sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Quando os jornais são notícia


As notícias mais chamativas destes últimos dias foram protagonizadas pelos próprios meios de comunicação, por acção e omissão.


Primeiro, o Tribunal Constitucional polaco reconheceu que o aborto é contrário à Constituição polaca, que defende explicitamente a vida e a dignidade de todos.


A Santa Sé saudou este progresso no reconhecimento pleno dos direitos humanos e o Papa Francisco aproveitou a memória litúrgica de S. João Paulo II e a celebração do centenário do seu nascimento para lembrar que João Paulo II «sempre defendeu um amor privilegiado pelos últimos e pelos indefesos e o cuidado de cada ser humano, desde a concepção até à morte natural. Por intercessão de Maria Santíssima e do Santo Pontífice polaco, peço a Deus que suscite nos corações de todos o respeito pela vida dos nossos irmãos, especialmente dos mais frágeis e indefesos, e que dê força aos que acolhem e cuidam dessa vida, mesmo quando isso exige um amor heróico».




Qual a reacção dos principais meios de comunicação? Classificar os polacos e o Tribunal Constitucional como ultra-conservadores e não referir a posição da Igreja e de outros defensores dos direitos humanos, para dar a entender que os polacos estão isolados.


Nessa mesma altura, o Papa foi entrevistado brevemente para um programa de televisão – uma resposta de menos de 30 segundos, que nem foi divulgada pelos canais habituais da Santa Sé – onde disse que era preciso respeitar as pessoas com tendências homossexuais, que se lhes poderiam aplicar leis comuns mas, de nenhum modo, as leis relativas ao casamento. Desta vez, o assunto mereceu uma cobertura noticiosa avassaladora, embora infelizmente distorcida.


Estimar todas as pessoas, independentemente do seu comportamento, é um princípio básico do cristianismo, que não se confunde com aprovar esse comportamento. O Papa tem sido muito claro acerca disso.


O segundo ponto é que, como o Papa sublinhou, as disposições que se aplicam a pessoas que vivem em comum diferem em vários aspectos do casamento. Não se lhes aplica o «número dois», não são relações indissolúveis e, obviamente, não têm a ver com a homossexualidade.


Em geral, quando várias pessoas partilham as despesas domésticas, não tem sentido exigir que sejam só duas. Porque é que um pai e dois filhos que vivem na mesma casa teriam menos direitos do que se fossem só duas pessoas? Porque é que cinco estudantes que alugam a mesma casa hão-de ter menos direitos do que se fossem só dois? A exigência de serem dois, um homem e uma mulher, aplica-se a quem funda uma família aberta aos filhos, os outros tipos de convivência podem juntar qualquer número de indivíduos.


As responsabilidades que um homem e uma mulher assumem ao constituírem uma família aberta aos filhos prolongam-se indefinidamente no tempo, e por isso a Igreja defende que o casamento é indissolúvel. Pelo contrário, as outras convivências dependem do arbítrio das partes.


Finalmente, o comportamento homossexual nunca pode ser fonte de direitos. Porque é que uma tia e uma sobrinha que partilham a mesma casa passariam a ter mais direitos se, em vez de levarem uma vida normal, fizerem orgias homossexuais?



Muitos órgãos de comunicação social não foram capazes de compreender as breves palavras do Papa, provavelmente porque receberam a informação através de agências noticiosas que simplificaram e distorceram as suas palavras. Em resultado, muitos atribuíram-lhe uma doutrina extravagante e louvaram-no por ceder à ideologia de género. Pelos vistos, ninguém os informou que o Papa classificou a ideologia de género como a grande ditadura dos nossos tempos.


Felizmente, o público está cada vez mais alerta para a manipulação da informação relativa à Igreja. Se, em certos casos, esta desconfiança for o princípio de um maior interesse por conhecer mais directamente a sua doutrina... como diz o povo, há males que vêm por bem.


José Maria C.S. André