«Eis um novo ensinamento, e feito com autoridade!»

São Boaventura (1221-1274), franciscano, Doutor da Igreja
Sermão «Christus unus omnium magister»

Não se pode chegar à certeza da fé revelada senão pelo advento de Cristo no espírito. Cristo vem seguidamente na carne, como palavra que confirma toda a palavra profética. Foi por isso que foi dito aos Hebreus: «Muitas vezes e de muitos modos falou Deus a nossos pais, noutros tempos, pelos profetas; nestes tempos, que são os últimos, Deus falou-nos por meio de Seu Filho» (1, 1-2). Com efeito, Cristo é a Palavra do Pai, cheio de poder, e quem pode dizer-Lhe: «Por que fazes isto?». Cristo é também uma palavra cheia de verdade, mais ainda, é a própria verdade, segundo aquilo que diz São João: «Santifica-os na verdade, a Tua palavra é a verdade» (17, 17). [...]

Assim, e dado que a autoridade pertence à palavra poderosa e verídica, e que Cristo é o Verbo do Pai, sendo por isso Poder e Sabedoria, assim está Nele fundada e consumida toda a firmeza da autoridade. É por isso que toda a doutrina autêntica e os pregadores desta doutrina se relacionam com Cristo, que veio na carne como fundamento de toda a fé cristã: «Segundo a graça que me foi dada, eu, como sábio arquitecto, coloquei o alicerce [...]. Mas ninguém pode pôr outro fundamento diferente do que foi posto, isto é, Jesus Cristo» (1Cor 3, 10-11). Com efeito, só Ele é o fundamento de toda a doutrina autêntica, quer apostólica, quer profética, de acordo com uma e outra Lei, a nova e a antiga. Foi por isso que foi dito aos Efésios: «Fostes edificados sobre o alicerce dos Apóstolos e dos Profetas, com Cristo por pedra angular» (2, 20). É pois claro que Cristo é o Senhor do conhecimento segundo a fé; Ele é o Caminho, de acordo com a Sua dupla vinda, em espírito e na carne.

O Evangelho de Domingo dia 1 de fevereiro de 2015

Depois foram a Cafarnaum; e Jesus, tendo entrado no sábado na sinagoga, ensinava. Os ouvintes ficavam admirados com a Sua doutrina, porque os ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas. Na sinagoga estava um homem possesso dum espírito imundo, que começou a gritar: «Que tens que ver connosco, Jesus de Nazaré? Vieste para nos perder? Sei Quem és, o Santo de Deus». Mas Jesus o ameaçou dizendo: «Cala-te, e sai desse homem!». Então o espírito imundo, agitando-o violentamente e dando um grande grito, saiu dele. Ficaram todos tão admirados, que se interrogavam uns aos outros: «Que é isto? Que nova doutrina é esta? Ele manda com autoridade até nos espíritos imundos, e eles obedecem-Lhe». E divulgou-se logo a Sua fama por toda a região da Galileia.

Mc 1, 21-28

«Porque sois tão medrosos?»

Santa Faustina Kowalska (1905-1938), religiosa 
Diário (Fátima, 2003), 1322


Vagueia, da minha vida, a barca,
Entre as sombras da noite e escuridão
E de terra não vejo marca,
Encontro-me num mar de imensidão.

A menor procela me pode afundar,
Mergulhando meu barco no turbilhão;
Se, ó Deus, por mim não estivésseis a velar,
A cada instante da vida, a cada ocasião.

Entre o estrondo da sondas, ululante
Navego tranquila e como quem confia,
E olho, infantil para o mais distante,
Porque vós, ó Jesus, sois o meu Guia.

À minha volta o terror do mar e o pavor
Mais que horror da minh’alma, a serenidade.
Porque quem convosco está não perecerá, Senhor,
Disso me assegura a divina caridade.

Cercam-me perigos, muitos em voragem,
Mas não temo, olho para o céu estrelado
E navego com alegria e coragem,
Como convém a um coração purificado.

Se a barca da minha vida vai em serenidade,
É, acima de tudo, por uma razão:
Por serdes vós, ó Deus, o meu guardião.
Eis meu testemunho de inteira humildade.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 31 de janeiro de 2015

Naquele mesmo dia, ao cair da tarde, disse-lhes: «Passemos à outra margem». Eles, deixando a multidão, levaram-n'O consigo, assim como estava, na barca. Outras embarcações O seguiram. Então levantou-se uma grande tempestade de vento, e as ondas lançavam-se sobre a barca, de tal modo que a barca se enchia de água. Jesus estava na popa a dormir sobre um travesseiro. Acordaram-n'O e disseram-Lhe: «Mestre, não Te importas que pereçamos?». Ele levantou-Se, ameaçou o vento e disse para o mar: «Cala-te, emudece». O vento amainou e seguiu-se uma grande bonança. Depois disse-lhes: «Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?». Ficaram cheios de grande temor, e diziam uns para os outros: «Quem será Este, que até o vento e o mar Lhe obedecem?». 

Mc 4, 35-41

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

“Para superar a letargia” (brevíssimos excertos conferência D. Gerhard Müller)


«Uma Igreja que apenas girasse em torno dos seus problemas estruturais, seria terrivelmente anacrónica e alheada do mundo, pois no seu ser e missão não poderá ser senão a Igreja de Deus Trinitário, origem e destino de cada homem e de todo o universo.»

«A Igreja Católica é communio ecclesiarum e não uma federação de Igrejas estatais ou uma aliança mundial de comunidades eclesiais religiosamente relacionadas, que respeita por tradição humana ao Bispo de Roma, como presidente honorário. Nação, língua, cultura, não são princípios constitutivos para a igreja, que testifica e realiza a unidade dos povos em Cristo, mas sim meios essenciais, nos quais é exibida toda a riqueza e a plenitude de Cristo nos redimidos.»

«No entanto a Igreja não é uma organização puramente humana, a pergunta sobre a sua fundação sociojurídica através de um Jesus "histórico", é objectivamente inapropriado e resulta anacrónica a partir de uma hermenêutica teológica da revelação histórica. A igreja, pelo contrário, foi fundada como uma comunidade de vida com Jesus, na Sua natureza divina e na Sua relação filial com o Pai, revelando-se historicamente na Sua atuação enquanto homem, pois na sua pessoa foi anunciado o Reino de Deus.»

(D. Gerhard Ludwig Müller – Perfeito da Congregação da Doutrina da Fé in ‘L’Osservatore Romano’ em 2014 com tradução de JPR a partir da edição em língua espanhola AQUI)

Deus é Pai porque nos escolheu e abençoou antes da criação do mundo

Nem sempre é fácil falar hoje de paternidade, disse o Papa. Sobretudo no mundo ocidental, as famílias desagregadas, os compromissos de trabalho sempre mais exigentes, as preocupações e frequentemente a dificuldade de enquadrar as contas familiares, a invasão dos meios de comunicação de massa são alguns dos factores que podem impedir uma relação serena e construtiva entre pais e filhos.

