domingo, 30 de abril de 2017

São Josemaría Escrivá nesta data em 1968

“Neste mês de Maio, que amanhã começa, quereria que cada um de nós começasse a fazer mais um pequeno sacrifício, um tempo mais de estudo, um trabalho mais bem acabado, um sorriso...; um sacrifício que seja um esforço da nossa piedade e uma prova da nossa entrega. Com generosidade, meu filho, deixa-te levar por Ela. Não podemos deixar de querer cada dia mais e mais ao Amor dos amores! E, com Maria, poderemos consegui lo, porque a nossa Mãe viveu docemente uma entrega total”.

Bom Domingo do Senhor!

Que o nosso coração se abrase diariamente na oração como sucedeu aos dois discípulos quando caminhavam com o Senhor e de que nos fala o Evangelho de hoje (Lc 24, 13-35). Tenhamos no entanto a disponibilidade para O reconhecer de imediato.

Que a nossa gratidão ao Senhor seja uma constante no nosso coração!

«VIMOS O SENHOR!»

Tinham combinado encontrar-se os três amigos, pois já não se viam há algum tempo.

Quando Tomé chegou perto do local do encontro, reparou ainda à distância, que os seus dois amigos estavam envolvidos numa conversa acesa, sentados a uma mesa da esplanada do café, mas sobretudo reparou na alegria e no entusiasmo com que falavam e se olhavam.
Não se lembrava nada deles serem assim, (aliás o Pedro era até um pouco taciturno, embora o João fosse mais aberto e simpático), por isso perguntava-se o que teria acontecido na vida daqueles dois para todo aquele entusiasmo, para toda aquela demonstração de vida?
Aproximou-se deles, abraçaram-se como velhos amigos que eram e perguntou num repente:
O que é vos aconteceu, que me parecem diferentes, mais animados, mais vivos, se assim posso dizer?

Eles olharam para ele e disseram a sorrir: «Vimos o Senhor!»

Olhou para eles, espantado, e perguntou: Referem-se ao Senhor, Senhor? Àquele que nos foi ensinado na catequese e há muito tempo que não pensamos nEle?

Eles responderam com um sorriso provocador: Sim, Esse mesmo!

Estão a gozar comigo ou quê? Há que tempos que não ligamos a essas coisas! – respondeu ele.

Responderam-lhe com uma convicção que não lhes conhecia antes: Isso é verdade, mas há uns tempos atrás, por causa de uma doença de um amigo nosso que estava a ficar cego, lembramo-nos dEle, com outras pessoas começámos a rezar, e com tudo isso aproximamo-nos dEle e Ele de nós e tudo mudou nas nossas vidas.

Tomé insistiu: E o que é que isso tem a ver com essa frase «Vimos o Senhor!»?

Muito simples - responderam eles - é que esse amigo nosso dois dias depois de receber os últimos exames que tinha feito à vista, soube que ia ficar cego no espaço de pouco tempo. Rezámos então mais insistentemente, e um dia, depois de rezarmos por ele com mais outras pessoas pedindo a sua cura se fosse da vontade dEle, ele sentiu uma paz imensa e um calor estranho nos olhos. Quando fez novos exames já nada tinha de mal! Já lá vão vários meses e ele continua a ver cada vez melhor! Ora não nos digas que isto não é «ver o Senhor!»

Olhou para eles, incrédulo, e disse-lhes: Pois eu não acredito nisso e só se vir com os meus olhos acontecer uma cura dessas e puder atestar com exames que alguém ficou curado à minha frente, é que acredito que Ele está connosco.

Conversaram mais um pouco, mas entretanto Tomé teve que se ir embora, pois nesse dia recebia os exames médicos que a sua filha tinha feito, e que muito o preocupavam.
Quando se afastava, ainda ouviu Pedro e João dizerem-lhe para rezar pela sua filha e que acreditasse que Ele estava mesmo presente nas vidas de cada um.

Em casa as notícias não podiam ser pior, pois os exames davam como certo que o mal tinha alastrado e o corpo da sua querida filha estava já todo minado por aquela terrível doença.
A hipótese de sobrevivência era nula e o desfecho final deveria acontecer muito rapidamente.

Tomé sentiu-se desfalecer e sem saber o que fazer! Sentiu-se imensamente só!

Passado um momento lembrou-se da última frase dos seus amigos Pedro e João e decidiu voltar-se para Ele, rezando e pedindo a cura da sua filha.
Nesses dias mais próximos uma estranha calma tomou conta dele, mas, embora cada vez rezasse mais e mais intensamente a sua filha piorava cada vez mais.

Um dia ao fim da tarde, junto à cama da sua filha no hospital, veio de repente ao seu pensamento, ao seu coração, uma vontade incrível de ir a uma Missa.
Sabia que havia Missa na capela do hospital nesse fim de tarde e levantando-se foi para a capela.
Por um lado achava tudo aquilo ridículo, sem grande sentido, mas por outro lado sentia que ali devia estar e por isso mesmo concentrou-se na Missa e nas orações que ia fazendo no seu coração.
Quando chegou a altura da Comunhão, e não podendo comungar, ajoelhou-se e rezou intensamente, pedindo a Ele que se fizesse sentir na sua vida e, sobretudo, pedindo-Lhe a cura da sua filha.
Sentiu então uma enorme serenidade e admirado com o que estava a sentir no seu coração, ouviu-se dizer: Seja feita a Tua vontade, Senhor!

Ao chegar ao quarto percebeu que a sua filha estava diferente, e ela própria lhe disse que se sentia muito melhor, que um estranho calor tinha percorrido o seu corpo e ela se sentia agora muito bem.

Chamou o médico e pediu, insistiu, reclamou por novos exames que foram feitos de seguida.
Esperou um tempo interminável, de mão dada com a filha, que alguém lhes viesse dizer os resultados dos exames que tão ansiosamente esperavam.

Passadas largas horas, o médico entrou no quarto e olhou para os dois com um olhar estranho, um olhar de admiração, e disse-lhes: Os exames estão todos bem! A doença desapareceu e eu não sei explicar porquê!

Tomé olhou o médico, olhou a filha, e apenas pode dizer: «Meu Senhor e meu Deus!»

Marinha Grande, 5 de Abril de 2016

Joaquim Mexia Alves

A hipótese que não existe

Um dilema com 2 mil anos: Jesus de Nazaré é Deus ou um impostor?

Conta-se que um nosso contemporâneo tinha péssima voz e ainda pior ouvido. Inconsciente das suas incapacidades canoras e auditivas, arriscava as mais arrojadas escalas, com terríveis resultados. Numa ocasião, um desesperado ouvinte, com escassa predisposição para o martírio, não aguentou mais e gritou-lhe:

- Cale-se! Essa nota não existe!

Uma nota inexistente é, como é óbvio, uma contradição nos termos, mas serve como exemplo de uma hipótese inexistente, como é a tese de que, negando a divindade de Cristo, também o não quer condenar, afirmando que era um bom homem. Ora acontece que, em termos meramente racionais ou lógicos, essa é a única hipótese que não existe.

