O desejo de transparência é muito
louvável, mas este processo não foi um exemplo de transparência.
Em primeiro lugar, as actividades
do Opus Dei são abertas e é facílimo verificar isso. Mesmo quem não tem tempo
para fazer essa experiência pessoalmente, encontra no «site» opusdei.org milhares de páginas
sobre os temas que interessam ao Opus Dei: oração, sacramentos, virtudes
cristãs, fidelidade à Igreja e ao Papa... sem qualquer espaço para agendas
políticas ou conluios reservados.
Há várias décadas que pertenço ao
Opus Dei e nunca participei em qualquer actividade que não fosse de âmbito
estritamente religioso e absolutamente transparente. Como é que passa pela
cabeça de algum jornalista que o Opus Dei seja uma instituição fechada?! A
experiência pessoal de um cidadão comum não é notícia, mas é chocante conhecer
directamente uma realidade —bem à vista e acessível— e ler o que alguns meios
de comunicação dizem.
Já sei que os jornalistas se
sentem obrigados a escrever muitas páginas todos os dias e têm pouco tempo para
se informar. E que todos nos enganamos. Mas alguns exageram!
Também me dou conta da tentação
de demonstrar equidistância. Como não há um único deputado ou membro do Governo
que pertença ao Opus Dei, justifica-se uma maldade sem consequências em nome de
uma manobra politicamente útil. Qualquer que seja a intenção, sugerir que o
Opus Dei é fechado é o exacto oposto de uma conduta transparente.
Perante o problema das sociedades
efectivamente secretas, os deputados excluíram da lei todas as instituições: as
de natureza política, religiosa, ideológica, sindical, sexual, etc., de modo
que parece que se preocupam com a transparência, mas fizeram uma lei que não incomoda
ninguém! Nem um grupo de conspiradores terroristas precisa de se denunciar,
desde que faça os atentados com desígnios políticos, religiosos, sexuais, ou
outros.
Pouco antes, a Assembleia da
República votou outra lei (entrada em vigor a 17 de Julho passado) que se
propunha transpor apenas uma Directiva europeia. Pouco depois da aprovação,
fomos percebendo que a maior parte dos deputados não teve tempo de ler o texto,
alguns leram-no mas não o entenderam e todos estavam com pressa. Foi assim que
votaram quase por unanimidade a instauração da censura em Portugal. Não se
percebe se a intenção dos autores corresponde ao resultado; o que felizmente sabemos
é que não houve uma maquinação colectiva: simplesmente ninguém suspeitou que um
artigo daquela lei previa a instauração da censura. Quando se deram conta,
alguns deputados demarcaram-se do que tinham votado e o Presidente da
República, que aparentemente promulgou a lei sem a ler, enviou «a posteriori» o
texto para o Tribunal Constitucional, na esperança de que os juízes arranjem
uma desculpa para reverter o processo e dar à Assembleia da República a
oportunidade de rejeitar liminarmente a introdução da censura em Portugal.
Se os políticos continuam a fazer
leis perigosas, que não se aplicam a ninguém, e aprovam por distracção a
introdução da censura, temos razão para ficar preocupados.
A Assembleia da República tem um grande caminho a fazer para se tornar mais transparente. Para começar, os deputados deveriam apresentar aos eleitores as grandes leis que querem aprovar e não deveriam impedir o povo de se pronunciar sobre elas. A bem da transparência, os que não propuseram a eutanásia durante a campanha eleitoral não teriam votado a favor, nem teriam impedido que o povo a rejeitasse em referendo.
José Maria C.S. André