Muitas vezes a comunicação é difícil, falta confiança e a relação com a figura paterna pode-se tornar problemática; e problemático se torna imaginar Deus como um pai, não tendo modelos adequados de referência. Quem teve a experiência de um pai demasiado autoritário e inflexível, ou indiferente e pouco afetuoso, ou até mesmo ausente, não é fácil pensar com serenidade a Deus como Pai e abandonar-se a Ele em confiança.

Mas a revelação bíblica ajuda-nos a compreender esta relação paterna. Deus é Pai porque nos escolheu e abençoou antes da criação do mundo; nos fez realmente seus filhos em Jesus; porque acompanha nossa existência, dando-nos a sua Palavra, os seus ensinamentos a sua graça e o seu Espírito, e porque podemos confiar no seu perdão quando erramos o caminho. Ele é um Pai bom, que não abandona, mas que ampara, ajuda e salva com uma fidelidade que supera infinitamente a dos homens. Ele deu-nos o seu Filho para que sejamos seus filhos e nos oferece o Espírito Santo para que possamos chamá-lo «Abbá, Pai».

(Bento XVI - Audiência geral de 30.01.2013)

«Estende tanto os ramos, que as aves do céu se podem abrigar à sua sombra»

São Pedro Crisólogo (c. 406-450), bispo de Ravena, doutor da Igreja 
Sermão 98; CCL 24A, 602


Como diz Cristo, o Reino de Deus é como um grão de mostarda. […] Cristo é o Reino: como um grão de mostarda, foi deitado à terra num jardim, o corpo da Virgem. Cresceu e tornou-Se a árvore da cruz que cobre toda a terra. […] Cristo é o Reino, pois nele reside toda a glória do seu reino. E Cristo é o homem, pois o homem na sua totalidade é renovado nele. Cristo é o grão de mostarda, o instrumento de que Deus Se serve para fazer descer toda a sua grandeza em toda a pequenez do homem. Ele próprio Se tornou todas as coisas, para renovar todos os homens nele. Enquanto homem, Cristo recebeu o grão de mostarda que é o Reino de Deus […]; enquanto Deus, possuía-o desde sempre. Ele deitou a semente à terra no seu jardim. […]

O jardim é esta terra cultivada que se estendeu por todo o mundo, lavrada pela charrua da Boa Nova, encerrada pelos limites da sabedoria; os Apóstolos penaram para arrancar todas as ervas daninhas. Dá gosto contemplar as jovens plantas que são os crentes, os lírios que são as virgens e as rosas que são os mártires: flores que dão constantemente o seu perfume.

Cristo semeou, pois, o grão de mostarda no seu jardim. A semente criou raízes quando Ele prometeu o seu Reino aos patriarcas, germinou com os profetas, cresceu com os Apóstolos e tornou-se a árvore imensa que estende os seus longos ramos sobre a Igreja, e lhe prodiga os seus dons. […] Toma as asas de prata da pomba de que fala o Profeta (Sl 67,14). […] Levanta voo para usufruir de um repouso sem fim, fora do alcance dos laços (Sl 90,3), por entre folhagens magníficas. Sê suficientemente forte para assim levantares voo, e vai habitar em segurança nesta vasta morada.

O Evangelho do dia 30 de janeiro de 2015

Dizia também: «O reino de Deus é como um homem que lança a semente à terra. Dorme e se levanta, noite e dia, e a semente germina e cresce sem ele saber como. Porque a terra por si mesma produz, primeiramente a haste, depois a espiga, e por último a espiga cheia de grãos. E, quando o fruto está maduro, mete logo a foice, porque chegou o tempo da ceifa». Dizia mais: «A que coisa compararemos nós o reino de Deus? Com que parábola o representaremos? É como um grão de mostarda que, quando se semeia no campo, é a menor de todas as sementes que há na terra; mas, depois que é semeado, cresce e torna-se maior que todas as hortaliças, e cria ramos tão grandes que “as aves do céu podem vir abrigar-se à sua sombra”». Assim lhes propunha a palavra com muitas parábolas como estas, conforme eram capazes de compreender. Não lhes falava sem parábolas; porém, em particular explicava tudo aos Seus discípulos.

Mc 4, 26-34

Combater o mal

«Uma vez que este inimigo pode mais que nós, devemos aproveitar-nos do ‘escudo da fé’, que é coisa sobrenatural, ouvindo uma palavra de Deus, ou recebendo os Sacramentos, ou meditando a doutrina da Igreja. E crendo firme com o entendimento que Deus pode tudo».

(São João de Ávila - Audi, filia, cap. 30)

«Àquele que tem, será dado; e ao que não tem, mesmo aquilo que tem lhe será tirado»

São Francisco de Assis (1182-1226), fundador da Ordem dos Frades Menores 
Admoestações, 19-22, 28


Feliz o servo que atribui todos os seus bens ao Senhor. Aquele que, pelo contrário, reivindica uma parte para si mesmo, esse esconde dentro de si o dinheiro do Senhor Deus, e o que julga possuir ser-lhe-á tirado (Mt 25,18.28).

Feliz o servo que, quando é felicitado e homenageado pelos homens, não se tem por melhor do que quando o tratam como pessoa vil, simples e desprezível. Porque quanto vale o homem diante de Deus, é isso que ele vale na realidade, e nada mais. […]

Feliz o religioso que não sente prazer nem alegria a não ser nas obras do Senhor, e com elas leva os homens ao amor de Deus com toda a alegria. […] Feliz o servo que não fala para se enaltecer, que não exibe o seu valor e que não está sempre ansioso por tomar a palavra, mas que fala e responde com sabedoria e reflexão. Ai do religioso que, em vez de guardar em seu coração o bem que o Senhor lhe faz, e em vez de deixar que os outros o vejam através das suas obras, o quer mostrar às pessoas por palavras para obter elogios. Com isso recebe a insignificante recompensa que cobiçava, mas os que o ouvem pouco fruto recolhem. […]

Feliz o servo que arrecada, mas no céu (Mt 6,20), o tesouro das graças que o Senhor lhe oferece, e que não anda a apregoá-las aos homens para deles obter recompensa, porque o próprio Altíssimo manifestará as suas obras a quem Lhe aprouver. Feliz o servo que guarda em seu coração os segredos do Senhor.

O Evangelho de dia 29 de janeiro de 2015

Dizia-lhes mais: «Porventura traz-se a lâmpada para se pôr debaixo do alqueire ou debaixo da cama? Não é para ser posta sobre o candelabro? Porque não há coisa alguma escondida que não venha a ser manifesta, nem que seja feita para estar oculta, mas para vir a público. Se alguém tem ouvidos para ouvir, oiça». Dizia-lhes mais: «Atendei ao que ouvis. Com a medida com que medirdes vos medirão a vós, e ainda se vos acrescentará. Porque ao que tem, dar-se-lhe-á ainda mais e ao que não tem, ainda o que tem lhe será tirado».

