O que é necessário para o ecumenismo é, antes de mais que, sob a pressão da secularização, não venhamos a perder, quase sem dar por isso, as grandes coisas que temos em comum, que por si mesmas nos tornam cristãos: sublinhou-o Bento XVI, em Erfurt, no encontro ecuménico que teve lugar esta sexta feira no ex-convento agostiniano onde viveu Martinho Lutero.
Evocando precisamente a figura do “reformador” protestante, o Papa lembrou que “o que constituiu a paixão profunda e a mola da sua vida e de todo o seu itinerário” foi a questão sobre Deus”, que estava por detrás de toda a sua investigação teológica e da sua luta interior.
“Para ele (Lutero), a teologia não era mera questão académica, mas a luta interior consigo mesmo, que, no fim de contas, era uma luta a propósito de Deus e com Deus.
Como posso ter um Deus misericordioso? O facto que esta pergunta tenha sido a força motriz de todo o seu caminho, não cessa de me maravilhar. Com efeito, quem se preocupa hoje com isto, mesmo entre os cristãos? Que significa a questão de Deus na nossa vida, no nosso anúncio?”
Uma questão fundamental, para cada um e para o mundo, num mundo devastado pela corrupção de grande e de pequenos e por uma crescente predisposição à violência, tantas vezes disfarçada sob uma aparente religiosidade. O mal não é algo de insignificante – recordou o Papa, mas não seria forte se nós colocássemos verdadeiramente Deus no centro da nossa vida.
“Esta pergunta que desinquietava Martinho Lutero – Qual é a posição de Deus a meu respeito, como apareço a seus olhos? – deve tornar-se de novo, certamente numa forma diversa, também a nossa pergunta. Penso que este constitui o primeiro apelo que deveremos escutar no encontro com Martinho Lutero.”
“Depois – prosseguiu o Papa - é importante também isto: Deus, o único Deus, o Criador do céu e da terra, é algo de diverso duma hipótese filosófica sobre a origem do universo. Este Deus tem um rosto e falou-nos. No homem Jesus Cristo, Ele tornou-Se um de nós, verdadeiro Deus e, simultaneamente, verdadeiro homem.
“O pensamento de Lutero, a sua espiritualidade inteira era totalmente cristocêntrica. Para Lutero, o critério hermenêutico decisivo na interpretação da Sagrada Escritura era «aquilo que promove Cristo». Mas isto pressupõe que Cristo seja o centro da nossa espiritualidade e que o amor por Ele, o viver juntamente com Ele, oriente a nossa vida.”
Bento XVI insistiu no risco de, sob a pressão da secularização, se perder de vista as “grandes coisas que temos em comum, que por si mesmas nos tornam cristãos e que nos ficaram como dom e tarefa. Há que viver a fé no mundo de hoje, de modo novo mas sempre integral.
“Esta constitui uma tarefa ecuménica central. Nisto deveríamos ajudar-nos mutuamente: a crer de modo mais profundo e vivo. Não serão as tácticas a salvar-nos, a salvar o cristianismo, mas uma fé repensada e vivida de modo novo, através da qual Cristo, e com Ele o Deus vivo, entre neste nosso mundo.
Tal como os mártires do período nazi nos aproximaram uns dos outros e suscitaram a primeira grande abertura ecuménica, assim também hoje a fé, vivida a partir do íntimo de nós mesmos, num mundo secularizado, é a força ecuménica mais poderosa que nos reúne, guiando-nos para a unidade no único Senhor.”
Rádio Vaticano
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