Que boa ocasião nos dá este mês tão mariano, dentro do Ano jubilar da misericórdia, para lhe pedir que nos obtenha do seu Filho um aumento grande desta virtude na nossa conduta pessoal! Recorramos a Santa Maria, Trono da Graça e da Glória, ut misericordiam consequamur [6], para alcançar misericórdia nos nossos afazeres.
O Evangelho da Missa da Assunção relata uma cena encantadora da vida da Virgem: a visita à sua prima santa Isabel. «Estas duas mulheres encontram-se –dizia o Santo Padre– e fazem-no com alegria: esse momento é de grande festa! Se aprendêssemos este serviço de ir ao encontro dos outros, como mudaria o mundo! O encontro é outro sinal cristão. Uma pessoa que se diz cristã e não é capaz de ir ao encontro dos outros não é totalmente cristã. Tanto o serviço como o encontro exigem sair de si próprio: sair para servir e sair para encontrar, para abraçar outra pessoa» [7].
Ao passar em revista as obras de misericórdia, detenhamo-nos agora numa que o Catecismo da Igreja Católica enuncia assim: suportar com paciência as contrariedades [8], tanto as que provêm dos nossos próprios limites, como as que procedem de fora. Mantenhamos uma confiança plena na misericórdia do Senhor que, de todos os acontecimentos, sabe tirar o bem. A paciência também cresce como um dos frutos mais saborosos da caridade para com o próximo. S. Paulo refere-o, no seu magnífico hino a esta virtude: O amor é paciente, o amor é prestável; não é invejoso, não é arrogante nem orgulhoso, nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita, nem guarda ressentimento, não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta [9].
A misericórdia há de conduzir-nos a viver diante dos outros com paciência, também quando se mostram inoportunos. Todos temos defeitos, arestas no caráter e, ainda que o não procuremos voluntariamente, muitas vezes causamos atritos que ferem os outros: os membros da nossa família, os colegas de trabalho, os amigos, nos momentos de crispação que podem surgir, por exemplo, nas filas de trânsito na cidade… Todas estas ocasiões nos dão oportunidade para tornar grata a vida aos outros, sem nos guiarmos por um caráter desordenado.
A paciência leva-nos a focar sem dramatismos as imperfeições dos outros, sem cair na tentação de lhas atirar à cara, nem procurar desabafar comentando-o com terceiros. De pouco serviria, por exemplo, calar-se perante certos defeitos de alguém se depois os puséssemos em evidência com um comentário irónico; ou se o nosso desgosto nos levasse a tratar a pessoa com frieza; ou se caíssemos em formas subtis de murmuração, que fazem mal a quem murmura, àquele que é objeto da murmuração, e a quem a ouve. Sofrer com paciência os defeitos dos outros convida-nos a procurar que essas carências não nos condicionem na altura de lhes querer bem: não se trata de os estimar apesar dessas limitações, mas sim de os amar com essas limitações. Esta é uma graça que podemos pedir ao Senhor: não nos determos nem justificar as nossas más reações perante as maneiras de ser diferentes dos outros que nos desgostam, porque cada uma, cada um, possui sempre muito maior riqueza, mais bondade do que os seus defeitos. Por isso, quando notarmos que o coração não responde, metamo-lo no coração do Senhor: Cor Iesu sacratissimum et misericors, dona nobis pacem! Ele transformará o nosso coração de pedra num coração de carne [10].
[6] Hb 4,16.
[7]. Papa Francisco, Homilia em Santa Marta, 31-V-2016.
[8]. Cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 2447.
[9]. 1 Cor 13, 4-7; cfr. Papa Francisco, Ex. apost. Amoris laetitia, capítulo IV.
[10]. Cfr. Ez 11, 19.
(D. Javier Echevarría excerto da carta do mês de agosto de 2016)
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