Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (Norte de África) e Doutor da Igreja
Sermões sobre o evangelho de João, n.° 27, § 10
«Não vos escolhi Eu a vós, os Doze? Contudo, um de vós é um diabo» (Jo 6,70). O Senhor devia dizer: «Escolhi onze de vós»; terá ele escolhido um demónio, haveria um demónio entre os eleitos? [...] Diremos nós que, ao escolher Judas, quis o Salvador cumprir através dele, contra sua vontade, sem que ele soubesse, uma obra tão grande e tão boa? Isto é próprio de Deus [...]: fazer que as más obras dos maus sirvam o bem [...]. O mau faz que todas as boas obras de Deus sirvam o mal; o homem de bem, ao contrário, faz que as más acções dos maus sirvam o bem. Haverá alguém tão bom quanto o Deus único? O próprio Senhor diz: «Ninguém é bom senão um só: Deus» (Mc 10,18) [...]
Haverá quem seja pior do que Judas? De entre os discípulos do Mestre, de entre os Doze, foi ele o escolhido para guardar a bolsa e prover aos pobres (Jo 13,29). Mas depois de tal dom, é ele quem recebe dinheiro para entregar Aquele que é a Vida (Mt 26,15); perseguiu como inimigo Aquele a Quem tinha seguido como discípulo [...]. Mas o Senhor fez que tão grande crime servisse o bem. Aceitou ser traído para nos resgatar: eis como o crime de Judas se transmuta em bem.
Quantos mártires terá Satanás perseguido? Mas, se não o tivesse feito, não celebraríamos hoje o triunfo daqueles [...]. O mau não pode contrariar a bondade de Deus. Ainda que Satanás seja um artesão do mal, o supremo Artesão não permitiria a existência do mal se não soubesse servir-Se dele para que tudo concorra para o bem.
(Fonte: Evangelho Quotidiano)
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