Deixemos o Senhor escrever a história

O homem é o sobrenome de Deus: de facto, o Senhor pega o nome de cada um de nós – quer sejamos santos quer pecadores – para fazer dele o próprio sobrenome. Porque ao encarnar-se o Senhor fez história com a humanidade: a sua alegria foi partilhar a sua vida connosco, «e isto comove: tanto amor, tanta ternura».

Foi com o pensamento dirigido ao Natal já iminente que o Papa Francisco comentou na terça-feira, 17 de Dezembro, as duas leituras propostas pela liturgia da palavra, tiradas respectivamente do Génesis (49, 2.8-10) e do Evangelho de Mateus (1, 1-17). No dia do seu septuagésimo sétimo aniversário o Santo padre presidiu como de costume à missa matutina na capela de Santa Marta. Concelebrou entre outros o cardeal decano Angelo Sodano, que lhe expressou as felicitações de todo o colégio cardinalício.

Na homilia, centrada na presença de Deus na história da humanidade, o bispo de Roma indicou em dois termos – herança e genealogia – as chaves para interpretar respectivamente a primeira leitura (relativa à profecia de Jacob que reúne os seus filhos e prediz uma descendência gloriosa para Judá) e o excerto evangélico que contém a genealogia de Jesus. Reflectindo em particular sobre esta última, evidenciou que não se trata de «uma lista telefónica», mas de «um tema importante: é história pura», porque «Deus enviou o seu filho» entre os homens. E, acrescentou, «Jesus é consubstancial ao pai, Deus; mas também consubstancial à mãe, uma mulher. E esta é aquela consubstancialidade da mãe: Deus fez-se história, Deus quis tornar-se história. Está connosco. Caminhou connosco».

Um caminho – prosseguiu o bispo de Roma – iniciado há muito tempo, no Paraíso, logo depois do pecado original. De facto, a partir daquele momento, o Senhor «teve uma ideia: caminhar connosco». Por isso «chamou Abraão, o primeiro nomeado nesta lista, e convidou-o a caminhar. E Abraão começou aquele caminho: gerou Isaac, e Isaac gerou Jacob, e Jacob Judá». E assim por diante, avançando na história da humanidade. Portanto, «Deus caminha com o seu povo», porque «não quis salvar-nos sem história; quis fazer história connosco».

Uma história, afirmou o Pontífice, feita de santidade e de pecado, porque na lista da genealogia de Jesus há santos e pecadores. Entre os primeiros o Papa recordou «o nosso pai Abraão» e «David, que depois do pecado se converteu». Entre os segundos indicou «pecadores de alto nível, que cometeram pecados graves», mas com os quais Deus igualmente «fez história». Pecadores que não souberam responder ao projecto que Deus tinha imaginado para eles: como «Salomão, tão grandioso e inteligente, que acabou como um pobrezinho que nem sabia como se chamava». E no entanto, constatou o Papa Francisco, Deus estava também com ele. «E isto é bonito: Deus faz história connosco. E mais, quando Deus quer dizer quem é, diz: eu sou o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob».

Eis por que à pergunta «qual é o sobrenome de Deus?» para o Papa Francisco é possível responder: «Somos nós, cada um de nós. Ele toma nosso nome para fazer dele o seu sobrenome». E no exemplo oferecido pelo Pontífice não estão só os pais da nossa fé, mas também de pessoas comuns. «Eu sou o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob, de Pedro, de Mariazinha, de Harmony, de Marisa, de Simão, de todos. De nós assume o sobrenome. O sobrenome de Deus é cada um de nós», explicou.

Eis a constatação de que tomando «o sobrenome do nosso nome, Deus fez história connosco»; aliás, ainda mais: «deixou que escrevêssemos a história». E nós ainda hoje continuamos a escrever «esta história» que é feita «de graça e de pecado», enquanto o Senhor não se cansa de nos seguir: «esta é a humildade de Deus, a paciência de Deus, o amor de Deus». De resto, também «o livro da Sabedoria diz que a alegria do Senhor está entre os filhos do homem, connosco».

«Ao aproximar-se o Natal» para o Papa Francisco – como ele mesmo confidenciou concluindo a reflexão – foi natural pensar: «Se ele fez a sua história connosco, se tomou o seu sobrenome de nós, se deixou que escrevêssemos a sua história», nós por nossa vez deveríamos deixar que Deus escrevesse a nossa. Porque, esclareceu, «a santidade» é precisamente «deixar que o Senhor escreva a nossa história». E estes foram os votos de Natal que o Pontífice quis dirigir «a todos nós». Felicitações que são um convite a abrir o coração: «Faz com que o Senhor escreva a tua história e que tu deixes que ele a escreva».