Mc 4, 21-25

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Dores e alegrias de S. José

A Igreja, seguindo um costume antigo, prepara a festa de S. José, dia 19 de março, dedicando ao Santo Patriarca os sete domingos anteriores a essa festa, lembrando as principais alegrias e dores da vida de S. José. Mais precisamente, foi o Papa Gregório XVI que fomentou a devoção dos sete domingos de São José, concedendo-lhe muitas indulgências, mas o Santo Padre Pio IX outorgou-lhes atualidade perene com o seu desejo de que se recorresse a S. José para acudir à então situação aflitiva da Igreja universal.
Primeira dor: Estando Maria, sua mãe, desposada com José, achou-se ter concebido por obra do Espírito Santo (Mt1,18). Primeira alegria: Um anjo do senhor lhe apareceu em sonhos, e lhe disse: José, filho de David, não temas receber em tua casa Maria, tua esposa, porque o que nela foi concebido é obra do Espírito Santo. Dará à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus (Mt 1, 20-21).
Como é que S. Josemaria imaginava S. José

Eu imagino-o jovem, forte, talvez com alguns anos mais do que a Virgem, mas na pujança da vida e das forças humanas. Sabemos que não era uma pessoa rica; era um trabalhador como milhões de homens no mundo. Exercia o ofício fatigante e humilde que Deus escolheu também para Si quando tomou a nossa carne e viveu trinta anos como uma pessoa mais entre nós.

A Sagrada Escritura diz que José era artesão. Vários Padres acrescentam que foi carpinteiro. Das narrações evangélicas depreende-se a grande personalidade humana de José: em nenhum momento nos aparece como um homem diminuído ou assustado perante a vida; pelo contrário, sabe enfrentar-se com os problemas, superar as situações difíceis, assumir com responsabilidade e iniciativa os trabalhos que lhe são encomendados (Cristo que passa, n. 40).

Papa Francisco na Audiência geral (resumo em português)

Locutor: Na catequese de hoje, refletimos sobre a figura do pai. Trata-se de uma palavra que possui um sentido universal e que é muito cara aos cristãos, pois Jesus nos ensinou a chamar assim a Deus. Hoje, porém, sobretudo na cultura ocidental, o conceito de pai parece estar em crise. Se no passado a paternidade estava ligada ao autoritarismo, agora se passou ao outro estremo: a ausência da figura paterna. Muitos são os jovens que experimentam um sentido de orfandade, não porque não tenham um pai, mas porque está ausente: seja porque se encontra tão concentrado sobre si mesmo e sobre a sua realização pessoal, que acaba se esquecendo da família, seja porque não é capaz de cumprir com o seu papel educativo. Tal ausência é muito nociva aos jovens, pois sem perspectivas e valores, ficam vazios e propensos a buscarem ídolos que preencham os seus corações. Por isso, mais do que nunca, é preciso lembrar a promessa de Jesus: «Não vos deixarei órfãos». Somente através de Cristo a paternidade pode realizar todas as suas potencialidades segundo o plano de Deus, nosso Pai.

Santo Padre:
Rivolgo un cordiale saluto a tutti i pellegrini di lingua portoghese, in particolare al gruppo del Collegio São José, di Coimbra, e ai fedeli dell’Arcidiocesi di Brasilia, accompagnati dai loro pastori. Preghiamo per tutte le famiglie, specialmente per quelle che si trovano in difficoltà, certi che esse sono un dono di Dio nelle nostre comunità cristiane! Dio vi benedica!

Locutor: Saúdo cordialmente todos os peregrinos de língua portuguesa, de modo particular ao grupo do Colégio São José, de Coimbra, e aos fiéis da Arquidiocese de Brasília, acompanhados pelos seus pastores. Rezemos por todas as famílias, especialmente por aquelas que passam por dificuldades, na certeza de que elas são um dom de Deus nas nossas comunidades cristãs. Que Deus vos abençoe!

«Produziu a trinta, a sessenta e a cem por um»

São Cesário de Arles (470-543), monge, bispo 
Sermões ao povo, n°6 passim; SC 175


Irmãos bem amados, quando vos apresentamos uma coisa útil para a vossa alma, que ninguém tente desculpar-se dizendo: «Não tenho tempo para ler, e é por isso que não posso conhecer os mandamentos de Deus nem observá-los.» […] Evitemos as vãs tagarelices e as brincadeiras corrosivas […], e veremos se não temos tempo para consagrar à leitura da Sagrada Escritura. […] Quando as noites são mais longas, haverá alguém capaz de tanto de dormir, que não possa ler ou ouvir ler as Escrituras? […] Pois a luz da alma e seu alimento eterno não é senão a Palavra de Deus, sem a qual o coração não pode nem viver nem ver. […]

O cuidado da nossa alma é semelhante ao cultivo da terra. Assim como para cultivar a terra se arranca de um lado e se extirpa do outro até à raiz para semear o bom grão, o mesmo se deve fazer à nossa alma: arrancar o que é mau e plantar o que é bom; extirpar o que é prejudicial, transplantar o que é útil; desenraizar o orgulho e plantar a humildade; deitar fora a avareza e guardar a misericórdia; desprezar a imoralidade e amar a castidade. […]

Efectivamente, vós sabeis como se cultiva a terra. Em primeiro lugar, arrancam-se as silvas e atiram-se as pedras para longe, seguidamente lavra-se a própria terra, recomeça-se uma segunda vez, uma terceira, e finalmente […] semeia-se. Que seja assim na nossa alma: em primeiro lugar, arranquemos as silvas, ou seja os maus pensamentos; seguidamente retiremos as pedras, isto é, a malícia e a dureza. Por último, lavremos o nosso coração com o arado do Evangelho e a relha da cruz e, quebrado pela penitência, amolecido pela esmola e pela caridade, preparemo-lo para a semente do Senhor […], para que possa receber com alegria a semente da palavra divina e não dar apenas trinta, mas sessenta e cem vezes o seu fruto.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho de dia 28 de janeiro de 2015

