As palavras de Bento XVI foram mais fortes do que o mau tempo que lhe impediu de voltar a La Verna, memória da mística franciscana, onde desejaria pronunciar palavras sobre a alma da vida cristã, importantes especialmente quando aos católicos se solicita o compromisso na cidade secular, hoje afligida pela crise e pelo desânimo. Arezzo e Sansepolcro, as duas etapas da 27ª viagem apostólica na Itália com La Verna, no final inacessível devido ao denso nevoeiro, só aparentemente desunidas entre si, na realidade constituíram um itinerário sobre o porquê e sobre o como ser cristãos ao serviço do bem comum na sociedade.
Para o ser verdadeiramente - é a mensagem do pontífice - é preciso subir espiritualmente à La Verna, escutar a voz de Deus e depois descer do monte, transformados e prontos para servir não os próprios interesses, mas as necessidades dos outros, especialmente dos mais pobres e necessitados. Contudo - admoesta - fazer o bem de todos, promover "cidades com o perfil cada vez mais humano" não é possível "através de lógicas puramente materialistas". É preciso sempre e sobretudo no presente, um despertar ético.
Nem os crentes podem realizá-lo se disserem só palavras, ou fizerem o bem sem conformar a própria vida com Cristo, a exemplo de são Francisco. Com efeito, o coração da experiência de La Verna consiste em seguir Cristo, procurando imitá-lo e conformar-se com Ele.
Bento XVI quis narrar a história dos fundadores de Sansepolcro os quais, voltando de Jerusalém, pensaram num modelo de cidade na qual os discípulos de Jesus eram chamados a ser o motor da sociedade e da paz, através da prática da justiça. Objectivo possível com uma condição: manter o olhar e o coração fixos em Deus que não se afasta da vida quotidiana, própria da humanidade, mas orienta-a e faz com que ela seja vivida de modo ainda mais intenso. Deus não quer permanecer fechado na solidão de La Verna, mas desce com os homens à cidade onde eles vivem.
O Papa pensa neste tipo de cristãos: presentes, empreendedores e coerentes com a própria fé. Não só activistas sociais ou políticos, mas portadores de uma esperança que não desilude, fundada na ressurreição de Jesus, contextualizada no amor fraterno para com todos, próximos e distantes. Trata-se de uma íntima convicção teológica de Joseph Ratzinger, que sobressaiu vigorosamente nos encontros do Papa com a comunidade de Arezzo e de Sansepolcro: também hoje, como aconteceu frutuosamente nas épocas passadas da Idade Média e do Renascimento, ser cristão tem sentido se formos sal da sociedade; se deixarmos de o ser, renunciando à nossa diversidade, tornamo-nos supérfluos como o sal que, ao perder o sabor, é deitado fora. Por isso, não obstante as provações e as dificuldades, Bento XVI permanece optimista em relação à Igreja à qual Deus não permitirá que faltem santos, bons samaritanos, os melhores amigos especialmente nas épocas difíceis da história. Eis o motivo da sua evidente decepção em ter que renunciar à etapa de La Verna, experiência franciscana emblemática e um dos modelos cativantes do ser cristão. De facto, quantos peregrinos subiram lá em busca de Deus "que é a verdadeira razão pela qual a Igreja existe: servir de ponte entre Deus e o homem". E, enfim, o encorajamento à Itália - manifestado também com o rápido mas cordialíssimo encontro com o presidente do Conselho dos ministros - e em particular aos jovens a pensar em grande, a saber ousar, prontos a dar "novo sabor" à inteira sociedade "com o sal da honestidade e do altruísmo abnegado".
CARLO DI CICCO
(© L'Osservatore Romano - 19 de maio de 2012)
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