(Fonte: 'news.va')

Vídeo da ocasião em italiano

"Evangelii Gaudium" (21)

Não à guerra entre nós
98. Dentro do povo de Deus e nas diferentes comunidades, quantas guerras! No bairro, no local de trabalho, quantas guerras por invejas e ciúmes, mesmo entre cristãos! O mundanismo espiritual leva alguns cristãos a estar em guerra com outros cristãos que se interpõem na sua busca pelo poder, prestígio, prazer ou segurança económica. Além disso, alguns deixam de viver uma adesão cordial à Igreja por alimentar um espírito de contenda. Mais do que pertencer à Igreja inteira, com a sua rica diversidade, pertencem a este ou àquele grupo que se sente diferente ou especial.

99. O mundo está dilacerado pelas guerras e a violência, ou ferido por um generalizado individualismo que divide os seres humanos e põe-nos uns contra os outros visando o próprio bem-estar. Em vários países, ressurgem conflitos e antigas divisões que se pensavam em parte superados. Aos cristãos de todas as comunidades do mundo, quero pedir-lhes de modo especial um testemunho de comunhão fraterna, que se torne fascinante e resplandecente. Que todos possam admirar como vos preocupais uns pelos outros, como mutuamente vos encorajais animais e ajudais: «Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 35). Foi o que Jesus, com uma intensa oração, Jesus pediu ao Pai: «Que todos sejam um só (…) em nós [para que] o mundo creia» (Jo 17, 21). Cuidado com a tentação da inveja! Estamos no mesmo barco e vamos para o mesmo porto! Peçamos a graça de nos alegrarmos com os frutos alheios, que são de todos.

100. Para quantos estão feridos por antigas divisões, resulta difícil aceitar que os exortemos ao perdão e à reconciliação, porque pensam que ignoramos a sua dor ou pretendemos fazer-lhes perder a memória e os ideais. Mas, se virem o testemunho de comunidades autenticamente fraternas e reconciliadas, isso é sempre uma luz que atrai. Por isso me dói muito comprovar como nalgumas comunidades cristãs, e mesmo entre pessoas consagradas, se dá espaço a várias formas de ódio, divisão, calúnia, difamação, vingança, ciúme, a desejos de impor as próprias ideias a todo o custo, e até perseguições que parecem uma implacável caça às bruxas. Quem queremos evangelizar com estes comportamentos?

101. Peçamos ao Senhor que nos faça compreender a lei do amor. Que bom é termos esta lei! Como nos faz bem, apesar de tudo amar-nos uns aos outros! Sim, apesar de tudo! A cada um de nós é dirigida a exortação de Paulo: «Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem» (Rm 12, 21). E ainda: «Não nos cansemos de fazer o bem» (Gal 6, 9). Todos nós provamos simpatias e antipatias, e talvez neste momento estejamos chateados com alguém. Pelo menos digamos ao Senhor: «Senhor, estou chateado com este, com aquela. Peço-Vos por ele e por ela». Rezar pela pessoa com quem estamos irritados é um belo passo rumo ao amor, e é um acto de evangelização. Façamo-lo hoje mesmo. Não deixemos que nos roubem o ideal do amor fraterno!

'Conto de Natal' de Joaquim Mexia Alves


Curvado, mais pelo frio do que pelo peso da idade, caminhava apressado, arrastando os pés pela rua molhada, nem sequer sentindo que a água entrava pelos buracos dos sapatos já velhos e rotos.
Fosse esse o seu pior mal!

Tinha perdido a noção das horas e dos dias já há muito tempo, mas esta noite ele sabia qual era, e uma profunda tristeza juntava-se ao desespero da sua vida.

Era noite Natal, não tinha dúvidas, pois bastava olhar para as pessoas que por ele passavam, para perceber isso mesmo.

Enquanto caminhava naquela noite fria e chuvosa, a memória transportou-o para uma sala, onde uma lareira grande aquecia a casa e os corações à sua volta.
Mesmo ao lado da lareira o presépio, feito com todo o esmero, com musgo como deve ser, e com as figuras tradicionais que representavam aquilo que deviam representar.
No canto esquerdo da sala, a árvore de Natal, simples e discreta, porque devia ser o presépio a ocupar o lugar de destaque.
Por baixo da árvore, embrulhos de todas as cores e feitios, os presentes de Natal.

