Instituição do
Sacramento do perdão
Podemos
julgar - e talvez inconscientemente o façamos - que sabemos muito bem o que é o
perdão. Talvez o que nos convenha ter claro seja: o que é PERDOAR!
Sim...
digo bem - o que é PERDOAR! Parece muito claro que PERDOAR consiste em relevar
uma ofensa - intencionalmente cometida contra a nossa pessoa. Parece que sim, é
uma conclusão aceitável, mas há algumas "condições" que se impõem: Realmente
o que ficou "ferido": a minha personalidade ou a minha soberba?
Ouvimos
falar de soberba e, talvez, pensemos numa atitude despótica e avassaladora, com
grande barulho de vozes que aclamam o triunfador que passa, como um imperador
romano, debaixo dos altos arcos, inclinando a cabeça, pois teme que a sua
fronte gloriosa toque o alvo mármore... Sejamos realistas. Este tipo de soberba
só tem lugar numa fantasia louca. Temos de lutar contra outras formas mais
subtis, mais frequentes: o orgulho de preferir a própria excelência à do
próximo; a vaidade nas conversas, nos pensamentos e nos gestos; uma
susceptibilidade quase doentia, que se sente ofendida com palavras ou acções
que não são de forma alguma um agravo... Tudo isto, sim, pode ser, é uma
tentação corrente. O homem considera-se a si mesmo como o sol e o centro dos
que estão ao seu redor. Tudo deve girar em torno dele. Por isso, não raramente
acontece que ele recorre, com o seu afã mórbido, à própria simulação da dor, da
tristeza e da doença: para que os outros se preocupem com ele e o mimem. A
maior parte dos conflitos que se apresentam na vida interior de muitas pessoas,
fabrica-os a imaginação: é que disseram isto ou aquilo, são capazes de pensar
aqueloutro, não me consideram... E essa pobre alma sofre, graças à sua triste
fatuidade, com suspeitas que não são reais. Nessa aventura desgraçada, a sua
amargura é contínua e procura desassossegar os outros, porque não sabe ser
humilde, porque não aprendeu a esquecer-se de si mesmo para se entregar,
generosamente, ao serviço dos outros por amor de Deus». (Cfr.
São Josemaria, Amigos de Deus 101)
A
"ofensa" foi real, concreta, feita directamente, ou por "me ter
constado"? Trata-se de uma falsidade a meu respeito, ou de uma crítica a
alguma faceta do meu carácter ou comportamento? Qual foi a minha primeira
reacção?
A
estas duas perguntas só é possível responder fazendo um exame sério e
“desapaixonado” e justo. A nossa susceptibilidade é muitas vezes exagerada
considerando agravos e ofensas o que, talvez, não passe de uma manifestação de
“correcção fraterna”, ou seja, de amizade. Alguns – eu incluído – mantêm
actualizada uma lista de “agravos” que consideram ter sido vítimas. É verdade
que muitas destas supostas - ou reais – ofensas já as perdoamos mas, não
obstante, mantemos viva a sua lembrança.
Diz-se:
Eu perdoo mas não esqueço! Isto é um contra-senso, um disparate. Não esqueço
porquê? Pensar na simples hipótese que se Deus Nosso Senhor procedesse assim
connosco - perdoasse mas não esquecesse – deve causar-nos um imediato “calafrio”,
medo e angústia.
No
julgamento a que - todos – seremos sujeitos logo após a nossa morte terrena,
quão extenso seria o volume do nosso “processo”? Esta maneira de ser apresenta,
ainda, um outro perigo a ter muito em conta: A lembrança dos pecados do nosso
passado - recente ou não – por vezes com detalhes que podem levar-nos a uma
tentação terrível: A tentação da memória.
Sei
- experimentei-o muitas vezes - que mesmo sem o desejar se pode repetir o
pecado mesmo pecado. Não há, pois, outro caminho: - Perdoar e esquecer!
(AMA,
2019)