O panorama mundial empresta
realismo a esta pergunta dramática. É verdade que nunca houve tantas conversões
e tantas vocações em muitas partes do mundo, mas todos os dias recebemos
notícias de crises graves e, sobretudo na Europa, de cristãos que se afastam.
De um ponto de vista sociológico,
o maior detonador desta desagregação é o divórcio. Um sujeito abandona a
mulher; continua a ser católico mas começa a faltar à Eucaristia dominical;
pergunta-se se este ou aquele ponto da doutrina fazem sentido mas não pede
ajuda a quem sabe, vai acumulando dúvidas por esclarecer. Até que, como não
está disposto a corrigir a situação, deixa suavemente de se sentir ligado à
Igreja. Conserva uma noção vaga de Deus, mas já não é um Deus pessoal, é uma
hipótese longínqua com quem é impossível falar. A seguir, talvez sem o próprio
se dar conta, afunda-se numa derrocada completa e cada vez se convence mais de
que não há solução. Nalguns casos, a certo ponto o desvario colectivo alavanca
o vazio individual e brota um desejo agressivo e intolerante de refundar a
Igreja em bases novas.
Este itinerário sociológico de
quem se afasta tem uma certa sequência lógica, porque qualquer queda, sobretudo
se é um resvalar gradual, tem uma dinâmica compreensível. Descer é fácil de
explicar, especialmente porque a acção perseverante do Demónio empurra a
debilidade humana. A mãozinha maléfica do Demónio sabe perfeitamente onde tem
de actuar. O Papa Francisco tem-se referido muitas vezes às estratégias do
Demónio, mas nesta quarta-feira foi particularmente explícito em relação a um
ponto central:
— «Quando o Inimigo, o Maligno,
quer combater a Igreja, fá-lo primeiro procurando secar as suas fontes,
impedindo-a de rezar».
O Demónio até aceita a Igreja,
desde que seja uma Igreja sem Deus, sem oração. Sobretudo nos países
economicamente mais desenvolvidos, a sensação de superioridade intelectual
alimenta o orgulho de refundar a Igreja sem importar como Cristo a instituiu. Quanto
mais a pessoa está longe de Deus, tanto mais o atrevimento com que brotam estas
propostas. Quanto mais descristianizado o país, tanto mais ousadas as propostas
que de lá vêm.
— «Por exemplo, vemos isto em
certos grupos que se põem de acordo para levar a cabo reformas eclesiais,
mudanças na vida da Igreja... Têm muitas organizações, meios de comunicação que
informam todos... Mas a oração não se vê. Não se reza. “Devemos mudar isto,
temos de tomar esta decisão que é um pouco forte...”. (...) Apenas com debate,
apenas com os meios de comunicação. Mas onde está a oração? A oração é que abre
a porta ao Espírito Santo, que inspira a avançar. Sem oração, as mudanças na
Igreja não são mudanças da Igreja, são mudanças de grupo. E quando o Inimigo —como
já disse— quer lutar contra a Igreja, primeiro procura secar as suas fontes,
impedindo-as de rezar e incitando-as a fazer este tipo de propostas».
O processo é quase sempre
gradual. O Demónio prefere amolecer progressivamente a vontade e alimentar o
orgulho. Perde pouco tempo a defender os vícios, infiltra-se. Prefere louvar a
ignorância de quem se afasta de Deus: quanta ciência! Que inteligência
fulgurante! Aqui está a luz do mundo!
Aos poucos, quase sem forçar, deixa-se
a oração, essa relação forte e vital com Deus.
Diz o Papa:
— «Por algum tempo parece que
tudo pode continuar como habitualmente —por inércia— mas depois de pouco tempo
a Igreja compreende que se torna como que um invólucro vazio, que perdeu o seu
eixo central, que já não possui a nascente do calor e do amor».
«Sem fé, tudo se desmorona; e,
sem a oração, a fé extingue-se. Fé e oração, juntas. Não há outro caminho. Por
isso a Igreja, que é casa e escola de comunhão, é casa e escola de fé e de
oração».
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