quinta-feira, 31 de julho de 2014

A fé e a busca de Deus

A luz da fé em Jesus ilumina também o caminho de todos aqueles que procuram a Deus e oferece a contribuição própria do cristianismo para o diálogo com os seguidores das diferentes religiões. A Carta aos Hebreus fala-nos do testemunho dos justos que, antes da Aliança com Abraão, já procuravam a Deus com fé; lá se diz, a propósito de Henoc, que « tinha agradado a Deus », sendo isso impossível sem a fé, porque « quem se aproxima de Deus tem de acreditar que Ele existe e recompensa aqueles que O procuram » (Heb 11, 5.6). Deste modo, é possível compreender que o caminho do homem religioso passa pela confissão de um Deus que cuida dele e que Se pode encontrar. Que outra recompensa poderia Deus oferecer àqueles que O buscam, senão deixar-Se encontrar a Si mesmo? Ainda antes de Henoc, encontramos a figura de Abel, de quem se louva igualmente a fé, em virtude da qual foram agradáveis a Deus os seus dons, a oferenda dos primogénitos dos seus rebanhos (cf. Heb 11, 4). O homem religioso procura reconhecer os sinais de Deus nas experiências diárias da sua vida, no ciclo das estações, na fecundidade da terra e em todo o movimento do universo. Deus é luminoso, podendo ser encontrado também por aqueles que O buscam de coração sincero.
Imagem desta busca são os Magos, guiados pela estrela até Belém (cf. Mt 2, 1-12). A luz de Deus mostrou-se-lhes como caminho, como estrela que os guia ao longo duma estrada a descobrir. Deste modo, a estrela fala da paciência de Deus com os nossos olhos, que devem habituar-se ao seu fulgor. Encontrando-se a caminho, o homem religioso deve estar pronto a deixar-se guiar, a sair de si mesmo para encontrar o Deus que não cessa de nos surpreender. Este respeito de Deus pelos olhos do homem mostra-nos que, quando o homem se aproxima d’Ele, a luz humana não se dissolve na imensidão luminosa de Deus, como se fosse um estrela absorvida pela aurora, mas torna-se tanto mais brilhante quanto mais perto fica do fogo gerador, como um espelho que reflecte o resplendor. A confissão de Jesus, único Salvador, afirma que toda a luz de Deus se concentrou n’Ele, na sua « vida luminosa », em que se revela a origem e a consumação da história.[31] Não há nenhuma experiência humana, nenhum itinerário do homem para Deus que não possa ser acolhido, iluminado e purificado por esta luz. Quanto mais o cristão penetrar no círculo aberto pela luz de Cristo, tanto mais será capaz de compreender e acompanhar o caminho de cada homem para Deus.
Configurando-se como caminho, a fé tem a ver também com a vida dos homens que, apesar de não acreditar, desejam-no fazer e não cessam de procurar. Na medida em que se abrem, de coração sincero, ao amor e se põem a caminho com a luz que conseguem captar, já vivem — sem o saber — no caminho para a fé: procuram agir como se Deus existisse, seja porque reconhecem a sua importância para encontrar directrizes firmes na vida comum, seja porque sentem o desejo de luz no meio da escuridão, seja ainda porque, notando como é grande e bela a vida, intuem que a presença de Deus ainda a tornaria maior. Santo Ireneu de Lião refere que Abraão, antes de ouvir a voz de Deus, já O procurava « com o desejo ardente do seu coração » e « percorria todo o mundo, perguntando-se onde pudesse estar Deus », até que « Deus teve piedade daquele que, sozinho, O procurava no silêncio ».[32]Quem se põe a caminho para praticar o bem, já se aproxima de Deus, já está sustentado pela sua ajuda, porque é próprio da dinâmica da luz divina iluminar os nossos olhos, quando caminhamos para a plenitude do amor.

[31] Cf. Congr. para a Doutrina da Fé, Decl. Dominus Iesus (6 de Agosto de 2000), 15: AAS 92 (2000), 756.
[32] Demonstratio apostolicae praedicationis, 24: SC 406, 117.

Lumen Fidei, 35

Imitar a paciência do Senhor

Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (Norte de África), doutor da Igreja 
«A fé e as obras», caps. 3-5


Nosso Senhor foi um modelo incomparável de paciência: aguentou um «demónio» entre os seus discípulos até à sua Paixão (Jo 6,70). Dizia Ele: «Deixai um e outro crescer juntos, até à ceifa, para que não suceda que, ao apanhardes o joio, arranqueis o trigo ao mesmo tempo» (cf Mt 13,29). Tendo a rede como símbolo da Igreja, predisse que esta traria para a praia, quer dizer, até ao fim do mundo, toda a espécie de peixes, bons e maus. E deu a conhecer de muitas outras maneiras, tanto abertamente como através de parábolas, que haveria sempre essa mistura de bons e maus. E, no entanto, afirmou que é necessário vigiar pela disciplina na Igreja quando disse: «Se o teu irmão pecar, vai ter com ele e repreende-o a sós. Se te der ouvidos, terás ganho o teu irmão» (Mt 18,15) […]

Mas hoje vemos pessoas que só tomam em consideração os preceitos rigorosos, que mandam reprimir os que causam perturbação, que ordenam que «não se dêem aos cães as coisas santas», que se «tratem como aos publicanos» aqueles que desprezam a Igreja, que se repudiem do seu corpo os membros escandalosos (Mt 7,6; 18,17; 5,30). O seu zelo intempestivo causa muita tribulação à Igreja, porque desejariam arrancar o joio antes do tempo e a sua cegueira faz deles próprios inimigos da unidade de Jesus Cristo. […]

Tomemos cuidado em não deixarmos entrar no nosso coração estes pensamentos presunçosos, em não procurarmos destacar-nos dos pecadores para não nos sujarmos com o seu contacto, em não tentarmos formar como que um rebanho de discípulos puros e santos. Sob o pretexto de não frequentarmos os maus, conseguiríamos apenas romper a unidade. Pelo contrário, recordemo-nos das parábolas da Escritura, dessas palavras inspiradas, desses exemplos tocantes, onde se nos demonstra que os maus estarão sempre misturados com os bons na Igreja, até ao fim do mundo e até ao dia do juízo, sem que a sua participação nos sacramentos seja prejudicial aos bons, desde que estes não participem dos pecados daqueles.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 31 de julho de 2014

«O Reino dos Céus é ainda semelhante a uma rede lançada ao mar, que apanha toda a espécie de peixes. Quando está cheia, os pescadores tiram-na para fora e, sentados na praia, escolhem os bons para cestos e deitam fora os maus. Será assim no fim do mundo: virão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, e lançá-los-ão na fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes. Compreendestes tudo isto?». Eles responderam: «Sim». Ele disse-lhes: «Por isso todo o escriba instruído nas coisas do Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas». Quando Jesus acabou de dizer estas parábolas partiu dali.

