Há uns meses atrás, um governo europeu tinha de ser muito atrevido ou muito temerário para não comprar vacinas contra a gripe A, quando a grande maioria as estava a comprar aos milhões. Mas o governo polaco saiu-se bem, e pode dar-se hoje por satisfeito por não ter gasto nem um cêntimo em vacinas, quando os outros países estão a tentar revender as que lhes enchem os armazéns.
Os polacos têm fama de agir por conta própria dentro da União Europeia e de não se renderem facilmente às tendências que consideram alheias à sua cultura ou aos seus interesses. Na questão da vacinação contra a gripe A, o governo manteve-se à margem das recomendações da Organização Mundial de Saúde, da União Europeia e dos laboratórios farmacêuticos, que insistiam numa imunização em massa da população.
A decisão do governo de Donald Tusk mostrou ser a mais acertada, já que a gripe A está a regredir e não foi mais mortífera que a gripe sazonal. Na Polónia causou 145 mortes.
Tusk afirma que "tomámos a decisão pensando exclusivamente no interesse do paciente e do contribuinte polaco". O governo afirmou em devida altura que a segurança da vacina não estava ainda devidamente comprovada.
Outros países da UE que encomendaram vacinas aos milhões - a princípio até se disse que eram precisas duas doses por paciente - não sabem agora o que fazer com elas antes de caducarem. As campanhas de vacinação que se levaram a cabo não tiveram grande êxito entre a população, que, ao constatar que a epidemia era bastante benigna, não mostrou grande interesse em se vacinar.
Em França, o governo comprou 94 milhões de doses pelo preço de 869 milhões de euros, mas apenas foram vacinadas 5 milhões de pessoas. Na Alemanha, dos 50 milhões de doses, usaram-se 6. A Holanda, depois de ter comprado 34 milhões de doses, quer agora revender 19 milhões. A Itália comprou 48 milhões de doses, mas em Dezembro apenas 840.000 tinham sido utilizadas.
A Espanha tinha encomendado 37 milhões de doses, tendo depois reduzido a encomenda para 13 milhões, mas somente 3 milhões de pessoas receberam a vacina, cerca de um terço da "população de risco" prevista. O custo foi de 90 milhões de euros.
O excesso de precauções reflecte-se igualmente no stock do antiviral Tamiflu: a Espanha adquiriu 15 milhões de unidades, das quais apenas 6.000 foram utilizadas. Compraram-se entre 2005 e 2006 dez milhões de unidades para fazer face a uma hipotética pandemia de gripe das aves e, como pareciam poucas para enfrentar a gripe A, adquiriram-se logo a seguir mais cinco milhões. Já que as reservas estão praticamente intactas, a Agência Espanhola do Medicamento alargou no passado mês de Dezembro a data da caducidade do fármaco dos cinco anos iniciais para sete.
Pressão dos laboratórios?
Neste momento não se assiste já a uma corrida ao armazenamento de vacinas; procura-se revendê-las ou oferecê-las. França e Alemanha competem pela primazia da revenda à Ucrânia. Vários países com excedente de vacinas puseram, através da OMS, 10% dos seus stocks à disposição dos países em desenvolvimento.
Os governos que compraram milhões de vacinas podem alegar que aplicaram o "princípio da precaução", pois havia grande incerteza sobre a propagação e a morbilidade da gripe A. Mas o "princípio da precaução" sai caro ao contribuinte.
Levantam-se agora vozes a pedir que se investigue se foi sobrevalorizada a gravidade da epidemia. A Comissão de Saúde da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa pediu para se averiguar se os laboratórios farmacêuticos "exerceram pressão para que fossem usados recursos destinados à saúde na incrementação de estratégias de vacinação inúteis".
Face às acusações de alarmismo dirigidas à OMS, que desde o passado mês de Junho declarou pandémica a gripe A e fomentou a compra massiva de vacinas e de tratamentos, a organização anunciou uma investigação externa dobre a sua gestão da gripe A. A OMS é acusada de beneficiar os laboratórios farmacêuticos, ao exagerar os riscos da doença. A isto, a OMS responde que declarou a pandemia devido à rápida proliferação da doença, e não pela sua mortalidade.
Aceprensa
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