Fiquei surpreendido de encontrar em jornais católicos, de Itália e de outros países, a notícia da morte de Laura Antonelli, no passado 22 de Junho. Não era uma actriz escandalosa?!
Bem, o mundo dá muitas voltas. A beleza de outrora perdera-se um pouco, por causa de uma operação plástica que correu mal, mas o interessante foi que trocou de amigos. Cortou com a pandilha dos anos frenéticos e ficaram outras pessoas, em quem ela não tinha reparado. Eram os da paróquia, a sua paróquia, nos arredores de Roma. Nos últimos anos, já não atendia mais ninguém, somente o pároco, o irmão que vive no Canadá, os amigos da paróquia e dois actores dos antigos tempos, também eles mudados. Laura Antonelli distribuiu a fortuna que lhe restava e vivia com o mínimo. Não tinha televisão, o seu contacto com o mundo exterior era apenas a Radio Maria.
A Radio Maria começou em 1987 como uma antena paroquial e, pouco a pouco, alargou o seu raio de acção, divulgando orações, programas de catequese e informações sobre a Igreja.
Um dos actores com quem manteve contacto depois dos tempos das filmagens foi Lino Banfi: «Laura era uma mulher que se dava com toda a gente, divertida, auto-irónica, sempre com a piadinha pronta, era uma grande amiga». «Metíamo-nos com ela: “não contas até 10 antes de te lançares a qualquer coisa, só até 3...”, era uma pessoa sem regras, fiava-se dos outros e muitas vezes era gente desastrosa». Os últimos anos de Laura foram de má saúde e dificuldades económicas. Banfi conta que no fim de uma das últimas visitas lhe deixou um pacotinho de notas: «Dois minutos depois vi que dava uma grande parte a uma rapariga que estava lá em casa. Disse-lhe: “Laura, eu dei-te esse dinheiro porque tens mesmo necessidade”. Respondeu-me que havia quem tivesse mais necessidade do que ela. Era assim a Laura».
Claudia Koll |
O outro contacto com o antigo mundo do cinema era a Claudia Koll, também ela uma ex-actriz atrevida, que recorda: «Tínhamos muito em comum: ambas tínhamos sido actrizes, belas, e num certo período da nossa vida tínhamos encontrado Deus. A Laura tinha encontrado a Fé e rezava o dia todo, sintonizada com a Radio Maria. Ofereci-lhe um quadro de Cristo. Noutro momento, levei-lhe um calendário das nossas Missões em África». Por sugestão de Claudia, Laura tinha começado a escrever a história da sua conversão.
Aliás, o percurso da própria Claudia Koll também dava um livro. Actualmente, forma actores e promove espectáculos com intuitos de evangelização, mas dedica a maior parte do tempo a ajudar crianças com Sida, em África. Começou assim:
«Um dia, entrei numa igreja em Roma. Queria que Deus me ajudasse. Aproximou-se um padre e perguntou: “Que queres de Deus?” Eu respondi: “Nada, sou uma pecadora”. Fez-me o sinal da cruz e senti o coração transformar-se. Dobraram-se-me os joelhos, tive que me sentar, comecei a chorar... Era a resposta de Deus».
Poucos dias antes da morte de Laura Antonelli, a homilia do Papa Francisco tinha sido sobre guardar o coração para amar Deus com todas as forças. «Temos de estar atentos, para quando Deus passa pelo nosso coração», para isso é preciso «guardar o coração», «afastar todo aquele ruído que não vem do Senhor», ter «um coração livre das más paixões», «um coração guardado pela humildade, pela mansidão...», «um coração aberto ao Senhor que passa».
Lembrou-me aquela história contada por Mariano Fazio no livro que escreveu, de jacto, quando o Cardeal Bergoglio foi eleito (intitulado «O Papa Francisco – Chaves do seu pensamento»):
«Numa dessas visitas, quando lhe falei de um filme, contou-me que, há muitos anos, na véspera da festa de Nossa Senhora das Mercês, estava a ver televisão com outras pessoas quando apareceu um programa inconveniente. Naquele momento, prometeu a Nossa Senhora nunca mais ver televisão. Cumpriu a promessa e só via alguma notícia quando os seus colaboradores lhe diziam que era importante. Preferia informar-se pelos jornais».
José Maria C.S. André
«Correio dos Açores», «Verdadeiro Olhar», «ABC Portuguese Canadian Newspaper», «Spe Deus»
05-VII-2015
05-VII-2015