Na visita que fez aos Emiratos
Árabes Unidos (3 a 5 de Fevereiro), Francisco assinou com o Grande Imã de Al-Azhar
um documento extenso sobre o empenho comum na construção da paz. Como o texto
reconhece, o pano de fundo desta declaração é também o jihadismo, as «guerras
santas» lançadas por alguns grupos muçulmanos, e a falta de liberdade religiosa
em muitos desses países. A partir desta situação de violências várias, já foram
dados passos importantes no caminho da paz, alguns deles na sequência dos
próprios surtos de violência anti-cristã, que foram rejeitados por grande parte
da população árabe e por alguns dos seus dirigentes, como inumanos e contrários
às autênticas convicções religiosas.
Depois do discurso de Bento XVI
em Ratisbona, vários católicos foram assassinados mas foram igualmente importantes
as tomadas de posição de várias correntes muçulmanas contra esses assassinatos.
No Paquistão, o fanatismo
muçulmano levou muitos cristãos à morte e à prisão, mas essa violência foi ocasião
de vários muçulmanos protestarem contra os abusos. Por se solidarizarem com os
cristãos, vários muçulmanos também morreram. Recentemente, multidões
enfurecidas paralisaram o Paquistão pedindo a condenação à morte de uma
rapariga católica, mas vários muçulmanos, entre eles os juízes do Supremo
Tribunal e os responsáveis de várias comunidades muçulmanas, tomaram posição
contra essa injustiça.
Não se podem esquecer a falta de
liberdade nos países muçulmanos e os atentados contra a dignidade humana,
apesar de se terem dado passos muito positivos nas últimas décadas.
Também é verdade que alguns
países ocidentais fomentam o terrorismo nos países árabes e promovem guerras
com objectivos económicos e de controlo político. Muitas vezes, do ponto de
vista das populações muçulmanas, essas intervenções são associadas à cultura
ocidental e ao cristianismo, alimentando ódios e desejos de vingança.
Em contraste, o documento assinado
por Francisco e pelo Grande Imã de Al-Azhar proclama a comum vocação de todos
os homens e mulheres a considerarem-se irmãos enquanto filhos e filhas de Deus.
Condena todas as formas de violência, especialmente aquela que se reveste de
pretextos religiosos e estabelece que todos se devem empenhar em difundir no
mundo os valores autênticos e a paz. Por todos estes motivos, o acolhimento
dispensado ao Papa Francisco nos Emiratos Árabes Unidos e a assinatura deste
documento são de enorme consequência para o futuro da humanidade.
Passaram 800 anos da tentativa de
S. Francisco de Assis de abrir portas no Norte de África, encontrando-se com o
Sultão Malik al-Kamil. O Papa explicou que esta viagem retomava o mesmo
propósito. «Pensei tantas vezes em S. Francisco durante esta viagem. Isso
ajudava-me a levar o Evangelho e o amor de Jesus Cristo no coração, enquanto
decorriam os vários momentos da visita. No meu coração estava o Evangelho de
Cristo, a oração do Pai por todos os seus filhos, especialmente os mais pobres,
as vítimas das injustiças, das guerras, da miséria».
As sementes de paz lançadas há
800 por S. Francisco de Assis começam, nos nossos dias, a dar os primeiros
frutos.
José Maria C.S. André