Já passaram alguns dias desde o início da Quaresma. Além de rever, com agradecimento e disposição de aprender, os quarenta dias de oração e jejum de Jesus Cristo no deserto, e a Sua luta vitoriosa contra o espírito maligno, a Igreja propõe-nos que nos preparemos muito bem para entrar mais a fundo nas cenas da Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor, na próxima Páscoa. Por isso nos convida a percorrer este tempo litúrgico muito unidos ao Mestre, como S. João Paulo II recordava há uns anos.
«Vamos subir a Jerusalém (Mc 10, 33). Com estas palavras, o Senhor convida os discípulos a percorrer com Ele o caminho que os conduz da Galileia até ao lugar onde a Sua missão redentora se consumará. Este caminho para Jerusalém, que os Evangelistas apresentam como o culminar do itinerário terreno de Jesus, constitui o modelo de vida do cristão comprometido em seguir o Mestre no caminho da Cruz.
Cristo também faz aos homens e às mulheres de hoje o convite a "subir a Jerusalém". E fá-lo com um vigor particular na Quaresma, tempo favorável para se converterem e encontrarem de novo a plena comunhão com Ele, participando intimamente no mistério da Sua Morte e Ressurreição. Portanto, a Quaresma representa para os crentes ocasião propícia para uma profunda revisão de vida» [1].
Conhecemos as principais práticas que a Igreja recomenda durante a Quaresma, para manifestarmos este desejo de conversão: a oração, a penitência, as obras da caridade. Gostaria que nos fixássemos agora particularmente nestas últimas. O Papa Francisco, na sua Mensagem para a Quaresma, refere-se à globalização da indiferença: um mal que se acentuou na nossa época e que se opõe frontalmente à forma de atuar de Deus. Com efeito, o Senhor, na Sua infinita misericórdia, cuida de todos e de cada um, procura-nos, também quando nos afastamos, não deixa de nos enviar a claridade da Sua luz e a força da Sua graça, para que nos decidamos a viver em cada momento como bons filhos Seus. Mas acontece-nos – sublinha o Santo Padre – que quando estamos bem e comodamente instalados, esquecemo-nos dos outros (isto, Deus Pai nunca o faz), não nos interessam os seus problemas, nem a sua dor, nem as injustiças que sofrem… [2].
Para superar este perigo, devemos considerar que somos solidários uns com os outros. E sobretudo refletir sobre a Comunhão dos santos, que nos impulsionará a servir, a ocupar-nos, dia após dia, das nossas irmãs e dos nossos irmãos necessitados de atenção espiritual ou material. A Quaresma converte-se assim num tempo especialmente propício a imitar Cristo, com uma entrega generosa aos membros do Seu Corpo místico, pensando em como Ele Se nos entrega.
A força para atuarmos assim provém da escuta atenta da Palavra de Deus e da receção dos sacramentos – a Confissão, a Eucaristia – referidos de modo concreto nos Mandamentos da Igreja relativos a esta época. Consideremos que, ao receber o Corpo do Senhor na Comunhão com as disposições espirituais necessárias, nos vamos parecendo cada vez mais com Ele, a nossa identificação com Jesus vai-se tornando mais perfeita até chegar a ser, como o nosso Padre repetia, ipse Christus, o próprio Cristo. E faremos muito nossas as indigências dos outros, sem deixar que se forme nos nossos corações a crosta do egoísmo, de nos centrarmos no próprio eu: quem é de Cristo pertence a um só Corpo e n'Ele não se é indiferente com os outros [3]. Como não recordar a pregação de S. Paulo: se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele. E se um membro é honrado, todos os outros se alegram com ele [4].
[1]. S. João Paulo II, Mensagem para a Quaresma, 7-I-2001.
[2]. Papa Francisco, Mensagem para a Quaresma de 2015, 4-X-2014.
[3]. Papa Francisco, Mensagem para a Quaresma de 2015, 4-X-2014.
[4]. 1 Cor 2, 16.
(D. Javier Echevarría na carta do mês de março de 2015)
© Prælatura Sanctæ Crucis et Operis Dei
© Prælatura Sanctæ Crucis et Operis Dei
Sem comentários:
Enviar um comentário