segunda-feira, 4 de julho de 2022

Encantos e jóias

Coroa Rainha Santa Isabel - Museu Machado de Castro
Hoje (4 de Julho) celebra-se em todo o mundo uma das figuras mais encantadoras da história portuguesa. Muitos escreveram sobre ela, mas a melhor biografia é a publicada em 2011 pelo historiador espanhol José Miguel Pero-Sanz.

Já adivinhou? É uma mulher aparentada com quase toda a realeza europeia: avós húngaros e alemães, pai aragonês, mãe de sangue alemão e siciliano. Pelo casamento com D. Dinis, ficou ligada à coroa portuguesa e indirectamente às famílias reais francesa e castelhana. Tinha um porte elegantíssimo, cabelo claro, olhos verdes, feições perfeitas. Os cronistas da época falam da «sua grande formosura, muito louvada nas cortes dos reis e dos príncipes». Media 1,76 m. Isabel era um deslumbramento, naquela época.

Sabia arranjar-se, usava bons vestidos e jóias caras. Era rainha a tempo inteiro e não deixava que alguém tivesse dúvidas a esse respeito. Até ao fim da vida, assinou sempre «Isabel, rainha de Portugal e do Algarve». Oficialmente, começou a ser rainha aos 11 de idade, embora só tenha começado a exercer funções quando entrou em Portugal, com 12 anos.

Um traço de carácter que se destacava era a autoridade natural. Mandava (mandou muito!), mas com uma ascendência tão forte que todos lhe reconheciam a liderança. O marido dizia e repetia que ela «nasceu para ser rei» (escrevia assim, no masculino) e o povo concordava, porque Isabel não precisava de puxar por uma espada para pôr em sentido os vassalos mais poderosos e ricos, pouco dados a obedecer.

Nasceu no palco das intrigas internacionais. Talvez por isso, tivesse um instinto e uma habilidade política tão extraordinários.

Naquela época, as famílias reais costumavam casar entre si, primos com primos, de modo que o flagelo da consanguinidade explica muita coisa. O caso de Isabel foi uma excepção. O seu próprio casamento com o rei português foi um dos poucos daquela época que não precisou de dispensa papal por razão de consanguinidade. Por causa dos cruzamentos entre familiares próximos ou do ambiente decadente da corte portuguesa, ou por várias razões juntas, D. Dinis foi um homem descontrolado, violento ou, como o descrevia Vitorino Nemésio, «vigoroso, com uma imaginação aguda e sensual; não lhe faltavam na sua própria casa exemplos de vida regalada». Este luxo e essa luxúria não ajudaram a formar uma personalidade íntegra e generosa. Desse descontrolo nasceram muitos filhos ilegítimos e confrontos sangrentos. Por outro lado, segundo os dados disponíveis, D. Dinis foi o primeiro rei português não analfabeto o que, só por si, diz muito sobre a rudeza intelectual daquela corte. D. Isabel tinha outra formação. Sabia latim. Ai dos padres, se alguma vez eram pouco rigorosos no latim, na presença dela!

A história descreve-nos D. Isabel como estadista profissional. Não tinha nada de frágil senhora num mundo desumano dominado por homens violentos. A sua profissão, a tempo inteiro, foi ser rainha. Administrou um património enorme, que mobilizou, com mão firme, ao serviço dos mais pobres e da cultura, e estendeu a sua acção diplomática a grande parte da Europa. Valendo-se dos laços familiares, tomou a iniciativa de intervir em muitas disputas, com tanto sentido de oportunidade e de justiça, com tanta capacidade de negociação, que resolveu conflitos aparentemente insolúveis. O correio diplomático e os enviados não paravam. A vida desta mulher é um exemplo extraordinário de capacidade de trabalho.

Em Lisboa, perto da «Loja dos Açores», existe uma lápide que pertenceu a um padrão ainda mais antigo. Traduzo: «Santa Isabel, rainha de Portugal, mandou colocar este padrão neste lugar em memória da pacificação que nele se fez entre seu marido el-rei D. Dinis e seu filho D. Afonso IV, estando para se darem batalha, na era de 1323». Recentemente, roubaram a cruz e depois a coluna do padrão. Resta a lápide, a recordar o episódio. Os poderosos preparavam-se para disputar o poder, à custa de uma guerra civil; intervém a rainha, com coragem física e inteligência rápida. Cederam o rei, o filho, os nobres.

