Obrigado, Perdão Ajuda-me

Obrigado, Perdão Ajuda-me
As minhas capacidades estão fortemente diminuídas com lapsos de memória e confusão mental. Esta é certamente a vontade do Senhor a Quem eu tudo ofereço. A vós que me leiam rogo orações por todos e por tudo o que eu amo. Bem-haja!

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Homilia do 'Te Deum' de agradecimento pelo ano que termina

No final do ano, a Palavra de Deus acompanha-nos com estes dois versículos do apóstolo Paulo (cf. Gal 4, 4-5). São expressões breves e densas: uma síntese do Novo Testamento que dá sentido a um momento «crítico» como é sempre uma passagem de ano. A primeira expressão que nos sensibiliza é «plenitude do tempo». Assume uma ressonância particular nestas horas finais dum ano solar, em que sentimos ainda mais a necessidade de algo que encha de significado o transcorrer do tempo. Algo, ou melhor, alguém. E este «alguém» veio. Deus enviou-o: é «o seu Filho», Jesus. Celebramos há pouco o seu nascimento: nasceu duma mulher, a Virgem Maria; nasceu sob a Lei, um menino hebreu, sujeito à Lei do Senhor. 

Mas, como é possível? Como pode ser isto o sinal da «plenitude do tempo»? Claro, por enquanto é quase invisível e insignificante, mas, dentro de pouco mais de trinta anos, aquele Jesus desencadeará uma força inaudita, que dura ainda e durará ao longo da história inteira. Esta força chama-se Amor. É o amor que dá plenitude a tudo, mesmo ao tempo; e Jesus é o «concentrado» de todo o amor de Deus num ser humano. São Paulo diz, claramente, o motivo por que o Filho de Deus nasceu no tempo, qual é a missão que o Pai Lhe confiou para realizar: nasceu «para resgatar». 

Esta é a segunda palavra que nos sensibiliza: resgatar, isto é, fazer sair duma condição de escravidão e restituir à liberdade – à dignidade e à liberdade próprias de filhos. A escravidão que o apóstolo tem em mente é a da «Lei», entendida como um conjunto de preceitos que devem ser observados, uma Lei que certamente educa o homem, é pedagógica, mas não o liberta da sua condição de pecador; antes, de certo modo «crava-o» a esta condição, impedindo-o de atingir a liberdade do filho. Deus Pai enviou ao mundo o seu Filho Unigénito para desenraizar do coração do homem a escravidão antiga do pecado e, assim, restituir-lhe a sua dignidade. Pois, é do coração humano – como Jesus ensina no Evangelho (cf. Mc 7, 21-23) – que saem todas as más intenções, as iniquidades que corrompem a vida e as relações. 

E aqui devemos deter-nos; deter-nos a refletir com amargura e arrependimento porque, também durante este ano que chega ao fim, muitos homens e mulheres viveram, e vivem, em condições de escravidão, condições indignas de pessoas humanas. Também na nossa cidade de Roma, há irmãos e irmãs que, por vários motivos, estão neste estado. Penso, de modo particular, naqueles que vivem sem um lar. São mais de dez mil. De inverno, a sua situação é particularmente dura. Todos eles são filhos e filhas de Deus, mas diferentes formas de escravidão, por vezes muito complexas, levaram-nos a viver no limite extremo da dignidade humana. O próprio Jesus nasceu em condição semelhante, mas não por acaso nem por um incidente: quis nascer assim, para manifestar o amor de Deus pelos humildes e os pobres e, deste modo, lançar no mundo a semente do Reino de Deus, Reino de justiça, amor e paz, onde ninguém é escravo, mas todos são irmãos, filhos do único Pai. 

A Igreja que está em Roma não quer ficar indiferente às escravidões do nosso tempo, nem limitar-se a observá-las e prestar-lhes assistência, mas quer estar dentro desta realidade, próxima a estas pessoas e situações. Apraz-me encorajar esta forma da maternidade da Igreja, ao celebrarmos a maternidade divina da Virgem Maria. Contemplando este mistério, reconhecemos que Deus «nasceu de uma mulher» para que nós pudéssemos receber a plenitude da nossa humanidade, «a adoção de filhos». Pelo seu abaixamento, fomos solevados. Da sua pequenez, veio a nossa grandeza. 

Da sua fragilidade, a nossa força. De Ele Se fazer servo, a nossa liberdade. 

Que nome dar a tudo isso, senão Amor? Amor do Pai e do Filho e do Espírito Santo, a Quem a santa mãe Igreja eleva em todo o mundo, nesta tarde, o seu hino de louvor e agradecimento.

«Non finito», pintura do Infinito

Vou transcrever extensos parágrafos de Maria Zarco sobre um quadro de Leonardo da Vinci [1], que vem a propósito deste Natal de 2017. O quadro, que tinha sido levado em 2011 para restauro, voltou agora a casa, na «Galleria degli Uffizi», em Florença. Uma entrada espectacular por uma janela alta do edifício, à uma da manhã, com escolta de «carabinieri», suspenso de um guindaste, à luz dos holofotes. É que o quadro mede 6 m2 e está pintado sobre grossas pranchas de madeira. É grande e pesa muito.

Tudo começou, corria o ano de 1481. Leonardo já era famoso quando recebeu, com 29 anos, esta encomenda do convento de San Donato. A grande superfície de madeira esperava o pincel, para se transformar num presépio com a adoração dos Magos. Foi preciso trabalhar longamente, porque os pintores têm muito que fazer antes de acometer a obra propriamente dita. Os quadros nascem nos bosquejos que se sucedem, experimentando a composição, os planos, as feições. É assim que, aos poucos, a obra ganha vida e amadurece, até à forma definitiva.

Passados 200 anos, o retábulo mudou-se para a «Galleria degli Uffizi», aonde agora voltou, depois de 6 anos de restauro, muito mais colorido e com algumas figuras secundárias que se tinham apagado com o tempo.

O interessante é recuar 536 anos, àqueles dois anos intensos que Leonardo gastou a pintar o quadro. A peça tem um impacto notável e parte desse efeito vem de que Leonardo levou ao extremo a estética do «non finito», do «não acabado». Em vez do retoque minucioso, preferiu sublinhar o essencial e, sobretudo, não dar a ilusão (talvez pretensiosa) da completude. A beleza e o equilíbrio da cena estão lá, mas concentradas na mensagem principal.