Não tinha a certeza, mas pareceu-lhe que, por debaixo da barba por fazer há tanto tempo, um sorriso se tinha aproximado dos seus lábios.

Pieguices, pensou ele, coisas do passado que já não voltam!

Mas isso obrigou-o a recordar a sua infância no Natal em casa dos seus pais, à volta do presépio, e a voz profunda do seu pai repetindo todos os anos:
Se deixarmos Jesus nascer nos nossos corações e se com Ele vivermos, nada nem ninguém nos pode tirar a paz e a alegria, e Ele nunca nos deixará sozinhos.

Tretas, disse ele entre dentes, tretas, basta bem olhar para mim!

Lembrou-se então que tinha seguido o conselho do seu pai durante uns anos.
O curso acabado, o primeiro trabalho, a primeira empresa, o seu casamento, a filha e o filho, a casa boa e a boa vida, uma aparente felicidade e a certeza de que nada lhe faltaria.
Algures durante esses anos afastou-se do conselho do pai e Jesus deixou de fazer parte da sua vida, embora, claro, comemorasse o Natal, tentando dar sempre os melhores presentes, até para mostrar como estava bem na vida.

E depois veio aquele ano terrível!
As finanças entraram em colapso, as encomendas deixaram de existir, deixou de haver dinheiro para os ordenados e finalmente os bancos exigiram o pagamento dos valores que tinha pedido para investir na empresa.
Num instante viu-se na rua, sem empresa, sem casa, sem nada e com uma vergonha impossível de suportar.
O mundo tinha-se abatido sobre ele e nada nem ninguém o podia ajudar!
Achava-se um nada, um ninguém, uma vida sem sentido e só a falta de “coragem” é que o impedia de pôr fim à vida.

Um dia não podendo suportar mais a vergonha, afastou-se definitivamente da família, dos filhos, e embrenhou-se na rua, onde passou a viver da esmola, da caridade, dos expedientes de momento, sem qualquer rumo, sem qualquer sentido, esperando apenas que a morte o levasse.

Tinha desistido de si próprio!

Tinha reparado como esta vida de rua, onde andrajoso e sujo agora vivia, podia transformar um homem em coisa nenhuma.
Havia pessoas que ele conhecia e passavam por ele na rua e, se ao princípio lhe parecia que o evitavam, rapidamente começou a perceber que agora nem o reconheciam, aliás, era um sentimento como se não existisse, ou seja, viam-no, mas era como se ele fosse transparente.

Já não havia nada a fazer, já não era ninguém, já não tinha sequer existência!

Lembrou-se então, nem percebia porquê, do conselho do seu pai, e pensou na sua miséria:
Será que se eu tivesse continuado a deixar nascer Jesus no meu coração, e a viver com Ele todos os dias, agora estaria melhor? Seria verdade que Ele estaria sempre comigo, até aqui na rua onde estou?

Voltou-lhe ao pensamento a frase que há um pouco tinha sussurrado entre dentes:
Tretas, basta bem olhar para mim!

Mas levado não sabia bem porquê, num murmúrio para si, quase desafiou Jesus dizendo:
Olha Jesus, hoje é noite de Natal. Por aqueles tempos em que Te segui arranja lá qualquer coisa que me faça sentir melhor!

Riu-se de si próprio, pensando que agora já não estava apenas só e sem nada, agora também estava louco!

Continuou a caminhar apressado, pois sabia bem que a carrinha daqueles jovens que lhes levavam à noite, comida e bebida quentes, devia estar a chegar ao sítio do costume, e ele queria ser dos primeiros, para ainda ter de beber e de comer.

Chegou enfim ao local quase ao mesmo tempo em que a carrinha aparecia, e reparou que felizmente ainda estavam poucos colegas de infortúnio à espera da distribuição da comida e da bebida.

Olhou para a carrinha e reparou que eram dois rapazes e duas raparigas que faziam a distribuição, mas logo desviou o olhar, porque se tinha vergonha de tudo, dos jovens ainda pior, talvez porque apesar de tudo, sentisse que lhes estava a dar um mau testemunho de vida, a eles que afinal ainda tinham a vida toda pela frente.

