Existe um enorme equívoco nas leituras que se fazem do PAN. O seu sucesso não está relacionado com ecologia, está relacionado com a solidão.
O factor que levou o PAN ao Parlamento não foi a preocupação ecologista dos portugueses, foi a solidão das famílias e dos indivíduos nas nossas cidades. A pequenez das nossas famílias cria um vazio que é preenchida por cães e gatos. É só isto. Numa sociedade de filhos únicos como a nossa, não há irmãos, não há primos. Mas há cães e gatos. Se não há crianças, também não há netos. Mas há cães e gatos. O PAN vem desta absurda solidão familiar que se vive em Portugal, não vem da ecologia. Já agora, os cães também ocupam o vazio dos divórcios (segunda taxa mais alta da Europa).
A humanização dos animais, uma marca ocidental, é fortíssima em Portugal, porque nós somos uma das sociedades mais velhas, uma das sociedades com mais divórcios, e uma das sociedades com menos filhos. Alerto há anos, aqui e na Renascença, contra os perigos do animalismo, precisamente porque vejo – há anos – a ascensão deste animalismo que humaniza cães e gatos como uma das marcas da decadência da família. A família humana, diga-se. De resto, as dificuldades do CDS, um partido centrado no valor da família, e ascensão do PAN são os dois lados da mesma moeda: a fragmentação total da família em Portugal. O PAN é mesmo um reflexo indireto do nosso imenso e total fracasso coletivo. Somos um país sem filhos, sem irmãos, sem primos, sem netos, país de gente separada e solitária, um país onde a velhice pode ser uma tortura.
Henrique Raposo in Expresso
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