Mt 13, 47-53

quarta-feira, 30 de julho de 2014

A fé desperta o sentido crítico

A luz do amor, própria da fé, pode iluminar as perguntas do nosso tempo acerca da verdade. Muitas vezes, hoje, a verdade é reduzida a autenticidade subjectiva do indivíduo, válida apenas para a vida individual. Uma verdade comum mete-nos medo, porque a identificamos — como dissemos atrás — com a imposição intransigente dos totalitarismos; mas, se ela é a verdade do amor, se é a verdade que se mostra no encontro pessoal com o Outro e com os outros, então fica livre da reclusão no indivíduo e pode fazer parte do bem comum. Sendo a verdade de um amor, não é verdade que se impõe pela violência, não é verdade que esmaga o indivíduo; nascendo do amor pode chegar ao coração, ao centro pessoal de cada homem; daqui resulta claramente que a fé não é intransigente, mas cresce na convivência que respeita o outro. O crente não é arrogante; pelo contrário, a verdade torna-o humilde, sabendo que, mais do que possuirmo-la nós, é ela que nos abraça e possui. Longe de nos endurecer, a segurança da fé põe-nos a caminho e torna possível o testemunho e o diálogo com todos.

Por outro lado, enquanto unida à verdade do amor, a luz da fé não é alheia ao mundo material, porque o amor vive-se sempre com corpo e alma; a luz da fé é luz encarnada, que dimana da vida luminosa de Jesus. A fé ilumina também a matéria, confia na sua ordem, sabe que nela se abre um caminho cada vez mais amplo de harmonia e compreensão. Deste modo, o olhar da ciência tira benefício da fé: esta convida o cientista a permanecer aberto à realidade, em toda a sua riqueza inesgotável. A fé desperta o sentido crítico, enquanto impede a pesquisa de se deter, satisfeita, nas suas fórmulas e ajuda-a a compreender que a natureza sempre as ultrapassa. Convidando a maravilhar-se diante do mistério da criação, a fé alarga os horizontes da razão para iluminar melhor o mundo que se abre aos estudos da ciência.

Lumen Fidei, 34

«Vende tudo quanto possui»

São João Crisóstomo (c. 345-407), presbítero de Antioquia, bispo de Constantinopla, doutor da Igreja 
Homilia 18 sobre a Carta aos Hebreus


«A pobreza torna o homem humilde» (Pr 10,4 LXX), diz a Escritura, e é por ela que Cristo começa as suas Bem-Aventuranças: «Felizes os pobres em espírito» (Mt 5,3). […] Quereis escutar o elogio da pobreza? O próprio Jesus Cristo a abraçou, Ele que não tinha «onde reclinar a cabeça» (Mt 8,20) e dizia aos seus discípulos: «Não possuais ouro, nem prata […] nem duas túnicas» (Mt 10,9-10). O seu Apóstolo Paulo dizia: «Nada tendo, tudo possuindo» (2Cor 6,10); e Pedro diz: «Não tenho ouro nem prata» (Act 3,6). […] Portanto, que ninguém encare a pobreza como desonra, pois os bens deste mundo não são mais do que palha e poeira, comparados com a virtude. Se quisermos possuir o Reino dos Céus, devemos amar a pobreza: «Vende o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu» (Mt 19,21). […]

Ninguém é mais rico do que aqueles que abraçam de vontade e de todo o coração a pobreza […], e são mais ricos do que os reis; estes, tendo grandes necessidades, temem que lhes faltem os recursos, ao passo que aos pobres nada falta, porque nada temem. Pergunto-vos então: quem é mais rico, aquele que se afadiga para amealhar cada vez mais […], ou o que se contenta com o pouco que tem como se vivesse na abundância? […] O dinheiro torna o homem escravo: «Os presentes e as dádivas cegam os olhos dos sábios» (Sir 20,29), diz a Escritura. […] Partilhai pois os vossos bens com os pobres, procurai seguir a Jesus Cristo […] e ouvireis um dia estas ditosas palavras: «Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo!» (Mt 25,34)

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 30 de julho de 2014

«O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que, quando um homem o acha, esconde-o e, cheio de alegria pelo achado, vai e vende tudo o que tem e compra aquele campo. O Reino dos Céus é também semelhante a um negociante que busca pérolas preciosas e, tendo encontrado uma de grande preço, vai, vende tudo o que tem e a compra.

Mt 13, 44-46

O diálogo entre fé e razão

Na vida de Santo Agostinho, encontramos um exemplo significativo deste caminho: a busca da razão, com o seu desejo de verdade e clareza, aparece integrada no horizonte da fé, do qual recebeu uma nova compreensão. Por um lado, acolhe a filosofia grega da luz com a sua insistência na visão: o seu encontro com o neoplatonismo fez-lhe conhecer o paradigma da luz, que desce do alto para iluminar as coisas, tornando-se assim um símbolo de Deus. Desta maneira, Santo Agostinho compreendeu a transcendência divina e descobriu que todas as coisas possuem em si uma transparência, isto é, que podiam reflectir a bondade de Deus, o Bem; assim se libertou do maniqueísmo, em que antes vivia, que o inclinava a pensar que o bem e o mal lutassem continuamente entre si, confundindo-se e misturando-se, sem contornos claros. O facto de ter compreendido que Deus é luz deu à sua existência uma nova orientação, a capacidade de reconhecer o mal de que era culpado e voltar-se para o bem.

Mas, por outro lado, na experiência concreta de Agostinho, que ele próprio narra nas suas Confissões, o momento decisivo no seu caminho de fé não foi uma visão de Deus para além deste mundo, mas a escuta, quando no jardim ouviu uma voz que lhe dizia: « Toma e lê »; ele pegou no tomo com as Cartas de São Paulo, detendo-se no capítulo décimo terceiro da Carta aos Romanos.[28] Temos aqui o Deus pessoal da Bíblia, capaz de falar ao homem, descer para viver com ele e acompanhar o seu caminho na história, manifestando-Se no tempo da escuta e da resposta.