A historicidade de Jesus de Nazaré não pode ser honestamente posta em causa, mas só os cristãos estão dispostos a reconhecer-lhe a condição divina que a sua fé afirma. Ateus, agnósticos e crentes de outras religiões não o têm por Deus, mas talvez também não por um impostor. Com efeito, até os mais incrédulos são sensíveis à beleza e à sabedoria dos seus ensinamentos e à exemplaridade da sua vida e por isso seguramente estariam dispostos a afirmar que Cristo foi um bom homem, sem se aperceberem da contradição de uma tal conclusão.

Com efeito, a personagem, que a história sagrada e profana conhece como Jesus de Nazaré disse ser Deus e, como tal, não só realizou prodígios - os milagres de que falam os Evangelhos - como aceitou ser adorada pelos homens. Uma tal afirmação só admite duas possibilidades: ser verdadeira ou falsa. Em nenhum dos casos, contudo, é compatível com a tal hipótese de Jesus ser apenas um homem bom.

De facto, se é verdade que Cristo é Deus, Jesus não foi simplesmente um homem bom, mas o ser divino, o próprio Deus encarnado, como afirma a fé cristã. A alguém que o chamou bom Mestre, Ele próprio disse que só Deus é bom. Mas nunca nenhum homem bom se atribuiu a si mesmo a condição divina. S. Paulo, quando confundido com uma divindade pagã, não permitiu que lhe fosse prestado culto. E S. João, quando se quis prostrar diante do anjo que se lhe revelou, foi por este admoestado, porque só a Deus é devida adoração. A mesma que Jesus de Nazaré recebeu e aceitou dos seus discípulos, precisamente por ser Deus. Se o não fosse, uma tal veneração teria sido idolátrica e, como tal, digna da pena capital.

Mas se Cristo não é Deus, tendo dito que o era, só poderia ser um mentiroso. Não cabe a hipótese de que fosse um alienado e, como tal, inimputável, porque nesse caso ninguém do seu tempo, ou depois, o teria tomado a sério, nem para o seguir nem para o condenar. Mas, se fosse de facto uma pessoa falsa, não seria decididamente um homem virtuoso, mas um blasfemo. Foi aliás por esta razão que foi condenado à morte pelo sinédrio. Tinham razão os que exigiram a sua morte, como réu confesso de tamanha ofensa à verdade e à dignidade divina?!

Ante Cristo, só cabem três atitudes: a indiferença dos néscios, o ódio ou a adoração. Os primeiros, como as avestruzes, enterram a cabeça na areia, abdicando da sua condição racional. Os outros, por força da razão, ou reconhecem que Jesus de Nazaré é Deus ou só podem tê-lo por um impostor. A cómoda hipótese do Jesus bonzinho, que daria tanto jeito aos que não se querem comprometer, porque o não querem seguir, nem condenar, pura e simplesmente não existe, como a desafinada nota do mau cantor.

Ou se entende que Cristo é um falsário e um mentiroso e, consequentemente, é justa e razoável a exigência da sua condenação, ou se aceita a sua divindade e se cai a seus pés, confessando: meu Senhor e meu Deus!

Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada

«Fica connosco»

São Josemaría Escrivá de Balaguer (1902-1975), presbítero, fundador
«Amigos de Deus», §§ 313-314


Os dois discípulos iam para Emaús. O seu caminhar era normal, como o de tantas outras pessoas que transitavam por aquelas paragens. E é aí, com naturalidade, que Jesus lhes aparece e segue com eles, com uma conversa que faz diminuir a fadiga. […] Jesus no caminho! Senhor, que grande és sempre! Mas comoves-me quando Te rebaixas para nos acompanhares, para nos procurares na nossa lida diária. Senhor, concede-nos a simplicidade de espírito, o olhar limpo, a mente clara que permitem entender-Te quando apareces sem nenhum sinal exterior da tua glória.

Termina o trajecto ao chegarem à aldeia, e aqueles dois que – sem o saberem – tinham sido feridos no fundo do coração pela palavra e pelo amor do Deus feito homem, têm pena de que Ele se vá embora. Porque Jesus despede-Se «como quem vai para mais longe». Nosso Senhor nunca Se impõe. Quer que O chamemos livremente, quando entrevemos a pureza do Amor que nos meteu na alma. Temos de O deter à força e de Lhe pedir: «fica connosco, porque é tarde e já o dia está no ocaso», cai a noite.

Somos assim: sempre pouco atrevidos, talvez por falta de sinceridade, talvez por pudor. No fundo pensamos: fica connosco, porque as trevas nos rodeiam a alma e só Tu és luz, só Tu podes acalmar esta ânsia que nos consome! […]

E Jesus fica. Abrem-se os nossos olhos como os de Cléofas e do companheiro, quando Cristo parte o pão; e, mesmo que Ele volte a desaparecer da nossa vista, também seremos capazes de empreender de novo a marcha – anoitece – para falar dele aos outros; porque tanta alegria não cabe num só coração.

Caminho de Emaús. O nosso Deus encheu este nome de doçura. E Emaús é o mundo inteiro, porque Nosso Senhor abriu os caminhos divinos da terra.

sábado, 29 de abril de 2017

Discurso Santo Padre encontro de oração no Seminário Copto-Católico de Maadi

Beatitudes,
Queridos irmãos e irmãs,
Al Salamò Alaikum! A paz esteja convosco!

«Este é o dia que o Senhor fez, alegremo-nos n’Ele! Cristo venceu a morte para sempre, alegremo-nos n’Ele!»

Sinto-me feliz por me encontrar entre vós neste lugar, onde se formam os sacerdotes e que representa o coração da Igreja Católica no Egito. Sinto-me feliz por saudar em vós – sacerdotes, consagrados e consagradas do pequeno rebanho católico no Egito – o «fermento» que Deus prepara para esta terra abençoada, para que, juntamente com os nossos irmãos ortodoxos, cresça nela o seu Reino (cf. Mt 13, 33).

Desejo, antes de mais nada, agradecer o vosso testemunho e todo o bem que fazeis cada dia, trabalhando no meio de muitos desafios e, frequentemente, poucas consolações. Desejo também encorajar-vos. Não tenhais medo do peso do dia-a-dia, do peso das circunstâncias difíceis que alguns de vós têm de atravessar. Nós veneramos a Santa Cruz, instrumento e sinal da nossa salvação. Quem escapa da cruz, escapa da Ressurreição. «Não temais, pequenino rebanho, porque aprouve ao vosso Pai dar-vos o Reino» (Lc 12, 32).

Trata-se, pois, de crer, testemunhar a verdade, semear e cultivar sem esperar pela colheita. Na realidade, nós recolhemos os frutos de muitos outros, consagrados e não consagrados, que generosamente trabalharam na vinha do Senhor: a vossa história está cheia deles!

No meio de muitos motivos de desânimo e por entre tantos profetas de destruição e condenação, no meio de numerosas vozes negativas e desesperadas, sede uma força positiva, sede luz e sal desta sociedade; sede a locomotiva que faz o comboio avançar para a meta; sede semeadores de esperança, construtores de pontes, obreiros de diálogo e de concórdia.
Isto é possível se a pessoa consagrada não ceder às tentações que todos os dias encontra no seu caminho. Gostaria de evidenciar algumas dentre as mais significativas.

