UNIÃO DE VIDA ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO

A questão da consagração legal da união de vida entre pessoas do mesmo sexo toca em sentimentos profundos.

De um lado, o sentimento dos homossexuais. A sociedade impressiona-se com a sua arrogância, com o seu excesso, com a sua intolerância, até, mas é preciso perceber o contexto de onde tudo isso emerge: uma longa história de desconsideração social, proscritos, discriminados, ridicularizados, 'desamados'.

Há 40 anos, desde que cresci, que me comove a solidão abandonada e secreta da generalidade dos meus amigos e amigas homossexuais. Revolta-me a sentença social de uma vida irreconhecida, a condenação à vergonha, deles e dos pais.

Como crente, não acredito que Deus, que é Amor ou não é, queira uma condenação social de vida assim. Cabe-me, enquanto ser humano, calcular e integrar um plano de Deus em que, aceitando a diferença, acolho o outro até onde se joga a sua dignidade e a minha se não perde.

De outro lado, o sentimento profundo de todos os que entendem que o instituto secular do casamento, como união de amor entre homem e mulher, expressa o sentido de referência do natural, o ideal de família e define nuclearmente a nossa matriz civilizacional. Tal como está no Código Civil: "Contrato entre duas pessoas de sexo diferente que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida".

Nem pessoas do mesmo sexo, nem mais de duas pessoas.

Separando a ordem espiritual da ordem temporal, a questão está em saber o que deve ser feito, na ordem civil, para acolher a dignidade dos homossexuais que pretendem unir as suas vidas.

Subverter o contrato nuclear da nossa ordem social, o casamento, é mexer com realidades e sentimentos profundos, demasiado profundos.

Se esse fosse um passo coerente e necessário para respeitar a dignidade dos homossexuais, a sociedade devia ponderar dá-lo. Mas não é.

Reclamam alguns homossexuais que se trata de ocupar, plenamente, o espaço do simbólico. Se os heterossexuais têm o direito de casar, é o direito de casar que os homossexuais deverão também ter.

Os símbolos valeriam se fossem realidades idênticas, mas não são. São idênticas na união de afectos humanos, na partilha de intimidade, no propósito de comunhão de vida.

Mas são decisivamente diferentes no projecto de família que encerram, no enquadramento para o desenvolvimento da personalidade das crianças, na tendência natural geradora de vida e na própria diferença entre sexos, diferença que, em si mesma, faz toda a diferença.

Regular a união de vida entre homossexuais através do regime da união de facto, como alguns defendem, acho insuficiente, legal e simbólico.

Há, assim, que criar um contrato novo. Chamar-lhe-ia união civil. A união civil entre pessoas do mesmo sexo, com normas próprias. O Direito é uma ciência especializada em distinguir o que é próximo.

(...) propor a criação na ordem jurídica de um novo contrato, que acolhesse a diferença e disciplinasse, reflectindo essa mesma diferença, a união de vida entre pessoas do mesmo sexo.

António Pinto Leite em 2009


NOTA: o editor do blogue subscreve na integra e sem reservas o texto acima, excepto que para ele Deus é amor, ponto final parágrafo.

«Procuravam, então, prendê-Lo, mas ninguém Lhe deitou a mão»

São João da Cruz (1542-1591), carmelita descalço, doutor da Igreja 
Cântico espiritual, estrofe 1 (Obras Completas, Ed. Carmelo, 2005)

Aonde Te escondeste, 
Amado, e me deixaste num gemido? 
Qual veado fugiste 
Havendo-me ferido. 
Atrás de Ti clamei, tinhas partido!

É como se dissesse: «Ó Verbo, meu Esposo, mostra-me o lugar onde estás escondido!» Deste modo, está a pedir que lhe mostre a sua essência divina, porque o lugar onde o Filho de Deus está escondido é, como diz São João, o seio do Pai (Jo 1,18), que é a essência divina, a qual permanece longe dos olhos mortais e escondida a todo o entendimento humano. Por isso, Isaías, falando de Deus, disse. «Na verdade, Vós sois um Deus escondido» (Is 45,15).

Advirta-se, portanto, que, por maiores comunicações, presenças, notícias sublimes e elevadas de Deus que uma alma possa ter nesta vida, isso não é essencialmente Deus nem tem a ver com Ele; na verdade, está ainda escondido à alma. É por isso que, além de todas essas grandezas, convém sempre à alma tê-lO por escondido e buscá-lO como escondido dizendo: «Aonde Te escondeste?» De facto, nem a comunicação elevada nem a presença sensível são uma demonstração clara da presença graciosa de Deus; nem tampouco a secura e carência de tudo isso na alma demonstra a Sua ausência. Daí que o profeta Job tenha dito: «Passa diante de mim e eu não O vejo, afasta-Se de mim e não me apercebo (Jb 9,11).

Desta maneira dá-se a entender que se a alma sentir uma grande comunicação, ou sentimento ou notícia espiritual, nem por isso se há-de convencer de que aquilo que sente consiste em possuir ou ver nítida e essencialmente a Deus, ou que seja possuir mais a Deus ou estar mais em Deus, por muito forte que seja. De igual modo, não deve pensar que, se todas essas comunicações sensíveis e espirituais lhe vierem a faltar, ficando às escuras, em aridez e abandono, Deus lhe falta. [...] Portanto, neste verso, a intenção principal da alma não consiste em pedir apenas a devoção afectiva e sensível, onde não é certo nem claro possuir-se o Esposo, mas, sobretudo, pedir a presença e a visão clara da Sua essência, da qual quer ter a certeza e a consolação na outra vida.

O Evangelho do dia 20 de março de 2015

Depois disto, andava Jesus pela Galileia; não queria andar pela Judeia, visto que os judeus O queriam matar. Estava próxima a festa dos judeus chamada dos Tabernáculos. Jesus respondeu-lhes: «Já vo-lo disse, e vós não Me credes. As obras que faço em nome de Meu Pai, essas dão testemunho de Mim; porém vós não credes, porque não sois das Minhas ovelhas. As Minhas ovelhas ouvem a Minha voz, e Eu conheço-as, e elas seguem-Me. Eu dou-lhes a vida eterna; elas jamais hão-de perecer, e ninguém as arrebatará da Minha mão. Meu Pai, que Mas deu, é maior que todas as coisas; e ninguém pode arrebatá-las da mão de Meu Pai. Eu e o Pai somos um».

Jo 7, 1-2.10.25-30