«Em 1936, um historiador alemão que vivia na Catalunha ouviu por acaso um grupo de camponeses que falava sobre a Igreja. Para espanto dele, os camponeses, que tinham assassinado e torturado milhares de católicos, repetiam as críticas dos folhetos contra Roma, distribuídos na Alemanha do século XVI. Se a Igreja não muda, o anticlericalismo também não. De Lutero ao "Iluminismo" e da grande revolução francesa aos pequenos jacobinos de Portugal e Espanha, que há pouco menos de cem anos queriam ainda, como Voltaire, "esmagar a Infame", a Igreja é invariavelmente acusada pela sua presuntiva riqueza e pelo comportamento sexual do clero. Agora chegou a vez da pedofilia, porque na sociedade contemporânea a pedofilia se tornou no último crime sexual. Claro que Bento XVI já disse que a pedofilia era um crime, além de ser um pecado, e acrescentou que os padres pedófilos tinham feito mais mal à Igreja do que mil anos de perseguição. Claro que Bento XVI mandou investigar o caso, removeu bispos, suspendeu padres, castigou culpados. Claro que nem ele, nem a Igreja são responsáveis pelas declarações, de facto ofensivas, de algumas figuras menores do Vaticano ou da Conferência Episcopal Portuguesa. Mas, como de costume, a lógica não abala o anticlericalismo. O anticlericalismo decretou que a Igreja intencionalmente encobre (ou encobriu) a pedofilia e não vai mudar. Quem sabe, mesmo à superfície, alguma história sabe que desde o princípio isto foi assim. Ratzinger, que não nasceu ontem, com certeza que não se perturba. Até porque provavelmente percebe que, por detrás do escândalo do encobrimento, está o ódio ao Papa "reaccionário"; ao Papa que se recusou a transigir com a cultura dominante em matérias como o divórcio, o aborto, a homossexualidade, o celibato do clero e a ordenação de mulheres. Não ocorre ao anticlericalismo que a integridade da Igreja pode exigir essa rigidez, como já mostrou a rápida ruína do anglicanismo. Ratzinger compreende que, sem o apoio do Estado ou influência sobre ele, a Igreja depende essencialmente da convicção e da força com que conseguir conservar a sua doutrina. Qualquer fraqueza a transformará numa instituição vulgar, à mercê da opinião pública e das mudanças do mundo. Isso Bento XVI não quer. Como não quer encobrir a pedofilia.»
Vasco Pulido Valente. Público
«O Papa Bento XVI vem a caminho e já há polémica. Tudo porque o governo decidiu conceder tolerância de ponto nos dias da visita apostólica. O fatal Miguel Vale de Almeida, deputado do PS, considerou a decisão ‘um erro político’. A Associação República e Laicidade também condenou o gesto, acusando o eng. Sócrates de discriminar positivamente uma igreja. E até os sindicatos – os sindicatos! – vieram protestar: a UGT e a CGTP não querem folgas para os trabalhadores; querem que eles fiquem encerrados nos respectivos cubículos, a contribuir para a produtividade da pátria. Se isto não é um milagre, eu gostaria de saber o que é. Não vou gastar o meu latim com divagações teóricas sobre a diferença entre ‘laicismo’ e ‘laicidade’, que os zelotes desconhecem. No meio da histeria, o que impressiona é a intolerância da tribo perante a tolerância do Estado. Um Estado que, apesar de laico, entende a sensibilidade religiosa da população maioritária que governa. O contrário disto é que seria um ‘erro político’. E uma ‘discriminação’ positiva a favor de uma igreja: a igreja do fanatismo laicista.»
João Pereira Coutinho, CM
Nota: Desde que Ratzinger foi escolhido para Papa, faz amanhã (hoje) cinco anos, que este blogue (‘portugal dos pequeninos’) tem dito o que entende que deve ser dito sobre o seu papel no actual momento da Igreja e do mundo. Não o faz por proselitismo nem com qualquer propósito de catequista de ocasião ou de escuteirinho idiota. Fá-lo porque percebe a importância da mensagem deste homem solitário e a distinção do seu pensamento no meio de tanta lixeira intelectual "agradável" ou, no limite, da pura bronquice mais palonça. Por isso aqui verão sempre a espada que Jesus anunciou aos macios e aos crédulos e nunca a transigência malsã e ingénua dos que imaginam que isto não é um combate. É. E uns estão de um lado e outros estão do outro. Muitos dos que deviam estar deste lado infelizmente apreciam "consensualizar" e "conviver" (quase ao nível dos "classificados" dos jornais) com os fariseus da "modernidade" para não perder o lugar na fila para a bem-aventurança terrena imediata. i. e., para a vida videirinha onde a alegada "espiritualidade" normalmente está bem guardada na carteira. Mas desenganem-se. Jamais de vós será o reino dos céus apesar da oportunisticamente manifesta pobreza de espírito.
(Fonte: blogue ‘portugal dos pequeninos’ AQUI)
Agradecimento: 'É o Carteiro!'
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