Os êxitos das mediações nacionais e internacionais de Santa Isabel não cabem num artigo de jornal.

Em Junho de 1336, chegou-lhe a notícia de mais uma guerra, desta vez entre Portugal e Castela. A rainha pôs-se a caminho. Tinha 65 anos, eram muitos quilómetros e vários rios pelo caminho, mas não houve maneira de a convencer.

O calor apertava. Ao fim de uma semana de viagem, chegou a Estremoz, recebida com imenso carinho, mas com uma úlcera no braço. Os tratamentos não deram nada. No dia 1 de Julho a febre foi tanta que não conseguiu levantar-se para assistir à Missa. Os médicos estavam confiantes, a rainha percebeu que estava por um fio.

No dia 4, confessou-se antes da Missa, celebrada no quarto. Ainda se levantou para ir à capela. Durante o dia, conversou com as visitas, encantadora como sempre. Tudo normal, excepto que Nossa Senhora lhe apareceu, quando estava com a nora. À noite, quis que não atrasassem o jantar por sua causa. Pouco depois teve um desfalecimento e D. Afonso correu para junto da mãe. Recompôs-se, e ficaram os dois a falar das netas. Passado um tempo, advertindo que o fim se aproximava, invocou Nossa Senhora, recitou o Credo, o Pai Nosso e outras orações. A voz ficou sumida e difícil de entender. Morreu.

Era o dia 4 de Julho. Hoje, festa de Santa Isabel.
José Maria C. S. André
«Correio dos Açores», 7-VII-2014

Rainha Santa Isabel de Portugal

Isabel de Aragão nasceu por volta de 1271 no Palácio de Aljaferia, na cidade de Saragoça, onde reinava o seu avô paterno D. Jaime I. Era filha de D. Pedro, futuro D. Pedro III, e de D. Constança de Navarra. A princesa recebeu o nome de Isabel por desejo de sua mãe em recordação de sua tia Santa Isabel da Hungria, Duquesa de Turíngia. O seu nascimento veio acabar com as discórdias na corte de Aragão, pelo que o seu avô lhe chamava “rosa da casa de Aragão”.

As virtudes da sua tia-avó viriam a servir-lhe de modelo e desde muito nova começou a mostrar gosto pela meditação, oração e jejum, não se sentido atraída pelos divertimentos comuns das jovens da sua idade. Isabel não gostava de música, passeios, nem jóias e enfeites, vestia-se sempre com simplicidade.

A Infanta D. Isabel tornara-se conhecida em beleza discrição e virtudes. Estas levaram muitos Príncipes a apresentarem-se a D. Pedro como pretendentes à mão da sua admirável filha. Os pais escolheram o mais próximo, D. Dinis, herdeiro do trono de Portugal, que era também o mais dotado de qualidades. Isabel estava mais inclinada a encerrar-se num Convento, no entanto, como era submissa, viu no pedido dos pais, a vontade do céu. Foram assinadas a 11 de Fevereiro de 1282 as bases do contrato de casamento, e o matrimónio realizou-se na vila de Trancoso, no dia de S. João Batista de 1282. Nos primeiros tempos de casada acompanhava o marido nas suas deslocações pelo país e com a sua bondade conquistou a simpatia do povo. Dava dotes a raparigas pobres e educava os filhos de cavaleiros sem fortuna.

Isabel deu ao Rei dois filhos: Constância, futura rainha de Castela e Afonso, herdeiro do trono de Portugal. As numerosas aventuras extraconjugais do marido humilhavam-na profundamente. Mas Isabel mostrava-se magnânima no perdão criando com os seus também os filhos ilegítimos de Dinis, aos quais reservava igual afeto. Entre seus familiares, constantemente em luta, desempenhou obra de pacificadora, merecendo justamente o apelido de anjo da paz.

Desempenhou sempre o papel de medianeira entre o Rei e o seu irmão D. Afonso, bem como entre o Rei e o Príncipe herdeiro. Por sua intervenção foi assinada a paz em 1322.