Mas, este encontro com o Deus da Palavra não levou Santo Agostinho a rejeitar a luz e a visão, mas integrou ambas as perspectivas, guiado sempre pela revelação do amor de Deus em Jesus. Deste modo, elaborou uma filosofia da luz que reúne em si a reciprocidade própria da palavra e abre um espaço à liberdade própria do olhar para a luz: tal como à palavra corresponde uma resposta livre, assim também a luz encontra como resposta uma imagem que a reflecte. Deste modo, associando escuta e visão, Santo Agostinho pôde referir-se à « palavra que resplandece no interior do homem ».[29] A luz torna-se, por assim dizer, a luz de uma palavra, porque é a luz de um Rosto pessoal, uma luz que, ao iluminar-nos, nos chama e quer reflectir-se no nosso rosto para resplandecer a partir do nosso íntimo. Por outro lado, o desejo da visão do todo, e não apenas dos fragmentos da história, continua presente e cumprir-se-á no fim, quando o homem — como diz o Santo de Hipona — poderá ver e amar;[30] e isto, não por ser capaz de possuir a luz toda, já que esta será sempre inexaurível, mas por entrar, todo inteiro, na luz.

[28]  Cf. Confessiones, VIII, 12, 29: PL 32, 762.
[29]  De Trinitate, XV, 11, 20: PL 42, 1071.
[30]  Cf. De civitate Dei, XXII, 30, 5: PL 41, 804.

Lumen Fidei, 33

«Jesus amava Marta e sua irmã Maria, e Lázaro» (Jo 11,5)

São Francisco de Sales (1567-1622), bispo de Genebra, doutor da Igreja 
Introdução à vida devota, III, 19


Amai toda a gente com um grande amor de caridade, mas reservai a vossa amizade profunda para aqueles que podem compartilhar convosco coisas boas. […] Se as compartilhardes na área de conhecimento, a vossa amizade é sem dúvida louvável; mais ainda o será se as comunicardes no campo da prudência, da discrição, da força e da justiça. Mas se o vosso relacionamento é baseado no amor, na devoção e na perfeição cristã, oh Deus, como a vossa amizade é preciosa! Ela será excelente porque vem de Deus, excelente porque busca a Deus, excelente porque o seu vínculo é Deus, porque vai durar para sempre em Deus. Como é bom amar na terra como se ama no céu, aprender a amar neste mundo como faremos eternamente no outro!

Não me refiro ao simples amor de caridade, porque ele deve ser levado a todos os homens; falo da amizade espiritual, em que dois ou três ou vários comungam na vida espiritual e se tornam um só espírito (cf Act 4,32). Compreende-se que tais almas possam cantar, felizes: «Como é bom e agradável os irmãos viverem em união!» (Sl 132,1) […] Parece-me que todas as outras amizades são apenas uma sombra desta. […] Os cristãos que vivem no mundo têm necessidade de se ajudar uns aos outros através de santas amizades; desta forma, encorajaram-se, apoiam-se, levam-se mutuamente para o bem. […] Ninguém pode negar que Nosso Senhor amou São João, Lázaro, Marta e Madalena com uma amizade mais suave e mais especial, porque a Escritura o testemunha.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 29 de julho de 2014

Muitos judeus tinham ido ter com Marta e Maria, para as consolarem pela morte de seu irmão. Marta, pois, logo que ouviu que vinha Jesus, saiu-Lhe ao encontro; e Maria ficou sentada em casa. Marta disse então a Jesus: «Senhor, se estivesses cá, meu irmão não teria morrido. Mas também sei agora que tudo o que pedires a Deus, Deus To concederá». Jesus disse-lhe: «Teu irmão há de ressuscitar». Marta disse-Lhe: «Eu sei que há-de ressuscitar na ressurreição do último dia». Jesus disse-lhe: «Eu sou a ressurreição e a vida; aquele que crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá; e todo aquele que vive e crê em Mim, não morrerá eternamente. Crês isto?». Ela respondeu: «Sim, Senhor, eu creio que Tu és o Cristo, o Filho de Deus, que vieste a este mundo».

Jo 11, 19-27

segunda-feira, 28 de julho de 2014

OS “GESTOS” DO PAPA FRANCISCO

Agora lemos e vemos permanentemente em jornais, revistas, televisões, etc., frases acompanhadas de fotografias, tais como:
«Papa Francisco almoça na cantina do Vaticano.»
«Papa Francisco pára para falar com deficiente.»
«Papa Francisco telefona a esta ou àquele.»
e podia continuar, enchendo folhas e folhas de papel com todas estas notícias sobre o Papa Francisco.

Antes de mais, quero louvar a Deus por este Papa que nos quis dar, neste tempo em que o mundo tanto necessita de testemunhos de paz, de humildade, de amor, enfim, testemunhos de Deus.
Depois afirmar que, para mim, todas estas notícias, todos estes testemunhos, me tocam e exortam a querer ser melhor cristão, mais católico, (universal), a querer ser mais Igreja com todos e para todos.

Mas também me apetece perguntar se a razão da comunicação social tanto noticiar o Papa Francisco se prende com a bondade de querer testemunhar este extraordinário exemplo, ou se pretendem fazer comparações com outros Papas, (criando divisão), ou de alguma forma atacar a Igreja antes deste Papa?
E depois perguntar ainda se, de alguma forma, os testemunhos deste Papa são noticiados para exercerem boa influência na sociedade, ou se são noticiados apenas como “fait divers”, que não levam a qualquer reflexão sobre a vida e a sociedade, até da parte daqueles que colocam tais notícias?

É que se as notícias sobre estes testemunhos da Papa Francisco servem apenas como “arma de arremesso” em desfavor dos anteriores Papas, ou como se houvesse uma pretensa “nova” Igreja, desiludam-se porque não é essa de modo nenhuma a vontade de Francisco, mas apenas e tão só ser o homem que o Espírito Santo entendeu colocar à frente da Igreja com todos as suas qualidades, capacidades, carismas e até defeitos, (que os terá, sem dúvida), no tempo certo, para sociedade deste tempo.

Vejamos todas essas fotografias com olhos de ver, leiamos todas essas notícias com a bondade do coração, rezemos cada vez mais pelo Papa Francisco e pela Igreja, e, sobretudo, tentemos imitar o seu testemunho de humildade e amor ao próximo.

