domingo, 8 de junho de 2014

Alocução do Santo Padre na Invocação pela Paz nos jardins do Vaticano

Senhores Presidentes,

Com grande alegria vos saúdo e desejo oferecer, a vós e às ilustres Delegações que vos acompanham, a mesma recepção calorosa que me reservastes na minha peregrinação há pouco concluída à Terra Santa.

Agradeço-vos do fundo do coração por terdes aceite o meu convite para vir aqui a fim de, juntos, implorarmos de Deus o dom da paz. Espero que este encontro seja o início de um caminho novo à procura do que une para superar aquilo que divide.

E agradeço a Vossa Santidade, venerado Irmão Bartolomeu, por estar aqui comigo a acolher estes hóspedes ilustres. A sua participação é um grande dom, um apoio precioso, e é testemunho do caminho que estamos a fazer, como cristãos, rumo à plena unidade.

A vossa presença, Senhores Presidentes, é um grande sinal de fraternidade, que realizais como filhos de Abraão, e expressão concreta de confiança em Deus, Senhor da história, que hoje nos contempla como irmãos um do outro e deseja conduzir-nos pelos seus caminhos.

Este nosso encontro de imploração da paz para a Terra Santa, o Médio Oriente e o mundo inteiro é acompanhado pela oração de muitíssimas pessoas, pertencentes a diferentes culturas, pátrias, línguas e religiões: pessoas que rezaram por este encontro e agora estão unidas connosco na mesma imploração. É um encontro que responde ao ardente desejo de quantos anelam pela paz e sonham um mundo onde os homens e as mulheres possam viver como irmãos e não como adversários ou como inimigos.

Senhores Presidentes, o mundo é uma herança que recebemos dos nossos antepassados , mas é também um empréstimo dos nossos filhos: filhos que estão cansados e desfalecidos pelos conflitos e desejosos de alcançar a aurora da paz; filhos que nos pedem para derrubar os muros da inimizade e percorrer a estrada do diálogo e da paz a fim de que triunfem o amor e a amizade. Muitos, demasiados destes filhos caíram vítimas inocentes da guerra e da violência, plantas arrancadas em pleno vigor. É nosso dever fazer com que o seu sacrifício não seja em vão. A sua memória infunda em nós a coragem da paz, a força de perseverar no diálogo a todo o custo, a paciência de tecer dia após dia a trama cada vez mais robusta de uma convivência respeitosa e pacífica, para a glória de Deus e o bem de todos.

Para fazer a paz é preciso coragem, muita mais do que para fazer a guerra. É preciso coragem para dizer sim ao encontro e não à briga; sim ao diálogo e não à violência; sim às negociações e não às hostilidades; sim ao respeito dos pactos e não às provocações; sim à sinceridade e não à duplicidade. Para tudo isto, é preciso coragem, grande força de ânimo. A história ensina-nos que as nossas meras forças não bastam. Já mais de uma vez estivemos perto da paz, mas o maligno, com diversos meios, conseguiu impedi-la. Por isso estamos aqui, porque sabemos e acreditamos que necessitamos da ajuda de Deus. Não renunciamos às nossas responsabilidades, mas invocamos a Deus como acto de suprema responsabilidade perante as nossas consciências e diante dos nossos povos. Ouvimos uma chamada e devemos responder: a chamada a romper a espiral do ódio e da violência, a rompê-la com uma única palavra: «irmão». Mas, para dizer esta palavra, devemos todos levantar os olhos ao Céu e reconhecer-nos filhos de um único Pai.

A Ele, no Espírito de Jesus Cristo, me dirijo, pedindo a intercessão da Virgem Maria, filha da Terra Santa e Mãe nossa:

Senhor Deus de Paz, escutai a nossa súplica!