Aproximou-se de cabeça baixa e recebeu das mãos de uma das jovens uma caneca fumegante e um pedaço de pão com carne.
A jovem disse-lhe então com uma voz suave:
Ao menos olhe para mim!

Num momento fugaz levantou a cabeça de olhos fechados, com vergonha, e baixou-a imediatamente, afastando-se rapidamente do local.

Não tinha dado três passos sentiu uma mão no ombro e ouviu uma voz que lhe dizia agora mais insistentemente, quase numa súplica:
Olhe para mim!

Havia naquela voz algo familiar que o levou a levantar a cabeça e olhar nos olhos da jovem que lhe tocava.

Nesse momento ouviu outra vez aquela voz que lhe atingiu o coração, e dizia agora repassada de tristeza e alegria ao mesmo tempo:
Pai, ó pai, és tu?!

Deixou cair tudo no chão, pois aqueles braços apertavam-no de tal maneira que ele não podia quase respirar.

Abraçou-se a ela também, tremendo, a garganta seca, não o deixava proferir palavra.

Ouviu então novamente a voz da sua filha que lhe dizia:
Anda pai, vamos para casa. Temos estado todos os dias à tua espera!

Aquelas e aqueles que ali estavam à volta daquela cena, podiam jurar que naquele momento tinham ouvido um coro celestial que cantava:
Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados!

Monte Real, 3 de Dezembro de 2009

Joaquim Mexia Alves

DEIXE-O ENTRAR!* - Neste Natal, dê colo a quem o não tem

Naquela manhã chuvosa e triste, foi maior a afluência de passageiros aos autocarros da carreira que, várias vezes ao dia, faziam a ligação entre um subúrbio e o centro da cidade. O motorista, já cansado pelas horas de serviço ao volante da possante viatura, parecia carrancudo. Os passageiros, num mutismo muito matinal, exibiam também caras pouco amistosas, indiferentes ante a paisagem costumeira, perdidos em cogitações à volta das suas habituais preocupações.

O ambiente crispou-se quando duas pessoas, a propósito de um lugar vago, encetaram uma discussão acesa. Ambas pretendiam o assento, a que cada qual se julgava com melhor direito. Enquanto o passageiro mais velho invocava a sua idade, a outra candidata pretendia ter sido a primeira a detectar a vaga. O motorista, sendo a única autoridade presente, tentou apaziguar os ânimos, mas sem êxito. Passageiros houve que tomaram partido, ora pela pessoa idosa, ora pela outra de meia-idade que, mais afoita, ocupou o lugar disputado para, com o facto consumado, atalhar a discussão, mas essa sua atitude suscitou um coro de vozes indignadas.

Entretanto, o autocarro travou e imobilizou-se em mais uma paragem. Desceram algumas pessoas e, depois, entrou uma jovem mãe, que trazia embrulhado num xaile o seu bebé. Apesar da falta de lugares e a recente discussão, de que ainda se ouviam alguns ecos, duas ou três pessoas levantaram-se e a mulher, agradecida, pôde sentar-se com o filho ao colo. O pequenito, de faces rosadas e olhinho muito vivo, espreitava para tudo e para todos com muita atenção. Perplexo, só sossegava quando o seu olhar se cruzava com o de sua mãe, o único rosto que lhe era familiar.

Naquele ambiente tenso e frio de uma manhã qualquer, escura e aziaga, tudo parecia sombrio, mas a presença daquele bebé logrou que as faces duras dos trabalhadores se descontraíssem e que os seus lábios circunflexos se abrissem em discretos sorrisos. Foi como se um raio de sol entrasse naquele espaço e o azul do céu florisse nos corações daquelas mulheres e homens, que pareciam condenados à dura escravidão de um trabalho servil. Um milagre escondido num menino recém-nascido.

O Natal é Deus presente num sorriso de amor. O Omnipotente fez-se visível na fraqueza do mais pequenino ser humano. Inerme, Ele desafia o poder dos poderosos. Pobre, Ele ri-se da opulência dos abastados. Perseguido e ignorado, faz-se irmão de todos os indigentes e humilhados, porque os párias deste mundo não estão esquecidos para Deus.

No silêncio da sua voz, Ele fala do amor do Pai. A sua mudez cala as discussões, o seu sorriso destrói os ressentimentos, a limpidez do seu olhar purifica as consciências, une as famílias e pacifica as nações. Porque a sua mão, pequenina mas poderosa, abençoa o mundo.