Então sim, acredito que estaremos a entender perfeitamente os gestos do Papa, estaremos a construir a Igreja de Cristo, que começou em Pedro e continuou pelos seus Sucessores, até chegar a este Francisco que Deus nos deu.

Marinha Grande, 28 de Julho de 2014

Joaquim Mexia Alves

A fé e razão reforçam-se mutuamente

A fé cristã, enquanto anuncia a verdade do amor total de Deus e abre para a força deste amor, chega ao centro mais profundo da experiência de cada homem, que vem à luz graças ao amor e é chamado ao amor para permanecer na luz. Movidos pelo desejo de iluminar a realidade inteira a partir do amor de Deus manifestado em Jesus e procurando amar com este mesmo amor, os primeiros cristãos encontraram no mundo grego, na sua fome de verdade, um parceiro idóneo para o diálogo. O encontro da mensagem evangélica com o pensamento filosófico do mundo antigo constituiu uma passagem decisiva para o Evangelho chegar a todos os povos e favoreceu uma fecunda sinergia entre fé e razão, que se foi desenvolvendo no decurso dos séculos até aos nossos dias. O Beato João Paulo II, na sua carta encíclica Fides et ratio, mostrou como fé e razão se reforçam mutuamente. [27] Depois de ter encontrado a luz plena do amor de Jesus, descobrimos que havia, em todo o nosso amor, um lampejo daquela luz e compreendemos qual era a sua meta derradeira; e, simultaneamente, o facto de o nosso amor trazer em si uma luz ajuda-nos a ver o caminho do amor rumo à plenitude da doação total do Filho de Deus por nós. Neste movimento circular, a luz da fé ilumina todas as nossas relações humanas, que podem ser vividas em união com o amor e a ternura de Cristo.

[27] Cf. n.º 73: AAS (1999), 61-62.

Lumen Fidei, 32

«O Reino do Céu é semelhante ao fermento»

Papa Francisco 
Exortação apostólica «Evangelii Gaudium / A alegria do evangelho» §§111-114 (trad. © copyright Libreria Editrice Vaticana, rev.)


Todo o povo de Deus anuncia o evangelho. A evangelização é dever da Igreja. Este sujeito da evangelização, porém, é mais do que uma instituição orgânica e hierárquica; é, antes de tudo, um povo que peregrina para Deus. […]

A salvação, que Deus realiza e a Igreja jubilosamente anuncia, é para todos, e Deus criou um caminho para Se unir a cada um dos seres humanos de todos os tempos. Escolheu convocá-los como povo, e não como seres isolados (Vaticano II, LG 9). Ninguém se salva sozinho, isto é, nem como indivíduo isolado, nem pelas suas próprias forças. Deus atrai-nos, no respeito pela complexa trama de relações interpessoais que a vida numa comunidade humana pressupõe. Este povo, que Deus escolheu para Si e convocou, é a Igreja. Jesus não diz aos Apóstolos para formarem um grupo exclusivo, um grupo de elite. Jesus diz: «Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos» (Mt 28,19); e São Paulo afirma que no povo de Deus, na Igreja, «não há judeu nem grego […], porque todos sois um só em Cristo Jesus» (Gal 3,28). Gostaria de dizer àqueles que se sentem longe de Deus e da Igreja, aos que têm medo e aos indiferentes: o Senhor também te chama para seres parte do seu povo, e fá-lo com grande respeito e amor!

Ser Igreja significa ser povo de Deus, de acordo com o grande projecto de amor do Pai. Isto implica ser o fermento de Deus no meio da humanidade; quer dizer anunciar e levar a salvação de Deus a este nosso mundo, que muitas vezes se sente perdido, necessitado de ter respostas que encorajem, que dêem esperança e novo vigor para o caminho. A Igreja deve ser o lugar da misericórdia gratuita, onde todos possam sentir-se acolhidos, amados, perdoados e animados a viver segundo a vida boa do Evangelho.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 28 de julho de 2014

Propôs-lhes outra parábola, dizendo: «O Reino dos Céus é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. É a mais pequena de todas as sementes, mas, depois de ter crescido, é maior que todas as hortaliças e chega a tornar-se uma árvore, de modo que as aves do céu vêm aninhar nos seus ramos». Disse-lhes outra parábola: «O Reino dos Céus é semelhante ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha até que tudo esteja fermentado». Todas estas coisas disse Jesus ao povo em parábolas; e não lhes falava sem parábolas, a fim de que se cumprisse o que estava anunciado pelo profeta, que diz: “Abrirei em parábolas a Minha boca, publicarei as coisas escondidas desde a criação do mundo”».

Mt 13, 31-35

domingo, 27 de julho de 2014

Bom Domingo do Senhor!

Sigamos a sugestão que o Senhor nos fala no Evangelho de hoje (Mt 13, 44-52) e demos-Lhe tudo certos que Ele nos chamará para a Felicidade Eterna no Reino do Céu.

Obrigado Senhor pela Tua infinita bondade!

Pela fé, podemos tocar em Jesus e receber a força da sua graça

Só assim, através da encarnação, através da partilha da nossa humanidade, podia chegar à plenitude o conhecimento próprio do amor. De facto, a luz do amor nasce quando somos tocados no coração, recebendo assim, em nós, a presença interior do amado, que nos permite reconhecer o seu mistério. Compreendemos agora por que motivo, para João, a fé seja, juntamente com o escutar e o ver, um tocar, como nos diz na sua Primeira Carta: « O que ouvimos, o que vimos (…) e as nossas mãos tocaram relativamente ao Verbo da Vida… » (1 Jo 1, 1). Por meio da sua encarnação, com a sua vinda entre nós, Jesus tocou-nos e, através dos sacramentos, ainda hoje nos toca; desta forma, transformando o nosso coração, permitiu-nos — e permite-nos — reconhecê-Lo e confessá-Lo como Filho de Deus. Pela fé, podemos tocá-Lo e receber a força da sua graça. Santo Agostinho, comentando a passagem da hemorroíssa que toca Jesus para ser curada (cf. Lc 8, 45-46), afirma: « Tocar com o coração, isto é crer ».[26] A multidão comprime-se ao redor de Jesus, mas não O alcança com aquele toque pessoal da fé que reconhece o seu mistério, o seu ser Filho que manifesta o Pai. Só quando somos configurados com Jesus é que recebemos o olhar adequado para O ver.