Tentámos tantas vezes e durante tantos anos resolver os nossos conflitos com as nossas forças e também com as nossas armas; tantos momentos de hostilidade e escuridão; tanto sangue derramado; tantas vidas despedaçadas; tantas esperanças sepultadas... Mas os nossos esforços foram em vão. Agora, Senhor, ajudai-nos Vós! Dai-nos Vós a paz, ensinai-nos Vós a paz, guiai-nos Vós para a paz. Abri os nossos olhos e os nossos corações e dai-nos a coragem de dizer: «nunca mais a guerra»; «com a guerra, tudo fica destruído»! Infundi em nós a coragem de realizar gestos concretos para construir a paz. Senhor, Deus de Abraão e dos Profetas, Deus Amor que nos criastes e chamais a viver como irmãos, dai-nos a força para sermos cada dia artesãos da paz; dai-nos a capacidade de olhar com benevolência todos os irmãos que encontramos no nosso caminho. Tornai-nos disponíveis para ouvir o grito dos nossos cidadãos que nos pedem para transformar as nossas armas em instrumentos de paz, os nossos medos em confiança e as nossas tensões em perdão. Mantende acesa em nós a chama da esperança para efectuar, com paciente perseverança, opções de diálogo e reconciliação, para que vença finalmente a paz. E que do coração de todo o homem sejam banidas estas palavras: divisão, ódio, guerra! Senhor, desarmai a língua e as mãos, renovai os corações e as mentes, para que a palavra que nos faz encontrar seja sempre «irmão», e o estilo da nossa vida se torne: shalom, paz, salam! Amen.

«Lost in translation»


Não é a comédia americana de 2003. Testa sobre testa, o Papa Francisco e o Presidente israelita Shimon Peres ficam a olhar um para o outro, emocionam-se um pouco, demoram. Na televisão, parece que não trocam palavras. Compreende-se que os jornais tenham ficado sem saber o que dizer. Não é fácil traduzir.

Há dias, na Terra Santa, o Papa convidou Abu Mazen e Shimon Peres, Presidentes da Palestina e de Israel, para rezarem com ele no Vaticano. A maioria dos meios de comunicação traduziu: o Papa convidou-os para umas conversações de paz. Nem sabiam no que se metiam. O Papa não gostou da tradução e, num encontro que teve a seguir com os jornalistas, demorou-se a explicar-lhes que ia ser só um dia de oração: nada de mediações, de procurar soluções de paz. «Vamos reunir-nos para rezar, apenas isso. E depois cada um volta para casa».

A dificuldade para entender o Papa é que ele acredita mesmo na oração. Gasta muitas horas por dia a rezar diante do Sacrário e acha que não está a perder o tempo. O outro problema é que o Papa gosta mesmo das pessoas. Não me refiro aos sorrisos encantadores ou aos aplausos, estou a pensar nos casos mais extremos e até repugnantes: os doentes mais contaminados, os criminosos, os caluniadores, os que blasfemam e atacam a Igreja. O que é que tudo isto pode querer dizer?

A imprensa dos Estados Unidos está boquiaberta, porque o Governo americano, depois de ter empenhado todo o seu poderio económico e militar, não conseguiu juntar Abu Mazen e Shimon Peres. E o Papa, de repente!... Lendo as explicações dos próprios, percebe-se que eles sentiram uma confiança inexplicável, uma amizade verdadeira, que não julgava factos passados, nem pedia contas. Era uma proposta que ninguém lhes tinha feito e eles não resistiram.

Esta semana, inflamaram-se alguns órgãos de informação, em países de língua inglesa e alemã, porque o Papa celebrou a Missa com um determinado padre e, no final, beijou-lhe as mãos que tinham tocado na Eucaristia. O facto é indesmentível, porque há registos fotográficos bem claros. O problema é traduzir o gesto. Alguns deduziram que se tratava de uma mudança radical na Igreja. Alguém que, primeiro embarcou em deduções apocalípticas, repensou o assunto e no dia seguinte escreveu outro artigo a dizer que o gesto também podia ter outras leituras, diametralmente opostas. Chega-se à conclusão de que o Papa fala em parábolas e esta linguagem, surpreendentemente poderosa, não é fácil de entender.

Uma frase que toda a gente recorda é «quem sou eu para julgar?...», a propósito das pessoas com tendência homossexual. Como é que este respeito é compatível com a catequese tão clara e directa do Papa? Porque, nessa mesma intervenção, o Papa denunciou frontalmente os «lobbies» que tentam deformar a doutrina da Igreja, em particular o «lobby gay».

O que aconteceria, se um Papa convidasse os dirigentes palestiniano e israelita para rezar? Há uma semana, eu desatava a rir, só de imaginar a cena. Agora, já não digo nada.