A criatividade fervilhante do pintor rompeu com as convenções artísticas, facilitando a coabitação de vários cenários, diferenciados pela ordenação em perspectiva, que era ainda um expediente invulgar. Este domínio exímio da profundidade permitiu hierarquizar as cenas em graus de distância. O recurso a sombreados e claridades acentuou esse efeito de perspectiva, alongando a vista até lonjuras então inimagináveis. E, tudo isto, com a aplicação exponenciada do «non finito».

O pintor encontrou uma nova posição para a Mãe e o Filho, ao centrá-los no primeiro plano, em vez da localização tradicional, numa das laterais, que desenrolava a cena bíblica em linha horizontal, a fluir de um lado ao outro. Neste quadro, o presépio passa para o epicentro de uma narrativa que se desenvolve na profundidade (em vez de em fila transversal), abarcando um espaço maior, em que se sobrepõem episódios de épocas diferentes. Leonardo coloca o presépio no contexto da história da humanidade, no vértice do tempo.
Qual é esta luz potente que se projecta sobre a história dos homens?

O retábulo organiza-se em torno da harmonia, do enlevo de uma jovem Mãe com o seu Menino. O traço subtil e aparentemente inacabado coloca a ternura divina no centro. O gesto espontâneo do Pequenino, maravilhado com a sumptuosidade dos presentes dos Magos, contrasta com o aparato do mundo, porque o trono não pertence a esses reis. O trono é Maria. A sobriedade vence a riqueza, a Mãe vale mais que os cofres cheios.

Os Magos em adoração rodeiam Maria e Jesus, no meio de um corrupio de acompanhantes (dizem que um jovem no lado direito seria o próprio Leonardo). Num plano mais recuado, sobre a esquerda, assomam as ruínas de um templo romano pagão. Ao mesmo nível, sobre a direita, um par de cavaleiros digladia-se ferozmente. Mais ao fundo, surge uma paisagem rochosa e desértica. Tudo isto, e outros pormenores, representa o mundo afastado de Cristo, longe da doçura da Mãe.
Árvores carregadas de simbolismo marcam presença em pontos significativos. Palmeiras, símbolo de vitória, imagem do Cântico dos Cânticos que a liturgia aplica a Nossa Senhora (Ct. 7, 7), símbolo também da palma do martírio, emergem, plantadas sobre as ruínas: triunfam pacificamente sobre a morte e a Roma imperial, ali representadas pela violência sanguinária e pelo esboroar dos monumentos pagãos. A segunda árvore, ao meio, é uma alfarrobeira, cujas sementes eram utilizadas na pesagem de pedras e metais preciosos. Está ali como testemunha silenciosa, a proclamar Cristo Rei do Universo e Maria Rainha dos Céus e da Terra.

O costume era pintar com régua e minúcia, Leonardo teve o arrojo deste traço vibrante, num estilo que ficou conhecido como «non finito», não «acabadinho». Maria Zarco classifica o resultado como inexcedível. Concordo.



[1] Acessível no blogue «http://adeus-ate-ao-meu-regresso.blogspot.pt/2017/12/vai-um-gin-do-peters_20.html», na secção «Vai um Gin do Peter’s?», 20 de Dezembro de 2017.
José Maria C.S. André
31-XII-2017
Spe Deus

Evangelho do dia 31 de dezembro de 2018

No princípio existia o Verbo; o Verbo estava em Deus; e o Verbo era Deus. No princípio Ele estava em Deus. Por Ele é que tudo começou a existir; e sem Ele nada veio à existência. Nele é que estava a Vida de tudo o que veio a existir. E a Vida era a Luz dos homens. A Luz brilhou nas trevas, mas as trevas não a receberam. Apareceu um homem, enviado por Deus, que se chamava João. Este vinha como testemunha, para dar testemunho da Luz e todos crerem por meio dele. Ele não era a Luz, mas vinha para dar testemunho da Luz. O Verbo era a Luz verdadeira, que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina. Ele estava no mundo e por Ele o mundo veio à existência, mas o mundo não o reconheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a quantos o receberam, aos que nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram de laços de sangue, nem de um impulso da carne, nem da vontade de um homem, mas sim de Deus. E o Verbo fez-se homem e veio habitar connosco. E nós contemplámos a sua glória, a glória que possui como Filho Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade. João deu testemunho dele ao clamar: «Este era aquele de quem eu disse: 'O que vem depois de mim passou-me à frente, porque existia antes de mim.'» Sim, todos nós participamos da sua plenitude, recebendo graças sobre graças. É que a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade vieram-nos por Jesus Cristo. A Deus jamais alguém o viu. O Filho Unigénito, que é Deus e está no seio do Pai, foi Ele quem o deu a conhecer.

Jo 1, 1-18

domingo, 30 de dezembro de 2018

Bom Domingo do Senhor!

Tentemos com humildade imitar o Senhor Jesus como nos narra o Evangelho de hoje (Lc 2, 41-52) e procuremos viver na casa do Pai, ou seja, que tudo na nossa vida seja centrado em Deus Nosso Senhor.

Pai Nosso que estais nos Céus …

Hino à Sagrada Família de Leão XIII - O LUX BEATA CAELITUM

«Três dias depois, encontraram-n'O no templo»

Orígenes (c. 185-253), presbítero, teólogo
Homilias sobre o evangelho de São Lucas, n°18; SC 87

Com doze anos, Jesus ficou em Jerusalém. Não o sabendo, Seus pais começam a procurá-Lo, inquietos, e não O encontram. Procuram «entre os parentes», procuram «entre os seus companheiros de viagem», procuram «entre os seus conhecidos», mas não O encontram. [...] O meu Jesus não quer ser encontrado no meio da multidão.

Ficai a saber onde O encontraram [...] para que também vós O possais encontrar: «Depois de muito procurar, encontraram-n'O no templo». Não num sítio qualquer mas «no templo», e não apenas no templo mas «sentado entre os doutores, a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas». Procurai vós também Jesus no templo de Deus, procurai-O na Igreja, procurai-O junto dos mestres que estão nesse templo e que não saem dali. Se o procurardes desta maneira, encontrá-l'O-eis. [...]

