terça-feira, 21 de abril de 2020

Sereno no meio das preocupações

Se, por teres o olhar fixo em Deus, souberes manter-te sereno no meio das preocupações; se aprenderes a esquecer as ninharias, os rancores e as invejas; pouparás muitas energias, que te fazem falta para trabalhar com eficácia, em serviço dos homens. (Sulco, 856).

Luta contra as asperezas do teu carácter, contra os teus egoísmos, contra o teu comodismo, contra as tuas antipatias... Além de que temos de ser corredentores, o prémio que receberás (pensa bem nisso!) estará em relação diretíssima com a sementeira que tiveres feito. (Sulco, 863).

Tarefa do cristão: afogar o mal em abundância de bem. Nada de fazer campanhas negativas, nem de ser anti-nada. Pelo contrário: viver de afirmação, cheios de optimismo, com juventude, alegria e paz; olhar para todos com compreensão: os que seguem Cristo e os que O abandonam ou não O conhecem.

Compreensão, porém, não significa abstencionismo, nem indiferença, mas actividade. (Sulco, 864)

Paradoxo: desde que me decidi a seguir o conselho do salmo - "Lança sobre o Senhor as tuas preocupações, e Ele te sustentará" - cada dia tenho menos preocupações na cabeça... E ao mesmo tempo, com o devido trabalho, resolve-se tudo com mais clareza! (Sulco, 873)

São Josemaria Escrivá

REFLEXÕES SOBRE A PESTE DE 2020 (II) Luís Filipe Thomaz

A segunda reflexão foi-me sugerida por uma conversa que escutei, à porta de uma loja, enquanto esperava fora a minha vez de ser atendido: explicava um velhote que a epidemia se devia aos chineses, que inventaram o vírus e o espalharam pelo mundo, para provocarem uma crise económica e assim poderem adquirir todas as empresas falidas. É evidente que é uma tese que jamais alguém conseguirá provar, mas não foi isso que me chamou a atenção: foi a mentalidade que lhe está inerente.
              No meio do racionalismo que de alguns séculos a esta parte domina o pensamento ocidental, pouco espaço há para o mistério. Tudo se explicaria por causas simples que o homem, com um pouco de esforço, seria sempre capaz de determinar. Já há anos, quando caiu a ponte de Entre-os-Rios e morreu uma vintena de pessoas, ouvi na televisão alguém da região afirmar: "é preciso descobrir o responsável, pois tem de haver um responsável…".
              Dentro desta mentalidade não se compreende sequer o que é o concurso fortuito de diversas causas, que uma a uma talvez se possam compreender, mas cuja concomitância permanece inexplicável. É como a água régia, mistura de ácido nítrico e clorídrico, que juntos conseguem dissolver o ouro, embora nenhum deles de per si o alcance. Se dentro de tal mentalidade resta ainda algum lugar para Deus é porque a sua majestade como Criador se impõe instintivamente a toda a criatura; mas não há já espaço para o Diabo!
              Se em certa medida se pode afirmar que a cultura contemporânea é marcada por uma certa morte de Deus, raros são os que dão conta de que essa foi de longa data preparada pela morte do Diabo. Não pretendo com isto afirmar que se imponha crer no demónio que tradicionalmente se figura: negro, como filho das trevas que é, com rabo de animal e cornos na testa, a entremostrar que na hierarquia dos seres queda mesmo abaixo do próprio homem, e grande forquilha na mão. O que se não deve perder de vista é que o Mal é um mistério, e que sobre a criação impende constantemente um potencial de maldade, pronto a precipitar-se sobre o mundo se algo o faz entrar em movimento. Pensemos, por exemplo, na Segunda Guerra Mundial. Eu era então criança, contava apenas três anos; só me recordo de estar então em Sintra, em casa da minha avó e ouvir subitamente foguetes a estalar no ar e os sinos todos a tocar, e a minha avó, comovida, a dizer-me de lágrimas nos olhos; "acabou a guerra, meu filho!". Só muito mais tarde vim a entrever o horror que fora.
              A Alemanha saíra da Primeira Grande Guerra não só vencida, mas também humilhada e ofendida. Não era a primeira vez que isso acontecia na História; mas na atmosfera de racionalismo e positivismo que dominava a cultura da época, a culpa tinha de ser de alguém. Era mister encontrar um bode expiatório. Acharam-no nos judeus, e decidiram por isso eliminá-los. E foram os horrores de Auschwitz e tudo o mais que não cabe aqui enumerar…
              Hitler chegou mesmo a descobrir que a Companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola, que era basco — e tinha, portanto, por idioma materno uma língua que não pertencia à família indo-europeia ou ariana — tinha por inconfessado objetivo opor-se aos arianos e assim evitar a supremacia alemã sobre o mundo!
              Foi um pouco a mesma coisa no Camboja dos Khmeres Vermelhos: se a Revolução não avançava, era devido aos inimigos do povo, aos exploradores das mais-valias de quem trabalhava e produzia, e a seus aliados confessos ou ocultos. Havia que eliminá-los. Ai de quem soubesse falar francês ou fosse dono de uma simples loja de comércio em qualquer rincão perdido. Não sei exatamente quantas pessoas pereceram. Não é esse o problema: aberta a porta à acusação dos conspiradores, que impediam a História de seguir o rumo que devia, tanto podia morrer um como morrerem todos.
              A priori toda a ideologia é perversa, pois, na bela expressão de Henrique Barrilaro Ruas, é “o pensamento a substituir-se ao conhecimento”, ou, se preferirmos, o λόγος ou razão humana a tomar o lugar do Λόγος, o Verbo Divino, num vão esforço para recriar o mundo — vão porque nenhuma ideia humana possui a potência criadora do Λόγος, por Quem todas as coisas foram feitas (Jo, 1, 3). A ideologia implica, frequentemente, que para que se salve a Ideia, pereça o Homem — e assim sucedeu e voltará a suceder sempre que à realidade das coisas se antepuser qualquer ideia humana transformada em deusa, por elevada e nobre que possa ser, como as de igualdade, de liberdade ou de justiça social.
              Felizmente para os nossos irmãos anónimos, é difícil achar para uma epidemia um bode expiatório. Nem os americanos a podem imputar ao Irão, nem os proletários aos seus exploradores, nem os nazis aos judeus, nem os burgueses aos indesejáveis comunistas…

