sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Homilia Santo Padre na Solenidade da Epifania do Senhor

Imagem da mesma data em 2015
«Onde está o Rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-Lo» (Mt 2, 2).

Com estas palavras, os Magos, que vieram de terras distantes, dão-nos a conhecer o motivo da sua longa caminhada: adorar o Rei recém-nascido. Ver e adorar são duas ações que sobressaem na narração evangélica: vimos uma estrela e queremos adorar.

Estes homens viram uma estrela, que os pôs em movimento. A descoberta de algo inusual, que aconteceu no céu, desencadeou uma série inumerável de acontecimentos. Não era uma estrela que brilhou exclusivamente para eles, nem possuíam um DNA especial para a descobrir. Como justamente reconheceu um Padre da Igreja, os Magos não se puseram a caminho porque tinham visto a estrela, mas viram a estrela porque se tinham posto a caminho (cf. João Crisóstomo). Mantinham o coração fixo no horizonte, podendo assim ver aquilo que lhes mostrava o céu, porque havia neles um desejo que a tal os impelia: estavam abertos a uma novidade.

Os Magos dão-nos, assim, o retrato da pessoa crente, da pessoa que tem nostalgia de Deus; o retrato de quem sente a falta da sua casa: a pátria celeste. Refletem a imagem de todos os seres humanos que não deixaram, na sua vida, anestesiar o próprio coração.

Esta nostalgia santa de Deus brota no coração crente, porque sabe que o Evangelho não é um acontecimento do passado, mas do presente. A nostalgia santa de Deus permite-nos manter os olhos abertos contra todas as tentativas de restringir e empobrecer a vida. A nostalgia santa de Deus é a memória crente que se rebela contra tantos profetas de desgraça. É esta nostalgia que mantém viva a esperança da comunidade crente que implora, semana após semana, com estas palavras: «Vinde, Senhor Jesus!»

Era precisamente esta nostalgia que impelia o velho Simeão a ir ao Templo todos os dias, tendo a certeza de que a sua vida não acabaria sem ter nos braços o Salvador. Foi esta nostalgia que impeliu o filho pródigo a sair duma conduta autodestrutiva e procurar os braços de seu pai. Era esta nostalgia que sentia no seu coração o pastor, quando deixou as noventa e nove ovelhas para ir à procura da que se extraviara. E foi também o que sentiu Maria Madalena na madrugada do Domingo de Páscoa, fazendo-a correr até ao sepulcro e encontrar o seu Mestre ressuscitado. A nostalgia de Deus tira-nos para fora dos nossos recintos deterministas, que nos induzem a pensar que nada pode mudar. A nostalgia de Deus é a disposição que rompe com inertes conformismos, impelindo a empenhar-nos na mudança que anelamos e precisamos. A nostalgia de Deus tem as suas raízes no passado, mas não se detém lá: vai à procura do futuro. Impelido pela sua fé, o crente «nostálgico» vai à procura de Deus, como os Magos, nos lugares mais recônditos da história, pois está seguro, em seu coração, de que lá o espera o Senhor. Vai à periferia, à fronteira, aos lugares não evangelizados, para poder encontrar-se com o seu Senhor; e não o faz, seguramente, numa atitude de superioridade, mas como um mendigo que se dirige a alguém aos olhos de quem a Boa Nova é um terreno ainda a explorar.

Entretanto no palácio de Herodes que distava poucos quilómetros de Belém, animados de procedimento oposto, não se tinham apercebido do que estava a acontecer. Enquanto os Magos caminhavam, Jerusalém dormia; dormia em conluio com Herodes que, em vez de andar à procura, dormia também. Dormia sob a anestesia duma consciência cauterizada. E ficou perturbado; teve medo. É aquela perturbação que leva a pessoa, à vista da novidade que revoluciona a história, a fechar-se em si mesma, nos seus resultados, nos seus conhecimentos, nos seus sucessos. A perturbação de quem repousa na riqueza, incapaz de ver mais além. É a perturbação que nasce no coração de quem quer controlar tudo e todos; uma perturbação própria de quem vive imerso na cultura que impõe vencer a todo o custo, na cultura onde só há espaço para os «vencedores» e a qualquer preço. Uma perturbação que nasce do medo e do temor face àquilo que nos interpela, pondo em risco as nossas seguranças e verdades, o nosso modo de nos apegarmos ao mundo e à vida. E assim Herodes teve medo, e aquele medo levou-o a procurar segurança no crime: «Necas parvulos corpore, quia te necat timor in corde – matas o corpo das crianças, porque o temor te matou o coração» (São Quodvultdeus, Sermo 2 de SymboloPL 40, 655).

