Com sua renúncia, então, ele parece dizer-nos que não é o poder, mas a impotência que nos torna verdadeiramente humanos. É a consciência do limite que mantém a porta aberta de cada um para o bem do outro. Em ninguém, de facto, podem estar ausentes as deficiências da sua condição sendo portanto normal que cada pessoa as tenha, mesmo tratando-se de um grande Pontífice. Ele revelou, enfim, com eficácia o significado moral que tem, para o bem de todos, a presença espiritual e pública do Papa no mundo, portadora da soberania do divino e do humano, o espiritual e o temporal, as misérias e as grandezas de cada um, uma complexidade que convida a separar interiormente o bem comum do vínculo mortal com a força do poder e dos interesses subjetivos.
Visto com essa amplitude de perspectiva, a renúncia de Joseph Ratzinger é em última instância um gesto exemplar e moralizante. Ao mesmo tempo, profundamente cristã e profundamente humana.
(Joaquín Navarro-Valls * – excerto com a parte final de artigo publicado no ‘la Reppublica’ AQUI com tradução e título da responsabilidade de JPR)
* Joaquín Navarro-Valls foi porta-voz do Vaticano no pontificado de João Paulo II
* Joaquín Navarro-Valls foi porta-voz do Vaticano no pontificado de João Paulo II
Pedindo licença para discordar de sua inteligente visão, entendo que essa é, porém, uma visão simplista, breve, reduzida da lamentável decisão de Bento XVI, meu caro.
ResponderEliminarA não ser que entendamos que a escolha de um Papa, sucessor de Pedro, a quem o próprio Cristo designou fundador e chefe da Igreja verdadeira, não tenha inspiração divina, seja apenas mais um ato que orbita a esfera das situações humanas, de vida em sociedade.
Não, meu caro! Mil vezes não!
O nosso amado Papa desistiu do percurso que recebera de Deus, seja lá por que lamentáveis razões, mas optou por saltar do imenso barco de que era condutor, timoneiro, para recolher-se na segurança de um local de terra firme.
Não sejamos excessivamente românticos e nem ingênuos, pois, justamente no Ano da Fé, dá-se a renúncia ao posto de líder maior de um rebanho imenso, mas já tão abalado por ataques vindos de todos os lados.
Dói afirmar isso, mas a verdade é que os católicos do mundo inteiro foram abandonados justamente por quem não tinha direito de fazê-lo.
João Paulo II tinha plena consciência de que sua investidura era resultado da obra de Deus, não podendo jamais, por isso, de ser objeto de outra postura a não ser a corajosa perseverança, até o inexorável final da vida.
Além disso, ou diferente disso, é ser inocente, poético, obnubilado pelo romantismo distanciado da realidade, ou pelo desejo ardente de interpretar como belo o que é inquestionavelmente feio, como bom o que é inapelavelmente mau.
Ademais, lembremos que tanto o matrimônio como a ordenação vêm a ser sacramentos.
A lamentável decisão de Bento XVI tem suscitado, então, questionamentos que jamais deveriam sê-lo, como, por exemplo, o de que "se o Papa pode renunciar, por que pessoas casadas não podem divorciar-se" (matéria de capa da revista Veja, desta semana).
É bem verdade que não existe ordenação de um Papa, propriamente dita, mas, mesmo assim, ninguém duvida que o complexo processo de escolha e investidura de um Papa é mais algém do que a ordenação de um sacerdote, como aos milhares ocorre todos os anos, no mundo inteiro.
Assim, emerge como hipocrisia dizer que o sacramento da "ordenação" de um Papa é renunciável, enquanto que, quanto ao sacramento do matrimônio, ele não é, há de ser até o final da vida.
Embora divergentes nossos posicionamentos, caríssimo, parabenizo-o pela lucidez e pela cultura com que você se destaca!
José Fernando M. SARABANDO (Belo Horizonte-MG)
Caríssimo José Sarabando,
ResponderEliminarDeixe-me apenas chamar a atenção que o Papa não recebeu nenhum sacramento especial. O único sacramento em causa é o da "Ordem".
A renúncia do Papa está prevista assim como existe a indicação que um bispo se "reforme" aos 75 anos.