(continua, são no total VII reflexões)

ESTADO DE EMERGÊNCIA CRISTÃ

Uma proposta diária de oração pessoal e familiar.

34º Dia. Terça-feira da segunda semana da Páscoa, 21 de Abril de 2020.

Meditação da Palavra de Deus (Jo 3, 7b-15)

Nascer de novo!

No seguimento daquela conversa de Jesus com Nicodemos, Nosso Senhor disse-lhe, com insistência, que era preciso nascer de novo. Não se limitou a propor um simples recomeço, nem uma mera alteração de vida, mas um novo nascimento. Nicodemos chegou a pensar que tinha que regressar ao ventre materno para, de novo, renascer, mas não era a isso que Jesus se referia.

Fazem dó aquelas pessoas que não se arrependem de nada do seu passado, ou que, como agora se diz, tudo assumem. É uma atitude de uma enorme soberba e total cegueira espiritual. Quem fizer um breve exame de consciência, imediatamente se dará conta de tantas coisas que fez mal, ou que não devia ter feito, ou que devia ter feito e não fez, ou devia ter feito melhor de como as fez, etc. Um cristão, que olhe com sinceridade para o seu passado, que só pode ter um desejo: o de recomeçar uma nova vida! Mas, como poderá ser nova essa vida se continua, cá dentro, o homem velho de que já São Paulo se queixava?! Como posso ser outro, continuando a ser eu mesmo?! Não é isso uma irresolúvel contradição?

