Quando, nestes dias, Barack Obama, presidente dos Estados Unidos da América do Norte, falava das vítimas dos disparos tresloucados de um jovem de Newtown, a maioria crianças entre os 5 e os 6 anos, e lembrava casos semelhantes ocorridos na América, comoveu-se e teve de limpar algumas lágrimas que lhe corriam da vista. Dizia ele que nessa noite os pais dessas crianças não as poderiam abraçar e dizer-lhes que as amavam, como ele e sua esposa o fariam com seus filhos. E apelava para a oração.
Na verdade, o sofrimento e a morte de pessoas indefesas, sobretudo se vítimas da maldade e da violência de adultos, toca profundamente a nossa sensibilidade e muitos perguntam como isso é possível. Alguns até fazem disso motivo para pôr Deus em causa e bani-lo da sua mente.
Pensa-se, e bem, na ajuda psicológica dos sobreviventes e das famílias atingidas. Mas muitas vezes esquece-se a ajuda espiritual, proveniente da fé e da oração. Obama pediu oração. O pároco da única paróquia católica de Newtown acorreu ao local poucos minutos depois, para ajudar as famílias e as pessoas da escola onde se deu o massacre. E a diocese pediu aos padres da vizinhança para irem ajudar. A paróquia organizou momentos de oração durante toda a noite, mantendo a igreja aberta.
Na Europa laica ignora-se muitas vezes o poder e a ajuda da oração e da fé. Embora não devendo lembrar-nos de Deus apenas quando nos sentimos impotentes, a fé em Deus, a educação moral e religiosa e a família contribuem para evitar tragédias como esta. Como alguém dizia, retirando Deus dos nossos ambientes e desvalorizando a família, permitimos que o egoísmo, a frieza e a violência determinem as relações humanas e sociais.
Sem abertura à transcendência, na fé, sem a experiência de amar e ser amado desde a concepção e o nascimento, o que apenas pode acontecer em famílias estruturadas, reina o egoismo coletivo e o bem comum torna-se o parente pobre da vida social, laboral, económica e política. Por isso não nos admiremos com a situação presente. Mas não pactuemos com ela.
2. Natal mostra-nos o caminho
Sentindo os problemas e angústias do nosso tempo, pergunto-me o que fazer, para construirmos uma sociedade mais fraterna. Como cristãos, como celebrar e viver o Natal?
Em primeiro lugar, acolhendo a manifestação do amor sem limites de Deus para com a sua criatura, assumindo a nossa condição, em tudo igual a nós, excepto no pecado, confiando-se a nós e entregando-se por nós. Ainda que uma mãe esqueça o filho que trouxe nas suas entranhas e amamenta, diz Deus pelo profeta Isaias (49, 15), eu não me esquecerei de vós. Diante da criança de Belém ajoelharam-se os pastores e os sábios, reconhecendo nela a glória de Deus e o Salvador prometido. O mesmo se pede a cada um de nós, um coração simples, acolhedor, aberto, contemplativo e grato.
Em segundo lugar, alargando a nossa gratidão e amor a todos aqueles que fazem parte da nossa vida, das nossas relações desde que nascemos. A família de sangue é a primeira instância do nosso trajeto de vida. Daí a tradição tão própria do Natal, o encontro da família. Apesar da crise e da austeridade, todos tentaremos reunir-nos à volta da mesma mesa, indo ao encontro daqueles que ainda ou já não podem vir até nós, devido à idade ou doença. Oxalá também nos juntemos à volta da mesa na oração da comunidade de fé, a família espiritual, em que Deus se torna presente como amigo e salvador de todos!
Por último, saltando muitas etapas da nossa vivência de Natal, acolhendo também como membros da nossa família, porque também filhos de Deus, todos os que sofrem por falta de amor, de teto, de trabalho e de pão. Nesta relação de gratuidade para quem não nos pode retribuir, vivemos a profundidade do Natal, do amor gratuito e solidário de Deus para connosco.
Não nos esqueçamos de partilhar os nossos presentes e sobretudo o nosso tempo e presença junto daqueles que a sociedade esquece e marginaliza. Se gosta de ajudar e tem pouco tempo ou quer permanecer anónimo, saiba que a diocese de Beja tem um fundo de emergência social, gerido pela Caritas, com o NIB nº 001 000 001 988 939 001 445 e agradece a sua generosidade para poder ajudar quem mais precisa.
Com esta visão e estas atitudes natalícias, cantemos também nós: Glória a Deus nos céus e paz na terra aos homens de boa vontade. A todos os diocesanos, leitores e ouvintes, o Bispo de Beja deseja Natal de amor e de paz e um ano de 2013 rico em vivências de boa vizinhança e solidariedade.
† António Vitalino, Bispo de Beja
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