Começou de novo a ensinar à beira-mar; e juntou-se à Sua volta tão grande multidão que teve de subir para uma barca e sentar-Se dentro dela, no mar, enquanto toda a multidão estava em terra na margem. E ensinava-lhes muitas coisas por meio de parábolas. Dizia-lhes segundo o Seu modo de ensinar: «Ouvi: Eis que o semeador saiu a semear. E ao semear, uma parte da semente caiu ao longo do caminho, e vieram as aves do céu e comeram-na. Outra parte caiu entre pedregulhos, onde tinha pouca terra, e logo nasceu, por não ter profundidade a terra; mas, quando saiu o sol, foi queimada pelo calor e, como não tinha raíz, secou. Outra parte caiu entre espinhos; e os espinhos cresceram e sufocaram-na e não deu fruto. Outra caiu em terra boa; e deu fruto que vingou e cresceu, e um grão deu trinta, outro sessenta e outro cem». E acrescentava: «Quem tem ouvidos para ouvir, oiça». Quando Se encontrou só, os doze, que estavam com Ele, interrogaram-n'O sobre a parábola. Disse-lhes: «A vós é concedido conhecer o mistério do reino de Deus; porém, aos que são de fora, tudo se lhes propõe em parábolas, para que, olhando não vejam, e ouvindo não entendam; não aconteça que se convertam, e lhes sejam perdoados os pecados». E acrescentou: «Não entendeis esta parábola? Então como entendereis todas as outras? O que o semeador semeia é a palavra. Uns encontram-se ao longo do caminho onde ela é semeada; mas logo que a ouvem vem Satanás tirar a palavra semeada neles. Outros recebem a semente em terreno pedregoso; ouvem a palavra, logo a recebem com alegria, mas não têm raízes em si mesmos, são inconstantes; depois, levantando-se a tribulação ou a perseguição por causa da palavra, sucumbem imediatamente. Outros recebem a semente entre espinhos; ouvem a palavra, mas os cuidados mundanos, a sedução das riquezas e as outras paixões, entrando, afogam a palavra, e ela fica infrutuosa. Aqueles que recebem a semente em terra boa, são os que ouvem a palavra, recebem-na, e dão fruto, um a trinta, outro a sessenta, e outro a cem por um».

Mc 4, 1-20

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Kon-Katidral ta’ San Ġwann - La Valetta - Malta

A Igreja de São João, mais conhecida como Co-Catedral de S. João (em maltês: Kon-Katidral ta’ San Ġwann), localizada em La Valetta, Malta, foi construída pelos Cavaleiros de S. João entre 1573 e 1578. Incumbida pelo Grão-Mestre Jean de la Cassière em 1572 como igreja conventual da Ordem dos Cavaleiros de S. João do Hospital - conhecidos como Hospitalários ou Cavaleiros de Malta, a Igreja foi desenhada pelo arquitecto militar maltês Gerolamo Cassar que delineou alguns dos edifícios mais proeminentes de La Valetta.

O exterior austero da Catedral, construída imediatamente após o Grande Cerco de 1565, possui reminiscências de um forte militar. O exterior austero da Catedral, construída imediatamente após o Grande Cerco de 1565, possui reminiscências de um forte militar.

O interior, em grande contraste com a fachada, é extremamente ornamentado [1] e foi decorado no auge do período Barroco. O interior foi largamente decorado por Mattia Preti, artista da Calábria e Cavaleiro da Ordem. Preti traçou as complexas paredes de pedra, pintou os tectos abobadados e os altares laterais parecem ao com cenas da vida de S. João. Curiosamente, as figuras pintadas no tecto junto a cada coluna para o espectador parecem inicialmente estátuas a 3 dimensões, mas, sob olhar atento, vemos que o artista criou astutamente a ilusão de uma tridimensionalidade através do uso e da colocação das sombras. Também digno de nota é o facto de que todo o entalhe foi realizado no local (in situ) em vez de as partes terem sido entalhadas de forma independente e, em seguida, ligadas às paredes (através de estuque). O calcário maltês de que a catedral é construída presta-se particularmente bem a estas esculturas intrincadas.

Próximo da entrada principal encontra-se o monumento funerário do Grão-Mestre Fra Marc'Antonio Zondadari de Siena, sobrinho do Papa Alexandre VII.

A Catedral contem oito ricas capelas, cada uma das quais dedicada ao santo padroeiro das 8 línguas (secção ou origens) dos Cavaleiros da Ordem. Do lado esquerdo da igreja encontram-se as seguintes capelas:

A Capela da Liga Anglo-Bávara, outrora conhecida como a Capela da Relíquia, onde os Cavaleiros costumavam manter as relíquias que tinham adquirido ao longo dos séculos.

A Capela da Provença é dedicada a S. Miguel.

A Capela de França é dedicada à Conversão de S. Paulo. Esta capela foi modificada no século XIX. Encontram-se nesta capela os monumentos funerários dos grão-mestres Fra Adrien de Wignacourt e Fra Emmanuel de Rohan-Polduc.

A capela de Itália, dedicada a Santa Catarina de Alexandria, santa padroeira da secção (língua) Italiana.

A Capela da Alemanha é dedicada à Epifania de Cristo. A pintura principal é do pintor maltês Stefano Erardi.

Do lado direito da igreja existem as seguintes capelas:

A Capela do Santíssimo Sacramento, outrora conhecida como a Capela de Nossa Senhora de Filermos. O quadro desta capela é Nossa Senhora de Carafa que é uma cópia da Nossa Senhora de Lanciano. Entre os cavaleiros enterrados nesta capela encontram-se Fra Gian Francesco Abela e Fra Flaminio Balbiano.

A Capela de Auvergne é dedicada a São Sebastião. O único monumento funerário nesta capela é o de Fra Annet de Clermont.

A Capela de Aragão é dedicada a São Jorge. O quadro principal foi pintado por Mattia Preti e é considerado como uma das suas obras-primas. Nesta capela podem-se encontrar os monumentos funerários dos seguintes grão-mestres: Fra Martin de Redin, Fra Raphael Cotoner, Fra Nicolau Cotoner e Fra Ramon Perellós.

A Capela de Castela, Leão e Portugal é dedicada a Santiago Maior. Aqui se encontram os monumentos funerários dos grão-mestres António Manuel de Vilhena e Manuel Pinto da Fonseca.

A Decapitação de S. João Baptista, 1608. Óleo sobre tela, 361 x 520 cm. Oratório da Co-Catedral.
A pintura que A Decapitação de S. João Baptista (1608) de Caravaggio (1571–1610) é a obra mais famosa da igreja. Considerada uma das obras-primas de Caravaggio e o único quadro assinado pelo pintor, a tela é exibida no Oratório para o qual foi pintada. Restaurada em Florença nos finais dos anos 90 do século XX, esta pintura mostra um dos usos mais impressionantes do estilo Chiaroscuro que o tornaram famoso – o círculo de luz que ilumina a cena da decapitação de S. João Baptista a pedido de Salomé. O oratório alberga igualmente o quadro “S. Jerónimo” (1607–1608) também de Caravaggio.