Em termos meramente humanos, é óbvio que ninguém pode nascer de novo, nem recuar no tempo da sua vida: o relógio não retrocede, nem pára, está sempre a avançar, em direção ao futuro. Também não podemos despir a nossa personalidade, para sermos, noutro tempo e lugar, um ser diferente, como pressupõe, sem nenhum fundamento científico e contrariando a Bíblia, os falsos profetas da reencarnação. Mas sim, podemos renascer!

A absolvição sacramental, depois de uma confissão íntegra e contrita, não apenas apaga os pecados cometidos e confessados, como os elimina de uma vez por todas. Por isso, a pessoa que acaba de receber o perdão dos seus pecados, sendo a mesma que antes se confessou, é também diametralmente diferente dela, porque começou uma nova vida, ou seja, nasceu de novo! É ela mesma, mas sem nada do que tanto a entristecia e entristecia Nosso Senhor, como também o curado de uma doença grave é a mesma pessoa que a padeceu, mas agora sem essa horrível enfermidade.

Quando as tuas faltas e pecados pesarem no teu coração, quando as tuas próprias infidelidades onerarem a tua consciência, não desesperes nem desanimes, mas vai confessar-te. Aí, ao abrires o teu coração, troca a tua vida velha e cheia de pecados pela vida nova e cheia de virtudes que Jesus te oferece no Sacramento da Penitência. E então sim, como Nicodemos, terás nascido de novo.

Intenções para os mistérios dolorosos do Santo Rosário de Nossa Senhora:

1º - A oração de Jesus no horto. Triste sonolência a dos apóstolos, que os leva dormir quando deveriam rezar. Rezemos por todos os que são tíbios, para que o Senhor os desperte para a verdadeira devoção.

2º - A flagelação de Jesus. Todos os pecados trazem consigo a sua própria penitência: quanto sofrimento experimentarão os que agora são escravos da sua luxúria. Rezemos pela sua conversão!

3º - A coroação de espinhos. A coroa é um símbolo de riqueza e de poder e quantos, por adorarem esses ídolos, comprometem a sua salvação. Rezemos por todos os que vivem apegados aos bens da terra.

4º - Jesus com a cruz às costas. O sofrimento, quando vivido com cristã resignação, é caminho para o Céu. Rezemos por todos os doentes, para que o seu sofrimento não os leve a cair em desesperação.

5º - Jesus morre na Cruz. Todos os que lidam com os moribundos – familiares, médicos, amigos, etc. – têm um dever grave de os preparar para o iminente encontro com Deus. Rezemos por todos os agonizantes, para que não lhes falte essa ajuda.

Para ler, meditar e partilhar! Obrigado e até amanhã, se Deus quiser!

Com amizade,
P. Gonçalo Portocarrero de Almada

O perdoar versus desculpar

«O perdão tem o seu caminho interior, perdão é cura, ou seja, exige o retorno à verdade. Quando não o faz, o perdão transforma-se numa aprovação da autodestruição, entra em contradição com a verdade, e dessa forma com o amor»

(Joseph Ratzinger - Olhar para Cristo)

«Para “desculpar” é preciso agora entender o mal reduzido a bagatela; eu deixo que uma coisa “seja boa”, embora sendo má.»

«…só se pode perdoar uma coisa expressamente considerada má e cuja negatividade precisamente não é ignorada (…). Por outro lado, o perdão pressupõe que o outro condena (“arrepende-se”) o que fez e que além disso aceita o perdão»

(J. Pieper citado em nota de rodapé pág. 103 de Olhar para Cristo – Joseph Ratzinger)

A FALTA DE TEMPO!

Aquela pessoa vagamente conhecida, chegou perto dele logo pela manhã e disse-lhe:

- Sabe, preciso de conversar um pouco. Preciso de desabafar. Ando tão sozinha e tão preocupada! Podemos conversar um pouco?

Fez um gesto de enfado e apressadamente disse:

- Agora não posso. Estou muito ocupado. Outro dia talvez. Depois telefone-me.

Afastou-se rapidamente e como cristão que é, olhou para o Céu e rezou:

- Senhor, desculpa, mas sabes bem que agora não tenho tempo!

