As graves inquietações que a intervenção do Presidente da França, e a liderança da chanceler da Alemanha, semearam entre os povos europeus, fazendo somar às carências dolorosas da qualidade de vida a incerteza sobre o futuro político, económico e social de todos, tendo por referência principal o destino do euro, tem escassa relação com a decisão, concepção do mundo e da vida, e sentido de responsabilidade dos fundadores da União. O facto tem sido aproximado do modelo de directório, que no passado sempre conduziu a quebras da paz, com o agravamento de, nesta circunstância que vivemos, haver um Tratado, redes legais de avaliação e decisão por confuso que seja o articulado, e, portanto, trata-se realmente de uma falta diplomática continuada, e também de uma descuidada avaliação dos focos de convulsão a crescer de tal modo que não podem escapar à observação do governante menos afeito à diplomacia, à prevenção, e à prontidão que semelhante situação exige. A reacção americana em relação à admissão da Palestina na UNESCO, que se afigura inadmissível em face dos princípios, por colocar o poder financeiro como padrão do direito de voto, também pode ser um sinal, naquela área em que a segurança dos interesses aconselha uma prudência que antecede a avaliação da justiça, e que muito cruamente tem relação com a importância de Israel para a espécie de reacção que os factos venham a exigir no que toca à política armamentista do Irão. Porque é do Irão que se trata, é da eventual posse de armas de destruição maciça que cogitam, é a um afirmado perigo, verificado pelos peritos, que julgam poder ser necessário atalhar. É certo que já uma vez a invocação do perigo equivalente serviu de motivo a uma sequência de intervenção militar longa, custosa em vidas e recursos, sem causa demonstrada, mas agora as coisas parecem mais seriamente observadas, oferecendo conclusões mais confiáveis, incluindo no risco o escoamento do tempo que não pára. É minimizar excessivamente a importância do facto, que acresce aos riscos inerentes do turbilhão do Mediterrâneo e à atitude eventualmente impulsiva de Teerão, e atingir internamente a frágil segurança económica, financeira e civil, da Europa em crise, com uma atitude que é formalmente de Directório, que ignora os princípios do Tratado de Lisboa, ao qual já bastam as imperfeições que muitos responsáveis estão prontos a corrigir, e que afecta a vontade, a confiança, a esperança no futuro dos cidadãos. Tudo numa situação em que qualquer urgência de segurança, que se desencadeie, nos virá encontrar, pior do que no passado, no que toca à confiança nas lideranças, e à confiança nos meios de intervenção que serão necessários. São ainda conhecidas, e lembradas pelos vivos, intervenções, no próximo passado do Irão, de poderes ocidentais que não respeitaram nem a jurisdição interna nem a dignidade internacional do país. Mas definitivamente, se ainda subsiste algum respeito pela Carta da ONU, não é em função desse passado que se deve pautar a luta de um governo pelo futuro em paz e desenvolvimento. Mas também não é admissível que responsáveis europeus não olhem para os factos, que fazem lembrar a situação da Europa, e a aflição de Erasmo, quando os turcos estavam às portas de Viena. O credo do mercado tem muitas vezes o efeito perigoso de desviar as atenções da realidade que se desenvolve tendo como motor apenas motivos emocionais, patrióticos, de retaliação, ou de orgulhos nacionais. Na situação presente, com o Mediterrâneo a fazer crescer as inquietações dos observadores atentos, não é de ignorar que os ataques impunes dos especuladores remetam para o descuido outros aspectos inquietantes da segurança de todos, a qual também é global. As agências de avaliação, tão cuidadosas em declarar os seus juízos negativos nas datas mais cruciais para as decisões europeias, não estão isentas de responsabilidades no agravamento das evidentes fragilidades da segurança.
Adriano Moreira in DN online
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