Outra característica impressionante da igreja é o conjunto de lápides de mármore na nave em que foram enterrados cavaleiros importantes. Os cavaleiros mais importantes foram colocados mais perto da frente da igreja. Estes túmulos, ricamente decorados com mármore embutido e com o brasão de armas do cavaleiro enterrados abaixo, tal como imagens relevantes para esse cavaleiro, muitas vezes narram um triunfo em batalha, criando um belo testemunho visual na igreja. Outra obra de arte importante é a escultura de grupo de Mazzuoli atrás do Altar principal.

Junto à igreja está o Museu da Co-Catedral de S. João, possuidor de obras de arte. Entre os conteúdos do museu encontram-se as tapeçarias do Grão-Mestre Fra Ramon Perellós i Rocafull, pinturas dos Grão-Mestres Jean de la Cassière, Nicolau Cotoner e Manuel Pinto da Fonseca, este último que estava na capela lateral, assim como o S. Jorge matando o Dragão de Francesco Potenzano.

Algumas notas pessoais:

A riqueza da Catedral é impressionante pelo estilo barroco flamejante que profusamente cobre a totalidade das paredes. Evidentemente que o material (calcário-cantaria) não terá a mesma “categoria” da “nossa” talha em madeira como por exemplo nas Igrejas de São Francisco ou Santa Clara, no Porto, mas nem por isso deixa de ser artisticamente complexo e belo.

Quanto a mim, o mais impressionante é o pavimento totalmente coberto de sepulturas de cavaleiros cujas lápides enumeram os seus feitos, qualidades e proezas todas em mármore policromado de grande beleza.

Não posso resumir em poucas palavras tudo quanto vi mas termino com uma referência ao Oratório cujas inúmeras pinturas de Carvaggio nos deixam sem fôlego. Principalmente as telas da Decapitação de São João Baptista e de São Jerónimo fizeram-me pensar que estava na presença dos originais das pinturas tantas vezes vistas em catálogos etc.
E senti-me muito feliz e um privilegiado por o Senhor me ter concedido esta “carícia”.

Algo que não pode deixar de chamar a atenção é o “rasto” deixado por São João Paulo II. Lá está o genuflexório onde se ajoelhou em oração quando aqui esteve.
Isto repete-se noutros locais.

Malta tem um Papa daqui oriundo: São Pio V e, naturalmente, existem bastantes referências, estátuas, etc., ao seu nome, mas, repito, São João Paulo II tem um lugar muito particular no coração deste povo como, de resto, no coração de tantos e tantos países que visitou.

António Mexia Alves

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO PARA A QUARESMA DE 2015

«Fortalecei os vossos coraçoes» (Tg 5,8)

Amados irmãos e irmãs!

Tempo de renovação para a Igreja, para as comunidades e para cada um dos fiéis, a Quaresma é sobretudo um « tempo favorável » de graça (cf. 2 Cor 6,2). Deus nada nos pede, que antes não no-lo tenha dado: « Nós amamos, porque Ele nos amou primeiro » (1 Jo 4,19). Ele não nos olha com indiferença; pelo contrário, tem a peito cada um de nós, conhece-nos pelo nome, cuida de nós e vai à nossa procura, quando O deixamos. Interessa-Se por cada um de nós; o seu amor impede-Lhe de ficar indiferente perante aquilo que nos acontece. Coisa diversa se passa connosco! Quando estamos bem e comodamente instalados, esquecemo-nos certamente dos outros (isto, Deus Pai nunca o faz!), não nos interessam os seus problemas, nem as tribulações e injustiças que sofrem; e, assim, o nosso coração cai na indiferença: encontrando-me relativamente bem e confortável, esqueço-me dos que não estão bem!

Hoje, esta atitude egoísta de indiferença atingiu uma dimensão mundial tal que podemos falar de uma globalização da indiferença. Trata-se de um mal-estar que temos obrigação, como cristãos, de enfrentar.

Quando o povo de Deus se converte ao seu amor, encontra resposta para as questões que a história continuamente nos coloca. E um dos desafios mais urgentes, sobre o qual me quero deter nesta Mensagem, é o da globalização da indiferença. Dado que a indiferença para com o próximo e para com Deus é uma tentação real também para nós, cristãos, temos necessidade de ouvir, em cada Quaresma, o brado dos profetas que levantam a voz para nos despertar. A Deus não Lhe é indiferente o mundo, mas ama-o até ao ponto de entregar o seu Filho pela salvação de todo o homem.

Na encarnação, na vida terrena, na morte e ressurreição do Filho de Deus, abre-se definitivamente a porta entre Deus e o homem, entre o Céu e a terra. E a Igreja é como a mão que mantém aberta esta porta, por meio da proclamação da Palavra, da celebração dos Sacramentos, do testemunho da fé que se torna eficaz pelo amor (cf. Gl 5,6). O mundo, porém, tende a fechar-se em si mesmo e a fechar a referida porta através da qual Deus entra no mundo e o mundo n’Ele. Sendo assim, a mão, que é a Igreja, não deve jamais surpreender-se, se se vir rejeitada, esmagada e ferida. Por isso, o povo de Deus tem necessidade de renovação, para não cair na indiferença nem se fe5 char em si mesmo. Tendo em vista esta renovação, gostaria de vos propor três textos para a vossa meditação.

1. «Se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros» (1 Cor 12,26) – A Igreja. Com o seu ensinamento e sobretudo com o seu testemunho, a Igreja oferece-nos o amor de Deus, que rompe esta reclusão mortal em nós mesmos que é a indiferença. Mas, só se pode testemunhar algo que antes experimentámos. O cristão é aquele que permite a Deus revesti-lo da sua bondade e misericórdia, revesti-lo de Cristo para se tornar, como Ele, servo de Deus e dos homens. Bem no-lo recorda a liturgia de Quinta-feira Santa com o rito do lava-pés. Pedro não queria que Jesus lhe lavasse os pés, mas depois compreendeu que Jesus não pretendia apenas exemplificar como devemos lavar os pés uns aos outros; este serviço, só o pode fazer quem, primeiro, se deixou lavar os pés por Cristo. Só essa pessoa « tem parte com Ele » (cf. Jo 13,8), podendo assim servir o homem. A Quaresma é um tempo propício para nos deixarmos servir por Cristo e, deste modo, tornarmo-nos como Ele. Verifica-se isto quando ouvimos a Palavra de Deus e recebemos os sacramentos, nomeadamente a Eucaristia. Nesta, tornamo-nos naquilo que recebemos: o corpo de Cristo. Neste corpo, não encontra lugar a tal indiferença que, com tanta frequência, parece apoderar-se dos nossos corações; porque, quem é de Cristo, pertence a um único corpo e, n’Ele, um não olha com indiferença o outro. « Assim, se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros; se um membro é honrado, todos os membros participam da sua alegria » (1 Cor 12,26). A Igreja é communio sanctorum, não só porque, nela, tomam parte os Santos mas também porque é comunhão de coisas santas: o amor de Deus, que nos foi revelado em Cristo, e todos os seus dons; e, entre estes, há que incluir também a resposta de quantos se deixam alcançar por tal amor. Nesta comunhão dos Santos e nesta participação nas coisas santas, aquilo que cada um possui, não o reserva só para si, mas tudo é para todos. E, dado que estamos interligados em Deus, podemos fazer algo mesmo pelos que estão longe, por aqueles que não poderíamos jamais, com as nossas simples forças, alcançar: rezamos com eles e por eles a Deus, para que todos nos abramos à sua obra de salvação.