Eles encontram-n'O «sentado entre os doutores, a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas». Ainda hoje Jesus está aqui; interroga-nos e ouve-nos falar. «Estavam todos estupefactos», afirma Lucas. Estupefactos com quê? Não com as Suas perguntas, que, no entanto, eram admiráveis, mas com as Suas respostas. [...] «Moisés falava, dizem as Escrituras, e Deus respondia-lhe através de uma voz» (Ex 19,19). Era assim que o Senhor ensinava a Moisés o que este ignorava. Jesus tanto pergunta como responde [...] e, por mais admiráveis que sejam as Suas perguntas, as Suas respostas ainda o são mais. 

Para que também nós O possamos ouvir e para que Ele nos possa fazer perguntas a que Ele próprio responderá, supliquemos-Lhe, façamos um esforço intenso e doloroso por procurá-Lo, e poderemos encontrar Aquele que procuramos. Não é em vão que está escrito nas Escrituras: «O Teu pai e eu andávamos aflitos à Tua procura». De facto, é preciso que aquele que procura Jesus não o faça com negligência e moleza, de uma maneira intermitente, como fazem alguns [...] que por esse motivo não O encontram. Nós dizemos: «Procuramos-Te com esforço».

sábado, 29 de dezembro de 2018

O Evangelho de Domingo dia 30 de dezembro de 2018

Seus pais iam todos os anos a Jerusalém pela festa da Páscoa. Quando chegou aos doze anos, indo eles a Jerusalém segundo o costume daquela festa, acabados os dias que ela durava, quando voltaram, o Menino ficou em Jerusalém, sem que os Seus pais o advertissem. Julgando que Ele fosse na comitiva, caminharam uma jornada, e depois procuraram-n'O entre os parentes e conhecidos. Não O encontrando, voltaram a Jerusalém à procura d'Ele. Aconteceu que, três dias depois, encontraram-n'O no templo sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os. E todos os que O ouviam estavam maravilhados da Sua sabedoria e das Suas respostas. Quando O viram, admiraram-se. E Sua mãe disse-Lhe: «Filho, porque procedeste assim connosco? Eis que Teu pai e eu Te procurávamos cheios de aflição». Ele disse-lhes: «Porque Me procuráveis? Não sabíeis que devo ocupar-Me nas coisas de Meu Pai?». Eles, porém, não entenderam o que lhes disse. Depois desceu com eles e foi para Nazaré; e era-lhes submisso. A Sua mãe conservava todas estas coisas no seu coração. Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens.

Lc 2, 41-52

Sempre juntos à Sagrada Família

Neste ano mariano (2015), rezemos especialmente por esta intenção. Talvez possamos usar alguma jaculatória que nos ajude a lembrar-nos dela. O nosso Padre rezava com frequência: Jesus, Maria e José, que esteja sempre com os Três. Nós insistiremos em pedir que todas as famílias do mundo estejam sempre bem abrigadas pela Sagrada Família de Nazaré.

Ao mesmo tempo que elevamos ao Céu esta oração, incluamos também os governantes e aqueles que dirigem as instituições internacionais, os que têm a responsabilidade de velar pela integridade desta célula fundamental da sociedade. Peçamos a Deus que se garanta a unidade e indissolubilidade do matrimónio e a sua abertura à vida, o direito dos pais a educarem os seus filhos de acordo com a sua fé, de modo que as leis civis não só não dificultem o desenvolvimento harmonioso da família, mas que facilitem o cumprimento dos objetivos que Deus estabeleceu ao criá-la.

É necessário um esforço decidido na nova evangelização da sociedade, começando por cada lar. Cada família cristã – como Maria e José – pode primeiro acolher Jesus, ouvi-Lo, falar com Ele, conservá-Lo, protegê-Lo e crescer com Ele, e assim melhorar o mundo [13]. É preciso cultivar na própria casa as virtudes que a liturgia nos recorda numa das leituras da festa da Sagrada Família. Portanto, como escolhidos de Deus, santos e amados, revesti-vos de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência. Apoiai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, se alguém tiver queixas contra outros. Cada um perdoe ao outro, como o Senhor vos perdoou a vós. E acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. Que a paz de Cristo reine nos vossos corações [14].

Estas recomendações comprometem todos os membros: pais, filhos, irmãos e outros familiares. E embora o termo "família" se use mais especificamente para designar o ambiente onde uma pessoa nasce e cresce, também sabemos que a Igreja é a família de Deus na Terra. E é também família esta porção viva da Igreja que é o Opus Dei. S. Josemaria salientava que podem pertencer à Obra, de uma forma ou de outra, uma imensa variedade de pessoas, com as suas maneiras de ser e as suas características muito pessoais. Não digo isto por dizer, comentava em certa ocasião, quando digo que a Obra é uma família divina e humana, em que acontece o mesmo que nas famílias que o Senhor abençoou com abundância, que têm muitos filhos: uns são mais altos, outros mais baixos, uns mais morenos, outros mais louros (…). E além disso, temos ao nosso lado esses parentes que tanto estimamos: os Cooperadores (…). E ainda tantos amigos e tantos colegas que, de alguma forma, participam da nossa família [15].

[13]. Papa Francisco, Discurso na Audiência geral, 17-XII-2014.
[14]. Cl 3, 12-15.
[15]. S. Josemaria, Notas de uma meditação, 5-III-1963.

(D. Javier Echevarría na carta do mês de janeiro de 2015)
© Prælatura Sanctæ Crucis et Operis Dei

Evangelho do dia 29 de dezembro de 2018

Depois que se completaram os dias da purificação de Maria, segundo a Lei de Moisés, levaram-n'O a Jerusalém para O apresentar ao Senhor segundo o que está escrito na Lei do Senhor: “Todo o varão primogénito será consagrado ao Senhor”, e para oferecerem em sacrifício, conforme o que também está escrito na Lei do Senhor: “Um par de rolas ou dois pombinhos”. Havia então em Jerusalém um homem chamado Simeão. Este homem era justo e piedoso; esperava a consolação de Israel, e o Espírito Santo estava nele. Tinha-lhe sido revelado pelo Espírito Santo que não veria a morte sem ver primeiro o Cristo do Senhor. Foi ao templo conduzido pelo Espírito. E, levando os pais o Menino Jesus, para cumprirem as prescrições usuais da Lei a Seu respeito, ele tomou-O nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz segundo a Tua palavra; porque os meus olhos viram a Tua salvação, que preparaste em favor de todos os povos; luz para iluminar as nações, e glória de Israel, Teu povo». O Seu pai e a Sua mãe estavam admirados das coisas que d'Ele se diziam. Simeão abençoou-os e disse a Maria, Sua mãe: «Eis que este Menino está posto para ruína e ressurreição de muitos em Israel e para ser sinal de contradição. E uma espada trespassará a tua alma. Assim se descobrirão os pensamentos escondidos nos corações de muitos».

