Obrigado, Perdão Ajuda-me

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As minhas capacidades estão fortemente diminuídas com lapsos de memória e confusão mental. Esta é certamente a vontade do Senhor a Quem eu tudo ofereço. A vós que me leiam rogo orações por todos e por tudo o que eu amo. Bem-haja!

domingo, 6 de março de 2011

“O Estado poderia chegar a resolver a identidade de género”

Paradoxalmente, o ideal libertário, que promove a ideologia de género, pode voltar-se contra o indivíduo em mãos do poder político. Assim o explica Francesco D'Agostino, catedrático de Filosofia do Direito na Universidade Tor Vergata (Itália). Entrevistámo-lo por ocasião do I Congresso Internacional de Ideologia de Género, organizado pela Universidade de Navarra de 9 a 11 de Fevereiro.

Embora os postulados da ideologia de género possam parecer exagerados para o cidadão comum, o seu influxo é visível na cultura actual: a proliferação de guias escolares com uma visão enviesada da sexualidade, leis como a do casamento entre homossexuais ou a que permite a mudança de sexo, e a promoção dos chamados "direitos da saúde sexual e reprodutiva" são alguns exemplos.

Para compreender a radicalidade da visão antropológica que propugna a ideologia de género, Francesco D'Agostino propõe-se a levar os seus postulados até às suas últimas

Catedrático de Filosofia do Direito na Universidade Tor Vergata (Itália), D'Agostino é presidente honorário do Comité Nacional de Bioética Italiano, membro da Academia Pontifícia para a Vida e presidente da União de Juristas Católicos Italianos, entre outros cargos.




Quando é o Estado a decidir

- A ideologia de género defende que cada pessoa decide autonomamente a sua identidade de género e, além disso, esta pode ser variável. Se, em nome da autodeterminação, a identidade pessoal se desvincula das suas raízes naturais, não poderia acontecer também que o poder político se considerasse legitimado para decidir essa identidade, que já não se baseia em nada natural?

- Não me parece possível que todas as pessoas escolham a sua identidade de género. Esta reivindicação é fundamentalmente abstracta e ideológica: pode ter conexão com um pequeno número de pessoas. Um dos sociólogos mais importantes do século XX, Niklas Luhmann, dizia que a distinção entre homem e mulher, entre marido e esposa, é compreensível pelo senso comum.

Se cada um pode escolher a sua identidade de género, é razoável pensar que também pode ser imposta de fora, a partir da sociedade ou do Estado. Pensando bem, poderia fazer-se um acordo colectivo que reconhecesse a primazia da decisão da maioria sobre a individual.

Se a identidade de género chega a ser uma decisão que não difere de outras decisões de carácter político ou social, não há dúvida que o poder poderia impô-la, como impõe indirectamente a função social e profissional de cada indivíduo.

- Mas nem todas as funções são impostas. Aliás, o que propõe a ideologia de género é precisamente libertar os indivíduos das funções arbitrárias.

- Efectivamente, ninguém pode chegar a ser médico, advogado ou engenheiro apenas por autodeterminação. A função profissional adquire-se através de uma formação juridicamente formalizada, que habilita os cidadãos para desempenhar essa função. Se o meu desejo de chegar a ser médico não corresponde à minha capacidade individual para ser médico, a sociedade civil nega-me essa função.

O paradoxo é que as teorias da ideologia de género estão a passar a identidade de género do plano natural para o plano social, e isto poderia levar a sociedade civil ou o Estado a "resolver" a identidade de género, talvez não tanto como uma imposição, mas sim como orientação.

Até às suas últimas consequências

- Nos últimos anos, os pró-família estão a envidar muitos esforços a estudar a ideologia do género. Entendo que alguns desses estudos são necessários, mas não acha que a atenção excessiva por esta corrente de pensamento desvia a atenção de outras questões mais relevantes? Tenho a impressão de que, afinal, os pró- família dedicam demasiado tempo a falar sobre o que outros dizem, em vez de proporem de forma positiva as suas próprias ideias.

- É verdade que estão a aumentar os estudos sobre ideologia de género, e partilho de algumas das inquietações que esta pergunta encerra. Ou melhor, há uma atenção excessiva sobre este tema, mas quero sublinhar que isto se deve, em parte, a uma grande honestidade intelectual. Não se pode contestar a ideologia de género a olhar para o lado, ou a classificar essas teorias como ridículas ou absurdas. A forma mais honesta de abordar este tema é aprofundar, de maneira precisa, os argumentos dessa ideologia, embora essa atenção pareça excessiva.

Não há uma única ideologia de género. Há múltiplas visões; algumas delas contradizem-se entre si; outras estão a evoluir. A teoria do género é uma perspectiva da antropologia, que se encontra enraizada entre a reflexão autêntica e séria sobre a identidade do homem, e uma antropologia do pós-humanismo, em que a identidade humana tem de ser desconstruída.

Torna-se inquietante pensar como seria uma sociedade que aspirasse a prescindir da identidade humana. Neste sentido, penso que a ideologia de género merece ser estudada atendendo às suas últimas consequências.

Uma forma de relativismo

- Surpreende o pouco espaço que Bento XVI dedica a falar sobre a ideologia de género. Embora em alguns dos seus escritos se tenha referido à revolta actual contra a natureza humana, dá a impressão que o Papa engloba a ideologia de género dentro do problema mais amplo do relativismo moral.

- Estou de acordo com esta afirmação. O Papa não se centra de maneira particular sobre a ideologia de género, e isto pode ser por diferentes razões.

Poder-se-ia dizer que Bento XVI é um Papa teólogo, não filósofo. De algum modo, os seus ensinamentos servem para recordar-nos que a filosofia passa e a teologia não, porque a teologia tem como objecto não tanto Deus como a palavra de Deus. Tem as suas raízes na verdade, de uma maneira diferente da filosofia.

Creio que o Papa deseja manter a Igreja num contexto forte de reflexão teológica, porque essa é a missão da Igreja, sobretudo se considerarmos que a Igreja é mestra de laicidade ("Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus"). Os pastores têm de falar de Deus e os filósofos falarão de César para construir a sociedade civil. Por isso, o facto de que o Papa não faça referência explícita à ideologia de género, a meu ver, é uma prova da distinção essencial entre teologia e filosofia. Também do respeito que o magistério da Igreja tem pela laicidade, quer dizer, pela autonomia do pensamento filosófico.

Ao mesmo tempo, isto tem um valor pastoral; na minha opinião, o que o Papa quer ensinar é que temos de pensar principalmente nas coisas do alto, como diz S. Paulo, e esse é o maior esforço que se pode pedir ao homem, porque muitas vezes estamos inclinados a olhar para as coisas de baixo.

Parece-me correcto, justo e coerente que o Papa não se centre em temáticas que são ideológicas. Isto convida a levar a sério a ideologia de género, que é muito importante, mas de uma importância relativa perante a palavra de Deus que, para quem crê e para o Papa, é o essencial.

Juan Meseguer

Aceprensa

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