Algumas pessoas pensam que a
santidade não tem truque, que é inteiro mérito de um super-homem, ou de uma
super-mulher. Aparentemente, ser santo implicaria aguentar a dor, como um
faquir, controlar o medo como um domador de leões, vencer o cansaço como um
atleta da maratona e, talvez, somar a estas proezas a eloquência dos políticos.
Tudo isto sem truque.
A Igreja tem uma perspectiva
diferente da santidade, a tal ponto que só canoniza alguém quando a intervenção
de Deus é manifesta, através de um milagre. A pessoa pode ter realizado com
mérito um milhão de proezas, mas isso não chega. Se foi tudo mérito seu, não
chega, a santidade genuína tem de ser mérito de Deus. Bento XVI dizia que «o
papel do santo é deixar Deus actuar».
Mural de D. Oscar Romero a ser canonizado pelo Papa Francisco a 14 de outubro deste ano |
É esta a conclusão que se tira
das recentes notícias de beatificações e canonizações. Em todas elas aparece,
como elemento decisivo, um milagre ocorrido depois de a pessoa morrer, isto é,
quando já nada dependia dela. Escrutinada minuciosamente a biografia, o processo
fica pendente enquanto não ficar clara a marca de Deus naquela vida. Como tem
sido declarado várias vezes pela Santa Sé, a canonização não exige que a pessoa
não tenha cometido erros e pecados, mas que tenha deixado Deus actuar na sua
vida. A própria inquirição biográfica tem esse objectivo.
O Papa diz que todos poderíamos
ser santos e deveríamos ser santos. Há poucos dias, por exemplo, mandou
publicar os decretos relativos às virtudes heróicas de Carlo Acutis, Alexia
González-Barros, que morreram tão novos que não tiveram oportunidade de
realizar feitos notáveis. Carlo morreu com 15 anos, Alexia com 14. Não
interessa a notoriedade.
Carte de D. Álvaro del Portillo, bispo e prelado do Opus Dei agradecendo-lhe as felicitações re- cebidas por ocasião do 50º aniversário da Obra |
Entre os que vão ser canonizados
depois do Verão, conta-se o Arcebispo Óscar Romero, de S. Salvador, assassinado
enquanto celebrava a Missa num hospital. Passados poucos anos, o Papa João
Paulo II nomeou Arcebispo de S. Salvador um padre do Opus Dei que tinha sido o confessor
e director espiritual de D. Óscar Romero – sabe-se isso porque o próprio D.
Óscar o disse e escreveu. A nomeação deste sucessor acabou por ser importante
no arranque do processo de canonização de D. Óscar Romero, porque naquela época
alguns confundiam a justiça cristã com a revolução comunista. Com todo o
trabalho de reconstrução biográfica, hoje é fácil de reconhecer a simplicidade
e virtude daquele homem de Deus, apaixonado da Eucaristia e dos sacramentos,
fidelíssimo à doutrina da Igreja, incansável no esforço de ajudar todos e
chegar a todos.
No entanto, depois de todo este
trabalho, para se chegar à canonização, o Papa quis que Deus interviesse com um
milagre.
Imagem: ©elsavador.com |
Em Agosto de 2015, Cecilia estava
à espera do terceiro filho. De repente, sentiu dores intensas. O marido levou-a
ao hospital e o caso precipitou-se. Tensão muito elevada, perda de visão... os
médicos resolveram antecipar o parto, mas a saúde de Cecilia piorou.
Diagnosticou-se-lhe a síndrome de Hellp, uma doença gravíssima e rara. A
solução foi induzir o coma, à espera que o corpo reagisse, ao mesmo tempo que
se faziam diálises para apoiar os rins, que tinham deixado de funcionar. O
marido, Alejandro, fez o que costumavam fazer na família: rezava. Na verdade,
embora fossem salvadorenhos, não tinham prestado atenção a D. Óscar Romero,
talvez porque não o tenham conhecido pessoalmente, mas a devoção da avó de
Alejandro decidiu a família a pedir a Deus que curasse a Cecilia por
intercessão de D. Óscar. Poucos dias depois, os parâmetros vitais de Cecilia
regularizaram-se, ela saiu do coma e teve alta do hospital. Desde então, nem a
mãe nem o filho tiveram mais sinais da doença, que costuma ter consequências
muito graves quer para a mãe quer para o filho.
Percebeu-se que Deus mostrava à
Igreja que queria que D. Óscar fosse canonizado, o que vai acontecer no final
do Verão, juntamente com o Papa Paulo VI e outros santos.
José Maria C.S. André
14-VII-2018
Spe Deus
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