É que este Domingo do Divino Espírito Santo, 8 de Junho de 2014, os três vão passar o dia a rezar juntos, no Vaticano. E o Papa pediu que todos rezássemos ao mesmo tempo com eles. Alguém entende a parábola?

José Maria C. S. André
«Correio dos Açores», 8-VI-2014

Recordações de D. Álvaro

Nos meses que faltam para o dia 27 de setembro, data da beatificação de D. Álvaro, gosto de pensar na figura do meu predecessor, tão leal a Deus, que seguiu com fidelidade o exemplo e os ensinamentos de S. Josemaria, também no seu interesse por alcançar a felicidade do Céu. Na Terra, era uma pessoa feliz e otimista, porque amava esta virtude sobrenatural da esperança, que implorava a Deus em cada dia. Com palavras que também eu ouvi muitas vezes ao nosso Fundador, D. Álvaro usava uma jaculatória muito adequada para pedir essa qualidade, sobretudo quando se notam com mais força a própria debilidade ou os limites do nosso eu. Repetia: Senhor, não Te fies em mim, eu, sim, é que me fio em Ti. Recomendava-a também a quem o ouvia, particularmente se alguém se considerava incapaz de corresponder à graça pelo peso das suas faltas e defeitos. Animava todas e todos a pôr a sua confiança em Deus, empregando ao mesmo tempo os meios humanos ao seu alcance.


Com a certeza de que o Senhor está sempre atento às nossas necessidades, temos de ouvir aquela exortação do Fundador do Opus Dei: É preciso mexer-se, meus filhos, é preciso fazer! Com fortaleza, com energia e com alegria de viver, porque o amor lança para longe o temor (cfr. 1 Jo 4, 18), com audácia, sem timidez (…). Tendes que fugir tanto da atitude do intrépido que acha tudo fácil, por achar que lhe sobram energias, como da vergonha do tímido, que vê tudo como dificuldade insuperável, por achar que não tem forças.

Não esqueçais que, se queremos, tudo se faz: Deus non dénegat grátiam, Deus não nega a Sua ajuda a quem faz o que pode [8].


Recordo um episódio da década de 1960, que mostra como D. Álvaro se servia de qualquer circunstância para fortalecer a sua esperança. Tinha pedido ao nosso Padre que lhe escrevesse umas palavras numa pequena fotografia e, depois da sua filial insistência, S. Josemaria escreveu o seguinte versículo de um salmo: hómines et iuménta salvábis, Dómine [9], Tu salvarás, Senhor, os homens e os jumentos. Talvez se tenha lembrado desta frase da Escritura porque a meditava com frequência, por se considerar um burrico diante de Deus. Não excluo que pensasse no próprio D. Álvaro, recordando o afeto e a fortaleza com que esse seu filho o ajudava a levar com alegria a divina carga do Opus Dei. Quando D. Álvaro ia anotar a data, leu o texto já escrito e, brincando com o seu apelido, comentou: isto abre um portillo [postigo] à esperança. S. Josemaria achou piada à frase e, com rapidez e bom humor, acrescentou esse comentário à fotografia.

[8]. S. Josemaria, Carta 6-V-1945, n. 44.
[9]. Sl 35 (36) 7.


(D. Javier Echevarría, Prelado do Opus Dei na carta do mês de junho de 2014)
© Prælatura Sanctæ Crucis et Operis Dei

O Divino Espírito Santo em Roma

Há na basílica de S. Pedro vários pormenores que dizem muito à cultura açoriana. Um deles, ocupa toda a cabeceira da basílica, a chamada ábside. É a parede frontal, com 58 m de largura e 46 m de altura. Se fosse um biombo, podia tapar completamente um edifício com 15 andares de altura. Mas, justamente, não é um biombo! É uma porta aberta, uma «porta» muito especial.

Quando se assiste à Missa celebrada pelo Papa na basílica, esta parede é o cenário que se vê por trás. Uma pessoa não se cansa de o admirar. Sobretudo, há uns minutos especiais em cada dia, em que esta composição do século XVI (da autoria de Gian Lorenzo Bernini) ganha vida e faz o peregrino recuar 2000 anos na história. É preciso estar lá à hora certa, pouco mais ou menos às sete da tarde.