2. «Onde está o teu irmão?» (Gn 4,9) – As paróquias e as comunidades Tudo o que se disse a propósito da Igreja universal é necessário agora traduzi-lo na vida das paróquias e comunidades. Nestas realidades eclesiais, consegue-se porventura experimentar que fazemos parte de um único corpo? Um corpo que, simultaneamente, recebe e partilha aquilo que Deus nos quer dar? Um corpo que conhece e cuida dos seus membros mais frágeis, pobres e pequeninos? Ou refugiamo-nos num amor universal pronto a comprometer-se lá longe no mundo, mas que esquece o Lázaro sentado à sua porta fechada (cf. Lc 16,19-31)? Para receber e fazer frutificar plenamente aquilo que Deus nos dá, deve-se ultrapassar as fronteiras da Igreja visível em duas direcções. Em primeiro lugar, unindo-nos à Igreja do Céu na oração. Quando a Igreja terrena reza, instaura-se reciprocamente uma comunhão de serviços e bens que chega até à presença de Deus. Juntamente com os Santos, que encontraram a sua plenitude em Deus, fazemos parte daquela comunhão onde a indiferença é vencida pelo amor. A Igreja do Céu não é triunfante, porque deixou para trás as tribulações do mundo e usufrui sozinha do gozo eterno; antes pelo contrário, pois aos Santos é concedido já contemplar e rejubilar com o facto de terem vencido definitivamente a indiferença, a dureza de coração e o ódio, graças à morte e ressurreição de Jesus. E, enquanto esta vitória do amor não impregnar todo o mundo, os Santos caminham connosco, que ainda somos peregrinos. Convicta de que a alegria 8 no Céu pela vitória do amor crucificado não é plena enquanto houver, na terra, um só homem que sofre e geme, escrevia Santa Teresa de Lisieux, doutora da Igreja: « Muito espero não ficar inactiva no Céu; o meu desejo é continuar a trabalhar pela Igreja e pelas almas » (Carta 254, de 14 de Julho de 1897). Também nós participamos dos méritos e da alegria dos Santos e eles tomam parte na nossa luta e no nosso desejo de paz e reconciliação. Para nós, a sua alegria pela vitória de Cristo ressuscitado é origem de força para superar tantas formas de indiferença e dureza de coração. Em segundo lugar, cada comunidade cristã é chamada a atravessar o limiar que a põe em relação com a sociedade circundante, com os pobres e com os incrédulos. A Igreja é, por sua natureza, missionária, não fechada em si mesma, mas enviada a todos os homens. Esta missão é o paciente testemunho d’Aquele que quer conduzir ao Pai toda a realidade e todo o homem. A missão é aquilo que o amor não pode calar. A Igreja segue Jesus Cristo pela estrada que a conduz a cada homem, até aos confins da terra (cf. Act 1,8). Assim podemos ver, no nosso próximo, o irmão e a irmã pelos quais Cristo morreu e ressuscitou. Tudo aquilo que recebemos, recebemo-lo também para eles. E, vice-versa, tudo o que estes irmãos possuem é um dom para a Igreja e para a humanidade inteira. Amados irmãos e irmãs, como desejo que os lugares onde a Igreja se manifesta, particularmente as nossas paróquias e as nossas comunidades, se tornem ilhas de misericórdia no meio do mar da indiferença!

3. «Fortalecei os vossos corações» (Tg 5,8) – Cada um dos fiéis Também como indivíduos temos a tentação da indiferença. Estamos saturados de notícias e imagens impressionantes que nos relatam o sofrimento humano, sentindo ao mesmo tempo toda a nossa incapacidade de intervir. Que fazer para não nos deixarmos absorver por esta espiral de terror e impotência? Em primeiro lugar, podemos rezar na comunhão da Igreja terrena e celeste. Não subestimemos a força da oração de muitos! A iniciativa 24 horas para o Senhor, que espero se celebre em toda a Igreja – mesmo a nível diocesano – nos dias 13 e 14 de Março, pretende dar expressão a esta necessidade da oração. Em segundo lugar, podemos levar ajuda, com gestos de caridade, tanto a quem vive próximo de nós como a quem está longe, graças aos inúmeros organismos caritativos da Igreja. A Quaresma é um tempo propício para mostrar este interesse pelo outro, através de um sinal – mesmo pequeno, mas 10 concreto – da nossa participação na humanidade que temos em comum. E, em terceiro lugar, o sofrimento do próximo constitui um apelo à conversão, porque a necessidade do irmão recorda-me a fragilidade da minha vida, a minha dependência de Deus e dos irmãos. Se humildemente pedirmos a graça de Deus e aceitarmos os limites das nossas possibilidades, então confiaremos nas possibilidades infinitas que tem de reserva o amor de Deus. E poderemos resistir à tentação diabólica que nos leva a crer que podemos salvar-nos e salvar o mundo sozinhos. Para superar a indiferença e as nossas pretensões de omnipotência, gostaria de pedir a todos para viverem este tempo de Quaresma como um percurso de formação do coração, a que nos convidava Bento XVI (Carta enc. Deus caritas est, 31). Ter um coração misericordioso não significa ter um coração débil. Quem quer ser misericordioso precisa de um coração forte, firme, fechado ao tentador mas aberto a Deus; um coração que se deixe impregnar pelo Espírito e levar pelos caminhos do amor que conduzem aos irmãos e irmãs; no fundo, um coração pobre, isto é, que conhece as suas limitações e se gasta pelo outro. Por isso, amados irmãos e irmãs, nesta Quaresma desejo rezar convosco a Cristo: « Fac cor nostrum secundum cor tuum – Fazei o nosso coração semelhante ao vosso » (Súplica das Ladainhas ao Sagrado Coração de Jesus). Teremos assim um coração forte e misericordioso, vigilante e generoso, que não se deixa fechar em si mesmo nem cai na vertigem da globalização da indiferença. Com estes votos, asseguro a minha oração por cada crente e comunidade eclesial para que percorram, frutuosamente, o itinerário quaresmal, enquanto, por minha vez, vos peço que rezeis por mim. Que o Senhor vos abençoe e Nossa Senhora vos guarde!

Vaticano, 4 de Outubro de 2014.

Festa de São Francisco de Assis.



