É sabido que nenhum político em nenhuma parte do Mundo ganha um voto usando na campanha eleitoral o ataque pessoal, a insinuação, a calúnia contra os outros candidatos.
A campanha eleitoral para a Presidência da República, como aliás todas as outras para qualquer órgão de soberania, é um momento importante da vida democrática. É mesmo o momento mais importante do exercício de cidadania, pois consagra o direito de eleger e de ser eleito. Votar é um acto responsável e que vai condicionar o futuro de cada um de nós, mas de todos enquanto país.
As campanhas eleitorais existem exactamente para permitir a fundamentação da escolha que vai influenciar determinantemente o futuro. Por isso mesmo, espera-se que a campanha seja exemplar, clara e transparente na forma e no conteúdo das candidaturas e no discurso dos candidatos. É na campanha que se assumem compromissos futuros e se mostram os valores e os princípios que o candidato quer demonstrar ter e ser a sua vida.
Se a campanha eleitoral é transformada num pântano e se limita às tentativas de criar suspeições, de lançar boatos, de ferir a honra e a credibilidade do outro, a política transforma-se num lodaçal insuportável e desinteressante de seguir. Quando há candidatos que o seu único programa, que o que têm para oferecer aos eleitores para ganhar o seu voto, é o ataque pessoal e difamante a outro candidato - perdem todos, a começar por nós eleitores. Perde a democracia, perde a política no seu todo. Em campanha eleitoral, quando se acusa não se tem evidentemente como objectivo o apuramento da verdade. Trata-se, sim, sempre da tentativa de denegrir, caluniar, insinuar, diminuir o outro candidato.
Escrutinar os poderosos, fiscalizar o que fazem e os seus gestos, verificar o seu percurso profissional, conhecer os seus actos e as razões deles, são fundamentais em democracia. Por isso, não há democracia sem liberdade de Imprensa e a liberdade de Imprensa avalia-se pela capacidade de escrutinar os políticos mais poderosos e nos mais importantes cargos de responsabilidade.
O presidente da República, o primeiro-ministro devem ser sempre escrutinados, nos seus gestos pessoais, na sua vida pública e privada, em tudo o que se refere com a verificação do cumprimento do seu dever de responsabilidade para o cargo que desempenham e para o apuramento da verdade. A democracia vive do apuramento da verdade e a verdade que é um direito dos cidadãos conhecer.
Coisa diferente é chegar a um acto eleitoral e um candidato basear a respectiva campanha no lançamento de insinuações pessoais, suspeições, baldes de lama, palavras de ataque pessoal, meias-palavras, tudo somado: limitar-se a transformar a sua campanha num calunioso terreno de atentado à dignidade do outro candidato.
Pessoalmente, que conheço a vida política de Manuel Alegre desde que as coisas da política me motivam, não esperava que o fizesse. O poeta, o resistente antifascista, o homem da liberdade que o país se habituou a respeitar mesmo quando discorda dele, não condiz com a imagem do candidato de dedo em riste, tentando manchar a honorabilidade do seu adversário eleitoral.
Além do mais, não se pode deixar de questionar: por que motivo Manuel Alegre - que na sua longa carreira política sofreu também situações terríveis de ataque e calúnias pessoais e sabe certamente o que isso é para o próprio e para os seus próximos - se envolve directamente? Eu, pessoalmente, não esqueço a campanha que contra Manuel Alegre e outros resistentes fez o PCP, quando do caso do "grupo da Argel" procurou transformar uma divergência política numa calúnia pessoal, como sempre envolvendo fundos, dinheiro.
Mais estranho ainda é que haja mentores de campanha que insistam nestes moldes 30 anos depois dos 33 mil contos lançados contra Sá Carneiro nas eleições que ele ganhou, ou os aviões que aterraram numa campanha do professor Aníbal Cavaco Silva, ou nas obras da marquise da sua casa da Travessa do Possolo.
Os portugueses sabem-no bem.
Zita Seabra
(Fonte: JN online)
Sem comentários:
Enviar um comentário