Até esse momento, reina o silêncio e a calma. O sol entra suavemente pelos janelões e pela cúpula, reflecte-se nas paredes e nas estátuas, inunda a basílica de uma luminosidade homogénea. É a célebre luz rosa e dourada do entardecer de Roma. A harmonia acolhedora daquele ambiente fala-nos da beleza da fé e convida a pensar no Céu.

É então que, à hora certa, o sol poente irrompe por trás da figura do Divino Espírito Santo. A Pomba, com 3 m de largura, parece voar majestosa, a 30 m de altura, como uma ave triunfante de paz. A pedra da imagem e a pedra à volta da imagem é de um alabastro tão fino, que deixa passar o sol como um vitral e, em contraluz, vemos um clarão vibrante, que não queima os olhos, projectar-se em todas as direcções. Dessa espécie de vitral de pedra irradiam raios fulgurantes, luminosos e dourados, que penetram através de nuvens difusas de talha dourada e se projectam pela parede como estilhaços de uma explosão, entre um alvoroço de anjos.

Quem assiste a esta efusão luminosa sente-se a reviver 2000 anos de história, quando os Apóstolos rodeavam Nossa Senhora e, de repente, «como que um vento impetuoso se abateu sobre eles» enchendo toda a casa e umas «como que línguas de fogo» pousaram sobre eles. O Espírito Santo marcou a alma dos primeiros cristãos e a pequenina Igreja, que cabia inteira naquela sala, saiu, cheia de coragem, a anunciar a Boa Nova.

O Evangelho atravessou os séculos com a força desta Presença. Para quem ignore o Espírito Santo, a história fica incompreensível. Por um lado, a traição, o pecado, a oposição de dentro e de fora, o cansaço dos cristãos. Por outro, uma vitalidade inesgotável, uma «Boa Nova» que não acaba. Sobretudo, uma santidade que é sempre maior do que todas as fraquezas humanas.

O Divino Espírito Santo é o retábulo do altar papal na basílica de S. Pedro porque desde sempre a Igreja se alimenta desta Presença.

Nos nossos dias, o Papa Francisco diz que a Igreja tem de tomar consciência do vento impetuoso do Pentecostes e ser fiel a esse chamamento de Deus. Na Exortação apostólica «Evangelii gaudium» (A alegria do Evangelho), acerca da urgência de evangelizar, o Papa Francisco fala 111 vezes do Espírito Santo. Agora, é o momento de sair ao encontro dos outros. Agora, o Divino Espírito Santo quer converter-nos e fazer de nós apóstolos. Agora, é o momento decisivo em que podemos ser-lhe fiéis, ou podemos fugir.

O Papa garante que, se formos fiéis, Deus encherá a nossa vida de uma alegria que nada poderá tirar. Por isso começa a Exortação apostólica com esta promessa: «A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus». A palavra alegria aparece 97 vezes no texto e também, muitas vezes, as palavras felicidade, júbilo, etc.

A imagem deslumbrante do Divino Espírito Santo, na ábside da basílica vaticana, não faz lembrar um muro: pretende ser a porta da felicidade, uma porta escancarada para dentro do Céu.

José Maria C. S. André
«Correio dos Açores» e «Verdadeiro Olhar», 8-VI-2014

PENTECOSTES por Joaquim Mexia Alves

Encerrado na minha casa,
sozinho,
deixo as janelas e portas fechadas,
pois tenho medo do que me pedes,
Senhor!

Como sempre,
quando tenho medo,
peço a tua Mãe que me ajude,
e me ensine o caminho!

E o que faz Ela?
Reza,
pede –Te o Espírito Santo,
para Ela,
para mim,
para todos.

De repente,
vindo do Céu,
ou de dentro de mim,
(pelo Baptismo, pelo Crisma),
irrompe uma força,
um vento impetuoso,
que leva as minhas dúvidas,
arrasta os meus medos,
e abre o caminho para Ti,
Senhor!

E eu levanto-me,
encho-me de coragem,
(ou és Tu que me enches,
Espírito de Deus),
e num grito da alma,
proclamo:
meu Senhor e meu Deus!