Lc 2, 22-35

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Quem é feliz?

A festa de Natal no Vaticano foi o encontro das famílias dos que lá trabalham com o Papa Francisco. Festejou uma bisavó de 93 anos, saudou mil e uma crianças e contou-lhes um segredo: que fazer para ser feliz?

– «O Natal é uma festa de alegria, no entanto, por vezes damo-nos conta de que as pessoas (talvez nós próprios) estão presas a tanta coisa que afinal não têm alegria, ou é muito superficial? Porquê?».

Francisco recordou o escritor francês Léon Bloy – «só há uma tristeza, (...) a de não ser santos» – e deduziu: «Portanto, o oposto da tristeza, isto é, a alegria, deriva de ser santo».

Arrancou assim uma lição de catequese viva, divertida, adaptada ao vocabulário dos mais pequenos.

«Olhemos para o presépio. Quem é feliz no presépio? Pergunto-vos a vós, crianças, que gostais de admirar as figuras... e talvez mexer-lhes um bocadinho, mudá-las de sítio, aborrecendo o pai, que as tinha colocado com tanto cuidado!»

«Então, quem é feliz no presépio? Nossa Senhora e S. José estão cheios de alegria: olham o Menino Jesus e estão felizes porque, depois de mil preocupações, acolheram este Presente de Deus com tanta fé e tanto amor. Estão “carregadinhos” de santidade e portanto de alegria (“sono ‘straripanti’ de santità e quindi di gioia”). Dir-me-ão: claro! São Nossa Senhora e S. José! Sim, mas não pensemos que as coisas foram fáceis para eles: não se nasce santo,
fazemo-nos santos, e isto também se aplica a eles».

«Depois, os pastores estão cheios de alegria. Também os pastores são santos, é evidente, porque responderam ao anúncio dos anjos, correram logo para a gruta e reconheceram o sinal do Menino na manjedoura. Não era óbvio. Muitas vezes, nos presépios há um pastorinho jovem que olha embevecido para dentro da gruta, encantado: aquele pastor expressa a alegria extasiada de quem acolhe o mistério de Jesus com alma de criança. Isto é uma característica da santidade: conservar a capacidade de se deslumbrar, de se maravilhar diante do dom de Deus, das suas “surpresas”, e o maior dom, a surpresa sempre nova é Jesus.  A grande surpresa é Deus!».

«Nos presépios maiores, com muitas personagens, estão os ofícios: o sapateiro, o distribuidor de água, o artesão, o padeiro... e quem tiver mais figuras, meta-as lá. E estão todos felizes.

Porquê? Porque estão “infectados” pela alegria (...) do Nascimento de Jesus. Assim, também o seu trabalho se santifica pela presença de Jesus, a sua vinda ao meio de nós».

«(...) Isto faz-nos pensar no nosso próprio trabalho. (...) Também no ambiente do trabalho existe “a santidade ao-pé-da-porta”. Também aqui no Vaticano: sou testemunha disso.

Conheço alguns de vós que são exemplo de vida: trabalham para a família, sempre com um sorriso, com uma laboriosidade sã, bela. A santidade é possível. É possível. Este é o meu sexto Natal como bispo de Roma e devo dizer que conheci vários santos e santas que trabalham cá. Santos e santas que vivem bem a vida cristã e, se fazem uma coisa mal feita, pedem desculpa. Mas continuam, com a família. Pode viver-se assim. É uma graça e é tão belo. (...) São pessoas alegres; não é que estejam sempre a rir, não, mas têm uma grande serenidade interior e sabem transmiti-la aos outros. Donde é que vem? Sempre dEle, de Jesus, o Deus-connosco. Ele é a fonte da nossa alegria, quer pessoal, quer na família ou no trabalho».

«Os meus votos são isto: ser santos, para ser felizes. Mas não santos como as pinturas dos santinhos, nada disso! Santos normais. Santos e santas de carne e osso, com o nosso carácter, os nossos defeitos, até os nossos pecados – pedimos perdão e vamos para a frente –, sempre prontos a deixarmo-nos “infectar” pela presença de Jesus no meio de nós, prontos a correr para Ele como os pastores, para ver este Menino, este Sinal incrível que Deus nos deu. O que é que os anjos disseram? “Eis que vos anuncio uma grande alegria, para todo o povo” (Lc 2,10). Vamos vê-Lo? Ou estamos presos com outras coisas?»

«Caros irmãos e irmãs, não tenhamos medo da santidade. Garanto-vos que é o caminho para a alegria». Tomo nota, porque esta informação vale mais que instalar o GPS.
José Maria C.S. André

Evangelho do dia 28 de dezembro de 2018

Tendo eles partido, eis que um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e lhe disse: «Levanta-te, toma o Menino e Sua mãe, foge para o Egipto, e fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o Menino para O matar». ele, levantando-se de noite, tomou o Menino e Sua mãe, e retirou-se para o Egipto. Lá esteve até à morte de Herodes, cumprindo-se deste modo o que tinha sido dito pelo Senhor por meio do profeta: “Do Egipto chamei o Meu filho”. Então Herodes, percebendo que tinha sido enganado pelos Magos, irou-se em extremo, e mandou matar, em Belém e em todos os seus arredores, todos os meninos de idade de dois anos para baixo, segundo a data que tinha averiguado dos Magos. Cumpriu-se então o que estava anunciado pelo profeta Jeremias: “Uma voz se ouviu em Ramá, pranto e grande lamentação; Raquel chorando os seus filhos, sem admitir consolação, porque já não existem”. 

Mt 2, 13-18

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Serão todas as religiões verdadeiras?

O seu modo de argumentar parecia ter uma certa lógica. «Eu sou daqueles que pensam que todas as religiões são verdadeiras. Pondo de parte algumas degenerações fanáticas, todas levam o homem a fazer o bem, promovem sentimentos positivos e satisfazem a necessidade de transcendência que temos dentro de nós. No fundo, acaba por ser a mesma coisa escolher uma religião ou outra. Viva a liberdade! Quem sou eu para impor a minha religião aos outros?