[26] Sermo 229/L, 2: PLS 2, 576 (« Tangere autem corde, hoc est credere »).

Lumen Fidei, 31

«O Reino do Céu é semelhante a um tesouro»

São Tomás de Aquino (1225-1274), teólogo dominicano, doutor da Igreja
Homilia sobre o Credo

É lógico que o fim de todos os nossos desejos, isto é, a vida eterna, seja indicado no fim de tudo o que nos é dado a crer no Credo, com estas palavras: «A vida eterna. Ámen.» [...] Na vida eterna acontece a união do homem com Deus [...], o louvor perfeito [...] e a perfeita saciedade dos nossos desejos, pois cada bem-aventurado ainda possuirá mais do que esperava e pensava. Nesta vida ninguém pode saciar os seus desejos; nunca nada criado poderá saciar os desejos do homem. Só Deus sacia, e fá-lo infinitamente. É por isso que só podemos repousar em Deus, como disse santo Agostinho: «Fizeste-nos para Ti, Senhor, e o nosso coração anda inquieto até que repouse em Ti».

Uma vez que, na pátria, os santos  possuirão a Deus de um modo perfeito, é evidente que, não apenas o seu desejo será saciado, mas ainda transbordará de glória. É por isso que o Senhor diz: «Entra no gozo do teu Senhor» (Mt 25,21). E Santo Agostinho diz, a esse respeito: «Não é que toda a alegria entrará naqueles que se alegram, mas que aqueles que se alegram entrarão inteiramente na alegria». Diz um salmo: «Quero contemplar-Te no santuário, para ver o Teu poder e a Tua glória» [63 (62),3], e outro: «Ele satisfará os desejos do teu coração» [Sl 37 (36),4]. [...] Porque, se desejamos as delícias, é aí que encontraremos a satisfação suprema e perfeita, pois ela consistirá no bem soberano que é o próprio Deus: «delícias eternas, à Tua direita» [Sl 17 (16),11].

sábado, 26 de julho de 2014

Quem encontra o Reino de Deus, muda as atitudes, respeita os outros e o ambiente, rejeita o mal

Na tarde deste sábado, 26, o Papa Francisco realizou uma visita pastoral à cidade italiana de Caserta. Partindo do Vaticano de helicóptero às 15 horas, o Pontífice aterrou no Heliporto da Aeronáutica militar 45 minutos após, sendo recebido por autoridades civis e religiosas. Após o encontro com os sacerdotes da diocese, Bergoglio passeou no meio da multidão a bordo do Jeep branco papal. Às 18 horas, presidiu a Missa na Praça diante da Régia da Calábria.

No dia em que a Igreja festeja Santa Ana, padroeira de Caserta, o Papa desenvolveu sua homilia partindo das duas Parábolas propostas pelo Evangelho – que tem como protagonistas o trabalhador pobre e o rico mercador -, onde Jesus ensina “o que é o reino dos céus, como ele é encontrado e o que se deve fazer para possuí-lo”. O Santo Padre, falou das mudanças de atitude que ocorrem com quem descobre o tesouro, que incluem atenção aos desfavorecidos, respeito pelo ambiente e a negação de diversas formal do mal.

Ao falar sobre “o que é o reino dos céus”, Bergoglio explicou que Jesus o enuncia desde o início, dizendo “que está próximo”, nunca o fazendo ver diretamente, mas sempre usando parábolas e figuras, como o modo de agir de um patrão, de um rei, das dez virgens e preferindo mostrar seus efeitos, como “capaz de mudar o mundo, como o fermento escondido na massa; pequeno e humilde como uma semente”, e assim por diante. “O Reino de Deus – observou o Papa – se faz presente na própria pessoa de Jesus”:
“É Ele o tesouro escondido e a pérola de grande valor. Se compreende a alegria do agricultor e do mercador: a encontraram! É a alegria de cada um de nós quando descobrimos a proximidade e a presença de Jesus na nossa vida. Uma presença que transforma a existência e nos torna abertos às exigências dos irmãos; uma presença que nos convida a acolher cada outra presença, também aquela do estrangeiro e do migrante”.

Ao explicar sobre “como se encontra o reino de Deus”, Francisco diz que cada um de nós tem um caminho particular, o que nos recorda que “Deus se deixa encontrar, porque é Ele que nos busca e se deixa encontrar também por quem não o procura”:
“Às vezes Ele se deixa encontrar em lugares insólitos e em tempos inesperados. Quando se encontra Jesus se fica fascinado, conquistado, e é uma alegria deixar o nosso modo de viver quotidiano, às vezes árido e apático, para abraçar o Evangelho, para deixar-se guiar pela lógica nova do amor e do serviço humilde e desinteressado”.

Refletindo sobre o terceiro ponto, “o que fazer para possuir o reino de Deus”, o Papa Bergoglio reitera a importância de se colocar “Deus em primeiro lugar na nossa vida”. E isto significa ter a coragem de dizer “não ao mal, à violência, à exploração, para viver uma vida de serviço aos outros e em favor da legalidade e do bem comum”. “Quando uma pessoa descobre o verdadeiro tesouro, abandona um estilo de vida egoísta e procura partilhar com os outros a caridade que vem de Deus”:
“Quem se torna amigo de Deus, ama os irmãos, se empenha em salvaguardar a vida e a saúde deles, também respeitando o ambiente e a natureza. E isto é particularmente importante nesta vossa bela terra que exige ser tutelada e preservada, exige ter a coragem de se dizer não a toda forma de corrupção e ilegalidade, exige de todos serem servidores da verdade e de assumir em todas as situações o estilo de vida evangélico que se manifesta na atenção ao pobre e ao excluído”.

Por fim, o Papa Francisco encoraja a todos a viver a Festa da Padroeira Santa Ana – a quem gosta de chamar de “a avó de Jesus - livres de todos os condicionamentos, reforçando os vínculos de fraternidade e solidariedade. (JE)

(Fonte: 'news.va')

OS EVANGELHOS SEGUNDO JESUS CRISTO

Não sei se era uma sexta-feira 13, mas a afirmação não poderia ter sido mais desastrada:
- Bom, deixemos isso – referia-se à Sagrada Escritura, que acabava de ser referida – pois tenho coisas mais importantes para vos dizer!

O caricato incidente que, si non è vero, è bene trovato, reflecte uma atitude corrente em muitas pessoas, também cristãs, que, na prática, entendem que têm coisas mais importantes para fazer do que ler a Bíblia, que é palavra de Deus.

