Na conferência de imprensa durante o voo de regresso do Rio de Janeiro
Da entrevista longa, serena e aberta que o Papa Francisco concedeu aos jornalistas - e a transcrição completa faz sentir perfeitamente o clima descontraído e quase divertido que distinguiu o encontro - as grandes novidades são sobretudo duas, e dizem respeito a duas questões às quais o Santo Padre até hoje tinha dado pouco espaço: as mulheres e os homossexuais.
As declarações do Papa sobre o papel das mulheres são claras e reveladoras de uma grande vontade de abertura, não pronunciadas em nome de uma necessidade improrrogável de adaptar a Igreja à igualdade entre os sexos realizada nas sociedades ocidentais, nem revestidas de paternalismo, frequentemente afectuoso, que quase sempre impregna as palavras dos altos prelados quando enfrentam o tema. A abertura é substancial, e está directamente ligada ao seu projecto de reforma da Igreja: sem um reconhecimento aberto do papel das mulheres não se pode esperar a Igreja vital e acolhedora que o Papa Francisco deseja, a Igreja que pode novamente atrair os fiéis e animar os seus corações. A mulher, disse, "ajuda a Igreja a crescer" porque é a relação igualitária e colaborativa entre mulheres e homens que dá origem à fecundidade. E se esta relação faltar, se não for viva e for negada, como acontece hoje, a Igreja não cresce.
A coragem de dizer a verdade, como todas as verdades também óbvias, mas que ninguém antes dele tinha ousado, isto é, que "Maria é mais importante que os apóstolos", não lhe impede de excluir o sacerdócio feminino, mas ao mesmo tempo de pedir um suplemento de estudos e reflexões para compreender como realizar esta igualdade na diferença. Suplemento de pesquisa ao qual, obviamente, as mulheres darão contributos fundamentais. Em poucas palavras, a novidade é expressa de modo claro, e sem ameaçar a tradição da Igreja. Pode-se mudar tudo sem mudar as regras básicas, aquelas sobre as quais foi construída a tradição católica: esta é a sua posição também sobre os homossexuais. A Igreja não deve ser uma dispensadora rígida de juízos, mas deve estar sempre pronta a acolher os pecadores, isto é, todos nós. O exemplo de Pedro que trai Jesus e depois se "torna Papa" é de uma clareza evidente que num instante desacredita todas as cartas de denúncia, as suspeitas, os venenos que estão a circular no mundo eclesiástico depois da menção da "lobby gay". E recorda a todos que o cristianismo sempre distinguiu entre condenação do pecado e misericórdia para o pecador e que não é um puritanismo sem coração.
Também a este propósito o Papa Francisco nada muda das regras morais, mas elimina um moralismo rígido e mexeriqueiro, e com poucas palavras afasta da Igreja católica aquela acusação difamadora de homofobia que a perseguiu nos últimos tempos. A misericórdia é a característica distintiva do cristão, que significa acolhimento do pecador e perdão. Caso contrário, equivaleria a mudar as normas para cancelar o pecado.
Invoca misericórdia também para os divorciados recasados, sem com isto abrir ao divórcio: o Papa pede neste caso um suplemento de pesquisa teológica sobre a pastoral matrimonial, uma mudança cultural para conseguir explicar este sacramento às mulheres e aos homens de hoje. De facto, ele aponta o problema: se os matrimónios religiosos diminuíram tanto, e os que são realizados com frequência não são válidos, é porque muitas vezes a Igreja usa palavras erradas, velhas, rígidas e estéreis para explicar a instituição da qual nasce a vida. Não é preciso mudar as normas, mas os seres humanos que as explicam e a cultura que as justifica. E também a propósito da renovação da pastoral matrimonial estamos certos de que o Papa Francisco saberá valorizar a experiência feminina, decisiva sob este ponto de vista.
Todos estes são problemas e situações que o padre Bergoglio, sacerdote e bispo, encontrava no seu caminho pelas ruas de Buenos Aires, nos seus encontros com mulheres e homens normais, que lhe abriam o coração com esperança e sinceridade. Uma bagagem de experiências humanas que hoje iluminam o seu pontificado, animam todos os seus discursos e lhe dão aquela tonalidade de verdade que faz compreender e amar as suas palavras.
LUCETTA SCARAFFIA
(© L'Osservatore Romano - 4 de Agosto de 2013)
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