«Que cada um escolha a sua própria religião. Que cada um escolha aquela que melhor se adapta ao seu modo de ser. Esta é a minha opinião e não acredito que esteja errada. Sobretudo, acho que é a única que pode ser considerada verdadeiramente tolerante. Quem acredita que a sua religião é a verdadeira acaba por ser um bocado fanático. E com pessoas fanáticas não é possível dialogar».

É verdade que todas as religiões, se o são de verdade, possuem algo de positivo. No entanto, isso não é a mesma coisa que afirmar que todas as religiões são verdadeiras. Não é sério dizer que podem ser verdadeiras ao mesmo tempo religiões que afirmam coisas diferentes e contraditórias. Assim como não é sério dizer que dois mais dois são aquilo que mais estiver de acordo com os sentimentos de cada um. A resposta é só uma. Não somos nós que a inventamos. A nós compete-nos somente descobri-la.

Se só existe um Deus, não pode haver mais do que uma verdade sobre Ele. E a descoberta do caminho para chegar a Deus é a mais importante da nossa vida. Dela depende a nossa eternidade. Viver de acordo com uma religião não é algo que esteja ao mesmo nível de escolher um produto num supermercado. Não tem a mesma importância que a selecção da cor de um automóvel que pretendemos comprar.

Uma pessoa não vive de acordo com uma religião porque isso lhe dê uma satisfação maior. Porque a faça sentir-se em harmonia com o universo. Nem porque lhe permita emitir suspiros mais ou menos celestiais. Uma pessoa vive de acordo com uma religião porque acredita que é o seu caminho para chegar a Deus. O seu caminho para que a sua vida tenha sentido. Para que a sua vida não termine no cemitério. Pelo contrário, para todos aqueles que se contentam com ficar por lá, não é necessária a procura de nenhuma religião. Nem é necessário ter a “dor de cabeça” de tentar encontrar a verdadeira.

Para os cristãos esse único caminho para chegar a Deus tem um nome: Jesus Cristo. Ele não é somente um homem especial. É Deus feito homem. Deus que se fez homem e morreu na Cruz para nos salvar. Não foram os cristãos que inventaram a Cruz por ela estar mais de acordo com os seus sentimentos. Foi Deus que escolheu esse modo concreto de nos salvar. Um modo que revela o seu infinito amor por nós e nos pede uma resposta.

Pe. Rodrigo Lynce de Faria

Evangelho do dia 27 de dezembro de 2018

Correu então, e foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo a quem Jesus amava, e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram». Partiu, pois, Pedro com o outro discípulo e foram ao sepulcro. Corriam ambos juntos, mas o outro discípulo corria mais do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. Tendo-se inclinado, viu os lençóis no chão, mas não entrou. Chegou depois Simão Pedro, que o seguia, entrou no sepulcro e viu os lençóis postos no chão, e o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus, que não estava com os lençóis, mas enrolado num lugar à parte. Entrou também, então, o outro discípulo que tinha chegado primeiro ao sepulcro. Viu e acreditou.

Jo 20, 2-8

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Evangelho do dia 26 de dezembro de 2018

Acautelai-vos dos homens, porque vos farão comparecer nos seus tribunais e vos açoitarão nas sinagogas. Sereis levados por Minha causa à presença dos governadores e dos reis, para dar testemunho diante deles e diante dos gentios. Quando vos entregarem, não cuideis como ou o que haveis de falar, porque naquela hora vos será inspirado o que haveis de dizer. Porque não sereis vós que falais, mas o Espírito de vosso Pai é o que falará em vós. O irmão entregará à morte o seu irmão e o pai o seu filho; os filhos se levantarão contra os pais e lhes darão a morte. Vós, por causa do Meu nome, sereis odiados por todos; aquele, porém, que perseverar até ao fim será salvo.

Mt 10, 17-22

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Mensagem 'Urbi et Orbi' do Natal

Queridos irmãos e irmãs, feliz Natal!

A vós, fiéis de Roma, a vós, peregrinos, e a todos vós que, das mais variadas partes do mundo, estais sintonizados connosco, renovo o jubiloso anúncio de Belém: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado» (Lc 2, 14).

Como os pastores, os primeiros que acorreram à gruta, ficamos maravilhados com o sinal que Deus nos deu: «Um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura» (Lc 2, 12). Em silêncio, ajoelhamo-nos e adoramos.

E que nos diz aquele Menino, nascido, para nós, da Virgem Maria? Qual é a mensagem universal do Natal? Diz-nos que Deus é um Pai bom, e nós somos todos irmãos.

Esta verdade está na base da visão cristã da humanidade. Sem a fraternidade que Jesus Cristo nos concedeu, os nossos esforços por um mundo mais justo ficam sem fôlego, e mesmo os melhores projetos correm o risco de se tornar estruturas sem alma.

Por isso, as minhas boas-festas natalícias são votos de fraternidade.

Fraternidade entre pessoas de todas as nações e culturas.

Fraternidade entre pessoas de ideias diferentes, mas capazes de se respeitar e ouvir umas às outras.

Fraternidade entre pessoas de distintas religiões. Jesus veio revelar o rosto de Deus a todos aqueles que o procuram.

E o rosto de Deus manifestou-se num rosto humano concreto. Apareceu, não sob a forma dum anjo, mas dum homem, nascido num tempo e lugar concretos. E assim, com a sua encarnação, o Filho de Deus indica-nos que a salvação passa através do amor, da hospitalidade, do respeito por esta nossa pobre humanidade que todos compartilhamos numa grande variedade de etnias, línguas, culturas... mas todos irmãos em humanidade!

Então, as nossas diferenças não constituem um dano nem um perigo; são uma riqueza. Como no caso dum artista que queira fazer um mosaico: é melhor ter à sua disposição ladrilhos de muitas cores, que de poucas.

A experiência da família no-lo ensina: irmãos e irmãs são diferentes um do outro e nem sempre estão de acordo, mas há um laço indissolúvel que os une, e o amor dos pais ajuda-os a quererem-se bem. O mesmo se passa com a família humana, mas, nesta, é Deus o «pai», o fundamento e a força da nossa fraternidade.

