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São perguntas que exigem de cada um de nós uma resposta pessoal , na intimidade da própria oração, diante de Deus. Não desceremos a um nível tão pessoal, que não pode ser o objectivo de um artigo, mas seguiremos uma via não menos exigente: recordar os objectivos assinalados por Bento XVI e, a partir daí, orientar as reflexões para o futuro.
“Tal ano – escrevia o Papa na carta de proclamação do Ano Sacerdotal – pretende contribuir para fomentar o empenho de renovação interior de todos os sacerdotes para um testemunho evangélico mais vigoroso e incisivo no mundo de hoje ”. Citava também uma frase que o Cura d’Ars repetia com frequência e que foi incluída no Catecismo da Igreja Católica: “o sacerdócio é o amor do coração de Jesus”. Para se compreender a si mesmo, o sacerdote não se deve limitar a considerar o seu próprio trabalho pastoral, mas tem de ir muito mais além, até chegar a Cristo, em cuja humanidade reverbera toda a vida trinitária e na qual essa vida trinitária se abre aos homens.
Nesta perspectiva compreende-se a profundidade de outras palavras de São João Maria Vianney, citadas pelo Romano Pontífice: o sacerdote “não se entenderá a si mesmo senão no Céu”. Só então, ao aperceber-se do dominfinito e inefável da entrega de Deus ao homem, o sacerdote saboreará plenamente a própria realidade. Deus não só quis comunicar-Se aos homens mas tomou a nossa mesma natureza em Jesus Cristo; instituiu a Igreja e chamou determinados homens a quem, com o sacramento da ordem, converte em Seus ministros e instrumentos. A “audácia” de Deus - disse Bento XVI na homilia de encerramento do Ano sacerdotal - que, “apesar de conhecer as nossas debilidades, considera os homens capazes de agir e de se apresentar em Seu nome”, e que confia em nós ao ponto de Se abandonar nas nossas mãos, essa audácia é “a grandeza que se oculta na palavra «sacerdócio»” .
Com homilias, cartas e alocuções pontifícias, com celebrações, congressos e jornadas de reflexão ou de oração, foram repetidas por todo o mundo estas grandes verdades, exortando todos e em particular os sacerdotes a uma nova, profunda e alegre conversão. De facto, não se pode saborear esse excesso de amor divino, próprio do sacerdócio, sem se sentir pessoalmente empenhados em ser – como costumava dizer São Josemaría Escrivá de Balaguer – “sacerdotes cem por cento” (homilia Sacerdote para a eternidade, 13-4-1973).
O que implica este convite? Responder a esta pergunta requereria uma longa exposição sobre a teologia e a espiritualidade do sacerdócio, no entanto é útil deter-se pelo menos em três considerações fundamentais:
Deve-se estar consciente da dignidade do sacerdócio, do valor e da riqueza que tal condição implica, para que esta realidade impregne a totalidade da conduta e confira autenticidade a todos os momentos da existência, com a certeza de que, apesar da nossa pequenez, Cristo quer utilizar-nos para comunicar ao género humano os frutos da Sua obra redentora.
O presbítero deve identificar-se com Cristo, ter os mesmos sentimentos de Cristo (cfr. Flp 2, 5)e morrer para si mesmo para que Ele habite em nós (cfr. Gal 2, 20): sentir-se impelido a ser homem de Eucaristia, a viver a Santa Missa com a fé de que em cada celebração se perpetua o sacrifício de Cristo, morto e ressuscitado, que vem ao encontro da Sua Igreja e do sacerdote, para os atrair a Si e conduzi-los com o Espírito à intimidade filial com Deus Pai.
Deve-se desejar servir, cum gaudio em Cristo e por Cristo, a própria grei, a Igreja e toda a humanidade, de modo que no seu ser, como no de Jesus, não haja lugar para o egoísmo ou para a indiferença perante as necessidades dos outros. Isto implica dedicar-se com empenho, ainda que custe, a tudo o que contribua para o bem das almas, com uma caridade efectiva, na pregação da Palavra de Deus e no sacramento da Reconciliação.
O Ano sacerdotal situou-nos, no tempo e a partir do tempo, diante do eterno, diante de um amor de Deus que não passa, que não termina, mas que é sempre jovem e activo; com a realidade – feliz, surpreendente e profundamente verdadeira – de que esse amor, visível em Jesus Cristo, se transmite através da Igreja a cada cristão e a cada sacerdote. O Ano sacerdotal está destinado, sem dúvida, a produzir muitos e variados frutos na pregação, na catequese, ano cuidado da liturgia, nos diversos campos da pastoral e fundamentalmente, na renovação interior de cada sacerdote, e também no aumento de seminaristas nas dioceses. A “audácia de Deus”, de que falou Bento XVI, convoca-nos a todos “esperando o nosso sim”.
+ Javier Echevarría
Prelado do Opus Dei