Em Portugal, as polémicas da silly season são iguaizinhas às do resto do ano. Veja-se, por exemplo, a fúria de nove (nove!) associações gay face à supressão de um beijo entre dois rapazes numa telenovela da TVI, cena filmada e não transmitida.
Embora as associações falem em "retrocesso civilizacional", a mim parece-me um avanço. Desde logo, porque a intromissão do activismo nas empresas privadas legitima a intromissão das empresas privadas no activismo. Assim, é perfeitamente aceitável que a TVI (ou quem calhar) comece a aliviar-se de uns palpites acerca da coreografia das paradas gay ou de juízos de valor so- bre o espectáculo que as mesmas constituem.
Porém, a principal consequência a retirar da polémica é óbvia: à medida que alcançam as suas reivindicações, as lutas pelos direitos civis acabam em caricaturas de si próprias. Em questão de décadas, o feminismo saltou da exigência do voto para a queima de sutiãs e o combate pela igualdade racial deslizou das conquistas justas para o folclore delinquente dos Panteras Negras e afins.
No caso dos homossexuais, as paradas do "orgulho" já eram sintoma da escassez de objectivos. Mas a consumação desses pináculos da modernidade que foram a legalização do casamento e, em breve, a legalização da adopção, indiciam que os activistas do ramo estão aqui, estão sem objectivo nenhum, excepto o de reclamar a expulsão da criança que chamou "maricas" ao colega da escola. Ou o de tentar censurar a crítica negativa ao último disco de Elton John.
Ou pior: quando uma associação cívica chega ao ponto de acompanhar os ‘Morangos com Açúcar’ à cata de ofensas, é altura de bater com a porta e pedir a dissolução. Vezes nove. Além do mais, ver telenovelas é demasiado efeminado até para os padrões em causa. Pobre causa.
Alberto Gonçalves
(Fonte: DN online, título da responsabilidade de JPR)
1 comentário:
Eu não concordo com a ideia expressa no texto segundo a qual a agenda gayzista está sem objectivos. Exactamente por se pensar assim é que essa agenda política tem avançado. O tradicional paternalismo em relação a uma agenda política que é, em si mesma, imbuída de um proto-totalitarismo, vai continuar a dar maus resultados.
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