(…)As elites intelectuais dos séculos XIX e XX construíram uma magna narrativa civilizacional para explicar não apenas para a miséria educativa, mas todo o desenvolvimento nacional. Mas nesse relato os heróis estão trocados com os vilões, as forças progressivas com as retrógradas, as causas com consequências.
A Inquisição, repetidamente acusada de todos os males nacionais, "teve um efeito objectivo nulo sobre o desenvolvimento da Matemática em Portugal" (pág. 53)* e um impacto civilizacional muito inferior ao que os seus inimigos oitocentistas lhe quiseram assacar. Quanto aos jesuítas, malditos entre os malditos, "ao longo de todo o século XVII foram eles os únicos a ensinar Matemática e ciências em Portugal" (pág. 54)*. Pelo contrário, o Marquês de Pombal, supremo herói maçónico, repetidamente celebrado como reformador genial, criou "medida política isolada mais catastrófica alguma vez tomada em Portugal" (pág. 60)*, precisamente ao expulsar a Companhia de Jesus: "De um dia para o outro Portugal acordou sem escolas, sem professores, sem estabelecimentos de ensino e com 20 000 ex-alunos na rua" (pág. 61)*.
Portugal é um país espantoso, com um povo capaz de feitos únicos e maravilhosos. Em compensação, o País está há séculos dotado de uma elite pedante, mesquinha e medíocre. Esse grupinho de iluminados tem sempre no bolso a salvação nacional e, atingindo o poder, tudo faz para arruinar o País. Os desastres de 1834, 1890, 1910, 1916, 1926, 1961, 1978, 1983 e 2011 não são azares externos, mas efeito directo das soluções milagrosas da elite, que depois compõe uma magna falsificação histórica para se desculpar e acusar os adversários. Vemos isso hoje, com a crise.
João César das Neves in DN online
* N. Spe Deus: O artigo refere-se ao Ensaio publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos ‘Uma Questão de Educação’, do professor Jorge Buescu
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