1. A tentação de deixar-se arrastar e não guiar. O bom pastor tem o dever de guiar o rebanho (cf. Jo 10, 3-4), de o conduzir a pastagens verdejantes e até à nascente das águas (cf. Sal 23/22, 2). Não pode deixar-se arrastar pelo desânimo e o pessimismo: «Que posso fazer?» Aparece sempre cheio de iniciativas e de criatividade, como uma fonte que jorra mesmo quando vem a seca; sempre oferece a carícia da consolação, mesmo quando o seu coração está alquebrado; é um pai quando os filhos o tratam com gratidão, mas sobretudo quando não lhe são agradecidos (cf. Lc 15, 11-32). A nossa fidelidade ao Senhor nunca deve depender da gratidão humana: «teu Pai, que vê o oculto, há de recompensar-te» (Mt 6, 4.6.18).

2. A tentação de lamentar-se continuamente. Sempre é fácil acusar os outros: as faltas dos superiores, as condições eclesiais ou sociais, as escassas possibilidades… Mas a pessoa consagrada é alguém que, pela unção do Espírito, transforma cada obstáculo em oportunidade, e não cada dificuldade em desculpa! Na realidade, quem se lamenta sempre é uma pessoa que não quer trabalhar. Por isso o Senhor, dirigindo-Se aos pastores, disse: «Levantai as vossas mãos fatigadas e os vossos joelhos enfraquecidos» (Heb 12, 12; cf. Is 35, 3).

3. A tentação da crítica e da inveja. O perigo é sério, quando a pessoa consagrada, em vez de ajudar os pequenos a crescer e a alegrar-se com os sucessos dos irmãos e irmãs, se deixa dominar pela inveja tornando-se numa pessoa que fere os outros com a crítica. Quando, em vez de se esforçar por crescer, começa a destruir aqueles que estão crescendo; em vez de seguir os bons exemplos, julga-os e diminui o seu valor. A inveja é um câncer que arruína qualquer corpo em pouco tempo: «Se um reino se dividir contra si mesmo, tal reino não pode perdurar; e se uma família se dividir contra si mesma, essa família não pode subsistir» (Mc 3, 24-25). Com efeito, «por inveja do diabo é que a morte entrou no mundo» (Sab 2, 24). E a crítica é o seu instrumento e a sua arma.

4. A tentação de se comparar com os outros. A riqueza reside na diferença e na unicidade de cada um de nós. Comparar-nos com aqueles que estão melhor, leva-nos frequentemente a cair no rancor; comparar-nos com aqueles que estão pior, leva-nos muitas vezes a cair na soberba e na preguiça. Quem tende sempre a comparar-se com os outros, acaba por se paralisar. Aprendamos de São Pedro e São Paulo a viver a diferença dos caráteres, dos carismas e das opiniões na escuta e docilidade ao Espírito Santo.

5. A tentação do «faraonismo», isto é, de endurecer o coração e fechá-lo ao Senhor e aos irmãos. É a tentação de se sentir acima dos outros e, consequentemente, de os submeter a si por vanglória; de ter a presunção de ser servido em vez de servir. É uma tentação comum, desde o início, entre os discípulos, os quais – diz o Evangelho –, «no caminho, tinham discutido uns com os outros, sobre qual deles era o maior» (Mc 9, 34). O antídoto para este veneno é o seguinte: «Se alguém quiser ser o primeiro, há de ser o último de todos e o servo de todos» (Mc 9, 35)

6. A tentação do individualismo. Como diz o conhecido provérbio egípcio: «Eu e, depois de mim, o dilúvio». É a tentação dos egoístas que, ao caminhar, perdem a noção do objetivo e, em vez de pensar nos outros, pensam em si mesmos, sem sentir qualquer vergonha; antes, justificando-se. A Igreja é a comunidade dos fiéis, o corpo de Cristo, onde a salvação de um membro está ligada à santidade de todos (cf. 1 Cor 12, 12-27; Lumen gentium, 7). Ao contrário, o individualista é motivo de escândalo e conflitualidade.

7. A tentação de caminhar sem bússola nem objetivo. A pessoa consagrada perde a sua identidade e começa a «não ser carne nem peixe». Vive com o coração dividido entre Deus e a mundanidade. Esquece o seu primeiro amor (Ap 2, 4). Na realidade, sem uma identidade clara e sólida, a pessoa consagrada caminha sem direção e, em vez de guiar os outros, dispersa-os. A vossa identidade como filhos da Igreja é ser coptas – isto é, radicados nas vossas raízes nobres e antigas – e ser católicos – isto é, parte da Igreja una e universal: como uma árvore que quanto mais enraizada está na terra tanto mais alta se eleva no céu.

Queridos consagrados, não é fácil resistir a estas tentações, mas é possível se estivermos enxertados em Jesus: «Permanecei em Mim, que Eu permaneço em vós. Tal como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, mas só permanecendo na videira, assim também acontecerá convosco, se não permanecerdes em Mim» (Jo 15, 4). Quanto mais enraizados estivermos em Cristo, tanto mais vivos e fecundos seremos. Só assim pode a pessoa consagrada conservar a capacidade de maravilhar-se, a paixão do primeiro encontro, o fascínio e a gratidão na sua vida com Deus e na sua missão. Da qualidade da nossa vida espiritual depende a da nossa consagração
.
O Egipto contribuiu para enriquecer a Igreja com o tesouro inestimável da vida monástica. Exorto-vos, pois, a beber do exemplo de São Paulo o Eremita, de Santo Antão, dos Santos Padres do deserto, dos numerosos monges que abriram, com a sua vida e o seu exemplo, as portas do céu a muitos irmãos e irmãs; e assim também vós podereis ser luz e sal, isto é, motivo de salvação para vós próprios e para todos os outros, crentes e não-crentes, e de modo especial para os últimos, os necessitados, os abandonados e os descartados.

A Sagrada Família vos proteja e abençoe a todos vós, ao vosso país com todos os seus habitantes. Do fundo do meu coração, desejo tudo de melhor a cada um de vós e, por vosso intermédio, saúdo os fiéis que Deus confiou aos vossos cuidados. O Senhor vos conceda os frutos do seu Santo Espírito: «amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio» (Gal 5, 22).

Sempre vos terei presente no meu coração e na minha oração. Coragem e avante, com o Espírito Santo! «Este é o dia que o Senhor fez, alegremo-nos n’Ele!» E, por favor, não vos esqueçais de rezar por mim.

Fátima (1): Aparições ou visões?

Na Cova da Iria os pastorinhos tiveram visões e não aparições, mas o valor não é menor porque, como notou Bento XVI, visões têm uma força de presença tal que equivalem à manifestação externa sensível.

Ainda não foi o centenário da primeira aparição de Nossa Senhora em Fátima e já abundam as alegadas ‘desmitificações’ do fenómeno ocorrido na Cova da Iria, agora reduzido a uma mera narrativa, que cada qual reinterpreta a seu bel-prazer. Os factos ocorreram de 13 de Maio a 13 de Outubro de 1917, tendo por protagonistas três crianças: os irmãos Francisco e Jacinta Marto, que o Papa Francisco vai muito felizmente canonizar no próximo dia 13, e a prima deles, Lúcia dos Santos, que foi a relatora das aparições.