Que este Natal nos faça redescobrir os laços de fraternidade que nos unem como seres humanos, interligando todos os povos. Permita a Israelitas e Palestinenses retomar o diálogo e embocar um caminho de paz que ponha fim a um conflito que, há mais de setenta anos, dilacera a Terra escolhida pelo Senhor para nos mostrar o seu rosto de amor.

O Menino Jesus permita, à amada e atormentada Síria, reencontrar a fraternidade depois destes longos anos de guerra. Que a Comunidade Internacional trabalhe com decisão para uma solução política que anule as divisões e os interesses de parte, de modo que o povo sírio, especialmente aqueles que tiveram de deixar as suas terras e buscar refúgio noutro lugar, possa voltar a viver em paz na sua pátria.

Penso no Iémen com a esperança de que a trégua mediada pela Comunidade Internacional possa, finalmente, levar alívio a tantas crianças e às populações exaustas pela guerra e a carestia.

Penso depois na África, onde há milhões de pessoas refugiadas ou deslocadas e precisam de assistência humanitária e segurança alimentar. O Deus Menino, Rei da paz, faça calar as armas e surgir uma nova aurora de fraternidade em todo o Continente, abençoando os esforços de quantos trabalham para favorecer percursos de reconciliação a nível político e social.

O Natal robusteça os vínculos fraternos que unem a península coreana e consinta de prosseguir no caminho de aproximação empreendido para se chegar a soluções compartilhadas que a todos assegurem progresso e bem-estar.

Este tempo de bênção permita à Venezuela reencontrar a concórdia e, a todos os componentes da sociedade, trabalhar fraternalmente para o desenvolvimento do país e prestar assistência aos setores mais vulneráveis da população.

O Senhor recém-nascido leve alívio à amada Ucrânia, ansiosa por reaver uma paz duradoura, que tarda a chegar. Só com a paz, respeitadora dos direitos de cada nação, é que o país poderá recuperar das tribulações sofridas e restabelecer condições de vida dignas para os seus cidadãos. Solidário com as comunidades cristãs daquela Região, rezo para que possam tecer relações de fraternidade e amizade.

Que, diante do Menino Jesus, se redescubram irmãos os habitantes da querida Nicarágua, para que não prevaleçam as divisões e discórdias, mas todos trabalhem para favorecer a reconciliação e, juntos, construir o futuro do país.

Desejo lembrar os povos que sofrem colonizações ideológicas, culturais e económicas, vendo dilaceradas a sua liberdade e identidade, e que sofrem por causa da fome e da carência de serviços educativos e sanitários.

Penso de modo particular nos nossos irmãos e irmãs que celebram a Natividade do Senhor em contextos difíceis, para não dizer hostis, especialmente onde a comunidade cristã é uma minoria, por vezes frágil ou desconsiderada. Que o Senhor lhes conceda, a eles e a todas as minorias, viver em paz e ver reconhecidos os seus direitos, sobretudo a liberdade religiosa.

O Menino pequenino e com frio, que hoje contemplamos na manjedoura, proteja todas as crianças da terra e todas as pessoas frágeis, indefesas e descartadas. Possamos todos nós receber paz e conforto do nascimento do Salvador e, sentindo-nos amados pelo único Pai celeste, reencontrarmo-nos e vivermos como irmãos!

Homilia Santa Missa celebração do Natal do Senhor

Juntamente com Maria sua esposa, José subiu «à cidade de David, chamada Belém» (Lc 2, 4). Nesta noite, também nós subimos a Belém, para lá descobrir o mistério do Natal.

1. Belém: o nome significa casa do pão. Hoje, nesta «casa», o Senhor marca encontro com a humanidade. Sabe que precisamos de alimento para viver. Mas sabe também que os alimentos do mundo não saciam o coração. Na Sagrada Escritura, o pecado original da humanidade aparece associado precisamente com o ato de tomar alimento: «…agarrou do fruto, comeu» – diz o livro do Génesis (3, 6). Agarrou e comeu. O homem tornou-se ávido e voraz. Para muitos, o sentido da vida parece ser possuir, estar cheio de coisas. Uma ganância insaciável atravessa a história humana, chegando ao paradoxo de hoje em que alguns se banqueteiam lautamente enquanto muitos não têm pão para viver.

Belém é o ponto de viragem no curso da história. Lá Deus, na casa do pão, nasce numa manjedoura; como se quisesse dizer-nos: Estou aqui ao vosso dispor, como vosso alimento. Não agarra, oferece de comer; não dá uma coisa, mas dá-Se a Si mesmo. Em Belém, descobrimos que Deus não é alguém que agarra a vida, mas Aquele que dá a vida. Ao homem, habituado desde os primórdios a agarrar e comer, Jesus começa a dizer: «Tomai, comei. Este é o meu corpo» (Mt 26, 26). O corpo pequenino do Menino de Belém lança um novo modelo de vida: não devorar e acumular, mas partilhar e dar. Deus faz-Se pequeno, para ser nosso alimento. Nutrindo-nos d’Ele, Pão de vida, podemos renascer no amor e romper a espiral da avidez e da ganância. A partir da «casa do pão», Jesus traz o homem de regresso a casa, para que se torne familiar do seu Deus e irmão do seu próximo. Diante da manjedoura, compreendemos que não são os bens que alimentam a vida, mas o amor; não a voracidade, mas a caridade; não a abundância ostentada, mas a simplicidade que devemos preservar.

O Senhor sabe que precisamos de nos alimentar todos os dias. Por isso, ofereceu-nos todos os dias da sua vida, desde a manjedoura de Belém até ao cenáculo de Jerusalém. E ainda hoje, no altar, faz-Se pão partido para nós: bate à porta, para entrar e cear connosco (cf. Ap 3, 20). No Natal, recebemos Jesus, Pão do céu na terra: trata-se de um alimento cuja validade é ilimitada, fazendo-nos saborear já agora a vida eterna.

Em Belém, descobrimos que a vida de Deus corre nas veias da humanidade. Se a acolhermos, a história muda a partir de cada um de nós; com efeito, quando Jesus muda o coração, o centro da vida já não é o meu «eu» faminto e egoísta, mas Ele, que nasce e vive por amor. Nesta noite, chamados a ir até Belém, casa do pão, interroguemo-nos: Qual é o alimento de que não posso prescindir na minha vida? É o Senhor ou outra coisa qualquer? Depois, entrando na gruta, ao vislumbrar na terna pobreza do Menino uma nova fragrância de vida, a da simplicidade, perguntemo-nos: Será verdade que preciso de tantas coisas, de receitas complicadas para viver? Quais são os contornos supérfluos de que consigo prescindir para abraçar uma vida mais simples? Em Belém, ao pé de Jesus, vemos pessoas que caminharam, como Maria, José e os pastores. Jesus é o Pão do caminho. Não Se compraz com as digestões lentas, longas e sedentárias, mas pede que nos levantemos rapidamente da mesa a fim de servir como pães partidos para os outros. Perguntemo-nos: No Natal, reparto o meu pão com aqueles que estão sem ele?

