1. O casamento (obviamente de um homem com uma mulher) é uma instituição fundamental, constituinte da família biológica humana, a qual é universalmente considerada como a célula ou elemento base da sociedade. A Declaração Universal dos Direitos do Homem diz, no nº 3 do art. 16º, que a família é o grupo natural e fundamental (natural e fundamental, note-se bem) da sociedade, e tem direito a ser protegida pela sociedade e pelo Estado: (3) The family is the natural and fundamental group unit of society and is entitled to protection by society and the State. A nossa Constituição diz também, no art. 67º: «a família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado». Não há nenhuma dúvida de que o conceito de família, quer na Declaração Universal, quer na nossa Constituição, é o da família fundada no casamento de um homem com uma mulher. Porque só esta família é naturalmente procriadora. É neste sentido que é célula ou elemento fundamental da sociedade. E é por esta razão que é merecedora de protecção, quer da sociedade quer do Estado.
2. Como escreveu o Prof. Daniel Serrão, e peço licença para transcrever: «A espécie humana é gonocórica, ou seja, tem uma forma corporal masculina e outra forma corporal feminina. Como em muitas outras espécies animais. As diferenças entre estas formas corporais dependem da diferente função dos órgãos, para que possa haver fecundação da forma feminina pela masculina. Os corpos dos seres humanos estão constituídos como corpos sexualizados. Portanto, em termos estritamente biológicos, o dimorfismo sexual está ordenado para a procriação. E este dado biológico não pode ser esquecido ou escamoteado, na ponderação da relação sexual entre corpos da mesma natureza sexual, ou seja, entre corpos masculinos entre si e corpos femininos igualmente entre si».
3. Nesta base (que aliás é bem evidente), não têm adequação os argumentos que tentam fazer equivaler juridicamente a «união homossexual» ao casamento, invocando erradamente o princípio constitucional da dignidade humana e o princípio constitucional da não discriminação. Vejamos.
4. A dignidade humana é comum a todas as pessoas: homens, mulheres, crianças, idosos, sãos e doentes, débeis mentais e deficientes profundos, todos têm a mesma dignidade. Inclusive o embrião humano, beneficia já da protecção devida à dignidade humana. Mas porque se trata de uma qualidade comum de todas as pessoas, não é quantificável. Ora, daqui não se tira que todas tenham as mesmas capacidades jurídicas e as mesmas legitimidades institucionais. Estas são, sem dúvida, diferenciáveis ou quantificáveis. Como é óbvio e nem vale a pena desenvolver. Qualquer jurista medíocre distingue entre personalidade jurídica (invariável) e capacidades jurídicas (variáveis). Portanto, o argumento da igual dignidade das pessoas é irrelevante para daí se concluir acerca da igualdade ou da desigualdade entre um «par homossexual» e um «casal heterossexual». A capacidade jurídica ou a legitimidade institucional para o casamento juridicamente reconhecido não decorre da dignidade: decorre de capacidades e de legitimidades específicas, reconhecidas exclusivamente ao casal homem-mulher, dados os fins indisponíveis da instituição casamento-família. E isto não ofende a igual dignidade, como é óbvio.
5. E quanto ao argumento da não discriminação? Se, como vimos, a discriminação não ofende a dignidade, também não implica ofensa à igualdade de capacidades ou condições, porque, pelo menos no aspecto essencial da reprodução, uma união de um «par homossexual» não é igual a uma união de um «casal humano». Só para quem não quer ver (e, como diz o Povo, quem não quer ver é cego), é que se pode esconder e desvalorizar, para efeito de obter uma completa igualdade e equiparação do «par homossexual» com o «casal humano», a função essencial da reprodução humana.
6. É portanto totalmente falso que os homossexuais sejam discriminados porque excluídos do casamento. Eles podem casar, desde que o façam numa relação heterossexual, para a qual (note-se bem) não são nem podem ser considerados incapazes — se o fossem, então sim estariam a ser discriminados. E também não é verdade que os homossexuais sejam discriminados por não poderem casar com pressupostos e conteúdos diferentes dos do casamento instituído; porque também os heterossexuais não podem alterar o casamento instituído. Nem os heterossexuais nem os homossexuais estão em posição diferente perante o mesmo casamento instituição. Logo, não há discriminação. O que os defensores do chamado «casamento homossexual» pretendem é um outro casamento, à medida das suas preferências subjectivas («orientação sexual»), que não pode ser igual porque não tem função reprodutiva. Em conclusão: tal como já vimos para o argumento da dignidade humana, é uma falácia invocar o princípio da não discriminação para tentar fundamentar juridicamente a igualdade entre «dois casamentos» que são evidentemente diferentes.
7. Uma nota mais quanto à adopção. É uma ironia suprema que os pares homossexuais reivindiquem a maternidade-paternidade adoptiva dos filhos que são biologicamente exclusivos dos casais heterossexuais. Na adopção está ínsita a ideia de supletividade, isto é, uma analogia funcional com a relação geração-criação de filhos. Ora, o par homossexual representa aqui uma negação. A aceitar-se a adopção por pares homossexuais, então teria de se aceitar a adopção colectiva por duas quaisquer pessoas, que para esse efeito estabelecessem um qualquer contrato entre si, porque a existência de comércio homossexual não tem relevância positiva para o efeito da adopção. Pelo contrário, tem uma relevância negativa, porque contradiz a base heterossexual da reprodução que é a legitimação natural da criação/educação — contradição que não existe na adopção por um casal ou por uma só pessoa, deve sublinhar-se.
Mário Pinto
In Público - 16. 12. 2009
Agradecimento: ‘Infovitae’
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