No sábado passado (2019), a Rádio Vaticana começou finalmente a emitir um telejornal em latim. Os documentos oficiais são redigidos em latim desde há muitos séculos; os textos litúrgicos de referência estão escritos em latim; o Papa publica «tweets» em latim; nas grandes celebrações, Francisco e os Papas anteriores continuam a celebrar a Missa em latim. A própria Rádio Vaticana transmite regularmente a Missa em latim e emite programas culturais em latim. Faltava um telejornal em latim com as notícias do dia-a-dia. A Rádio Vaticana tem noticiários em muitas línguas, mas faltava esta. Agora, já não falta. Quem quiser, pode sintonizar o canal:
– «Tcharan!» (Música de abertura). «Hebdomada Papæ, notitiæ vaticanæ latine redditæ, etc.».
Hoje, já não há soldados romanos! – objecta alguém.
– Essa agora?! A conta de «Tweeter» do Papa Francisco tem cerca de 1 milhão de seguidores, enquanto as línguas menos importantes, como o alemão ou o português, têm só metade de seguidores.
Há minutos, Francisco «tweetou» na sua conta em latim, account@Pontifex_ln: «Sancte Spiritus, fac nos opifices concordiae, seminatores boni, apostolos spei!» Espírito Santo, faz-nos operadores de concórdia, semeadores do bem, apóstolos da esperança!
Seguindo este conselho, não vamos discutir se há por aí soldados romanos. Talvez não sejam soldados, nem mártires. Talvez sejam só poucos milhões. Mas o latim não se mede pela popularidade.
A Igreja nasceu católica. Ao contrário da generalidade das religiões, o cristianismo não é uma religião nacional, própria de uma civilização, confinada a uma época. O culto promovido por Zaratrusta desapareceu com o ocaso da civilização persa. As divindades solares Amon, Ra, Ptah, deixaram de brilhar com o eclipse da civilização egípcia. As divindades do Olimpo ficaram reduzidas a estátuas arqueológicas quando o Panteão grego se reduziu a arqueologia. As divindades romanas Apolo, Diana, Mercúrio, Vénus, Marte... são nomes de planetas ou pouco mais. O tempo desvaneceu os cultos locais da Europa, da Ásia, da África e da América e as religiões que subsistem nalgumas zonas ainda não atravessaram as primeiras mudanças de regime político, em particular o teste da democracia. Em contrapartida, o cristianismo não pertenceu ao império romano, nem foi característico do Renascimento, ou do iluminismo..., nem é próprio da Itália, da Europa, ou do mundo ocidental. Desde o princípio, quando os discípulos estavam fechados com Nossa Senhora, na sala do cenáculo, cheios de medo, com as portas fechadas, a Igreja já era universal, porque Jesus Cristo a tinha fundado universal, de uma vez para sempre.
A universalidade da Igreja não reúne apenas os católicos de todos as condições e proveniências. Abrange as multidões que nos precederam através dos séculos e abre os braços a todos os que hão-de receber da nossa geração o testemunho de Cristo.
Hoje, talvez não haja soldados romanos, mas o latim permanece como símbolo desta universalidade sem fronteiras de espaço ou de tempo. O latim é uma espécie de linguagem gestual, um sorriso aberto que transmite a bem-aventurança comum. Mesmo para quem não estudou latim, é ouvir a voz dos primeiros cristãos ressoar, em crescendo, através dos séculos. Em latim e em todas as línguas, a voz da Igreja é a voz de Cristo, a mesma voz de sempre, através dos séculos.
Sintonizo a Rádio Vaticana. Os locutores latinos saúdam os ouvintes com simpatia:
– «Salutem plurimam omnibus vobis auscultantibus... et feliciter vobis audientibus novos nuntios Latina lingua prolatos».
– Felicidades também para vocês! Bom serviço! Cuidado com certas construções gramaticais.
José Maria C.S. André
Sem comentários:
Enviar um comentário