Para alguns, tudo não passou de um embuste político-religioso, para que foram aliciadas umas criancinhas analfabetas que, a troco de sabe-se lá o quê, se prestaram a ser videntes de mirabolantes aparições celestiais. Para outros, é evidente que a manobra teve mãozinha clerical e intenção marcadamente antirrepublicana, em tempos em que a Igreja Católica era ferozmente perseguida pelos Afonsos Costas deste país. Também os há que, embora afirmando-se fiéis, olham com desdém para este tipo de fenómenos, que reprovam em nome da sua impoluta racionalidade, mais livre-pensadora do que verdadeiramente católica. É caso para perguntar: afinal, em que ficamos?!

Quem ler as Memórias da Irmã Lúcia, a vidente que sobreviveu e relatou os acontecimentos extraordinários ocorridos na Cova da Iria em 1917, percebe de imediato que, se alguma pressão sofreram aquelas três crianças, quer por parte do seu pároco, quer ainda por parte das suas famílias – que, para o efeito, até recorreram a vias de facto! – foi precisamente no sentido de as obrigar a desmentir as aparições. Também as zelosas autoridades públicas tudo fizeram para obrigar os videntes a se desdizerem ou, pelo menos, revelarem o segredo que lhes tinha sido dito pela sua celestial interlocutora.

A própria Igreja portuguesa, de início, não reagiu positivamente às aparições. Só a 13 de Maio de 1922 se iniciou a investigação canónica relativa aos acontecimentos de Fátima, que concluiu oito anos e meio depois, a 13 de Outubro de 1930, com a aprovação do culto e das aparições, que não constituem, contudo, matéria de fé.

Neste sentido, o Padre Anselmo Borges, em entrevista ao Expresso, a 16-4-2017, afirmou: “Posso ser um bom católico e não acreditar em Fátima, porque não é um dogma”. É verdade que Fátima não é, nem nunca poderá ser, um dogma, mas é pouco provável que possa ser um “bom católico” quem não aceita o veredicto da hierarquia eclesial em relação a estas aparições, até porque a totalidade da mensagem atribuída à ‘Senhora mais brilhante do que o sol’ é de uma total e irrepreensível coerência evangélica. Aliás, nenhuma revelação particular, como é o caso, pode ser reconhecida pela Igreja se não for absolutamente coincidente com a fé católica.

O P. Anselmo Borges igualmente declarou: “É preciso também distinguir aparições de visões. É evidente que Nossa Senhora não apareceu em Fátima. Uma aparição é algo objetivo. Uma experiência religiosa interior é outra realidade, é uma visão, o que não significa necessariamente um delírio, mas é subjectivo.”

A distinção entre aparições e visões não é nenhuma novidade pois, como recordou Bento XVI, quando era cardeal perfeito da Congregação para a Doutrina da Fé, “a antropologia teológica distingue, neste âmbito, três formas de percepção ou «visão»: a visão pelos sentidos, ou seja, a percepção externa corpórea; a percepção interior; e a visão espiritual (visio sensibilis, imaginativa, intellectualis). É claro que, nas visões de Lourdes, Fátima, etc, não se trata da percepção externa normal dos sentidos: as imagens e as figuras vistas não se encontram fora no espaço circundante, como está lá, por exemplo, uma árvore ou uma casa. Isto é bem evidente, por exemplo, no caso da visão do inferno (descrita na primeira parte do «segredo» de Fátima) ou então na visão descrita na terceira parte do «segredo», mas pode-se facilmente comprovar também noutras visões, sobretudo porque não eram captadas por todos os presentes, mas apenas pelos «videntes». De igual modo, é claro que não se trata duma «visão» intelectual sem imagens, como acontece nos altos graus da mística. Trata-se, portanto, da categoria intermédia, a percepção interior que, para o vidente, tem uma força de presença tal que equivale à manifestação externa sensível” (Cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Comentário teológico, in A mensagem de Fátima, 26-6-2000).

Assim sendo, não oferece dúvidas que, de facto, Nossa Senhora não apareceu, em sentido técnico, na Cova da Iria. Que se tenha tratado de uma visão e não de uma aparição não permite, contudo, afirmar que foi, como disse o P. Anselmo Borges, apenas uma “experiência religiosa interior” dos videntes, nem que, mesmo não sendo “necessariamente um delírio”, teria sido contudo algo meramente “subjectivo”.

Bento XVI, no seu já citado comentário teológico à mensagem de Fátima, esclarece: “Este ver interiormente não significa que se trata de fantasia, que seria apenas uma expressão da imaginação subjectiva. Significa, antes, que a alma recebe o toque suave de algo real mas que está para além do sensível, tornando-a capaz de ver o não-sensível, o não-visível aos sentidos: uma visão através dos «sentidos internos». Trata-se de verdadeiros «objectos» que tocam a alma, embora não pertençam ao mundo sensível que nos é habitual”. Atente-se aos termos usados pelo Cardeal Ratzinger para descrever as ‘aparições’ de Fátima: não “se trata de fantasia”, nem de “uma expressão da imaginação subjectiva”, mas de “algo real”, de “verdadeiros ‘objectos’”!

Prossegue Bento XVI, no seu Comentário teológico: “Como dissemos, a «visão interior» não é fantasia” – ao contrário do que o termo ‘visão imaginativa’, usado por D. Carlos Azevedo, na sua entrevista ao Público, no passado dia 21, poderia levar a crer – “mas uma verdadeira e própria maneira de verificação. Fá-lo, porém, com as limitações que lhe são próprias. Se, na visão exterior, já interfere o elemento subjectivo, isto é, não vemos o objecto puro mas este chega-nos através do filtro dos nossos sentidos que têm de operar um processo de tradução; na visão interior, isso é ainda mais claro, sobretudo quando se trata de realidades que por si mesmas ultrapassam o nosso horizonte”.

Nada tem de muito surpreendente este esclarecimento se se tiver em conta que, também no Evangelho, se recorre com frequência a metáforas que facilitam a compreensão dos mistérios da fé: é óbvio que o inferno não pode ser fogo, nem o céu um banquete e, quando Jesus diz que ele é “a videira verdadeira” (Jo 15, 1), não se está a atribuir a si mesmo uma natureza vegetal, mas apenas a sugerir que, da mesma forma como os ramos estão unidos ao tronco e dele recebem a vida, assim também os cristãos em graça estão enxertados em Cristo, de quem lhes vem a energia que alimenta a sua vida sobrenatural.

