Alguém poderia objetar que esta [a igreja de Santa Maria Maior, em Roma] não é uma igreja dedicada à Natividade, e, portanto, uma igreja dedicada a Cristo, mas sim um templo mariano, a primeira igreja dedicada a Maria em Roma e em todo o Ocidente. Essa objeção indicaria, porém, que quem a formula não entendeu precisamente aquilo que é essencial, tanto na piedade mariana da Igreja como no mistério do Natal.
O Natal tem na estrutura interna da fé cristã, um significado muito particular. Não o celebramos da mesma maneira como se recordam os dias em que nasceram os grandes homens, porque a nossa relação com Cristo é também muito diferente da admiração que experimentamos diante dos grandes homens. O que interessa neles é a sua obra: os pensamentos que pensaram e deixaram escritos, a arte que criaram e as instituições que nos legaram. Essa obra pertence-lhes, não procede das suas mães, pelas quais só nos interessamos na medida em que podem fornecer-nos algum elemento que contribua para explicar a obra mencionada.
Mas Cristo não conta para nós apenas pela sua obra, pelo que fez, mas sobretudo pelo que era e pelo que é, na totalidade da sua pessoa. Conta para nós de uma maneira distinta da de qualquer outro homem, porque Ele não é simplesmente um homem. Conta porque nEle a terra e o céu se tocam, e assim Deus se faz nEle tangível para nós como homem. Os Padres da Igreja denominaram Maria a terra santa da qual Ele foi formado enquanto homem; e o que é mais maravilhoso é que, em Cristo, Deus permanece para sempre unido a esta terra. Agostinho expressou certa vez este mesmo pensamento da seguinte forma: Cristo não quis um pai humano para manter visível a sua filiação com respeito a Deus, mas quis uma Mãe humana. "Quis receber em si o género masculino, e dignou-se honrar o feminino na sua Mãe... Se Cristo homem tivesse aparecido sem enaltecer o género das mulheres, estas teriam que desesperar de si... Mas Ele honrou os dois, enalteceu os dois, assumiu os dois. Nasceu de mulher. Não desespereis, homens:
Cristo dignou-se ser homem. Não desespereis, mulheres: Cristo dignou-se nascer da mulher. Ambos os géneros colaboram para a salvação, quer se trate do masculino, quer do feminino: na fé, não há homem nem mulher".
Digamo-lo de novo de outra maneira: no drama da salvação, não é que Maria tenha tido que desempenhar um papel para depois calar-se, como alguém cuja fala terminou. A Encarnação a partir da mulher não é um papel que se tenha encerrado depois de um breve tempo, mas a estada permanente de Deus na terra, com o ser humano, connosco, que somos terra. Daí que a festa do Natal seja ao mesmo tempo uma festa de Maria e uma festa de Cristo, e é por isso que uma autêntica igreja dedicada ao Natal deve ser um templo mariano.
(Cardeal Joseph Ratzinger in ‘Meditación para el tiempo de Navidad’, em Humanitas, n. 12)
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