Quero quedar-me assim,
a gozar da tua presença,
mas Tu não me deixas,
e abrindo as janelas,
escancarando as portas,
mostras–me o mundo e dizes-me:
Vai, anuncia-Me!

Oh, pobre de mim,
o que dizer,
o que fazer,
como anunciar-te,
Senhor!

Mas Tu,
Senhor,
docemente,
sedutoramente no amor,
como sempre fazes,
dizes-me ao ouvido:
«diz o que te for dado nessa hora,
pois não serás tu a falar,
mas sim o Espírito Santo.»*

* Mc 13, 11

Marinha Grande, 27 de Maio de 2012

Joaquim Mexia Alves AQUI

Espírito Santo alma da Igreja

«Ele é a alma Desta Igreja. Ele é Quem explica aos fieis o sentido profundo dos ensinamentos de Jesus e o Seu mistério. Ele é Quem, hoje como nos começos da Igreja, actua em cada evangelizador que se deixa possuir e conduzir por Ele, e pões nos lábios as palavras que por si só não poderia achar, predispondo também a alma daquele que escuta para torná-la aberta e acolhedora da Boa Nova e do reino anunciado.»

(Paulo VI - Evangelii muntiandi, nº 75)

Spiritus Domini - Canto Gregoriano



Spíritus Dómini replévit órbem terrárum, allelúia:
et hoc quod cóntinet ómnia, sciéntiam hábet vócis, allelúia, allelúia, allelúia.
Exsúrgat Déus, et dissipéntur inimíci éjus: et fúgiant, qui odérunt éum, a fácie éjus.
Glória Pátri, et Fílio, et Spirítui Sáncto.
Sicut erat in princípio, et nunc, et semper, et in saécula saeculórum. Amen.
Spíritus Dómini replévit órbem terrárum, allelúia:
et hoc quod cóntinet ómnia, sciéntiam hábet vócis, allelúia, allelúia, allelúia.

«Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar sobre as maravilhas de Deus» (Act 2,4.11)

Jean Tauler (c. 1300-1361), dominicano de Estrasburgo 
Sermão 26, 2º para o Pentecostes


Eis o aniversário do dia em que o Espírito Santo foi enviado aos santos discípulos e a todos os que com eles estavam reunidos, o dia em que nos foi dado esse belo tesouro que tínhamos perdido no Paraíso terrestre, por obra da astúcia do Inimigo e pela claudicação humana [...].

Essa dádiva aconteceu de maneira maravilhosa, a começar já por aquilo que exteriormente se viu; quanto ao mistério escondido e encerrado interiormente em tais maravilhas, não há razão, pensamento ou criatura alguma que o pudesse conhecer, conceber ou dizer. O Espírito Santo é uma grandeza de tal forma imensa, tão incompreensível e tão doce, que toda a grandeza apenas concebível pela razão, por maior que se conceba, [...] nada é ao lado desta. Comparados com ela, o céu e a Terra, assim como tudo aquilo que pudemos ver, nada são [...]. Eis porque tem de ser o próprio Espírito Santo a preparar o lugar onde deve ser recebido, porque deve ser Ele a tudo fazer para tornar o homem capaz de O receber [...]; é o abismo inexprimível de Deus que tem de ser para Ele [...] o Seu lugar e a Sua capacidade de recepção.

«Encheu toda a casa» (At 2,2). Esta casa simboliza, em primeiro lugar, a santa Igreja, que é a morada de Deus; mas, em segundo lugar, simboliza cada homem em quem o Espírito Santo habita. Assim como numa casa há muitas divisões, muitos quartos, também o homem possui muitas faculdades, sentidos e diferentes energias; e o Espírito Santo a todas visita de maneira especial. Assim que aparece, Ele insta o homem, excita-o, acorda nele certas inclinações, trabalha-o e ilumina-o. Nem todos os homens sentem da mesma maneira esta visita e esta acção interiores. Ainda que o Espírito Santo habite em todos os homens corajosos, aquele que quer tomar consciência da Sua operação, sentir e saborear a Sua presença, deve recolher-se em si mesmo [...], na calma e no silêncio [...]. Quanto mais o homem se predispuser a esse movimento de recolhimento, mais tomará consciência dessa manifestação interior e sempre crescente do Espírito Santo, que afinal lhe foi dada completamente desde o início.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)