Poucos meios de informação referiram
as palavras do Papa, mas alguns publicaram as reacções dos lobbies animalistas
à sua análise. Os animalistas protestaram porque não entendem que a Igreja dê
mais valor a uma criança do que a outro bicho: todos os bichos têm os mesmos direitos!
Nalgumas redes sociais, por exemplo no Twitter, durante alguns dias os
protestos contra o Papa ultrapassaram o número de mensagens relacionadas com a
Covid ou os grandes temas da política.
Médicos psiquiatras que
acompanham crianças contam-me que lhes começaram a chegar ao consultório numerosos
rapazes e raparigas, pré-adolescentes, com problemas graves de identidade,
porque não sabem se são rapazes ou raparigas.
Ao mesmo tempo, a grande maioria
da população de muitos países do mundo ocidental ignora o que seja a família. Há
trinta anos, era só nos países escandinavos que, quando a generalidade das crianças
nascia, os pais já não viviam em conjunto. Hoje em dia, essa estatística
verifica-se generalizadamente, também em Portugal. Isto é, a maioria dos
rapazes e raparigas ignora o que sejam as responsabilidades familiares e não tem
a maturidade necessária para ter filhos. Em muitos casos, a consciência desta
impreparação leva as pessoas a evitar casar-se e a evitar ter filhos, mas às
vezes são surpreendidas pela realidade e não sabem o que fazer com uma criança
que surge.
Percebe-se que as experiências educativas
em curso no mundo ocidental estão a deixar marcas profundas. Ao banalizar o
sexo, o corpo e as relações humanas, ao eliminar o sentido de responsabilidade e
a capacidade de compromisso, este tipo de educação está a destruir as novas
gerações e, diz o Papa, afecta as raízes da sociedade: «Em vez de filhos, as
pessoas querem cães e gatos. E a pátria sofre».
Fala-se de «Inverno demográfico»,
de desequilíbrios económicos que inviabilizam a médio prazo o sistema de segurança
social. Isso é grave, no entanto, não é o que mais preocupa o Papa. «A paternidade
é a plenitude da vida de uma pessoa» e, diz ele, «vivemos numa época de
orfandade, numa civilização órfã». Há demasiado «egoísmo»: «quantos casais só
querem um filho!... É uma tragédia!» — sublinha o Papa.
Por um lado, as sociedades
tornaram-se demasiado complicadas, o trabalho e os meios de subsistência criam
uma enorme insegurança. Por outro lado, a pressão social exige tantos requisitos
materiais para uma vida normal, que os pais dificilmente conseguem garantir aos
filhos esse tipo de vida considerada normal. É evidente que caímos numa
ratoeira que gera infelicidade. Por isso a Igreja tem alertado as sociedades da
abundância para que, se não forem capazes de se desprender de tanta carga supérflua,
afundam-se numa imensa frustração e perdem o melhor da vida.
— «Se não podeis ter filhos,
pensai em adoptar uma criança. É um risco, sim: ter um filho é sempre um risco,
seja um filho natural, ou adoptado. Mas é mais perigoso não ter filhos». Um
homem ou uma mulher que voluntariamente «não desenvolvem o sentido da paternidade
e da maternidade carecem de qualquer coisa principal».
Em parte, esta crise humana —tragédia,
como o Papa a classificou— está a ser promovida pela «teoria de género», que
algumas vezes Francisco considerou uma forma violenta de ditadura. Este delírio
ideológico, que está a ser ensinado nas escolas de alguns países, está a perturbar
de tal maneira as novas gerações que muitas crianças se sentem inseguras sobre
se são rapazes ou raparigas, não distinguem entre uma pessoa e um bicho, chegam
à adolescência sem capacidade de assumir responsavelmente um compromisso
familiar.
Não seria bom mudar radicalmente
o nosso sistema educativo?
José Maria C.S. André