Pelo menos na Eucaristia de
Domingo, no Credo, os católicos confessam que confiam na Igreja una e santa
mas, perante a quantidade de protestos que se ouvem, perguntamo-nos o que
significa essa unidade.
O comentário do Papa é que «o
primeiro conforto vem-nos da constatação de que Jesus rezou muito pela unidade
dos discípulos. Trata-se da prece da última Ceia, na qual Jesus pediu
insistentemente: “Pai, que eles sejam um só”».
Jesus rezou tão insistentemente
pela unidade que a Igreja não pode deixar de estar unida. Então, o que se
passa? A história apresenta-nos exemplos maravilhosos de harmonia, assim como o
sofrimento da desunião. Continua o Papa:
– «Os Actos dos Apóstolos
recordam-nos que os primeiros cristãos se distinguiam por terem “um só coração
e uma só alma” (Act 4, 32); além disso, o apóstolo Paulo exortava as suas
comunidades a não se esquecerem de que constituem “um só corpo” (1 Cor 12, 13).
No entanto, a experiência revela-nos que se cometem muitos pecados contra a
unidade».
Há um mistério nesta mistura de
trigo e de joio. Porque é que Jesus conta nessa parábola que o diabo semeou
joio no campo de trigo da Igreja e, contudo, não devemos cortar o joio? Porque
é que o joio há-de ficar na Igreja a manchar a pureza do bom trigo?
Não faltam aqueles que exigem que
o Papa e os bispos expulsem o joio. Porque é que Jesus não parece concordar com
um saneamento geral? O Papa Francisco propõe um exame de consciência:
– «Diante de tudo isto, devemos
fazer um sério exame de consciência. Numa comunidade cristã, a divisão é um dos
pecados mais graves, porque a torna sinal não da obra de Deus, mas do Diabo, o
qual é por definição aquele que separa, que arruína os relacionamentos, que
insinua preconceitos».
Este conselho do Papa faz pensar no
perigo de o inimigo ter semeado joio no NOSSO coração. Se tivesse semeado joio lá
fora, podíamos tomar medidas drásticas para conter a infestação, o problema é
que talvez a semente da divisão esteja no interior da alma. Julgo que é por isso
que o Papa diz que «devemos fazer um sério exame de consciência».
O joio que nos envenena a alma
esconde-se, quando o procuramos descobrir: a crítica justifica-se porque os
outros se portaram mal; criticamos os outros para que se corrijam; até nos
deviam agradecer; talvez devêssemos ser ainda mais amargos na crítica que lhes
fazemos. Viva a nossa crítica, tão santa! Vibra em nós a indignação dos
apóstolos quando encontraram uma aldeia que não os queria receber: «Mestre,
queres que mandemos vir fogo do céu e os consuma?». Jesus desatou a rir e
chamou àqueles discípulos, com simpatia e bom humor, «filhos do trovão». Quando
se faz um exame de consciência sério, Jesus faz-nos ver que não nos compete
castigar o mundo, mas amá-lo. Podemos ajudar quem erra, se o amarmos. Com o
mesmo sorriso divertido, Jesus arrancará suavemente o joio do nosso coração?
Continua o Papa Francisco:
– «Deus quer que cresçamos na
capacidade de nos aceitarmos, de nos perdoarmos e de nos amarmos uns aos
outros, para nos assemelharmos cada vez mais Àquele que é comunhão e caridade.
Eis no que consiste a santidade da Igreja: em reconhecer-se à imagem de Deus,
repleta da sua misericórdia e graça».
É curioso como a unidade está tão
relacionada com a santidade, a tal ponto que S. Josemaria Escrivá dizia que são
a mesma coisa (homilias «Amar a Igreja»).
Felizmente, o exame de
consciência que o Papa sugere não é tão doloroso. É uma bênção de paz, para nós
e para a Igreja:
– «Caros amigos, deixemos ressoar
no nosso coração estas palavras de Jesus: “Bem-aventurados os pacíficos, porque
serão chamados filhos de Deus!” (Mt 5, 9). Peçamos sinceramente perdão por
todas as vezes que constituímos ocasião de divisão ou de incompreensão (...),
conscientes de que não chegaremos à comunhão, a não ser através de uma
conversão contínua».
Neste tempo de Quaresma, de
conversão contínua, de exame de consciência, vieram-me à memória estas
considerações do Papa Francisco durante aquelas audiências com os peregrinos na
Praça de S. Pedro dedicadas a meditar o mistério da Igreja, no ano de 2014. Os
textos citados são da audiência de 27 de Agosto de 2014.
José Maria C.S. André
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