Neste Natal, quando Ele chegar e bater de mansinho à sua porta, deixe-O entrar. Prepare-Lhe, pelo sacramento da penitência, um lugar no seu coração, porque é aí que, pela Eucaristia, Ele quer nascer de novo. E, depois, faça uma paragem na sua vida, abra os seus braços e dê o seu colo a quem ainda o não tem. Porque esse menino sem ninguém é, como Jesus, filho de Deus, mas precisa, aqui na terra, de uns pais também.

P. Gonçalo Portocarrero de Almada in Voz da Verdade de 15.12.2013

*Para o Refúgio Aboim Ascensão, com muito apreço e amizade.

Última Semana do Advento - "Mais uma vez o Natal nos bate à porta"

Mais uma vez o Natal nos bate à porta. E, com ele, todas as esperanças que, para nós, cristãos, representa a Encarnação de Jesus Cristo, de acordo com a promessa que Deus fez aos nossos primeiros pais, logo após a tremenda desobediência do pecado original. Advertindo o demónio, disse Iavé: Estabelecerei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a descendência dela. Esta há-de pisar-te a cabeça, e tu armarás traições ao seu calcanhar (Gén 3, 15).

O Senhor fala para seres inteligentes, que dominam as coisas quando as conhecem e as compreendem e, por isso mesmo, as podem governar ou servir-se delas para seu próprio benefício. É óbvio que Adão e Eva, ao cederem à tentação que o demónio lhes lançou, ficaram seus escravos, pois deram mais crédito ao que o diabo lhes insinuou do que à palavra veracíssima de Deus. Nesta nova condição, perderam o dom de um dia viverem na eternidade com Deus, e passaram a sofrer e a morrer. No entanto, o homem tinha sido dotado com uma alma imortal, de natureza espiritual, por criação divina. Esta continuaria a existir depois da morte, podendo alcançar, quando muito, uma felicidade natural, de acordo com os méritos maiores ou menores que conquistasse na sua vida terrena. Ou então, ser condenada à convivência horrorosa com todos os seres que recusaram soberbamente o Amor de Deus, como os anjos rebeldes que deram origem ao inferno.

Mas se há alguém, que, da descendência da mulher, é capaz de pisar a cabeça do demónio, isto significa que retirará dele o poder com que ficou sobre os nossos primeiros pais e os seus descendentes. E ainda, que os ataques que ele conseguir armar aos que forem libertados do seu jugo – as tais “traições ao seu calcanhar” – serão ineficazes se houver fidelidade a Deus. Vemo-lo com evidente clareza na forma como o próprio Jesus Se negou a seguir os caminhos que o demónio Lhe sugeriu, quando O tentou.

Esse alguém da descendência da mulher, dizem os exegetas da Sagrada Escritura e o Magistério da Igreja, é Cristo, concebido miraculosamente, por obra e graça do Espírito Santo, sem o concurso de varão, no seio puríssimo da Virgem Maria. Deste modo, a passagem do Génesis citada, é considerada como o primeiro anúncio da Encarnação de Jesus, ou seja, o chamado proto (= primeiro) Evangelho.

À Encarnação une-se o seu fim, que foi a Redenção, isto é, a reconquista, por parte de Cristo com os seus méritos, da condição original do homem ser candidato à felicidade eterna, junto de Deus (o Céu), dom que havia perdido com o pecado original.

Com a concepção de Jesus, manifesta-se essa acção divina de Amor pelo homem. Depois, concretiza-se ainda mais, se se pode assim dizer, quando O vemos nascer, totalmente pobre e totalmente inerme, no presépio de Belém, sob os olhares maravilhados de Nossa Senhora e de S. José, aos quais rapidamente se juntam os dos pastores das imediações, alertados pelos anjos que aparecem nos céus.

É esta criança simples e pobre, que veremos mais tarde, já adulta, pregar o Reino de Deus, sofrer a Paixão e Morte, ressuscitar e subir aos Céus e aí nos esperar nas muitas moradas que, com o seu Amor e o seu sacrifício, nos veio preparar nos anos que passou aqui na terra.


Olhemos o presépio que vamos fazer nas nossas casas. Procuremos descobrir todas as lições de Amor e de desprendimento que ele comporta. O Menino Jesus, deitado na manjedoura, é o Deus-feito-Homem que nos ama loucamente, nos perdoa os nossos pecados, nos alenta a segui-Lo nos caminhos nem sempre fáceis que a Sua Cruz comporta e nos quer estreitar no abraço eterno do Céu, a fim de que sejamos inteiramente felizes. Para isso nos criou.A todos, votos de um Santo Natal e de Boas Festas.

