As palavras de Jesus que acabamos de ouvir são uma maravilhosa abertura do seu coração, em que Ele fala ao Pai e aos seus discípulos. Da mesma forma também nós, os cristãos, estamos chamados a falar com Deus e com os nossos irmãos. A evangelização, o apostolado, é precisamente fruto da nossa intimidade com Deus, como escreveu são Josemaria: “O teu apostolado deve ser uma superabundância da tua vida «para dentro»”[1].
Nesta celebração eucarística em sufrágio pelo bispo e prelado do Opus Dei, D. Javier Echevarría, o Evangelho traz à minha memória a naturalidade com que D. Javier procurava nos ensinar a amar Cristo e os outros. Todos os dias comentava alguma passagem da Liturgia da Palavra ou dos outros textos da Missa. Fazia isso, é claro, em meditações ou conversas sobre temas espirituais, mas também no meio da simplicidade da sua vida diária. Assim, na mesma hora, começava a rezar e convidava os que estavam com ele a rezar: por uma viagem do Papa, pela paz na Síria, pelas vítimas de desastres naturais, pelos refugiados, pelos desempregados, e pelos doentes, por quem sempre teve uma particular preferência, que também aprendeu de São Josemaria. Quando voltava de uma viagem longa, antes de ir para casa, aproximava-se algumas vezes ao hospital para visitar a algum doente. Todos cabiam no seu coração. Tinha aprendido do fundador do Opus Dei a "amar o mundo apaixonadamente" porque, como explicava o santo "no mundo encontramos a Deus (...) nas ocorrências e acontecimentos do mundo, Deus se manifesta a nós e a nós se revela"[2]. E assim, Dom Javier amava a vida real, os fatos, as histórias belas e verdadeiras da misericórdia de Deus.
Teve que responder a um desafio: o de ser o sucessor de dois santos, são Josemaria e o bem-aventurado Álvaro. Estava convencido de que não estava à altura. Mas, ao mesmo tempo, tinha a força espiritual e a coragem para seguir em frente, sem nunca perder a esperança, porque era um destes pequenos a quem o Senhor revelou o mistério do seu amor (cfr. Mt 11,29).
Tinha conhecido o amor de Cristo na sua juventude. Em primeiro lugar, no lar da família; depois, para ele houve a grande luz do encontro com São Josemaria: descobriu então com maior profundidade a beleza do amor de Cristo. Lembrava como, naquela época, poucos dias depois de ter encontrado pela primeira vez a São Josemaria, andando de carro com ele e alguns outros, ouviu-o cantar uma canção de amor humano, que São Josemaria trasladava ao âmbito divino. Dizia: "Eu tenho um amor que me enche de alegria, esse amor é a maravilha de cada dia". Entendeu que este amor era o Amor de Deus por nós e que o Espírito Santo infundia no seu coração o amor para amar a Deus e aos outros. “O meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mt 11,30), é o que Jesus diz, porque o jugo é o amor: “Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei.” (Jo 15,12).
Quando Javier Echevarría foi ordenado sacerdote, apesar de ser ainda muito jovem, a Missa já tinha se tornado o centro e a raiz do seu dia, porque a Eucaristia é “fonte e cume de toda a evangelização”[3], como ensina o Concilio Vaticano II. Durante mais de sessenta anos, enquanto se revestia com a casula para celebrar os santos mistérios, gostava de rezar com o coração aquela oração da Igreja que recorda a doçura do jugo do Senhor; a imensidão da sua caridade e da sua misericórdia, revelada de modo excelso em Jesus, morto na Cruz e ressuscitado por nós.
