Constitui, por
assim dizer, a estrutura da aventura da Redenção que ela sempre diga respeito à
liberdade. Por isso, [a Redenção] nunca é simplesmente imposta do exterior ou
cimentada em estruturas fixas, mas está inserida no frágil vaso da liberdade
humana. [...] Como está ligada à liberdade e não é coisa que se possa impor ao
homem por meio de estruturas, volta sempre a reportar-se a essa liberdade e,
através dela, também pode, até certo ponto, ser destruída.
Mas temos de
reconhecer que o cristianismo libertou uma e outra vez grandes forças de amor.
Quando se considera o que realmente entrou na História graças ao cristianismo, vemos
que é notável. Goethe disse: "Surgiu o respeito profundo pelo que se
encontra abaixo de nós". Na realidade, somente através do cristianismo é
que se desenvolveu uma assistência organizada aos doentes, o amparo aos fracos
e toda uma organização de amor. Através do cristianismo cresceu, aliás, o
respeito por todas as pessoas em todas as situações sociais. É interessante
observar que o imperador Constantino, ao reconhecer o cristianismo, se tenha
sentido primeiro na obrigação de modificar as leis para introduzir o domingo
como feriado universal e que tenha procurado garantir certos direitos aos escravos.
Lembro-me
também, por exemplo, de Atanásio, o grande bispo alexandrino do século IV, que
narra, a partir da sua própria experiência, como as tribos se enfrentavam com violência
em toda a parte, até que, através dos cristãos, surgiu uma certa disposição
para a paz. Isso não são coisas que estejam garantidas por si mesmas através da
estrutura de um império político: podem, como observamos hoje, tornar a
desmoronar uma e outra vez.
Quando o homem
abandona a fé, os horrores do paganismo regressam com toda a força.
Julgo que
pudemos de facto constatar que Deus entrou na História, por assim dizer, de modo
muito mais frágil do que gostaríamos. Mas também pudemos constatar que essa é a
sua resposta à liberdade. E se queremos [...] que Deus respeite a nossa
liberdade, também temos de aprender a respeitar e a amar a fragilidade da sua
ação.
(Cardeal
Ratzinger em ‘O sal da terra’, págs.
173-175)
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