A Sagrada Escritura não é letra morta, mas espírito e vida, porque, como afirma o apóstolo João, Cristo é a palavra de Deus que se fez carne e habitou entre nós. 

É verdade que não se conhece nenhum texto escrito directamente por Jesus, mas muitos foram os seus contemporâneos que, como Mateus, um dos doze apóstolos, e Marcos, relataram os seus feitos e ensinamentos. Lucas, também ele discípulo do Mestre, dá conta das muitas versões escritas que circulavam entre os primeiros cristãos. Mas, como nem todas eram fidedignas, ele, sendo médico, redigiu um novo relato, que é o terceiro evangelho. Estes três textos, mais o atribuído ao apóstolo João, são os únicos quatro evangelhos que a Igreja católica reconhece como sendo palavra de Deus. Outros havia e há que não consta terem sido divinamente inspirados.

Para alimentar a fé incipiente das comunidades cristãs que ia fundando, Paulo de Tarso escrevia-lhes cartas: as epístolas que ainda hoje se lêem nas celebrações litúrgicas. Eram textos que circulavam entre os fiéis, ensinando-lhes a prática da fé, resolvendo as suas dúvidas doutrinais, alentando-os a permanecer como luzes ardentes num mundo obscurecido pelas trevas da ignorância e do pecado.

Decorridos quase dois mil anos, a Bíblia não perdeu actualidade, nem pertinência, para cristãos e não-cristãos. Não conhecer a Sagrada Escritura não é apenas uma grave manifestação de ignorância religiosa, mas também um indesmentível sinal de iliteracia cultural. Não são só os italianos que têm de ler a Divina Comédia, nem os britânicos os únicos que devem conhecer as obras de Shakespeare. 

Deus não é de nenhum país e é-o de todos. Por isso, a palavra divina não se confunde com nenhuma cultura ou época, transcende todas as fronteiras e ultrapassa todas as civilizações. É de sempre e para sempre. É intemporal, sem deixar de ser de cada tempo e lugar. É universal, sendo pessoal para todos e cada um dos homens, porque é um lugar privilegiado de encontro íntimo com Deus. É uma explicação do mundo, mas também um mapa da felicidade. Fala de Deus, omnipotente e criador, mas que é, sobretudo, amor e que, no seu filho, Cristo, é caminho, verdade e vida. Porque ensina a amar, ensina a viver. Promete a bem-aventurança no além, mas enche também de alegria e de esperança a vida terrena. Quantas pessoas encontraram, nas páginas do texto sagrado, a mais profunda e plena razão do seu viver! 

Quem lê a Bíblia não fica indiferente ao livro que, não em vão, é a obra mais editada de todos os tempos. Se aceita o diálogo interpelante dos evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, os únicos que são, verdadeiramente, segundo Jesus Cristo, é muito provável que se dê conta de que esse texto não é apenas a mais valiosa obra da literatura universal, mas uma carta íntima que Deus escreveu a cada ser humano. E então, seja crente, ateu, agnóstico ou indiferente, compreenderá por que razão, em cada missa, depois da proclamação do evangelho, o celebrante beija-o. Um gesto de amor que, se não for unido ao propósito de realizar na vida a palavra de Deus, será de traição, como o beijo de Judas. 

Gonçalo Portocarrero de Almada
jornal i – 26 julho 2014

«Vende tudo o que possui»

São Basílio (c. 330-379), monge, bispo de Cesareia na Capadócia, doutor da Igreja 
Regras Monásticas, Regras Maiores, § 8


Nosso Senhor Jesus Cristo insistiu vivamente no seguinte, muitas vezes: «Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me» (Mt 16,24). […] E noutro passo: «Se queres ser perfeito, vende o que tens, dá o dinheiro aos pobres»; ao que acrescenta : «depois, vem e segue-Me» (Mt 19,21).

Para aquele que sabe compreender, a parábola do negociante quer dizer a mesma coisa: «O Reino dos céus é semelhante a um negociante à procura de pedras preciosas; assim que encontrou uma de grande valor, corre a vender tudo o que tem, para poder comprá-la.» A pedra preciosa designa indubitavelmente o Reino dos céus, e o Senhor mostra-nos que nos é impossível obtê-lo se não abandonarmos tudo o que possuímos: riqueza, glória, nobreza de nascimento e tudo aquilo que tantos outros buscam avidamente.

O Senhor declarou ainda que é impossível ocuparmo-nos convenientemente do que fazemos quando o espírito é solicitado por diversas coisas: «Ninguém pode servir a dois senhores», disse (Mt 6,24). Por isso, «o tesouro que está no céu» é o único que podemos escolher para a ele ligarmos o coração: «Pois onde estiver o teu tesouro, aí estará também o teu coração» (Mt 6,20ss). […] Em suma, trata-se de transportarmos o nosso coração para a vida do céu, de maneira que possamos dizer: «A cidade a que pertencemos está nos céus» (Fil 3,20). Trata-se, sobretudo, de começarmos a tornar-nos semelhantes a Cristo, «que, sendo rico, Se fez pobre» por nós (2Cor 8,9).

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho de Domingo dia 27 de Julho de 2014

«O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que, quando um homem o acha, esconde-o e, cheio de alegria pelo achado, vai e vende tudo o que tem e compra aquele campo. O Reino dos Céus é também semelhante a um negociante que busca pérolas preciosas e, tendo encontrado uma de grande preço, vai, vende tudo o que tem e a compra. «O Reino dos Céus é ainda semelhante a uma rede lançada ao mar, que apanha toda a espécie de peixes. Quando está cheia, os pescadores tiram-na para fora e, sentados na praia, escolhem os bons para cestos e deitam fora os maus. Será assim no fim do mundo: virão os anjos e separarão os maus do meio dos justos, e lançá-los-ão na fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes. Compreendestes tudo isto?». Eles responderam: «Sim». Ele disse-lhes: «Por isso todo o escriba instruído nas coisas do Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas».

