que constitui indiscutivelmente uma das mais vastas e relevantes instituições mundiais.
Mais surpreendente, praticamente inédito, é que tal entidade possa entrar voluntariamente num processo de profunda reforma interna. É raríssimo que organizações desta dimensão e influência consigam sequer simples reestruturações, quanto mais esforços desta magnitude. A coisa fica ainda mais incrível ao notar que o projecto foi provocado, não por necessidade premente ou acontecimento externo, mas por intuição profética de um homem providencial. Isto faz que, até na longa lista dos concílios, o último seja único.
A Igreja Católica é sem dúvida a instituição mais reformada de sempre. Os sete primeiros concílios trataram da pureza da doutrina contra heresias, mas os 14 seguintes, ao longo de 1097 anos, ocuparam-se de reorganização eclesial. Em todos, porém, existia um problema urgente que exigia resposta dos padres conciliares. No maior e mais influente, em Trento de 1545 a 1563, fez-se o ajustamento ao humanismo, que criara já uma suposta "reforma" por parte dos luteranos, que realmente fora uma ruptura. Coube ao Concílio a verdadeira, e tão esperada, reforma. Mas em 1962 ninguém esperava nada. Foi surpresa total.
Realmente em meados do século XX a Igreja não defrontava nenhum desafio visível. É verdade que há mais de 200 anos sofria a atitude hostil, muitas vezes violenta, da modernidade. Pode dizer-se até que fora essa dificuldade a motivar o Concílio anterior, Vaticano I, aliás interrompido brutalmente à mão militar em 1870. Mas 92 anos depois a pressão já não era candente. O motor do Concílio foi apenas o ardor pastoral de João XXIII.
Uma vez deflagrado o processo, tornou-se evidente a razão por que outras instituições nunca o fazem: é muito difícil equilibrar a necessidade de mudança com o risco de fractura ou distorção. A ânsia que sempre motivou a Igreja nos sucessivos concílios foi o regresso à pureza da sua identidade e missão, mas a multidão histórica de heresias mostra a dificuldade de fazê-lo com verdade. O processo foi longo e doloroso mas 50 anos depois vemos hoje que foi coroado de um êxito espantoso e inesperado. Ainda existem os que recusam a mudança ou condenam a inércia, mas a verdade é que o II Concílio do Vaticano conseguiu uma transformação formal mais profunda do que alguém poderia prever, enquanto reforçava a fidelidade doutrinal e a concórdia interna. Ninguém esperaria mais e melhor dos padres conciliares.
O propósito da reunião era claro: "O que mais importa ao Concílio Ecuménico é o seguinte: que o depósito sagrado da doutrina cristã seja guardado e ensinado de forma mais eficaz" (João XXIII, discurso na abertura do concílio, V.1). Porquê a doutrina?
Vivemos numa época que pensa poder viver sem colocar as perguntas fundamentais da existência, embriagado num utilitarismo míope. Reduzindo a Caridade a mera solidariedade e sem saber onde radicar a Esperança, torna-se cada vez mais claro que o que falta no mundo é a Fé. Ignorando o significado da vida, tudo o resto perde sentido. "O mundo actual apresenta-se, assim, simultaneamente poderoso e débil, capaz do melhor e do pior, tendo patente diante de si o caminho da liberdade ou da servidão, do progresso ou da regressão, da fraternidade ou do ódio" (Gaudium et Spes, 9).
O mundo, que nunca seria capaz de fazer um concílio, precisa da Fé que este proclamou. Meio século depois Bento XVI, último dos papas do Concílio, propõe um Ano da Fé.
          
João César da Neves in DN online AQUI

Sem comentários: