Obrigado, Perdão Ajuda-me

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As minhas capacidades estão fortemente diminuídas com lapsos de memória e confusão mental. Esta é certamente a vontade do Senhor a Quem eu tudo ofereço. A vós que me leiam rogo orações por todos e por tudo o que eu amo. Bem-haja!

sábado, 14 de novembro de 2009

Reflexões bioéticas sobre a "enhancement"

O mundo melancólico dos super-homens

Os progressos científicos no âmbito das neurociências, das ciências cognoscitivas, da genética, das biotecnologias e das cibertecnologias abrem novos cenários que formulam interrogações éticas inéditas. É possível usar fármacos e tecnologias não só para tratar doenças ou conservar condições de saúde mas também para potencializar as capacidades físicas, mentais e emocionais? É lícito intervir no corpo para finalidades que vão além da terapia, só para nos fazer sentir "melhores", transformando-nos em superman e wonder woman?

Na literatura anglo-americana é muito difundida a expressão enhancement ("potenciação") que indica as intervenções de alteração do corpo e da mente em relação ao normal funcionamento físico e psíquico. Apresenta-se a possibilidade de agir sobre os mecanismos biológicos do envelhecimento para o atrasar e tornar o homem não só longevo mas até imortal. Pensemos no uso de psicofármacos para potencializar a memória, para incrementar a actividade intelectiva, para eliminar selectivamente recordações traumáticas ou desagradáveis, para controlar estados emotivos indesejados; na utilização de substâncias hormonais dopantes para melhorar prestações desportivas; no uso do hormónio do crescimento para satisfazer o desejo de se tornar mais altos. Então, um novo âmbito de reflexão bioética põe em discussão as finalidades da medicina, o significado de cura, os confins entre saúde e doença, normal e patológico, mas também o significado de natureza humana e justiça social.

Aqueles que apoiam a legitimidade do enhancement afirmam que melhorar as capacidades físicas e psíquicas humanas não só é lícito, mas inclusive desejável e moralmente necessário. Antes de tudo, porque a potenciação é considerada uma possível escolha subjectiva que entra no direito de autonomia: seria o indivíduo a estabelecer subjectivamente os confins entre saúde e doença e, portanto, qualquer condição poderia ser considerada doença e requerer uma intervenção médica, inclusive o sentir-se baixo, ansioso ou simplesmente melancólico. Em segundo lugar, porque a potenciação é finalizada ao melhoramento, assim como ao treino e à educação: com efeito, treina-se para melhorar as prestações físicas e educa-se um indivíduo para que sejam desenvolvidas as suas capacidades intelectuais. Do mesmo modo, é considerado justificável e necessário potencializar-se com o uso de fármacos e das novas ofertas tecnológicas. Aliás, quem se opõe à potenciação, segundo esta perspectiva, provoca um dano ao homem e à sociedade enquanto impede a possibilidade de obter melhores resultados de modo mais fácil e rápido.

Na realidade, a potenciação ameaça a dignidade humana. De facto, trata-se de uma tentativa de superar os limites da natureza, no esforço de a manipular com base nos desejos subjectivos e, portanto, arbitrários, seleccionando características físicas, mentais e emotivas consideradas melhores. A potenciação ameaçaria também a justiça social, porque inevitavelmente produziria desigualdades entre quem tem a possibilidade de aceder às tecnologias e quem permanece nas condições naturais, introduzindo desequilíbrios na competição. Enfim, a potenciação conduziria a novas formas de discriminação: não só criaria uma subalternidade entre habilitados (naturais) e super-habilitados (potencializados), mas acentuaria inevitavelmente a diferença entre desabilitados e habilitados, promovendo uma mentalidade de marginalização de quem é considerado "imperfeito".

A corrida à potenciação levaria desse modo a legitimar todas as exigências do sujeito ao médico prescindindo de objectivas condições de doença, quer em relação a si mesmo (para melhorar) quer em relação aos outros (para ter os filhos melhores, mediante a eugenética positiva ou a selecção das características genéticas preferidas). O médico tornar-se-ia desta maneira um mero executor dos desejos alheios, acabando por esquecer o seu dever terapêutico. O uso de tecnologias ou fármacos com finalidades melhorativas poderia além de tudo provocar danos graves, desproporcionados em relação aos benefícios alcançáveis: paradoxalmente, com o objectivo de melhorar-se, poder-se-ia danificar a própria saúde. E acabar-se-ia também por esquecer que o verdadeiro melhoramento se obtém não através de fármacos ou de tecnologias, de modo rápido e passivo, mas mediante o esforço pessoal, o empenho activo e quotidiano e a relação com os outros.

Laura Palazzani


(© L'Osservatore Romano - 14 de Novembro de 2009)

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