Num país onde os deputados ganham mais de cem vezes o ordenado médio, ainda há quem seja capaz de generosidade.
Um polícia queniano doou a totalidade do seu salário de Julho a uma organização que ajuda pessoas atingidas pela fome. A notícia fez manchete nesse país leste-africano, e não só. Numa altura em que mais de dois milhões de quenianos recebem ajuda alimentar, espera-se que o gesto inspire outras pessoas, se não a fazerem o mesmo, pelo menos a contribuírem.
O gesto de Hashim Mohammed Elmogo, um muçulmano de 36 anos, parece ter sido espontâneo. Ele diz que foi a resposta a um choque que o atingiu de repente quando viu uma criança a tentar mamar no peito da sua mãe já morta. "Fiquei muito emocionado", diz. "Temos de fazer o que pudermos para aliviar a situação e salvar os nossos irmãos quenianos".
Comparando com a vizinha Somália, a fome no Quénia tem recebido pouca atenção. No entanto, é uma situação que já afeta milhões de pessoas, em especial no Norte. Um milhão de seiscentas mil pessoas dependem do programa alimentar da ONU. Outras oitocentos mil, de ajuda governamental. E várias organizações no terreno desempenham um papel importante.
Amigos vão ajudá-lo durante o Ramadão
Hashim ganha o equivalente a 376 dólares, ou 265 euros. Não é um mau ordenado, num país onde o rendimento médio anda pelos 1600 dólares anuais. (Embora os membros do parlamento ganhem 175 mil dólares, e estejam atualmente a ver se conseguem continuar isentos de impostos!).
Primeiro de nove filhos, Hashim nasceu numa família com algum envolvimento na política local. Após estudar Jornalismo e Ciência Política na Índia, regressou ao Quénia. Tentou cursar direito, mas não entrou. Candidatou-se então à polícia.
A sua carreira lá não tem sido isenta de acidentes. Uma hérnia impediu-o de terminar um curso especial de promoção. Dois enfrentamentos pessoais com a lei, um por posse de bhang (uma intoxicante barato de origem indiana) e outro por agressão, também não ajudaram.
Nenhum desses casos acarretou consequências de maior, e nada terão a ver com a decisão generosa tomada por Hashim. Os seus amigos confirmam, e já se comprometeram a sustentá-lo durante o mês do Ramadão, que agora se inicia.
"Peço aos meus colegas que compreendam o significado de dar, especialmente durante o mês santo do Ramadão", diz Hashim. Inúmeras pessoas responderam já ao seu apelo.