A sua vida será marcada por quatro virtudes fundamentais: a piedade, a caridade, a humildade e a inquietude pela paz. Tornou-se uma mulher de grande piedade conservando em sua vida a prática da oração e a meditação da Palavra de Deus. Buscou sempre a reconciliação e a paz entre as pessoas, as famílias e até entre nações.

D. Isabel costumava dizer “Deus tornou-me Rainha para me dar meios de fazer esmolas.” Sempre que saía do Paço era seguida por pobres e andrajosos a quem sempre ajudava.

Após a morte de seu marido, entregou-se inteiramente às obras assistenciais que havia fundado, não podendo vestir o hábito das clarissas e professar os votos no mosteiro que ela mesma havia fundado, fez-se terciária franciscana, após ter deposto a coroa real no Santuário de Santiago de Compostela e haver dado seus bens pessoais aos necessitados. Fixou residência em Coimbra, junto ao convento de Santa Clara, nos Paços de Santa Ana, de que faria doação ao convento.

Mandou edificar o hospital de Coimbra junto à sua residência, o de Santarém e o de Leiria para receber enjeitados.

Viveu uma profunda caridade sendo sempre sensível às necessidades dos pobres e excluídos. Viveu o resto da vida em pobreza voluntária, dedicada aos exercícios de piedade e de mortificações.

Isabel faleceu a 4 de Julho de 1336, deixando em testamento grandes legados a hospitais e conventos.

O povo criou à sua volta uma lenda de santidade, atribuindo-lhe diversos milagres e a santa foi canonizada em 1625.

Foram-lhe atribuídos muitos milagres, como a cura da sua dama de companhia e de diversos leprosos. Diz-se também que fez com que uma pobre criança cega começasse a ver e que curou numa só noite os graves ferimentos de um criado. No entanto o mais conhecido é o milagre das rosas.

Reza a lenda que, durante o cerco de Lisboa, D. Isabel estava a distribuir moedas de prata para socorrer os necessitados da zona de Alvalade, quando o marido apareceu. O Rei perguntou-lhe: “O que levais aí, Senhora?” Ao que ela, com receio de desgostar a D. Dinis, e, como que inspirada pelo céu respondeu:

São rosas senhor....” E, abrindo o manto, perante o olhar atónito do Rei, não se viram moedas, mas sim rosas encarnadas e frescas.

Por ordem do Bispo D. Afonso de Castelo Branco abriu-se o túmulo real, verificando-se que o corpo da saudosa Rainha estava incorrupto. A sua canonização pelo Papa Urbano III teve lugar em 1625. Quando esta notícia chegou à cidade realizaram-se grandes festejos que se prolongam até aos nossos dias.

Rainha Santa Isabel

Filha do rei D. Pedro II de Aragão e da rainha D. Constança. Pensa-se que tenha nascido em princípios de 1270. Em Barcelona? Não sabemos ao certo.

Casou-se em 1282 com D. Dinis, rei de Portugal. Neta de Jaime I o Conquistador, bisneta de Frederico II da Alemanha, deles herdou a energia tenaz e a força de alma. Mas caracterizava-se principalmente pela bondade imensa e pelo espírito equilibrado e justo de Santa Isabel da Hungria, sua parente próxima. Era mulher cheia de doçura e de bondade. Gostava da vida interior e do trabalho silencioso, jejuava dias sem conta ao longo do ano, comovia-se com os que erravam, rezava pelo Livro de Horas, cosia e fazia bordados na companhia das damas e distribuía esmolas aos necessitados.

Aos 20 anos foi mãe de D. Afonso IV, o Bravo, que foi a sua cruz. Caso único na 1ª dinastia portuguesa, a vida deste homem foi pura e nisto se vê influência de sua mãe.

Era discreta esta jovem rainha que obrigava o filho a obedecer ao pai (ele era o rei), que fingia ignorar as andanças do rei e que criava os seus filhos ilegítimos. Na política peninsular de então, o seu poder moderador fez-se sentir profundamente. Serviu de juiz nas rixas entre D. Dinis, seu irmão e seu turbulento filho.

Após a morte de D. Dinis, vestiu o hábito de Santa Clara. Construiu mosteiros e hospitais. Morreu em Estremoz a 4 de Julho de 1336. Foi canonizada a 25 de Maio de 1625 pelo papa Urbano VIII. Portugal venera-a com a antonomásia de Rainha Santa.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)