Fazer a vondade de Deus

Imagem de arquivo de 17.11.2014
Eu rezo para que o Senhor me dê a vontade de fazer a sua vontade ou busco acordos porque tenho medo da vontade de Deus? Outra coisa: rezar para conhecer a vontade de Deus em relação a mim e à minha vida, sobre a decisão que devo tomar agora. Sobre a maneira de administrar as coisas… A oração para querer fazer a vontade de Deus, e a oração para conhecer a Sua vontade. E quando conheço a vontade de Deus, com a oração pela terceira vez: realizá-la. Para realizar a vontade, que não é a minha, mas é Sua. E não é fácil.

Papa Francisco na homilia na Capela do Espírito Santo da Casa da Santa Marta em 27.01.2015

JPR

As mulheres enquanto elo fundamental na transmissão da fé

Ocorre-me este pensamento, mas porque serão principalmente as mulheres a transmitir a fé? Simplesmente porque aquela que trouxe Jesus é uma mulher. Ele quis ter uma Mãe, também o dom da fé passa através das mulheres, como Jesus passou por Maria.

Papa Francisco na homilia na Capela do Espírito Santo da Casa da Santa Marta em 26.01.2015, título e tradução do italiano da responsabilidade de JPR

«Aquele que fizer a vontade de Deus, esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe.»

Papa Francisco 
Encíclica «Lumen fidei / A luz da fé», § 58 (trad. © Libreria Editrice Vaticana, rev)


Na parábola do semeador, São Lucas refere estas palavras com que o Senhor explica o significado da «terra boa»: «São aqueles que, tendo ouvido a palavra com um coração bom e virtuoso, a conservam e dão fruto com a sua perseverança» (Lc 8, 15). […] A menção do coração bom e virtuoso, em referência à Palavra ouvida e conservada, pode constituir um retrato implícito da fé da Virgem Maria; o próprio evangelista nos fala da memória de Maria, dizendo que conservava no coração tudo aquilo que ouvia e via, de modo que a Palavra produzisse fruto na sua vida. A Mãe do Senhor é ícone perfeito da fé, como dirá Santa Isabel: «Feliz de ti que acreditaste» (Lc 1, 45).

Em Maria, Filha de Sião, tem cumprimento a longa história de fé do Antigo Testamento, com a narração de tantas mulheres fiéis a começar por Sara; mulheres que eram, juntamente com os Patriarcas, o lugar onde a promessa de Deus se cumpria e a vida nova desabrochava. Na plenitude dos tempos, a Palavra de Deus dirigiu-se a Maria, e Ela acolheu-a com todo o seu ser, no seu coração, para que n’Ela tomasse carne e nascesse como luz para os homens. […] De facto, na Mãe de Jesus, a fé mostrou-se cheia de fruto e, quando a nossa vida espiritual dá fruto, enchemo-nos de alegria, que é o sinal mais claro da grandeza da fé. Na sua vida, Maria realizou a peregrinação da fé seguindo o seu Filho (Vat.II, «Lumen Gentium» 58). Assim, em Maria, o caminho de fé do Antigo Testamento foi assumido no seguimento de Jesus e deixa-se transformar por Ele, entrando no olhar próprio do Filho de Deus encarnado.

O Evangelho do dia 27 de janeiro de 2015

Nisto chegaram Sua mãe e Seus irmãos, os quais, ficando fora, O mandaram chamar. Estava muita gente sentada à volta d'Ele. Disseram-Lhe: «Eis que Tua mãe e Teus irmãos estão lá fora e procuram-Te». Ele respondeu-lhes: «Quem é Minha mãe e quem são Meus irmãos?». E, olhando para os que estavam sentados à volta d'Ele, disse: «Eis Minha mãe e Meus irmãos. Porque quem fizer a vontade de Deus, esse é Meu irmão, Minha irmã e Minha mãe».

Mc 3, 31-35

Ide

Anónimo bizantino (século XI) 
Vida de São Lucas, 6-7; PG 115, 1134-1135


Quando, após ter abandonado as trevas do erro para aderir ao amor de Deus, Paulo se junta ao número dos discípulos, Lucas acompanha-o para todo o lado e torna-se seu companheiro de viagem (At 16,10ss.). [...] Dá-se tão bem com ele, torna-se-lhe tão familiar e partilha de tal modo todas as suas graças, que Paulo, quando escreve aos crentes, se refere a Lucas como o seu bem-amado (Cl 4,14). Desde Jerusalém, e por toda aquela região até à Dalmácia (Rm 15,19), pregou com ele o Evangelho. Da Judeia a Roma partilha com ele as mesmas correntes, os mesmos trabalhos, as mesmas provações, os mesmos naufrágios. Queria receber a mesma coroa que ele, por ter participado nos mesmos trabalhos.

Após ter adquirido de Paulo o talento para a pregação e ter conseguido conduzir tantas nações para o amor de Deus, Lucas surge, não só como o discípulo que ama e é amado pelo Senhor, mas também como o evangelista que escreveu a Sua história sagrada; pois seguira o Mestre (cf Lc 10,1), fizera a recolha dos testemunhos dos Seus primeiros servos (Lc 1,1) e recebera a inspiração do alto. Foi ele o evangelista que narrou o mistério do mensageiro Gabriel, enviado à Virgem para anunciar a alegria ao mundo inteiro. Foi ele que narrou com clareza o nascimento de Cristo: revela-nos o Recém-Nascido deitado numa manjedoura e descreve os pastores e os anjos proclamando a grande alegria. [...] Relata um maior número de ensinamentos dados em parábolas do que os outros evangelistas. E, assim como nos dá a conhecer a descida do Verbo, a Palavra de Deus, sobre a terra, também nos descreve a Sua Ascensão ao céu e o Seu regresso ao trono do Pai (24,51). [...]

Mas em Lucas a graça não se fica por aqui. A sua língua não se limita unicamente ao serviço do Evangelho. Após o fim dos milagres de Cristo, ele narra também os Actos dos Apóstolos. [...] Lucas não é um simples o espectador de todas estas coisas, mas participa verdadeiramente nelas. É por isso que tem um extremo cuidado em nos instruir.

O Evangelho do dia 26 de janeiro de 2015

Depois disto, o Senhor escolheu outros setenta e dois, e mandou-os dois a dois à Sua frente por todas as cidades e lugares onde havia de ir. Disse-lhes: «Grande é na verdade a messe, mas os operários poucos. Rogai, pois, ao dono da messe que mande operários para a Sua messe. Ide; eis que Eu vos envio como cordeiros entre lobos. Não leveis bolsa, nem alforge, nem calçado, e não saudeis ninguém pelo caminho. Na casa em que entrardes, dizei primeiro: A paz seja nesta casa. Se ali houver algum filho da paz, repousará sobre ele a vossa paz; senão, tornará para vós. Permanecei na mesma casa, comendo e bebendo do que tiverem, porque o operário é digno da sua recompensa. Não andeis de casa em casa. Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei o que vos puserem diante; curai os enfermos que nela houver, e dizei-lhes: Está próximo de vós o reino de Deus.