2. Depois de Belém, casa do pão, reflitamos sobre Belém, cidade de David. Lá David, na sua adolescência, era pastor e, como tal, foi escolhido por Deus, para ser pastor e guia do seu povo. No Natal, na cidade de David, são precisamente os pastores que acolhem Jesus. Naquela noite, quando «a glória do Senhor refulgiu em volta deles – diz o Evangelho –, tiveram muito medo» (Lc 2, 9), mas o anjo disse-lhes: «Não temais» (2, 10). Reaparece muitas vezes no Evangelho esta frase «não temais»: parece o refrão de Deus à procura do homem. Porque o homem desde o princípio, por causa do pecado, tem medo de Deus: «…cheio de medo, escondi-me» (Gn 3, 10) – diz Adão, depois do pecado. Belém é o remédio para o medo, porque lá, não obstante os «nãos» do homem, Deus diz para sempre «sim»: será para sempre Deus connosco. E, para que a sua presença não provoque medo, faz-Se um terno menino. A frase «não temais» não é dirigida a santos, mas a pastores, pessoas simples que então não primavam por garbo nem devoção. O Filho de David nasceu no meio dos pastores, para nos dizer que doravante ninguém estará sozinho; temos um Pastor que vence os nossos medos e nos ama a todos, sem exceção.

Os pastores de Belém mostram-nos também como ir ao encontro do Senhor. Velam durante a noite: não dormem, mas fazem aquilo que Jesus nos pedirá várias vezes: vigiar (cf. Mt 25, 13; Mc 13, 35; Lc 21, 36). Permanecem vigilantes; aguardam, acordados, na escuridão; e a glória de Deus «refulgiu em volta deles» (Lc 2, 9). O mesmo vale para nós. A nossa vida pode ser umaexpetação, em que a pessoa, mesmo nas noites dos problemas, se confia ao Senhor e O deseja; então receberá a sua luz. Ou então uma pretensão, na qual contam apenas as próprias forças e meios; mas, neste caso, o coração permanece fechado à luz de Deus. O Senhor gosta de ser aguardado e não é possível aguardá-Lo no sofá, dormindo. De facto, os pastores movem-se: «foram apressadamente» – diz o texto (2, 16). Não ficam parados como quem sente ter chegado a casa e não precisa de nada; mas partem, deixam o rebanho indefeso, arriscam por Deus. E depois de terem visto Jesus, embora sem grande habilidade para falar, vão anunciá-Lo, de modo que «todos os que ouviram se admiravam do que lhes diziam os pastores»"(2, 18).

Esperar acordado, ir, arriscar, contar a beleza são gestos de amor. O bom Pastor, que vem no Natal para dar a vida às ovelhas, na Páscoa dirigirá a Pedro, e através dele a todos nós, a pergunta determinante: «Tu Me amas?» (Jo 21, 15). Da resposta, dependerá o futuro do rebanho. Nesta noite, somos chamados a responder, dizendo-Lhe também nós: «Sou deveras teu amigo». A resposta de cada um é essencial para todo o rebanho.

«Vamos a Belém…» (Lc 2, 15): assim disseram e fizeram os pastores. Também nós, Senhor, queremos vir a Belém. O caminho, ainda hoje, é difícil: é preciso superar os cumes do egoísmo, evitar escorregar nos precipícios da mundanidade e do consumismo. Quero chegar a Belém, Senhor, porque é lá que me esperas. E dar-me conta de que Tu, colocado numa manjedoura, és o pão da minha vida. Preciso da terna fragrância do teu amor, a fim de tornar-me, por minha vez, pão repartido para o mundo. Toma-me sobre os teus ombros, bom Pastor: amado por Ti, conseguirei também eu amar tomando pela mão os irmãos. Então será Natal, quando Te puder dizer: «Senhor, Tu sabes tudo; Tu sabes que eu sou deveras teu amigo!» (Jo 21, 17).

Bom Natal de Jesus Cristo Nosso Senhor!

Hoje, Natal do Senhor Jesus, e sempre, tenhamos uma atitude idêntica à de João Batista como nos narra o Evangelho desta extraordinária data (Jo 1, 1-18) e reconheçamos de coração humilde e apaixonado a grandeza do Messias que Deus nos enviou para recebermos todas as graças.

Louvado sejais Senhor Jesus Cristo nossa Luz e nossa Verdade! 

Feliz e Santo Natal


Evangelho do dia 25 de dezembro de 2018 - Natal do Senhor

No princípio existia o Verbo; o Verbo estava em Deus; e o Verbo era Deus. No princípio Ele estava em Deus. Por Ele é que tudo começou a existir; e sem Ele nada veio à existência. Nele é que estava a Vida de tudo o que veio a existir. E a Vida era a Luz dos homens. A Luz brilhou nas trevas, mas as trevas não a receberam. Apareceu um homem, enviado por Deus, que se chamava João. Este vinha como testemunha, para dar testemunho da Luz e todos crerem por meio dele. Ele não era a Luz, mas vinha para dar testemunho da Luz. O Verbo era a Luz verdadeira, que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina. Ele estava no mundo e por Ele o mundo veio à existência, mas o mundo não o reconheceu. Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Mas, a quantos o receberam, aos que nele crêem, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram de laços de sangue, nem de um impulso da carne, nem da vontade de um homem, mas sim de Deus. E o Verbo fez-se homem e veio habitar connosco. E nós contemplámos a sua glória, a glória que possui como Filho Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade. João deu testemunho dele ao clamar: «Este era aquele de quem eu disse: 'O que vem depois de mim passou-me à frente, porque existia antes de mim.'» Sim, todos nós participamos da sua plenitude, recebendo graças sobre graças. É que a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade vieram-nos por Jesus Cristo. A Deus jamais alguém o viu. O Filho Unigénito, que é Deus e está no seio do Pai, foi Ele quem o deu a conhecer.