Queremos adorar. Aqueles homens vieram do Oriente para adorar, decididos a fazê-lo no lugar próprio de um rei: no Palácio. E isto é importante: aqui chegaram eles com a sua busca; era o lugar idóneo, porque é próprio de um rei nascer num palácio, ter a sua corte e os seus súditos. É sinal de poder, de êxito, de vida bem-sucedida. E pode-se esperar que o rei seja reverenciado, temido e lisonjeado; mas não necessariamente amado. Estes são os esquemas mundanos, os pequenos ídolos a quem prestamos culto: o culto do poder, da aparência e da superioridade. Ídolos que prometem apenas tristeza, escravidão, medo.

E foi lá precisamente onde começou o caminho mais longo que tiveram de fazer aqueles homens vindos de longe. Lá teve início a ousadia mais difícil e complicada: descobrir que não se encontrava no Palácio aquilo que procuravam, mas estava noutro lugar: e não só geográfico, mas também existencial. Lá não veem a estrela que os levava a descobrir um Deus que quer ser amado, e isto só é possível sob o signo da liberdade e não da tirania; descobrir que o olhar deste Rei desconhecido – mas desejado – não humilha, não escraviza, não aprisiona. Descobrir que o olhar de Deus levanta, perdoa, cura. Descobrir que Deus quis nascer onde não o esperávamos, onde talvez não o quiséssemos; ou onde muitas vezes o negamos. Descobrir que, no olhar de Deus, há lugar para os feridos, os cansados, os maltratados, os abandonados: que a sua força e o seu poder se chamam misericórdia. Como é distante, para alguns, Jerusalém de Belém!

Herodes não pode adorar, porque não quis nem pôde mudar o seu olhar. Não quis deixar de prestar culto a si mesmo, pensando que tudo começava e terminava nele. Não pôde adorar, porque o seu objetivo era que o adorassem a ele. Nem sequer os sacerdotes puderam adorar, porque sabiam muito, conheciam as profecias, mas não estavam dispostos a caminhar nem a mudar.

Os Magos sentiram nostalgia, não queriam mais as coisas usuais. Estavam habituados, dominados e cansados dos Herodes do seu tempo. Mas lá, em Belém, havia uma promessa de novidade, uma promessa de gratuidade. Lá estava a acontecer algo de novo. Os Magos puderam adorar, porque tiveram a coragem de caminhar e, prostrando-se diante do pequenino, prostrando-se diante do pobre, prostrando-se diante do inerme, prostrando-se diante do insólito e desconhecido Menino de Belém, lá descobriram a Glória de Deus.

São Josemaría Escrivá nesta data em 1956

Epifania do Senhor. “Ao entrarem em casa, viram o Menino com Maria, sua Mãe. Nossa Senhora não se separa do seu Filho. Os Reis Magos não são recebidos por um rei sentado no trono, mas por um Menino nos braços da Mãe. Peçamos, pois, à Mãe de Deus, que é nossa Mãe, que nos prepare o caminho que conduz à plenitude do amor: Cor Mariæ dulcissimum, iter para tutum! O seu suave coração conhece o caminho mais seguro para encontrarmos Cristo”

'Profetas há muitos'

São deste tipo alguns políticos, que nunca conseguiram ser eleitos, alguns ex-governantes ressabiados por terem sido apeados do poder

É infalível como o destino: sempre que se conclui um ano surgem, a par das inevitáveis retrospectivas fotográficas, as profecias para o novo ciclo. Nas rádios e televisões, nos jornais e nos blogues, não há quem não dê o seu palpite, mais ou menos sábio ou prudente. Os vaticínios são de todo o tipo: desde as ponderadas análises dos comentadores oficiosos, até às aldrabices dos tolos, no seu estado mais puro e bruto.

