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Edição de 07-III-2009 |
Depois de quase três séculos, no dia 2 de Março de 1939 foi eleito Papa um romano e Secretário de Estado. Há setenta anos (2009), os cardeais escolheram Eugenio Pacelli, o colaborador mais estreito do saudoso Pontífice. O escolhido, que precisamente naquele dia completava sessenta e três anos de idade, assumiu o nome de Pio XII, em homenagem aos dois predecessores, Sarto e Ratti, que tinha principalmente servido. O conclave, com apenas três escrutínios em menos de vinte e quatro horas, foi um dos mais rápidos jamais realizados e, pela primeira vez, nele participou todo o colégio cardinalício, ou seja, inclusive todos os purpurados americanos, que ao contrário tinham chegado tarde demais para as precedentes eleições papais.
Numa situação internacional que se ia precipitando rapidamente no abismo, começava assim um pontificado que se teria revelado um dos mais importantes do século XX. O novo Papa, marcado por uma profunda religiosidade, que lhe era reconhecida também por críticos severos como Ernesto Buonaiuti, era com toda a probabilidade o mais preparado e brilhante representante de uma diplomacia pontifícia que também contava com homens fora do comum, como os dois mais estreitos colaboradores do Secretário de Estado que acabava de se tornar sucessor de Pedro, Giovanni Battista Montini e Domenico Tardini, que o Papa confirmou imediatamente nas suas funções-chave. A partir do serviço na Secretaria de Estado sob Pio X, e depois como representante de Bento XV na Alemanha e enfim como primeiro colaborador de Pio XI, Pacelli tinha adquirido uma experiência singular e de primeiro plano, tanto da situação da Igreja como das questões internacionais. E o Pontífice fecundou esta experiência ao serviço papal que, desde o primeiro dia, levou a cabo com um escrúpulo só comparável com a sua preparação, rigorosa e continuamente actualizada. A atenção à modernidade, já vivíssima no jovem Pacelli, foi com efeito um dos sinais característicos do novo Papa, como depois teria reconhecido Montini que, numa anotação redigido imediatamente depois da morte de Pio XII, o definiu "amigo do nosso tempo" e que com a sua sensibilidade, ampliada pelo extraordinário quinquénio joanino e pelo início do Concílio seguiu os seus passos como seu segundo sucessor.
Precisamente esta amálgama entre a rigorosa preparação teológica, jurídica e espiritual, segundo as melhores tradições do clero de Roma, a abertura internacional, também ela de certa forma romana, e a acentuada atenção à modernidade teria permitido que Pacelli em continuidade com Pio XI e com os Papas que o tinham precedido ajudasse o catolicismo a enfrentar, superada a assustadora tragédia da guerra, a transição para uma era nova, marcada para a Igreja de Roma primeiro pela eleição de João XXIII e depois, sobretudo, pelo Vaticano II, governado e concluído por Paulo VI, que deu início à sua aplicação.
Todavia, o início do pontificado foi envolvido pela tremenda obscuridade que, na primeira encíclica, Pio XII definiu, com a expressão evangélica, "hora das trevas". Assim, abriu-se de par em par o abismo da guerra e dos horrores indizíveis que daí derivaram primeiro de todos o Shoah que Pacelli, inerme como a sua Igreja, enfrentou repetindo palavras de paz sem se cansar e trabalhando silenciosamente para salvar o maior número possível de vidas humanas.
Esta obra de paz prosseguida no pós-guerra pelo apoio à reconstrução e às opções democráticas foi primeiro reconhecida mas depois esquecida, aliás, ofuscada por polémicas instrumentais e historicamente infundadas. No entanto, a setenta anos da eleição de Pacelli, parece que está a voltar um consenso amplo e mais equilibrado a respeito da sua obra durante a guerra e da importância do seu pontificado, fazendo justiça à história, antes ainda que a um grande Papa.
Giovanni Maria Vian
(Director)