Um pouco mais tarde na rua alguém lhe estendeu a mão.
Tentou disfarçar, mas era difícil, e então, entre dentes, disse para o pedinte um pouco incomodado:
- Desculpe, mas agora não tenho tempo. Fica para a outra vez!
Mais uma vez olhou para o Céu e rezou:
- Senhor, desculpa, mas sabes bem que agora não tenho tempo!

Finalmente no escritório, já sentado, bateram à porta e ele mandou entrar.
Era um dos seus empregados, talvez o mais tímido de todos, que lhe disse:
- Estou com um grave problema familiar. Preciso de ajuda. Pode ouvir-me por um instante.
Mesmo sem levantar os olhos dos seus papéis, falou num tom condescendente:
- Oh, homem, agora não que estou muito ocupado. Mas volte mais tarde.
Assim que se fechou a porta levantou mais uma vez os olhos ao Céu e repetiu:
- Senhor, desculpa, mas sabes bem que agora não tenho tempo!

Ao fim da tarde, chegou a casa e a mulher disse-lhe preocupada:
- Precisamos de falar por causa de uns problemas da nossa família.
Olhou para ela e disse com um ar enfadado:
- Ainda agora cheguei a casa! Tem paciência deixa-me descansar um pouco.
Temos tempo para falar.
E afastando-se para o quarto, mais uma vez olhou para o Alto e rezou novamente:
- Senhor, desculpa, mas sabes bem que agora não tenho tempo!

Pouco depois, sentado na sala, frente à televisão, chegou o seu filho que lhe dá um beijo, dizendo:
- Oh pai, quero falar contigo por causa de uma coisa que aconteceu hoje na escola e me preocupa muito.
Sem tirar os olhos da televisão, dirigiu-se ao filho de uma maneira algo ríspida:
- Caramba, será que nem sequer posso ver as notícias na televisão? Com certeza que isso pode esperar, não?
O filho saiu cabisbaixo da sala e ele olhando mais uma vez para cima rezou:
- Senhor, desculpa, mas sabes bem que agora não tenho tempo!

Chega agora a sua hora de deitar.
Enquanto caminha para o quarto sente uma dor aguda no peito e percebe que o seu coração está a falhar.
Levanta os olhos ao Céu e reza angustiadamente:
- Senhor preciso de Ti! Ajuda-me depressa!
Ouve então uma Voz que lhe diz calmamente, repassada de amor:
- Não sei que resposta esperavas de Mim, mas para ti, meu filho, estou sempre, sempre disponível, e pronto a ouvir-te e ajudar-te!

Monte Real, 25 de Março de 2010


Joaquim Mexia Alves
http://queeaverdade.blogspot.com/2010/04/falta-de-tempo.html

Santo Anselmo de Cantuária, bispo, Doutor da Igreja, †1109

Santo Anselmo nasceu em Aosta, no Piemonte, em 1033. Educado pelos beneditinos, quis abraçar a vida monástica. Diante da oposição do pai (conde Gondulfo) desistiu momentaneamente da ideia. Aos 20 anos, perante a impertinência do pai, saiu do castelo com um burro e um criado, fugindo assim da casa paterna. Aventurou-se pela Borgonha, França e Normandia. Sempre sedento de conhecimentos, aos 27 anos ingressou no mosteiro de Bec. Era lá professor Lanfranc de quem se dizia que "sabia a gramática como Herodiano, a dialéctica como Aristóteles, a retórica como Cícero e a Sagrada Escritura como S. Jerónimo e Santo Agostinho". Mais tarde veio a suceder a Lanfranc. Era o ano 1060. Foi nomeado abade de Bec e posteriormente, arcebispo de Cantuária. Estava-se em 1090. Santo Anselmo exerceu grande influência intelectual no seu tempo, dando à teologia foros de ciência, válida por si mesma. É considerado, pois, o fundador da ciência teológica no Ocidente. Partiu para o Paraíso no dia 21 de Abril de 1109.