O que há mais, sobretudo na comunicação social, é profetas de desgraças, porque a desgraça vende bem. Por exemplo, a esperada pandemia da gripe A foi manchete, até ao seu estrepitoso malogro. O aquecimento global deu que falar mas, mais uma vez, a montanha pariu um rato e, mesmo esse, simplesmente morno. Também a ameaçadora gripe das aves, que tinha todos os ingredientes para ser a peste bubónica do terceiro milénio, não resultou, porque as ditas não aderiram, ou porque tinham sido prevenidas, ou porque já estavam vacinadas. Mas uma catástrofe é sempre um bom negócio, um óptimo produto mediático e, por isso, os correspondentes profetas têm sempre assegurada a mais ampla publicidade para os seus tremendos augúrios

Dados estes e outros insucessos, há quem prefira apostar em vaticínios seguros, para garantir o negócio e a fidelização da clientela. Sem cair no exagero do provérbio – «chuva em Novembro, Natal em Dezembro» – cuja autenticidade os especialistas em sabedoria popular não confirmam, os astrólogos cultivam um tipo de profecias deste género. As suas previsões são sempre cautelosas e infalíveis: «nesta semana, importa cuidar da sua saúde!». Não se pense que é fácil acertar no horóscopo de um determinado signo pois que, embora pareça uma verdade de La Palice, na realidade esconde um profundo conhecimento do futuro. E, por incrível que pareça, dá sempre certo. Formidável, não é? É o que dá ser a astrologia uma ciência exacta.

Outro tipo de profecias muito em voga e não menos certeiras, são as retroactivas. Nestes casos, como o próprio nome esclarece, o prudente visionário, já não necessariamente um vidente encartado, não se antecipa ao facto mas, uma vez verificado o acontecimento, afirma triunfalmente: «eu sempre disse que isto ia acontecer!». Se o não disse logo que teve essa premonitória intuição, não foi por cobardia ou acanhamento, mas para poupar aos outros a humilhação correspondente.

Não é menos corrente a modalidade portuguesa, o adivinho lusitano, vulgus velho do Restelo. Requer-se, para o caso, uma voz grave, cheia de enigmáticos silêncios, a apontar para fatídicos malefícios: «Isto vai mal!». E, caso alguém manifeste alguma incredulidade ante o seu pessimismo crónico, o profeta nacional não só não desiste como insiste: «Isto está muito mal!». E está tudo dito.

São deste tipo alguns políticos, que nunca conseguiram ser eleitos, alguns ex-governantes ressabiados por terem sido apeados do poder e que, por isso, agora barafustam contra o escândalo da governação. Também os há nas lides desportivas: são os treinadores de bancada que, mesmo sem nunca terem dado nenhum pontapé na bola, marcam imaginários golos na grande área do seu lúcido e profético discernimento, ao mesmo tempo que se insurgem contra a inépcia dos jogadores em campo, pela sua manifesta incapacidade de realização das suas geniais tácticas. Para já não falar das menos canónicas referências ao treinador titular, ao árbitro e respectivas progenitoras.

Decididamente, o nosso problema não é de falta de profecias, nem de profetas de mau agoiro. Falta apenas quem trabalhe e, já agora, quem saiba apoiar e animar os órgãos de soberania, a administração pública, a família, o ensino, as empresas e todos os âmbitos da actividade humana. Em poucas palavras, a selecção que somos todos nós.

Gonçalo Portocarrero de Almada

O Evangelho do dia 6 de janeiro de 2017

Jesus, quando começou o Seu ministério, tinha cerca de trinta anos, sendo filho, como se julgava, de José, filho de Heli, filho de Matã, filho de Levi, filho de Melqui, filho de Jane, filho de José, filho de Matatias, filho de Amós, filho de Naum, filho de Hesli, filho de Nagé, filho de Maat, filho de Matatias, filho de Semei, filho de Josech, filho de Jodá, filho de Joanão, filho de Resa, filho de Zorobabel, filho de Salatiel, filho de Neri, filho de Melqui, filho de Adi, filho de Cosão, filho de Elmadão, filho de Er, filho de Jesus, filho de Eliezer, filho de Jorim, filho de Matã, filho de Levi, filho de Simeão, filho de Judá, filho de José, filho de Jonão, filho de Eliacim, filho de Meleá, filho de Mená, filho de Matatão, filho de Natão, filho de David, filho de Jessé, filho de Obed, filho de Booz, filho de Salá, filho de Naasson, filho de Aminadab, filho de Admin, filho de Arni, filho de Esron, filho de Farés, filho de Judá, filho de Jacob, filho de Isaac, filho de Abraão, filho de Taré, filho de Nacor, filho de Seruch, filho de Ragau, filho de Falec, filho de Eber, filho de Salá, filho de Cainão, filho de Arfaxad, filho de Sem, filho de Noé, filho de Lamech, filho de Matusalém, filho de Henoch, filho de Jared, filho de Maleleel, filho de Cainão, filho de Enós, filho de Set, filho de Adão, filho de Deus.

Lc 3, 23-38