(Pe. Rui Rosas da Silva – Prior da Paróquia de Nossa Senhora da Porta Céu em Lisboa in Boletim Paroquial de Dezembro de 2008, selecção do título da responsabilidade do blogue)

O que sucedeu no Concílio de Niceia? - Respondem os especialistas da Universidade de Navarra

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Jesus Cristo, Filho de David, Filho de Abraão

Papa Francisco 
Encíclica «Lumen fidei / A luz da fé», §§8-9 (trad. © Libreria Editrice Vaticana, rev)


Abraão, nosso pai na fé: A fé desvenda-nos o caminho e acompanha os nossos passos na história. Por isso, se quisermos compreender o que é a fé, temos de explanar o seu percurso, o caminho dos homens crentes. […] Um posto singular ocupa Abraão, nosso pai na fé. Na sua vida, acontece um facto impressionante: Deus dirige-lhe a Palavra, revela-Se como um Deus que fala e chama-o pelo seu nome. A fé está ligada à escuta. Abraão não vê Deus, mas ouve a sua voz. Deste modo, a fé assume um carácter pessoal: o Senhor não é o Deus de um lugar, nem mesmo o Deus vinculado a um tempo sagrado específico, mas o Deus de uma pessoa, concretamente o Deus de Abraão, Isaac e Jacob, capaz de entrar em contacto com o homem e de estabelecer com ele uma aliança. A fé é a resposta a uma Palavra que interpela pessoalmente, a um Tu que nos chama pelo nosso nome.

Esta Palavra comunica a Abraão um chamamento e uma promessa. Contém, antes de tudo, um chamamento a sair da própria terra, um convite a abrir-se a uma vida nova, o início de um êxodo que o encaminha para um futuro inesperado (Gn 12,1). A perspectiva que a fé vai proporcionar a Abraão estará sempre ligada a este passo em frente que ele tem de dar: a fé «vê» na medida em que caminha, em que entra no espaço aberto pela Palavra de Deus.

Mas tal Palavra contém ainda uma promessa: a tua descendência será numerosa, serás pai de um grande povo (cf Gn 13,16; 15,5; 22,17). É verdade que a fé de Abraão, enquanto resposta a uma Palavra que a precede, será sempre um acto de memória; contudo esta memória […], sendo memória de uma promessa, torna-se capaz de abrir ao futuro, de iluminar os passos ao longo do caminho. Assim […], está intimamente ligada à esperança.

(Fonte: Evangelho Quotidiano)

O Evangelho do dia 17 de dezembro de 2013

Genealogia de Jesus Cristo, filho de David, filho de Abraão. Abraão gerou Isaac, Isaac gerou Jacob, Jacob gerou Judá e seus irmãos. Judá gerou, de Tamar, Farés e Zara, Farés gerou Esron, Esron gerou Aram. Aram gerou Aminadab, Aminadab gerou Naasson, Naasson gerou Salmon. Salmon gerou Booz de Raab, Booz gerou Obed de Rut, Obed gerou Jessé. Jessé gerou o rei David. David gerou Salomão daquela que foi mulher de Urias. Salomão gerou Roboão, Roboão gerou Abias, Abias gerou Asa. Asa gerou Josafat, Josafat gerou Jorão, Jorão gerou Ozias. Ozias gerou Joatão, Joatão gerou Acaz, Acaz gerou Ezequias. Ezequias gerou Manassés, Manassés gerou Amon, Amon gerou Josias. Josias gerou Jeconias e seus irmãos, na época da deportação para Babilónia. E, depois da deportação para Babilónia, Jeconias gerou Salatiel, Salatiel gerou Zorobabel. Zorobabel gerou Abiud, Abiud gerou Eliacim, Eliacim gerou Azor. Azor gerou Sadoc, Sadoc gerou Aquim, Aquim gerou Eliud. Eliud gerou Eleazar, Eleazar gerou Matan, Matan gerou Jacob, e Jacob gerou José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado Cristo. Assim, são catorze todas as gerações desde Abraão até David; e catorze gerações desde David até à deportação para Babilónia, e também catorze as gerações desde a deportação para Babilónia até Cristo. 

Mt 1, 1-17