Como Deus repousou da Criação no sétimo dia, também descansou da Redenção no Sábado.
Que significa o repouso do Criador, se Deus não se fatiga? Há o repouso do cansaço, e há o repouso da confiança. Deus descansou no homem, confiando-lhe a Criação, como um pai descansa nos filhos quando os vê preparados para a vida, mas continua sendo pai, amparando-os sempre nas suas necessidades e dificuldades. Na Redenção, Deus também descansou no Homem, no seu Filho, o Verbo encarnado, confiando-lhe a salvação do mundo.
Descansou na sua Morte por nós, que lhe mereceu a sua Ressurreição e a nossa, para toda a eternidade.
Para nós, o Sábado Santo foi um dia de grande tristeza, mas Nosso Senhor já tinha prometido aos Apóstolos que depois se alegrariam, e que a sua alegria permaneceria para sempre, porque O haviam de ver novamente, e nunca nos deixaria órfãos, desamparados.
E assim sucedeu: após um dia de profunda pena, angústia e perplexidade, veio o Domingo, e a sua alegria foi imensa, tão grande, que nem queriam acreditar em tanta felicidade.
Ser cristão é ser feliz. Quem não é feliz não é cristão.
Mas então deixamos de ser cristãos quando estamos tristes? Depende. Depende de quê? Da esperança. A tristeza sem esperança é uma infelicidade; a felicidade está na esperança, como o Santo Padre nos recordou na última encíclica. Sem esperança, até as alegrias são penas; com esperança, até o martírio é uma alegria.
Tu és cristão porque foste baptizado, porque crês em Cristo, porque amas Cristo, porque queres seguir Cristo. É verdade. Daqui a pouco vais dizê-lo solenemente: - Sim, creio! Sim, renuncio ao pecado!
Mas crês em Cristo vivo ou em Cristo morto?
Porque há muitos cristãos que continuam a viver no Sábado, no dia da tristeza. Crêem em Cristo, amam-no, querem segui-lo, mas não crêem no Ressuscitado, que vive, e vive junto deles, que os acompanha com imenso carinho fraterno, paterno e materno; que os espera no Sacrário; que lhes dá toda a força do seu Espírito; que habita neles; que se lhes entrega todos os dias; que transforma em bem tudo o que lhes acontece, até quando fraquejam nas tentações; que gosta de cada um como filho único; que lhes fala na Sagrada Escritura, na Igreja, na oração, na consciência, em cada instante da vida; e os compreende, e perdoa quantas vezes for preciso; e os anima; e os ilumina; e os torna luz, a luz do mundo...
Há muitos cristãos que não chegaram ao Domingo, e por isso andam tristes, desanimados, sem esperança, sem alegria.
Que veio dizer Nosso Senhor a S. Josemaria? Que ser cristão é ser feliz. Que ser feliz é ser santo, e ser santo é ser feliz. «Queres ser feliz? Sê santo. Queres ser mais feliz? Sê mais santo. Queres ser muito feliz? Sê muito santo», dizia. E vice-versa, podemos acrescentar: Se queres ser santo, sê feliz. «Alegrai-vos sempre no Senhor!», exorta-nos S. Paulo. «Que a tua alegria seja a nossa fortaleza», pedimos nós, os sacerdotes, no Ofício divino.
Peçamos isso para todos os nossos irmãos: que nunca se conformem com a tristeza; que saibam ver em tudo a mão de Deus; que descubram o que há de divino e providencial em qualquer circunstância da vida, como insistia com tanta força o Fundador do Opus Dei. E nas horas de perplexidade, que Deus sabe mais, e tem direito a que confiemos n’Ele.
Peçamos que todos os cristãos passem do Sábado, descubram o Domingo, e sejam tão felizes como os Apóstolos e as santas mulheres ao descobrirem o Ressuscitado.
(Mons. Hugo de Azevedo – Homilia da Vigília Pascal de 2008 no Oratório São Josemaría em Lisboa)
Imagem: foto quadro de Rafael Sanzio (1483-1520) - reprodução oferecida aos participantes na Vigília Pascal de 11-IV-2009 no Oratório São Josemaría
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