Jo 1, 1-18

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

"Noite Santa para todos"

«Nasceu-vos hoje na cidade de David um Salvador, que é o Cristo, o Senhor» (Lc 2, 11). Este anúncio do Anjo aos pastores possui uma força inesgotável de renovação para os homens e mulheres de todos os tempos e lugares da Terra. É o anúncio por excelência desta Noite Santa ― Noite única do ano! É o anúncio da Noite de Natal que todos os anos se repete e que sempre nos deixa assombrados e maravilhados: como Deus é grande! Como é humilde! Fez-Se uma criança para que nos aproximemos d’Ele com toda a confiança!

Hoje, «o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós» (Jo 1, 14). Nesta Noite, o tempo abre-se à eternidade. É Deus que vem habitar no meio das suas criaturas. E vem para nos salvar, para nos redimir, para nos resgatar da nossa vã maneira de viver. Para nos recordar que valemos muito para Ele. Não somos um produto do acaso. O nosso caminhar terreno possui um sentido divino porque possui um sentido eterno.

O Natal é, por definição, a festa da Vida. Recorda-nos que, por mais crises que atravessemos, vale a pena viver. E vale a pena porque Vós, Jesus, vindo à luz como cada um de nós, abençoastes a hora do nosso nascimento. Uma hora que, como dizia o Papa João Paulo II, simbolicamente representa o mistério de toda a nossa existência nesta Terra. Uma existência que une em si a aflição e a esperança, as sombras e a luz, a dor e a alegria. Tudo isto aconteceu também nesta Noite Santa em Belém e continua a acontecer na vida de cada um de nós.

Deus chora numa manjedoura «porque não havia lugar para eles na hospedaria» (Lc 2, 7). Não é num palácio que nasce o nosso Salvador. Nasce num estábulo. E acende nessa manjedoura um fogo que nunca mais se apagará: o fogo do amor de Deus. Possa esse fogo arder nos nossos corações como chama de uma caridade activa e vigilante. Uma caridade que saiba acolher e apoiar tantos irmãos nossos provados pelas necessidades, pelo sofrimento, pela ausência de sentido para as suas vidas.

Senhor Jesus, fazei-nos testemunhas do vosso Amor! Fazei que a luz que acendeste nesta Noite Santa ― mais brilhante do que o Sol ― oriente os nossos passos e os de toda a Humanidade pelo caminho da verdadeira paz.

Neste Ano da Fé, que estamos a viver, caminha, Senhor, com a tua Igreja. Faz-nos conscientes de que, se de verdade acreditamos em Ti, sentir-nos-emos envolvidos pela ternura do Teu Amor. E nos empenharemos ― sem desfalecimentos ― em que todos aqueles com quem convivemos encontrem o sentido divino do seu caminhar terreno. E, assim, possam chegar connosco um dia ao presépio eterno que tens preparado para nós.

Noite de Natal, Noite Santa para todos! Noite de alegria e de luz para toda a Humanidade!

Pe. Rodrigo Lynce de Faria

Chega o Natal

O Natal mostra-nos onde se esconde a grandeza da Deus: num estábulo, numa gruta. "Deus humilha-Se para que possamos aproximar-nos d’Ele, para que possamos corresponder ao seu Amor com o nosso amor" (Cristo que passa, 18)

Quando chega o Natal, gosto de contemplar as imagens do Menino Jesus. Essas figuras que nos mostram o Senhor tão apoucado, recordam-me que Deus nos chama, que o Omnipotente Se quis apresentar desvalido, quis necessitar dos homens. Do berço de Belém, Cristo diz-me a mim e diz-te a ti que precisa de nós; reclama de nós uma vida cristã sem hesitações, uma vida de entrega, de trabalho, de alegria.

Não conseguiremos jamais o verdadeiro bom humor se não emitarmos deveras Jesus, se não formos humildes como Ele. Insistirei de novo: vedes onde se oculta a grandeza de Deus? Num presépio, nuns paninhos, numa gruta. A eficácia redentora das nossas vidas só se pode dar com humildade, deixando de pensar em nós mesmos e sentindo a responsabilidade de ajudar os outros.

É corrente, às vezes até entre almas boas, criar conflitos íntimos, que chegam a produzir sérias preocupações, mas que carecem de qualquer base objectiva. A sua origem está na falta de conhecimento próprio, que conduz à soberba: o desejo de se tornarem o centro da atenção e da estima de todos, a preocupação de não ficarem mal, de não se resignarem a fazer o bem e desaparecerem, a ânsia da segurança pessoal... E assim, muitas almas que poderiam gozar de uma paz extraordinária, que poderiam saborear um imenso júbilo, por orgulho e presunção tornam-se desgraçadas e infecundas!

Cristo foi humilde de coração. Ao longo da sua vida, não quis para Si nenhuma coisa especial, nenhum privilégio. Começa por estar nove meses no seio de sua Mãe, como qualquer outro homem, com extrema naturalidade. Sabia o Senhor de sobra que a Humanidade padecia de uma urgente necessidade d’Ele. Tinha, portanto, fome de vir à terra para salvar todas as almas; mas não precipita o tempo; vem na Sua hora, como chegam ao mundo os outros homens. Desde a concepção ao nascimento, ninguém, salvo S. José e Santa Isabel, adverte esta maravilha: Deus veio habitar entre os homens!

O Natal também está rodeado de uma simplicidade admirável: o Senhor vem sem aparato, desconhecido de todos. Na Terra, só Maria e José participam na divina aventura. Depois, os pastores, avisados pelos Anjos. E mais tarde os sábios do Oriente. Assim acontece o facto transcendente que une o Céu à Terra, Deus ao homem!

Como é possível tanta dureza de coração que cheguemos a acostumar-nos a estes episódios? Deus humilha-Se para que possamos aproximar-nos d’Ele, para que possamos corresponder ao seu Amor com o nosso amor, para que a nossa liberdade se renda, não só ante o espectáculo do seu poder, como também ante a maravilha da sua humildade.

Grandeza de um Menino que é Deus! O Seu Pai é o Deus que fez os Céus e a Terra, e Ele ali está, num presépio, quia non erat eis locus in diversorio, porque não havia outro sítio na Terra para o dono de toda a Criação! (Cristo que passa, 18)

São Josemaria Escrivá