Mt 13, 44-52

O ver, graças à sua união com o ouvir, torna-se seguimento de Cristo

A conexão entre o ver e o ouvir, como órgãos do conhecimento da fé, aparece com a máxima clareza no Evangelho de João, onde acreditar é simultaneamente ouvir e ver. A escuta da fé verifica-se segundo a forma de conhecimento própria do amor: é uma escuta pessoal, que distingue e reconhece a voz do Bom Pastor (cf. Jo 10, 3-5); uma escuta que requer o seguimento, como acontece com os primeiros discípulos que, « ouvindo [João Baptista] falar desta maneira, seguiram Jesus » (Jo 1, 37). Por outro lado, a fé está ligada também com a visão: umas vezes, a visão dos sinais de Jesus precede a fé, como sucede com os judeus que, depois da ressurreição de Lázaro, « ao verem o que Jesus fez, creram n’Ele » (Jo 11, 45); outras vezes, é a fé que leva a uma visão mais profunda: « Se acreditares, verás a glória de Deus » (Jo 11, 40). Por fim, acreditar e ver cruzam-se: « Quem crê em Mim (...) crê n’Aquele que Me enviou; e quem Me vê a Mim, vê Aquele que me enviou » (Jo 12, 44-45). O ver, graças à sua união com o ouvir, torna-se seguimento de Cristo; e a fé aparece como um caminho do olhar em que os olhos se habituam a ver em profundidade. E assim, na manhã de Páscoa, de João — que, ainda na escuridão perante o túmulo vazio, « viu e começou a crer » (Jo 20, 8) — passa-se a Maria Madalena — que já vê Jesus (cf. Jo 20, 14) e quer retê-Lo, mas é convidada a contemplá-Lo no seu caminho para o Pai — até à plena confissão da própria Madalena diante dos discípulos: « Vi o Senhor! » (Jo 20, 18).

Como se chega a esta síntese entre o ouvir e o ver? A partir da pessoa concreta de Jesus, que Se vê e escuta. Ele é a Palavra que Se fez carne e cuja glória contemplámos (cf. Jo 1, 14). A luz da fé é a luz de um Rosto, no qual se vê o Pai. De facto, no quarto Evangelho, a verdade que a fé apreende é a manifestação do Pai no Filho, na sua carne e nas suas obras terrenas; verdade essa, que se pode definir como a « vida luminosa » de Jesus.[24] Isto significa que o conhecimento da fé não nos convida a olhar uma verdade puramente interior; a verdade que a fé nos descerra é uma verdade centrada no encontro com Cristo, na contemplação da sua vida, na percepção da sua presença. Neste sentido e a propósito da visão corpórea do Ressuscitado, São Tomás de Aquino fala de oculata fides (uma fé que vê) dos Apóstolos:[25] viram Jesus ressuscitado com os seus olhos e acreditaram, isto é, puderam penetrar na profundidade daquilo que viam para confessar o Filho de Deus, sentado à direita do Pai.

[24] Cf. Heinrich Schlier, « Meditationen über den Johanneischen Begriff der Wahrheit », in: Besinnung auf das Neue Testament. Exegetische Aufsätze und Vorträge 2 (Friburgo, Basel, Viena 1959), 272.
[25]  Cf. Summa theologiae, III, q. 55, a. 2, ad 1.

Lumen Fidei, 30

«Ditosos os vossos olhos, porque vêem»

Jean Tauler (c. 1300-1361), dominicano de Estrasburgo 
Sermão 53, §§ 4-5, 8


Disse Nosso Senhor: «Muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não o viram» (Lc 10,24). Por profetas entenda-se os grandes espíritos subtis e dados ao raciocínio que se apegam às subtilezas da razão natural e delas têm vaidade; uns olhos assim não são ditosos. Por reis entenda-se os que são por natureza senhores, de energia forte e poderosa, senhores de si próprios, das suas palavras, das suas obras e do seu idioma, e que fazem tudo o que querem com jejuns, vigílias e novenas, fazendo disso grande alarde, como se de algo extraordinário se tratasse, mas desprezam os outros. Também não são esses olhos que são ditosos.

Todas estas pessoas quiseram ver e não viram. Quiseram ver, mas apegaram-se à vontade própria [...], uma vontade que encobre os olhos da alma como uma película ou uma membrana encobre os olhos do corpo, impedindo-os de ver [...]. Quanto mais permanecerdes na vontade própria, mais privados sereis de ver com o olhar interior, uma vez que a verdadeira felicidade advém do abandono verdadeiro, que é o afastamento da vontade própria. Tudo isso nasce do fundo da humildade [...]. Quanto mais pequenos e humildes fordes, menos vontade própria tereis [...].


Quando tudo está em paz, a alma vê a sua própria essência e todas as suas faculdades; reconhece-se como imagem racional d'Aquele de Quem saiu, e os olhos [...] que fixam aí o seu olhar podem perfeitamente ser tidos por ditosos por causa do que vêem. E então sim, é a maravilha das maravilhas que se descobre, o que há de mais puro, de mais certo, aquilo que menos poderá ser-vos tirado (Lc 10,42) [...]. Possamos nós seguir neste caminho e ver de tal modo que os nossos olhos sejam ditosos. Assim Deus nos ajude!

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 26 de julho de 2014

Ditosos, porém, os vossos olhos, porque vêem e os vossos ouvidos, porque ouvem. Em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes e não o viram, ouvir o que ouvis e não o ouviram.

Mt 13, 16-17

sexta-feira, 25 de julho de 2014

«A fé vem da escuta» (Rm 10, 17)

Justamente porque o conhecimento da fé está ligado à aliança de um Deus fiel, que estabelece uma relação de amor com o homem e lhe dirige a Palavra, é apresentado pela Bíblia como escuta, aparece associado com o ouvido. São Paulo usará uma fórmula que se tornou clássica: « fides ex auditu — a fé vem da escuta » (Rm 10, 17). O conhecimento associado à palavra é sempre conhecimento pessoal, que reconhece a voz, se lhe abre livremente e a segue obedientemente. Por isso, São Paulo falou da « obediência da fé » (cf. Rm 1, 5; 16, 26).[23] Além disso, a fé é conhecimento ligado ao transcorrer do tempo que a palavra necessita para ser explicitada: é conhecimento que só se aprende num percurso de seguimento. A escuta ajuda a identificar bem o nexo entre conhecimento e amor.

A propósito do conhecimento da verdade, pretendeu-se por vezes contrapor a escuta à visão, a qual seria peculiar da cultura grega. Se a luz, por um lado, oferece a contemplação da totalidade a que o homem sempre aspirou, por outro, parece não deixar espaço à liberdade, pois desce do céu e chega directamente à vista, sem lhe pedir que responda. Além disso, parece convidar a uma contemplação estática, separada do tempo concreto em que o homem goza e sofre. Segundo esta concepção, haveria oposição entre a abordagem bíblica do conhecimento e a grega, a qual, na sua busca duma compreensão completa da realidade, teria associado o conhecimento com a visão.