“Isto” – prossegue o Cardeal Ratzinger – “é patente em todas as grandes visões dos Santos; naturalmente vale também para as visões dos pastorinhos de Fátima. As imagens por eles delineadas não são de modo algum mera expressão da sua fantasia, mas fruto duma percepção real de origem superior e íntima”. Portanto, se se trata, como explica Bento XVI, de uma “percepção real de origem superior e íntima” e “não são de modo algum mera expressão da sua (deles, pastorinhos) fantasia”, impõe-se a conclusão óbvia: o seu valor não é menor do que se se tivesse tratado, em sentido técnico, de autênticas aparições, pois “tem uma força de presença tal que equivale à manifestação externa sensível”. Razão que explica também que a Conferência Episcopal Portuguesa, na sua nota pastoral sobre o centenário de Fátima (Fátima, Sinal de Esperança para o nosso tempo, Carta pastoral no Centenário das Aparições de Nossa Senhora em Fátima, 2016), mantenha o uso do termo “aparições”, mesmo não sendo o tecnicamente mais preciso. Também o inquilino se refere à casa em que vive como sendo sua, embora juridicamente não seja o seu proprietário.

Como sintetizou o então Cardeal Secretário de Estado, Ângelo Sodano, na celebração eucarística da beatificação de Jacinta e Francisco Marto, na Cova da Iria, a 13-5-2000, presidida por São João Paulo II, “a visão de Fátima refere-se sobretudo à luta dos sistemas ateus contra a Igreja e os cristãos e descreve o sofrimento imane das testemunhas da fé do último século do segundo milénio. É uma Via Sacra sem fim, guiada pelos Papas do século vinte.”

Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada in Observador AQUI

Homilia do Santo Padre Missa no Cairo

Al Salamò Alaikum (A paz esteja convosco)!

Hoje, o Evangelho do terceiro domingo de Páscoa fala-nos do itinerário dos dois discípulos de Emaús que deixaram Jerusalém. Um Evangelho que se pode resumir em três palavras: morte, ressurreição e vida.

Morte. Os dois discípulos voltam à sua vida quotidiana, repletos de desânimo e desilusão: o Mestre morreu e, por conseguinte, é inútil esperar. Sentiam-se desorientados, enganados e desiludidos. O seu caminho é um voltar atrás; é um afastar-se da experiência dolorosa do Crucificado. A crise da Cruz – antes, o «escândalo» e a «loucura» da Cruz (cf. 1 Cor 1, 18, 2, 2) – parece ter sepultado todas as suas esperanças. Aquele sobre quem construíram a sua existência morreu, derrotado, levando consigo para o túmulo todas as suas aspirações.

Não podiam acreditar que o Mestre e Salvador, que ressuscitara os mortos e curara os doentes, pudesse acabar pregado na cruz da vergonha. Não podiam entender por que razão Deus Todo-Poderoso não O tivesse salvo duma morte tão ignominiosa. A cruz de Cristo era a cruz das suas ideias sobre Deus; a morte de Cristo era uma morte daquilo que imaginavam ser Deus. Na realidade, eram eles os mortos no sepulcro da sua limitada compreensão.

Quantas vezes o homem se autoparalisa, recusando-se a superar a sua ideia de Deus, um deus criado à imagem e semelhança do homem! Quantas vezes se desespera, recusando-se a crer que a omnipotência de Deus não é omnipotência de força, de autoridade, mas é apenas omnipotência de amor, de perdão e de vida!

Os discípulos reconheceram Jesus no ato de «partir o pão» (Lc 24, 35), na Eucaristia. Se não deixarmos romper o véu que ofusca os nossos olhos, se não deixarmos romper o endurecimento do nosso coração e dos nossos preconceitos, nunca poderemos reconhecer o rosto de Deus.

Ressurreição. Na obscuridade da noite mais escura, no desespero mais desconcertante, Jesus aproxima-Se dos dois discípulos e caminha pela sua estrada, para que possam descobrir que Ele é «o caminho, a verdade e a vida» (Jo 14, 6). Jesus transforma o seu desespero em vida, porque, quando desaparece a esperança humana, começa a brilhar a divina: «O que é impossível aos homens é possível a Deus» (Lc 18, 27; cf. 1, 37). Quando o homem toca o fundo do fracasso e da incapacidade, quando se despoja da ilusão de ser o melhor, ser o autossuficiente, ser o centro do mundo, então Deus estende-lhe a mão para transformar a sua noite em alvorada, a sua tristeza em alegria, a sua morte em ressurreição, o seu voltar atrás em regresso a Jerusalém, isto é, regresso à vida e à vitória da Cruz (cf. Heb 11, 34).

Com efeito, depois de ter encontrado o Ressuscitado, os dois discípulos retornam cheios de alegria, confiança e entusiasmo, prontos a dar testemunho. O Ressuscitado fê-los ressurgir do túmulo da sua incredulidade e tristeza. Encontrando o Crucificado-Ressuscitado, acharam a explicação e o cumprimento de toda a Escritura, da Lei e dos Profetas; acharam o sentido da aparente derrota da Cruz.

Quem não faz a travessia desde a experiência da Cruz até à verdade da Ressurreição, autocondena-se ao desespero. Com efeito, não podemos encontrar Deus, sem crucificar primeiro as nossas ideias limitadas dum deus que reflete a nossa compreensão da omnipotência e do poder.

Vida. O encontro com Jesus ressuscitado transformou a vida daqueles dois discípulos, porque encontrar o Ressuscitado transforma toda a vida e torna fecunda qualquer esterilidade.[1] De facto, a Ressurreição não é uma fé nascida na Igreja, mas foi a Igreja que nasceu da fé na Ressurreição. Diz São Paulo: «Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã é também a nossa fé» (1 Cor 15, 14).

O Ressuscitado desaparece da vista deles, para nos ensinar que não podemos reter Jesus na sua visibilidade histórica: «Felizes os que creem sem terem visto!» (Jo 21, 29; cf. 20, 17). A Igreja deve saber e acreditar que Ele está vivo com ela e vivifica-a na Eucaristia, na Sagrada Escritura e nos Sacramentos. Os discípulos de Emaús compreenderam isto e voltaram a Jerusalém para partilhar com os outros a sua experiência: «Vimos o Senhor... Sim, verdadeiramente ressuscitou!» (cf. Lc 24, 32).

A experiência dos discípulos de Emaús ensina-nos que não vale a pena encher os lugares de culto, se os nossos corações estiverem vazios do temor de Deus e da sua presença; não vale a pena rezar, se a nossa oração dirigida a Deus não se transformar em amor dirigido ao irmão; não vale a pena ter muita religiosidade, se não for animada por muita fé e muita caridade; não vale a pena cuidar da aparência, porque Deus vê a alma e o coração (cf. 1 Sam 16, 7) e detesta a hipocrisia (cf. Lc 11, 37-54; At 5, 3.4).[2] Para Deus, é melhor não acreditar do que ser um falso crente, um hipócrita!

A fé verdadeira é a que nos torna mais caridosos, mais misericordiosos, mais honestos e mais humanos; é a que anima os corações levando-os a amar a todos gratuitamente, sem distinção nem preferências; é a que nos leva a ver no outro, não um inimigo a vencer, mas um irmão a amar, servir e ajudar; é a que nos leva a espalhar, defender e viver a cultura do encontro, do diálogo, do respeito e da fraternidade; é a que nos leva a ter a coragem de perdoar a quem nos ofende, a dar uma mão a quem caiu, a vestir o nu, a alimentar o faminto, a visitar o preso, a ajudar o órfão, a dar de beber ao sedento, a socorrer o idoso e o necessitado (cf. Mt 25, 31-45). A verdadeira fé é a que nos leva a proteger os direitos dos outros, com a mesma força e o mesmo entusiasmo com que defendemos os nossos. Na realidade, quanto mais se cresce na fé e no seu conhecimento, tanto mais se cresce na humildade e na consciência de ser pequeno.

