Melhor que visitar escolas, foi
falar com o Prof. Charles Sotz. Tive a sorte de o apanhar de férias no Uganda e
aproveitei a oportunidade para me informar sobre o sistema educativo das antigas
colónias inglesas de África. Sotz é um queniano com raízes argentinas e checas,
apaixonado pelo ensino e pelo desenvolvimento social, é dos que mais sabe de
educação nestes países. Foi ele quem me apresentou as escolas privadas para
pobres, sobretudo no ensino básico.
O fenómeno tem raízes antigas,
mas acelerou na última década. Por exemplo, em 2005, havia quase uma centena de
escolas estatais na província de Mombasa e um número equivalente de escolas não
estatais. Em 10 anos, a procura das escolas estatais manteve-se e a das outras
escolas triplicou. Na província de Nairobi, a proporção actual já é de 4
escolas privadas por cada escola estatal. No «ranking» dos exames nacionais de 2005,
a melhor escola estatal da província de Mombasa estava em 23º lugar,
actualmente, a melhor escola estatal está em 94º lugar.
As comparações económicas são
difíceis de estabelecer, porque o custo de vida é muito diferente do da Europa,
mas podemos confrontar as escolas entre si. As propinas de algumas escolas
privadas custam 14 euros por mês, mas na maioria a propina é de 7 euros por mês,
durante 10 meses. Ao lado, o Estado gasta mensalmente cerca de 35 euros por
aluno nas escolas estatais.
Esta disparidade de custo e
sobretudo de eficácia tem muitas explicações. A mais óbvia é que as instalações
das escolas não estatais são realmente muito deficientes, os salários são muito
inferiores aos dos funcionários públicos e geralmente os professores das
escolas não estatais têm piores qualificações formais. Isto explica a diferença
entre o que os pais pagam nas escolas privadas e o que o Estado gasta por aluno
nas escolas estatais.
A parte interessante, e que
mais ocupou as minhas conversas com Sotz, foi a razão de as escolas privadas
serem tão assinaladamente melhores.
Em primeiro lugar, Sotz
verificou uma diferença abissal entre a motivação dos professores, pais e
alunos. No Estado, os pais não conseguem contactar com os professores e os
professores não estão dispostos a sacrificar-se pelos alunos. No ensino
privado, os alunos são mais responsáveis, trabalham mais e sabem o que estão a
fazer na escola.
Outra observação estatística
que me deixou a pensar é que não há correlação entre a qualidade dos edifícios
e o nível de aprendizagem dos alunos. Se a escola não tem instalações
desportivas, os alunos jogam ao ar livre; se as salas são velhas e
desconfortáveis, isso não afecta o rendimento escolar. As qualificações formais
dos professores também não têm relação estatística com os resultados dos
alunos: um professor trabalhador e exigente é muito melhor que um diplomado em
pedagogia, com uma atitude pouco generosa.
Os sindicatos dos professores
das escolas estatais opõem-se ferozmente à existência de escolas livres e têm
forçado o Governo a tomar medidas restritivas, tais como exigir melhores
equipamentos e professores mais qualificados. Os pais reagem, porque essas
medidas aumentam os custos e, se a propina aumentar acima de 7 euros por mês,
as famílias mais pobres têm de colocar os filhos nas escolas do Estado. Criando
mais exigências, o Governo já conseguiu fechar várias escolas privadas. (Onde é
que eu já vi isto?). O surpreendente, explicou-me Sotz, é que essas escolas continuam
a funcionar. Como?!
– Os pais têm lá os filhos
durante todo o ano lectivo e, no final, inscrevem-nos numa escola do Estado,
para eles fazerem os exames nacionais.
– E as escolas estatais aceitam
esses paraquedistas?!...
– Sim, porque esses alunos têm
melhor preparação que os das escolas do Estado e fazem-nas subir no «ranking».
Spe Deus
11-IX-2016
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