Mas tal suposta oposição não é corroborada de forma alguma pelos dados bíblicos: o Antigo Testamento combinou os dois tipos de conhecimento, unindo a escuta da Palavra de Deus com o desejo de ver o seu rosto. Isto tornou possível entabular diálogo com a cultura helenista, um diálogo que pertence ao coração da Escritura. O ouvido atesta não só a chamada pessoal e a obediência, mas também que a verdade se revela no tempo; a vista, por sua vez, oferece a visão plena de todo o percurso, permitindo situar-nos no grande projecto de Deus; sem tal visão, disporíamos apenas de fragmentos isolados de um todo desconhecido.

Lumen Fidei, 29

O SURF DE DEUS

Experiência de contemplação e de testemunho da fé cristã

Não sei se o facto do meu ministério pastoral me obrigar a percorrer, com frequência, a estrada entre o Dafundo e o Estoril, à beira-mar, faz de mim um padre na linha … ou, pelo contrário, um marginal!

Mas, a verdade é que não me canso daquele trajecto que, apesar de conhecido como a palma da mão, é sempre de uma surpreendente beleza. Mais do que as pequenas fortalezas costeiras, a contrastar com a imponência do Forte de São Julião da Barra, ou o Bugio, ou ainda os cruzeiros que, de manhã cedo, entram pelo rio e, ao crepúsculo, desaparecem no horizonte, entusiasma-me o espectáculo dos surfistas que, durante todo o ano, se podem ver nalgumas praias.

Ao volante e sempre apressado, quase nunca tenho o tempo que desejaria para uma observação mais prolongada, excepto quando o trânsito está mais lento ou o semáforo me concede alguns segundos de distracção. É então que contemplo, com alguma inveja, aquelas pranchas à tona da água, em velozes ziguezagues entre as ondas, aproveitando a força da maré, em jogos de equilíbrio que parecem danças guerreiras, ou um estranho ballet. O mar, esse espelho de água em que o azul do céu se reflecte, está por vezes calmo mas, em geral, o vento suscita uma considerável ondulação que, nas marés vivas, chega a ser furiosa, ouvindo-se então um bramido assustador, que recorda o mítico Adamastor. À fragilidade do nauta, sem outra defesa que a sua destreza sobre a instável plataforma, assiste apenas o seu saber de experiência feito e, se a tiver, a sua fé. Foi essa a ciência e essa a luz sobrenatural – Lumen fidei, como recorda a primeira encíclica do Papa Francisco – que guiou os navegantes lusíadas que, aventurando-se por rotas desconhecidas, deram novos mundos ao mundo e dilataram a fé.

Neste Ano da Fé e já na iminência de mais umas Jornadas Mundiais da Juventude, quero crer que muitos jovens cristãos sulcarão as marés adversas, com a determinação e a alegria da fé. Para um cristão, esta apaixonante prática desportiva não pode ser apenas uma mera diversão, nem uma exibição egoísta, nem muito menos uma agressiva competição, mas uma escola de vida cristã. Deve ser – porque não? – experiência de Deus na comunhão da natureza, ou seja, oração. E testemunho de fé na vivência da caridade com todos os irmãos.

Quando passo pela praia e vejo o «cardume» de jovens desportistas a surfar, não posso deixar de sorrir e de rezar por quantos navegam pelas tumultuosas águas do mundo, pedindo a Deus que nos conceda a graça de poder ver, um dia, sobre os altares, alguns dos que agora vejo sobre as pranchas. Com quanta alegria e devoção eu rezaria a um santo surfista!

P. Gonçalo Portocarrero de Almada in 'Hora da Verdade' 21.07.2013

ORAÇÃO DO SURFISTA

Para rezar antes e depois de ir ao mar

Obrigado, Deus-Pai, pela beleza do mar
E pela grandeza do vento e da maré!
Fazei que sempre vos saibamos amar
E aumentai em nós o dom da vossa fé!

Jesus, que andastes sobre as águas do mar,
Dizei-nos o que outrora mandastes a Simão
Para que sobre as ondas saibamos caminhar
E se o pé faltar, não nos falte a vossa mão!

Espírito Santo, que sois fogo e vento,
Acendei em nós o lume da caridade
Para que aos náufragos demos alento
E ajuda a quem tenha necessidade!

Oh Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe,
Estrela do Mar: sede sempre o nosso norte
Porque quem na vida a seu lado vos tem,
É feliz agora e na hora da sua morte!

Anjos da Guarda, doce companhia,
E vós, bem-aventurados Santos e Santas:
Socorrei-nos e salvai-nos, noite e dia,
Guiai nossas almas e as nossas pranchas!

«Podeis beber o cálice que Eu estou para beber?»

São Basílio (c. 330-379), monge, bispo de Cesareia na Capadócia, doutor da Igreja 
Homília sobre o salmo 115, §4.


«Como retribuirei ao Senhor?» (Sl 116,12). Nem com sacrifícios nem com holocaustos, nem com a observância dos preceitos da lei, mas com toda a minha vida. E é por isso que o salmista diz: «Elevarei o cálice da salvação» (v. 13). Os trabalhos que sofreu nos combates da sua devoção filial a Deus e a constância pela qual resistiu ao pecado até à morte, a isso chama o salmista o seu cálice.

É a propósito desse cálice que o próprio Senhor Se exprime assim no Evangelho: «Meu Pai, se é possível, afaste-se de Mim este cálice» (Mt 26,39); e aos seus discípulos: «Podeis beber o cálice que Eu estou para beber?» Com isto queria referir-Se à morte que iria sofrer pela salvação do mundo. Por isso diz: «elevarei cálice da salvação», isto é, todo o Meu ser se lança sedento para a consumação do martírio, a ponto de achar os tormentos sofridos nos combates do amor filial um repouso para a alma e para o corpo, e não um sofrimento. «Oferecer-Me-ei ao Senhor», diz, «como um sacrifício e uma oblação». […] Estou pronto para testemunhar essas promessas perante todo o povo: «Cumprirei as minhas promessas feitas ao Senhor na presença de todo o seu povo» (v. 14).

(Fonte: Evangelho Quotidiano)