Queridos irmãos e irmãs, Deus só aprecia a fé professada com a vida, porque o único extremismo permitido aos crentes é o da caridade. Qualquer outro extremismo não provém de Deus nem Lhe agrada.

Agora, como os discípulos de Emaús, voltai à vossa Jerusalém, isto é, à vossa vida diária, às vossas famílias, ao vosso trabalho e à vossa amada pátria, cheios de alegria, coragem e fé. Não tenhais medo de abrir o vosso coração à luz do Ressuscitado e deixai que Ele transforme a vossa incerteza em força positiva para vós e para os outros. Não tenhais medo de amar a todos, amigos e inimigos, porque, no amor vivido, está a força e o tesouro do crente.

A Virgem Maria e a Sagrada Família, que viveram nesta terra abençoada, iluminem os nossos corações e vos abençoem a vós e ao amado Egito que, ao alvorecer do cristianismo, recebeu a evangelização de São Marcos e, ao longo da história, deu muitos mártires e uma longa série de Santos e Santas!

Al Massih kam; bilhakika kam (Cristo ressuscitou; ressuscitou verdadeiramente)!


[1] Cf. Bento XVI, Audiência-Geral de Quarta-feira, 11 de abril de 2007.
[2] Santo Efrém exclama: «Arrancai a máscara que cobre o hipócrita e não vereis nele senão podridão» (Serm.). «Ai do coração débil (…) que segue dois caminhos»: diz o Eclesiástico (2, 12; cf. 2, 14 Vulg.).

O Evangelho de Domingo dia 30 de abril de 2017

No mesmo dia, caminhavam dois deles para uma aldeia, chamada Emaús, distante de Jerusalém sessenta estádios. Iam falando sobre tudo o que se tinha passado. Sucedeu que, quando eles iam conversando e discorrendo entre si, aproximou-Se deles o próprio Jesus e caminhou com eles. Os seus olhos, porém, estavam como que fechados, de modo que não O reconheceram. Ele disse-lhes: «Que palavras são essas que trocais entre vós pelo caminho?». Eles pararam cheios de tristeza. Um deles, chamado Cléofas, respondeu: «Serás tu o único forasteiro em Jerusalém que não sabe o que ali se passou nestes dias?». Ele disse-lhes: «Que foi?». Responderam: «Sobre Jesus Nazareno, que foi um profeta, poderoso em obras e em palavras diante de Deus e de todo o povo; e de que maneira os príncipes dos sacerdotes e os nossos chefes O entregaram para ser condenado à morte, e O crucificaram. Ora nós esperávamos que Ele fosse o que havia de libertar Israel; depois de tudo isto, é já hoje o terceiro dia, depois que estas coisas sucederam. É verdade que algumas mulheres, das que estavam entre nós, nos sobressaltaram porque, ao amanhecer, foram ao sepulcro e, não tendo encontrado o Seu corpo, voltaram dizendo que tinham tido a aparição de anjos que disseram que Ele está vivo. Alguns dos nossos foram ao sepulcro e acharam que era assim como as mulheres tinham dito; mas a Ele não O encontraram». Então Jesus disse-lhes: «Ó estultos e lentos do coração para crer tudo o que anunciaram os profetas! Porventura não era necessário que o Cristo sofresse tais coisas, para entrar na Sua glória?». Em seguida, começando por Moisés e discorrendo por todos os profetas, explicava-lhes o que d'Ele se encontrava dito em todas as Escrituras. Aproximaram-se da aldeia para onde caminhavam. Jesus fez menção de ir para mais longe. Mas os outros insistiram com Ele, dizendo: «Fica connosco, porque faz-se tarde e o dia já declina». Entrou para ficar com eles. Estando com eles à mesa, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o, e lho deu. Abriram-se os seus olhos e reconheceram-n'O; mas Ele desapareceu da vista deles. Disseram então um para o outro: «Não é verdade que nós sentíamos abrasar-se-nos o coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?». Levantando-se no mesmo instante, voltaram para Jerusalém. Encontraram juntos os onze e os que estavam com eles, que diziam: «Na verdade o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão». E eles contaram também o que lhes tinha acontecido no caminho, e como O tinham reconhecido ao partir o pão.

Lc 24, 13-35

O Evangelho do dia 29 de abril de 2017

Então Jesus, falando novamente, disse: «Eu Te louvo ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e aos prudentes, e as revelaste aos pequeninos. Assim é, ó Pai, porque assim foi do Teu agrado. «Todas as coisas Me foram entregues por Meu Pai; e ninguém conhece o Filho senão o Pai; nem ninguém conhece o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar. O «Vinde a Mim todos os que estais fatigados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e achareis descanso para as vossas almas. Porque o Meu jugo é suave, e o Meu fardo leve».

Mt 11, 25-30

sexta-feira, 28 de abril de 2017

DECLARAÇÃO COMUM DE SUA SANTIDADE FRANCISCO E DE SUA SANTIDADE TAWADROS II

1. Nós, Francisco, Bispo de Roma e Papa da Igreja Católica, e Tawadros II, Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos, no Espírito Santo damos graças a Deus por nos ter concedido a feliz oportunidade de nos encontrarmos mais uma vez, trocarmos o abraço fraterno e juntarmo-nos novamente em oração comum. Damos glória ao Todo-Poderoso pelos laços de fraternidade e amizade existentes entre a Sé de São Pedro e a Sé de São Marcos. O privilégio de estar juntos aqui no Egito é um sinal de que a solidez do nosso relacionamento tem aumentado de ano para ano e de que estamos a crescer na proximidade, na fé e no amor de Cristo nosso Senhor. Damos graças a Deus pelo amado Egito, «terra natal que vive dentro de nós», como costumava dizer Sua Santidade Papa Shenouda III, «povo abençoado pelo Senhor» (cf. Is 19, 25) com a sua antiga civilização dos Faraós, a herança grega e romana, a tradição copta e a presença islâmica. O Egito é o lugar onde a Sagrada Família encontrou refúgio, é terra de mártires e santos.

2. O nosso vínculo profundo de amizade e fraternidade tem a sua origem na plena comunhão que existia entre as nossas Igrejas nos primeiros séculos tendo-se expressado de várias maneiras nos primeiros Concílios Ecuménicos, a começar pelo Concílio de Niceia em 325 e a contribuição de Santo Atanásio, corajoso Padre da Igreja que mereceu o título de «Protetor da Fé». A nossa comunhão manifestava-se através da oração e práticas litúrgicas semelhantes, da veneração dos mesmos mártires e santos, e no fomento e difusão do monaquismo, seguindo o exemplo do grande Santo Antão, conhecido como o pai de todos os monges.

