Num mundo tão
confuso como o nosso, a dúvida voltará sempre, inevitavelmente, a invadir cada
pessoa. A dúvida não tem de estar automaticamente ligada a uma negação da fé.
Posso confrontar-me seriamente com as questões que me inquietam, e ao mesmo tempo
confiar em Deus, no núcleo essencial da fé. Por um lado, posso tentar resolver
as contradições aparentes, mas, por outro, apesar de não poder encontrar
soluções para tudo, posso confiar em que se venha a resolver o que não é
possível solucionar agora.
Também na
história da teologia volta sempre a haver questões que, de momento, não podem
ser resolvidas, mas que não se devem pôr de parte com interpretações forçadas.
Também faz
parte da fé a paciência do tempo. O tema a que acabou de referir-se - Darwin, a
Criação, a teoria da evolução - é tema de um diálogo que ainda não está concluído
e que, no momento, provavelmente não poderá ser concluído com os meios de que
dispomos. O problema dos seis dias não se põe com particular agudeza entre a posição
da ciência moderna sobre a origem do mundo e a fé. Porque também na Bíblia é claramente
um esquema teológico, que não pretende narrar de forma literal a história da
Criação.
No próprio
Antigo Testamento existem outras representações da Criação". No livro de Jó
e nos livros sapienciais, encontramos relatos da Criação que deixam claro que
os crentes não pensavam que o processo da Criação estivesse, por assim dizer, representado
fotograficamente nesses textos, mesmo na ocasião em que foram escritos.
Só está
representado na medida em que nos permite apreender o essencial: que o mundo provém
do poder de Deus e é criado por Ele. Como se desenvolveram depois os processos
concretos é uma questão completamente diferente, em que até a própria Bíblia
deixa uma grande abertura. Por outro lado, penso que a teoria da evolução ainda
não ultrapassou, em grande parte, o campo das hipóteses, e que, muitas vezes,
está misturada com filosofias quase míticas, sobre as quais ainda tem de haver
diálogos críticos.
(Cardeal Joseph Ratzinger in ‘O sal da terra’ págs 26 e 27)
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