Não quereria entrar aqui nas complexas discussões dos últimos anos, mas apenas ressaltar um aspecto fundamental para todas as culturas: o respeito pelo que é sagrado para outra pessoa, e particularmente o respeito pelo sagrado no sentido mais alto, por Deus. É lícito supor que deveríamos poder encontrar esse respeito mesmo em quem não está disposto a crer em Deus. Onde se viola esse respeito, perde-se algo essencial na sociedade.
Na sociedade actual, graças a Deus, multa-se todo aquele que desonra a fé de Israel, a sua imagem de Deus, as suas grandes figuras. Multa-se também aquele que vilipendia o Corão e as convicções de fundo do Islão. Mas quando se trata de Cristo e do que é sagrado para os cristãos, a liberdade de opinião aparece como o bem supremo, cuja limitação representaria uma ameaça ou até uma destruição da tolerância e da liberdade em geral. No entanto, a liberdade de opinião tem um limite: não pode destruir a honra e a dignidade do outro; não há liberdade para mentir ou para destruir os direitos humanos.
O Ocidente sente um ódio por si mesmo que é estranho e só pode ser considerado patológico. Tenta, louvavelmente, abrir-se, cheio de compreensão, para valores externos, mas já não se ama a si próprio; só vê da sua História o que é censurável e destrutivo, ao mesmo tempo que não é capaz de perceber o que é grande e puro. A Europa precisa de uma nova aceitação de si própria - embora certamente crítica e humilde -, se quiser verdadeiramente sobreviver.
(Cardeal Joseph Ratzinger in ‘Fundamentos espirituales de Europa’, conferência na biblioteca do Senado da República Italiana, 13.05.2004; publicado em Zenit, 22.05.2004)
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