Seguindo o exemplo e os ensinamentos de São Josemaria, Javier Echevarría foi um homem de grande coração, capaz de perdoar e de pedir perdão. Amava muito o sacramento da Reconciliação e da Penitência, em que deixamos Jesus entrar na nossa alma, e experimentamos a “plena liberdade do amor, com o que Deus entra na vida de cada pessoa”[4], como escreve o Santo Padre Francisco. D. Javier, como vigário geral da Prelazia, nunca teve outro objetivo fora ajudar o bem-aventurado Álvaro na sua missão de guiar esta pequena parte do Povo de Deus. E depois de são João Paulo II nomeá-lo prelado, seu único pensamento e desejo ardente foi o de ajudar, aos que tinham passado a ser seus filhos e filhas espirituais, a buscar verdadeiramente a santidade que Deus quer nos dar; a irradiar o amor a Deus ao nosso redor, especialmente na busca da santificação através do trabalho e das atividades da vida diária: na família, com os amigos, na sociedade. De fato, partiu para o Céu rezando pela fidelidade de todos.
Penso que podemos descobrir o segredo de tudo isto na leitura do Evangelho que acabamos de ouvir. É a oração, a fé na presença amorosa de Deus, que nos faz filhos de Deus em Cristo pelo Espírito Santo: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos.” (Mt 11,25). Sim, a santidade não é outra coisa senão a plenitude da caridade em nós, fazer frutificar os talentos que Deus nos dá, sair de nós mesmos em direção aos outros; a participação na vida de Cristo, isto é, o crescimento da filiação adotiva no único e eterno Filho do Pai. Pode-se dizer que dentro do coração de D. Javier Echevarría vibrava a espera impaciente da revelação dos filhos de Deus a que São Paulo se refere em sua Carta aos Romanos (cfr. Rm 8,19).
Gostaria de agradecer aos cardeais, aos arcebispos e bispos, aos irmãos no sacerdócio, às religiosas e religiosos, bem como às autoridades civis, e tantos outros fieis que quiseram se unir à nossa oração por D. Javier, e agradecer conosco por esta vida entregue a serviço dos outros.
Agora, gostaria de acrescentar algumas palavras, pensando especialmente nos fiéis da Prelatura. Se aquele que chamamos Padre durante vinte e dois anos estivesse aqui entre nós, com certeza nos pediria que aproveitássemos estes momentos para intensificar o nosso amor à Igreja e ao Papa, que permanecêssemos muito unidos entre nós e com todos os nossos irmãos em Cristo. E repetiria aquilo que, especialmente nos últimos anos, tinha chegado a ser um refrão nos seus lábios: que vos queirais bem, que vos ameis cada vez mais! E não só nos seus lábios: impressionava ver como sabia querer bem aos outros. Lembro, por exemplo, que um dia antes de falecer, expressou o seu desconforto por estar incomodando a tantas pessoas que cuidavam dele. E espontaneamente respondi: “Não, Padre. É o senhor que sustenta a todos nós”.
Queridos irmãos e irmãs, todas as graças chegam a nós através da mediação de Maria. O Padre a amava muito. O santuário de Guadalupe, no México, é um dos santuários marianos aos que peregrinou com São Josemaria e o bem-aventurado Álvaro, ou depois como Prelado. A Providência quis que o Padre fosse chamado ao Céu precisamente no dia 12 de dezembro, festa de Nossa Senhora de Guadalupe. No mesmo dia, quando a sua saúde estava piorando, um sacerdote perguntou-lhe se queria que colocasse na sua frente uma imagem de Nossa Senhora de Guadalupe; o Padre respondeu que não era necessário, porque não conseguia vê-la. Mas acrescentou que, no entanto, a sentia muito próxima. Deixemos nas mãos da Virgem Maria, spes mostra, esperança nossa, a nossa oração por D. Javier Echevarría, enquanto agradecemos ao Senhor por nos ter dado este pastor bom e fiel.
[1] Caminho, 961.
[2] Entrevistas, 70.
[3] Concílio Vaticano II, Decreto Presbyterorum Ordinis, n. 5.
[4] Francisco, Carta apostólica Misericordia et Misera, n. 2.
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