Lc 10, 1-9

domingo, 25 de janeiro de 2015

Homilia integral do Santo Padre na celebração das Vésperas da Solenidade da Conversão de São Paulo

Na sua viagem da Judeia para a Galileia, Jesus passa através da Samaria. Não tem dificuldade em encontrar os samaritanos considerados hereges, cismáticos, separados dos judeus. A sua atitude diz-nos que o confronto com quem é diferente de nós pode fazer-nos crescer.

Jesus, cansado da viagem, não hesita em pedir de beber à mulher samaritana. Mas a sua sede estende-se muito para além da água física: é também sede de encontro, desejo de abrir diálogo com aquela mulher, oferecendo-lhe assim a possibilidade de um caminho de conversão interior. Jesus é paciente, respeita a pessoa que tem à sua frente, revela-Se-lhe progressivamente. O seu exemplo encoraja a procurar um confronto sereno com o outro. As pessoas, para se compreenderem e crescerem na caridade e na verdade, precisam de se deter, acolher e escutar. Desta forma, começa-se já a experimentar a unidade.

A mulher de Sicar interpela Jesus sobre o verdadeiro lugar da adoração a Deus. Jesus não toma partido em favor do monte nem do templo, mas vai ao essencial derrubando todo o muro de separação. Remete para a verdade da adoração: «Deus é espírito; por isso, os que O adoram devem adorá-Lo em espírito e verdade» (Jo 4, 24). É possível superar muitas controvérsias entre cristãos, herdadas do passado, pondo de lado qualquer atitude polémica ou apologética e procurando, juntos, individuar em profundidade aquilo que nos une, ou seja, a chamada a participar no mistério de amor do Pai, que nos foi revelado pelo Filho através do Espírito Santo. A unidade dos cristãos não será o fruto de sofisticadas discussões teóricas, onde cada um tenta convencer o outro da justeza das suas opiniões. Temos de reconhecer que, para se chegar à profundeza do mistério de Deus, precisamos uns dos outros, encontrando-nos e confrontando-nos sob a guia do Espírito Santo, que harmoniza as diversidades e supera os conflitos. Pouco a pouco, a mulher samaritana compreende que Aquele que lhe pediu de beber é capaz de a saciar. Jesus apresenta-Se-lhe como a fonte donde jorra a água viva que mata a sua sede para sempre (cf. Jo 4, 13-14). A existência humana revela aspirações ilimitadas: busca de verdade, sede de amor, de justiça e de liberdade. Trata-se de desejos apenas parcialmente saciados, porque o homem, do fundo do seu próprio ser, é movido para um «mais», um absoluto capaz de satisfazer definitivamente a sua sede. A resposta a estas aspirações é dada por Deus em Jesus Cristo, no seu mistério pascal. Do lado trespassado de Jesus, jorraram sangue e água (cf. Jo 19, 34): Ele é a fonte donde brota a água do Espírito Santo, isto é, «o amor de Deus derramado nos nossos corações» (Rm 5, 5) no dia do Baptismo. Por acção do Espírito, tornamo-nos um só com Cristo, filhos no Filho, verdadeiros adoradores do Pai. Este mistério de amor é a razão mais profunda da unidade que liga todos os cristãos e que é muito maior do que as divisões ocorridas no decurso da história. Por este motivo, na medida em que nos aproximamos humildemente do Senhor Jesus Cristo, acontece também a aproximação entre nós.

O encontro com Jesus transforma a samaritana numa missionária. Tendo recebido um dom maior e mais importante do que a água do poço, a mulher deixa lá o seu cântaro (cf. Jo 4, 28) e corre a contar aos seus compatriotas que encontrou o Messias (cf. Jo 4, 29). O encontro com Ele restituiu-lhe o significado e a alegria de viver, e a mulher sente o desejo de comunicá-lo. Hoje, há uma multidão de homens e mulheres, cansados e sedentos, que nos pedem, a nós cristãos, para lhes dar de beber. É um pedido a que não nos podemos subtrair. Na chamada a ser evangelizadores, todas as Igrejas e Comunidades eclesiais encontram uma área essencial para uma colaboração mais estreita. Para se poder cumprir eficazmente esta tarefa, é preciso evitar de fechar-se em particularismos e exclusivismos e também de impor uniformidade segundo planos meramente humanos (cf. Exort. ap. Evangelii gaudium, 131). O compromisso comum de anunciar o Evangelho permite superar qualquer forma de proselitismo e a tentação da competição. Estamos todos ao serviço do único e mesmo Evangelho!

Com esta jubilosa certeza, dirijo as minhas cordiais e fraternas saudações a Sua Eminência o Metropolita Gennadios, representante do Patriarcado Ecuménico, a Sua Graça David Moxon, representante pessoal em Roma do Arcebispo de Cantuária, e a todos os representantes das diversas Igrejas e Comunidades eclesiais aqui congregados na Festa da Conversão de São Paulo. Além disso, saúdo com grande prazer os membros da Comissão Mista para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, aos quais desejo um frutuoso trabalho na sessão plenária que terá lugar em Roma nos próximos dias. Saúdo também os alunos do Ecumenical Institute of Bossey e os jovens que beneficiam de bolsas de estudo oferecidas pelo Comité de Colaboração Cultural com as Igrejas Ortodoxas, operativo no Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos.

Hoje estão presentes também religiosos e religiosas pertencentes a diferentes Igrejas e Comunidades eclesiais que, nestes dias, participaram num convénio ecuménico organizado pela Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, em colaboração com o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, por ocasião do Ano da vida consagrada. A vida religiosa, como profecia do mundo futuro, é chamada a dar testemunho, no nosso tempo, daquela comunhão em Cristo que ultrapassa toda a diferença e é feita de opções concretas de recepção e diálogo. Consequentemente, a busca da unidade dos cristãos não pode ser prerrogativa apenas de qualquer indivíduo ou comunidade religiosa particularmente sensível a tal problemática. O conhecimento recíproco das diferentes tradições de vida consagrada e um fecundo intercâmbio de experiências podem ser úteis para a vitalidade de toda a forma de vida religiosa nas diferentes Igrejas e Comunidades eclesiais. Amados irmãos e irmãs, hoje nós, que estamos sedentos de paz e fraternidade, com coração confiante invocamos do Pai celeste, por meio de Jesus Cristo único Sacerdote e por intercessão da Virgem Maria, do Apóstolo Paulo e de todos os Santos, o dom da comunhão plena de todos os cristãos, a fim de que possa resplandecer «o sagrado mistério da unidade da Igreja» (Conc. Ecum. Vat. II, Decr. sobre o Ecumenismo Unitatis redintegratio, 2) como sinal e instrumento de reconciliação para o mundo inteiro.