Esta experiência comum de comunhão, anterior ao tempo de separação, assume um significado especial na nossa busca atual do restabelecimento da plena comunhão. A maior parte das relações que existiam nos primeiros séculos continuaram, apesar das divisões, entre a Igreja Católica e a Igreja Copta Ortodoxa até ao dia de hoje e recentemente foram mesmo revitalizadas. Estas desafiam-nos a intensificar os nossos esforços comuns, perseverando na busca duma unidade visível na diversidade, sob a guia do Espírito Santo.

3. Recordamos, com gratidão, o encontro histórico de há quarenta e quatro anos entre os nossos predecessores Papa Paulo VI e Papa Shenouda III, aquele abraço de paz e fraternidade depois de muitos séculos em que os nossos vínculos mútuos de amor não tiveram possibilidade de se expressar devido à distância que se criara entre nós. A Declaração Comum, que eles assinaram em 10 de maio de 1973, representou um marco no caminho ecuménico e serviu como ponto de partida para a instituição da Comissão de Diálogo Teológico entre as nossas duas Igrejas, que produziu muito fruto e abriu o caminho para um diálogo mais amplo entre a Igreja Católica e toda a família das Igrejas Ortodoxas Orientais. Naquela Declaração, as nossas Igrejas reconheceram que, no sulco da tradição apostólica, professam «uma só fé no Deus Uno e Trino» e «a divindade do Unigénito Filho de Deus (...) perfeito Deus, quanto à sua divindade, e perfeito homem quanto à sua humanidade». Reconheceu-se também que «a vida divina é-nos dada e alimentada em nós pelos sete sacramentos» e que «veneramos a Virgem Maria, Mãe da verdadeira Luz», a «Theotókos».

4. Com profunda gratidão, recordamos o encontro fraterno que nós próprios tivemos em Roma, a 10 de maio de 2013, e a instituição do dia 10 de maio como jornada anual em que aprofundamos a amizade e a fraternidade entre as nossas Igrejas. Este renovado espírito de proximidade permitiu-nos discernir ainda melhor como o vínculo que nos une foi recebido de nosso único Senhor no dia do Batismo. Com efeito, é através do Batismo que nos tornamos membros do único Corpo de Cristo que é a Igreja (cf. 1 Cor 12, 13). Esta herança comum é a base da peregrinação que juntos realizamos rumo à plena comunhão, crescendo no amor e na reconciliação.

5. Conscientes de que ainda há tanto caminho a fazer nesta peregrinação, recordamos o muito que já foi alcançado. Em particular, lembramos o encontro entre Papa Shenouda III e São João Paulo II, que veio como peregrino ao Egito durante o Grande Jubileu do ano 2000. Estamos determinados a seguir os seus passos, movidos pelo amor de Cristo Bom Pastor, na convicção profunda de que, caminhando juntos, crescemos em unidade. Para isso auferimos a força de Deus, fonte perfeita de comunhão e de amor.

6. Este amor encontra a sua expressão mais alta na oração comum. Quando os cristãos rezam juntos, chegam a compreender que aquilo que os une é muito maior do que aquilo que os divide. O nosso desejo ardente de unidade encontra inspiração na oração de Cristo «para que todos sejam um só» (Jo 17, 21). Para isso aprofundemos as raízes que compartilhamos na única fé apostólica, rezando juntos e procurando traduções comuns do Pai Nosso e uma data comum para a celebração da Páscoa.

7. Enquanto caminhamos para o dia abençoado em que finalmente nos reuniremos à mesma Mesa Eucarística, podemos colaborar em muitas áreas e tornar tangível a grande riqueza que já temos em comum. Podemos testemunhar juntos certos valores fundamentais como a sacralidade e dignidade da vida humana, a sacralidade do matrimónio e da família, e o respeito por toda a criação, que Deus nos confiou. Não obstante a multiplicidade de desafios contemporâneos, como a secularização e a globalização da indiferença, somos chamados a oferecer uma resposta compartilhada baseada nos valores do Evangelho e nos tesouros das nossas respetivas tradições. Nesta linha, somos encorajados a aprofundar o estudo dos Padres Orientais e Latinos e promover um frutuoso intercâmbio na vida pastoral, especialmente na catequese e num mútuo enriquecimento espiritual entre comunidades monásticas e religiosas.

8. O testemunho cristão que compartilhamos é um sinal providencial de reconciliação e esperança para a sociedade egípcia e suas instituições, uma semente semeada para frutificar na justiça e na paz. Uma vez que acreditamos que todos os seres humanos são criados à imagem de Deus, esforcemo-nos por promover a tranquilidade e a concórdia através duma coexistência pacífica entre cristãos e muçulmanos, testemunhando assim que Deus deseja a unidade e a harmonia de toda a família humana e a igual dignidade de cada ser humano. Temos a peito a prosperidade e o futuro do Egito. Todos os membros da sociedade têm o direito e o dever de participar plenamente na vida do país, gozando de plena e igual cidadania e colaborando para construir a sua nação. A liberdade religiosa, que engloba a liberdade de consciência e está enraizada na dignidade da pessoa, é a pedra angular de todas as outras liberdades. É um direito sagrado e inalienável.

9. Intensifiquemos a nossa oração incessante por todos os cristãos no Egito e em todo o mundo, especialmente no Médio Oriente. Alguns acontecimentos trágicos e o sangue derramado pelos nossos fiéis, perseguidos e mortos unicamente pelo motivo de ser cristãos, recordam-nos ainda mais que o ecumenismo dos mártires nos une e encoraja no caminho da paz e da reconciliação. Pois, como escreve São Paulo, «se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros» (1 Cor 12, 26).

10. O mistério de Jesus, que morreu e ressuscitou por amor, situa-se no coração do nosso caminho para a plena unidade. Mais uma vez, os mártires são os nossos guias. Na Igreja primitiva, o sangue dos mártires foi semente de novos cristãos; assim também, em nossos dias, o sangue de tantos mártires seja semente de unidade entre todos os discípulos de Cristo, sinal e instrumento de comunhão e de paz para o mundo.

11. Obedientes à ação do Espírito Santo, que santifica a Igreja, a sustenta ao longo dos séculos e conduz àquela unidade plena pela qual Cristo rezou, hoje nós, Papa Francisco e Papa Tawadros II, para alegrar o coração do Senhor Jesus bem como os corações dos nossos filhos e filhas na fé, declaramos mutuamente que, com uma só mente e coração, procuraremos sinceramente não repetir o Batismo administrado numa das nossas Igrejas a alguém que deseje juntar-se à outra. Isto confessamos em obediência às Sagradas Escrituras e à fé expressa nos três Concílios Ecuménicos reunidos em Niceia, Constantinopla e Éfeso.

Pedimos a Deus nosso Pai que nos guie, nos tempos e modos que o Espírito Santo dispuser, para a unidade plena no Corpo místico de Cristo.

12. Concluindo, deixemo-nos guiar pelos ensinamentos e o exemplo do apóstolo Paulo, que escreve: «[Esforçai-vos] por manter a unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz. Há um só corpo e um só Espírito, assim como a vossa vocação vos chamou a uma só esperança; um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por todos e permanece em todos» (Ef 4, 3-6).

O Cairo, 28 de abril de 2017

São Josemaría Escrivá nesta data em 1932

“Diz: Meu Deus, amo-Te, mas... ensina-me a Amar!”, anota nesta data nos seus Apontamentos íntimos.

Breve oração pela viagem de Francisco ao Egipto

Deus Pai Misericordioso, rogamo-Vos que recorrendo à intercessão da Virgem Santa Maria e de todos os Santos e Santas protegeis o Santo Padre, o Papa Francisco, durante a delicada viagem que hoje inicia a terras do Egipto e que delas saiam importantes frutos para o diálogo e a paz entre os homens.
Ámen

O Evangelho do dia 28 de abril de 2017

Depois disto, passou Jesus ao outro lado do mar da Galileia, isto é, de Tiberíades. Seguia-O uma grande multidão porque via os milagres que fazia em favor dos doentes. Jesus subiu a um monte e sentou-Se ali com os Seus discípulos. Ora a Páscoa, a festa dos judeus, estava próxima. Jesus, então, tendo levantado os olhos e visto que vinha ter com Ele uma grande multidão, disse a Filipe: «Onde compraremos pão para dar de comer a esta gente?». Dizia isto para o experimentar, porque sabia o que havia de fazer. Filipe respondeu-Lhe: «Duzentos denários de pão não bastam para que cada um receba um pequeno bocado». Um de Seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro, disse-Lhe: «Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixes, mas que é isso para tanta gente?». Jesus, porém, disse: «Mandai sentar essa gente». Havia naquele lugar muita relva. Sentaram-se, pois; os homens em número de cerca de cinco mil. Tomou, então, Jesus os pães e, tendo dado graças, distribuiu-os entre os que estavam sentados; e igualmente distribuiu os peixes, tanto quanto quiseram. Estando saciados, disse aos Seus discípulos: «Recolhei os pedaços que sobraram para que nada se perca». Eles os recolheram, e encheram doze cestos de pedaços dos cinco pães de cevada, que sobraram aos que tinham comido. Vendo então aqueles homens o milagre que Jesus fizera, diziam: «Este é verdadeiramente o profeta que deve vir ao mundo». Jesus, sabendo que O viriam arrebatar para O fazerem rei, retirou-Se de novo, Ele só, para o monte.

Jo 6, 1-15

quinta-feira, 27 de abril de 2017

NÃO É FÁCIL FAZER AS MALAS PARA A VIAGEM COM DEUS!

É tão fácil pensar que já estamos convertidos, que de um modo geral, as “coisas” do mundo já não nos afectam facilmente, que já não nos deixamos levar com facilidade por orgulhos, vaidades ou as nossas vontades.

E de repente, perante um texto, uma publicação, uma fotografia, uma opinião, um conselho, vem ao de cima tudo aquilo que afinal andamos há tanto tempo a combater e lá nos deixamos levar, dando respostas, fazendo comentários, opinando, afinal como se fossemos os donos do mundo, ou melhor, os donos da verdade, que afinal é sempre a “nossa verdade”.

Claro que me refiro a mim próprio, quando me dou conta, sobretudo nestas redes sociais, que às vezes comento, opino, respondo com o mesmo modo de proceder que antes tinha, sem pensar, ou melhor, sem perguntar primeiro a Deus, se é mesmo essa resposta, esse comentário ou essa opinião que é de Sua vontade eu dar.

Obviamente que, quando à posteriori faço a pergunta, a resposta que invariavelmente vem ao meu coração, é que me deixei levar pelas minhas certezas, pelos meus orgulhos, pelas minhas vaidades.

Já em tempos tinha prometido a mim mesmo não voltar a comentar, a responder, a opinar, sem antes rezar.
Infelizmente a memória é curta, sobretudo quando o inimigo espreita todas as oportunidades, e por isso, terei que recomeçar … todos os dias!

Isto faz-me lembrar um episódio passado comigo.

Um dia estava em oração e agradecia a Deus pela viagem feita e que estava a fazer, com Ele, por Ele e nEle.
E senti no meu coração esta resposta: «Viagem, meu filho? Tu ainda nem começaste a fazer as malas!»

Pois é, começar a fazer as malas para fazer a viagem com Deus e para Deus, demora muito tempo, exige muita dedicação e sobretudo muita entrega.

Obrigado, Senhor, por me mostrares as minhas fraquezas, mas sobretudo porque, mostrando-mas, me dás a mão para eu prosseguir no caminho da Tua vontade.

Marinha Grande, 27 de Abril de 2017

Joaquim Mexia Alves

São Josemaría Escrivá nesta data em 1954

Festa de Nossa Senhora de Montserrat. Sofre um choque anafiláctico e começa a ficar inexplicavelmente curado da diabetes de que sofre há 10 anos. “Quando estava quase a perder os sentidos, em poucos segundos, o Senhor fez-me ver a minha vida como se fosse um filme; enchi-me de vergonha por tantos erros, e pedi perdão a Deus. É impossível passar por mais. É como se tivesse morrido”.

Santos - S. João XXIII e S. João Paulo II canonizados há três anos nesta data

Nunca na história da Igreja de Roma um seu bispo proclamou santos dois predecessores tão próximos no tempo como acontece agora com a canonização de Angelo Giuseppe Roncalli e Karol Wojtyła. Sem dúvida alguma, João XXIII e João Paulo II foram protagonistas na segunda metade do século XX de dois pontificados — o primeiro breve, o segundo bastante longo, até ao início do novo século — dos quais se sente a importância já agora, ainda antes que deste tempo seja permitida uma avaliação fundada em perspectiva histórica.

E todavia, o sentimento dos fiéis — mas também a percepção a partir de fora, até em mundos distantes — precedeu o reconhecimento da Igreja, ao sentir imediatamente a índole extraordinária destas duas figuras de cristãos, muito diversos entre si. O primeiro radicado no catolicismo camponês lombardo do final do século XIX, orientado pela formação romana em terras de fronteira, Papa tradicional e revolucionário; o segundo, fruto maduro e novo de uma fé antiga e provada pelos totalitarismos do século XX, primeiro bispo de Roma não italiano depois de quase meio milénio.

Todavia, a santidade pessoal de Roncalli e de Wojtyła — sancionada por procedimentos canónicos iniciados por Paulo VI e por Bento XVI mas completados pela decisão do seu sucessor Francisco — tem um significado especial. Com efeito, é a luz do Vaticano II, meio século depois do seu encerramento, que ilumina e une as duas canonizações. E, emblematicamente, as únicas imagens fotográficas que retratam juntos o Papa João XXIII e o jovem bispo auxiliar de Cracóvia são aquelas de uma audiência ao episcopado polaco, precisamente na vigília do concílio. Portanto, a sua santidade inscreve-se no contexto do Vaticano II: Roncalli intuiu-o e com coragem tranquila o inaugurou, e Wojtyła viveu-o apaixonadamente como bispo. Assim, o gesto do seu sucessor Francisco — primeiro bispo de Roma que acolheu com convicção o concílio sem nele ter participado — indica não só a exemplaridade de dois cristãos que se tornaram Papas, mas inclusive o caminho comum, por eles marcado, da renovação e da simpatia pelas mulheres e pelos homens do nosso tempo.

Giovanni Maria Vian - Diretor

© L'Osservatore Romano 2014